segunda-feira, 27 de outubro de 2008

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NOÇÕES INTRODUTÓRIAS





1) DIREITO

O estudo do Direito Administrativo há de partir, necessariamente, da noção geral do Direito, tronco de onde se ramificam todos os ramos da Ciência Jurídica. O Direito, objetivamente considerado, é o conjunto de normas ou regras de conduta coativamente impostas pelo poder estatal. Na clássica conceituação de Jhering, é o complexo das condições existenciais da sociedade, asseguradas pelo poder público. Em última análise, o Direito se traduz em princípios de conduta social, tendentes a realizar a justiça.

Quando esses princípios são sustentados em afirmações teóricas formam a Ciência Jurídica, em cuja cúpula está a Filosofia do Direito; quando esses mesmos princípios são concretizados em norma jurídica, temos o Direito Positivo, expresso na Legislação. A sistematização desses princípios, em normas legais, constitui a ordem jurídica, ou seja, o sistema legal adotado para assegurar a existência do Estado e a coexistência pacífica dos indivíduos na comunidade.



2)SOCIEDADE E ESTADO

É uma característica da natureza humana conviver em sociedade. Aliás, observando o mundo que nos circunda, podendo constatar que todos os fenômenos prendem-se a uma das seguintes realidade: ou à da natureza física, que se guia por leis fixas e externas ao próprio homem (lei da gravidade), ou a resultante do atuar em sociedade, da qual resulta a cultura. Podemos, pois, afirmar que sempre estaremos diante de algum fenômeno da natureza física ou cultural. Esta última é resultante da atividade humana e, portanto, é guiada por leis que o próprio homem cria e protege.

A sociedade é o modo natural de o ser humano viver. Ao contrário de outras espécies, o homem não se realiza solitariamente, é um ser gregário, uma vez que só pode cumprir e alcançar suas finalidades junto com outros homens. Pois, os indivíduos têm necessidades que somente podem ser supridas pela atividade conjunta e não pela atuação isolada. Assim sendo, reúnem-se em sociedade. Essas sociedade não só obedecem a uma ordem, como também perseguem um fim. Isso levanta a questão da relação do homem com a sociedade. Uma vez que, substancialmente, só existem os indivíduos. A sociedade, o Estado ou mesmo, outras formas associativas (a família, a empresa, a igreja, o clube, partidos políticos), são resultantes de uma atuação humana voltada ao atingimento de um fim.

Toda vez, pois, que ocorre a conjugação desses elementos - do elemento humano mais a existência de um objetivo comum e, ainda, uma ordem que se expressa através de normas - estaremos diante de uma modalidade qualquer de sociedade. Na verdade, são múltiplas as sociedade. Há as que visam fins comerciais, outras, fins religiosos, outras, ainda, fins de benemerência; porém, existe uma dentre elas que tem como finalidade um espectro extremamente amplo de objetivos, que, globalmente considerados, formam o BEM COMUM.

Trata-se, no fundo, de uma sociedade que é mais abrangente de todas. Uma sociedade que visa propiciar condições para que o homem viva com outros homens, além de ter condições, inclusive, de criar outras sociedade dentro dela mesma. A esta sociedade abrangente, de fins variáveis, conforme os tempos e sempre voltados ao bem de todos, dá-se o nome de Estado. Ocorre que, nem sempre foi assim. Em outras épocas a sociedade política ganhava outro nomes. A partir do mundo moderno consagrou-se a palavra Estado, cujo o teórico no que diz respeito a sua formação foi Maquiavel, para designar a sociedade de fins abrangentes, envolventes das demais e detentora de uma modalidade especial de poder.
De fato, quando falamos que a sociedade pressupõe ordem, normas, implicitamente estamos nos referindo ao poder, que é o que confere eficácia a essas ordens e a essas normas da sociedade. O poder é de existência difusa na sociedade (Teoria do Contrato Social - Rousseau). Há poderes de diversas espécies nos diversos setores da atividade humana. O poder vem a ser a faculdade que alguém tem de obter obediência para suas ordens. Não há que se confundir poder com força física. Aliás, quem faz uso da força, a rigor, não está fazendo uso do poder, porque a força quebranta a própria vontade daquele sobre quem é exercida.

Assim, diante da frase a bolsa ou a vida, a vítima não cede a rigor ao poder de outrem, mas à força física do agressor. O poder embora não prescinda também de certa quantidade de força física, tem uma essência sobretudo ética. Pois, volta-se a tingir a vontade daquele a quem é imposto. Todo poder, portanto, envolve obediência; implica uma adoção voluntária e não por força de um elemento que iniba o exercício da própria vontade. O Estado necessita visceralmente do exercício do poder, sem o que não pode assegurar a realização do atingimento de seus fins.

Esse poder encontra-se institucionalizado e expressa-se através de autoridades que, pelo fato de ocuparem determinados postos na sociedade, têm a capacidade de editar normas cuja obediência é forçosa. Não é, portanto, a lei do mais forte, mas a lei daquele que é legitimado para editá-la. Uma vez que, não pode haver ordem acima do Direito, sob pena da inversão dos valores da força do Direito, pelo direito da Força. Daí o porque do fenômeno do Poder, no Estado, estar intrinsecamente ligado ao Direito.

O Estado não pode exercer o Direito de forma desordenada, inestável, mutável, segundo as circunstâncias. Precisa de um poder que se exercite sob normas estáveis, que definam aquele que é competente que exercê-lo e quais as condições que devem ser satisfeitas para que se ascenda a esse poder, assim como definam seus limites e o seu controle. Essas normas voltam-se tanto para a constituição do Estado, quanto para a definição dos direitos dos próprios indivíduos.

Destarte, o Estado, ao fazer uso da estrutura adequada para o atingimento de suas finalidade, dá origem a um tipo de poder, que é o poder público, cuja natureza é tão abrangente que o diferencia dos demais poderes existentes em setores específicos da sociedade.



3)ESTADO, PODER E DIREITO

O poder é um instrumento indispensável para que o Estado atinja as suas finalidades, sendo expressão do caráter superior deste ente. É por esta razão que o poder estatal lhe confere o seu atributo da soberania, consistente no fato de formalmente não existir outro poder mais forte do que ele. Podem existir os poderes de outros Estados que se igualam formalmente, mas, dentro do mesmo Estado, todos os poderes têm que ser exercidos na conformidade com a ordem jurídica existente. O poder exercido em oposição à ordem jurídica torna-se um poder ilícito; seus atos são criminosos e, em conseqüência, perseguidos e punidos pelo Estado.

O poder no Estado tem a sua manifestação primeira na ocasião mesma da sua constituição. A esse poder que constitui o Estado dá-se o nome de Poder Constituinte. Exprime-se através da edição de uma Constituição, norma superior dentro do ordenamento jurídico estatal, que estabelece as funções fundamentais mediante as quais o Estado atingirá os seus fins: função legislativa, função executiva e função judiciária ou jurisdicional, assim como estabelece os órgãos que desempenharão: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Para este fenômeno dá-se o nome de institucionalização do poder. É a própria Constituição que institui e reconhece os poderes existentes no Estado. Dá-se, a esses poderes, reconhecíveis no funcionamento normal do Estado, o nome de poderes constituídos. Em oposição ao Poder Constituinte, que subjaz a todos e que se encontra permanentemente no povo em estado de virtualidade, de latência, já que o seu exercício é fugaz e raro; só ocorre nos momentos de constituição ou de reconstituição do Estado. Frise-se, este Poder Constituinte reside no povo.

No entanto, não basta organizar-se instituições que desfrutem do poder. É preciso que este (poder) se manifeste através do exercício, que se faça valer em casos concretos. Pois, é através desta atuação que o Estado atinge o seu bem comum. O poder é, portanto, um meio e não um fim em si mesmo. Consiste no instrumento de que se vale o Estado para atingir o bem comum, sua verdadeira finalidade.
4)PERSONALIDADE ESTATAL

O Estado cria a ordem jurídica, e ao fazê-lo atribui a si mesmo a condição de ser um dos centros de direitos e obrigações. Pois, o ente estatal atua como pessoa jurídica, dotado que é de personalidade.

O Estado desdobra-se em diversas pessoas. Umas, criadas em função da distribuição geográfica do poder: União, Estados-membros e Municípios. Outras, ditadas por conveniência da descentralização administrativa: autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público; bem como, entes paraestatais: sociedade de economia mista e empresas públicas. Desses, o Estado é o único que detém personalidade com capacidade política. Daí falar-se que os entes que exprime o Estado, no caso brasileiro: a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal, são os únicos que têm capacidade política, consistente na faculdade de editar normas originárias conhecidas por lei. E o seu estatuto é de natureza constitucional, por ser a própria Constituição que prevê estes entes.

Destarte, o estudo que se empreenderá, nesta disciplina de Direito Administrativo, não é do Estado na sua totalidade, mas a do Estado atuador, enquanto agente incumbido de concretizar as regras editadas pelo Legislativo. A esta atividade denomina-se Administração, motivo pelo qual a disciplina tem o nome de Direito Administrativo. Assim, podemos, por ora, dizer que Direito Administrativo é o direito que prevê as normas a que está sujeita a parcela do Estado destinada a realizar concretamente as regras editadas genérica e abstratamente pelo Poder Legislativo.



5)AUTONOMIA

O Direito porém constitui uma unidade indivisível, maciça e monolítica. Reconhece-se todavia, principalmente para fins didáticos e científicos, como forma de facilitar os estudos, a autonomia do Direito Administrativo já que podemos compreender o seu estudo a um grupo de normas que apresentam homogeneidade particular, seja, em relação ao seu objeto (campo próprio de atuação), seja em relação a seus institutos (afetação, desafetação, autotutela, desapropriação, licitação) e métodos de investigação próprios, seja em relação a alguns princípios norteadores e poderes (estudados adiante) que integram um verdadeiro regime jurídico-administrativo. O Direito Administrativo, enquanto Direito, não podemos perder de vista, faz parte de todo e por isso se correlaciona, com outros ramos do saber jurídico, embora possua institutos próprios e princípios particulares que, como vimos, afirmam a sua relativa AUTONOMIA. Autonomia esta, que segundo a doutrina francesa remonta-se ao famoso caso Blanco, encerrado em 8 de fevereiro de 1873, quando o Tribunal de Conflitos, adotando o voto do Conselheiro David reconheceu a responsabilidade do Estado em termos públicos.



6)POSIÇÃO: DIREITO PÚBLICO OU DIREITO PRIVADO?

O Direito tradicionalmente divide-se em dois ramos fundamentais, teorizados, desde o império romano, por Ulpiano, que são: Direito Público e Direito Privado. O Direito Privado cuida predominantemente dos interesses individuais, de modo a assegurar as relações das pessoas em sociedade, assim como a fruição de seus bens, seja em suas relações individuais, seja em suas relações com o Estado. Já, o Direito Público interno regula, principalmente, a organização e competência (atribuições) do Estado, ou seja, todos os interesses estatais e sociais. O Direito Público externo, por sua vez, ocupa-se das relações dos Estados soberanos entre si, assim como das atividades destes com os organismos internacionais.

O Direito Administrativo é portanto sub-ramo do direito público interno, uma vez que disciplina as relações jurídicas em que predominam os interesses do Estado (público) e porque em pelo menos um dos pólos da relação disciplinada por ele está a Administração Pública. Devemos lembrar todavia, que existem normas do direito privado que objetivam também defender interesses públicos (direito de família) e por outro lado, normas de direito administrativo que objetivam defender os interesses dos particulares ou seja, dos administrados (normas de segurança, direitos fundamentais).


7)CRITÉRIOS PARA CONCEITUAÇÃO

A definição de qualquer coisa deve sempre se apoiar num CRITÉRIO, ou seja, num referencial obrigatório para a estrutura conceitual. Para definir o Direito Administrativo, os estudiosos têm escolhido os mais variados critérios. Vejamos:

a) Critério Legalista

· Conceito: Direito Administrativo é o ramo da ciência jurídica que estuda as Leis Administrativas.(Sinônimo perfeito de direito positivo)

· Crítica: É um conceito incompleto uma vez que o Direito Administrativo não é só um amontoado de leis, englobando também conceitos doutrinários, jurisprudência e usos e costumes.

· Principais defensores: Barão De Gérando (1º Mestre de Direito Administrativo), Macarel, Ducop, Batbie, Foucart, De Gioannis Gianquinto, De Courmenim, Dufour, Posada de Herrera e Pimenta Bueno (no Brasil).

· Escola: Exegética, Legalista, Francesa, Empírica ou Caótica (porque trouxe um verdadeiro caos a este ramos do direito)

b) Critério do Poder Executivo

· Conceito: Direito Administrativo é o conjunto de normas jurídicas que regulam o Poder Executivo.

· Crítica: É um conceito insuficiente uma vez que não somente o Poder Executivo edita atos administrativos, mas também os outros poderes, quando, por exemplo, abrem uma sindicância, nomeiam um funcionário ou concedem férias, O Estado pratica ainda atos regidos pelo Direito Privado (compra e venda, locação) e atos materiais (dirigir caminhões, varrer ruas) que não pertencem a este ramos do Direito.

· Principais Defensores: Lorenzo Meucci, Ranelletti, Zanobini, Reggi e Carlos de Barros Júnior (no Brasil)

· Escola: Italiana ou Subjetivista

c) Critério das Ralações Jurídicas

· Conceito: Direito Administrativo é o ramo da Ciência Jurídica que estuda as relações entre administrados e poder administrante, entre Estado e administrados.

· Crítica: Esta definição também pode ser aplicada a outros ramos do Direito Público, além de reduzir seu objeto.

· Principais Defensores: Laferriére, Block, Otto Mayer, Fritz Fleiner, Trolley e Yorodzu Oda.

d) Critério dos Serviços Públicos

· Conceito: Direito Administrativo é o conjunto de regras jurídicas relativas aos serviços públicos.

· Crítica: O Direito Administrativo é mais do que serviço público e a própria expressão que o define é vaga e de difícil entendimento.

· Principais Defensores: Gaston Jèse, León Duguit, Rafael Bielsa, Rodolfo Bullrich, Bonnard, Rolland, Laubadère, Temístocles Cavalcanti e Henrique Carvalho Simas (estes últimos no Brasil).

· Escola: do Serviço Público

e) Critério Teleológico ou Finalístico

· Conceito: Direito Administrativo é o sistema de princípios que regulam a atividade do Estado para o cumprimento de seus fins.

· Crítica: É criticável por trazer à baila a discussão dos fins do Estado.

· Principais Defensores: Vittorio Emanuel, DAlessio, Royo Villanova, Guenechea e Osvaldo Aranha Bandeira de Mello (no Brasil).

f) Critério da Hierarquia Orgânica

· Conceito: Direito Administrativo é o ramo que estuda os órgãos inferiores do Estado enquanto o Constitucional, estuda os superiores.

· Crítica: o cargo de Presidente da República, o mais alto da hierarquia, objeto de estudo do Direito Administrativo, não é órgão inferior do Estado.

· Principais Defensoes: René Foignet

g) Critério Negativista ou Residual

· Conceito: Direito Administrativo é o regulador de toda atividade estatal que não seja legislativa e judicial.

· Crítica: As definições devem definir o que a coisa é, e não o que não é.

· Principais Defensores: Tito Prates da Fonseca (no Brasil)

h) Outros Critérios

Além de todos estes conceitos estribados nos mais variados critérios de natureza unidimensional, ainda se nos apresentam outros conceitos oriundos da junção de dois ou mais destes, ou seja, embasados em critérios bidimensionais ou pluridimensionais, objetivando atingir sempre, na visão de seus autores, uma definição mais precisa do que seja Direito Administrativo. Todavia, não podemos afirmar que o produto destes arranjos, seja, em sua essência, melhores ou piores do que os antes arrolados uma vez, que se conjugarmos referenciais inadequados, não conseguiremos, por certo, tornar mais preciso ou correto o conceito resultante.



8) CONCEITO DE DIREITO ADMINISTRATIVO

Consoante José Cretella Júnior, Direito Administrativo é o ramo do Direito Público interno que regula a atividade jurídica não contenciosa do Estado e a constituição dos órgãos e meios de sua ação, ou seja, o ramo do Direito Público que rege a ação do Estado para a consecução dos seus fins.

O conceito de Direito Administrativo amplamente difundido pelo saudoso Hely Lopes Meirelles, sintetiza-se no:

¨ Conjunto harmonioso de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado.

Este conceito embasa-se em um critério diverso dos arrolados no item anterior, ou seja, o da Administração Pública, que esta contido nas expressões órgãos, agentes e atividades públicas.

Celso Ribeiro Bastos, preleciona ser o Direito Administrativo o:

¨ Ramo do direito que regula, predominantemente, um dos poderes do Estado, qual seja, o Executivo.

Em suma, cabe, ao Direito Administrativo, fundamentalmente, disciplinar as atividades que regem a função administrativa. Atividade que se diferencia das demais por constituir campo de aplicação de um regime próprio, o que acaba por tornar o objeto deste ramo do direito também individualizado.



9)RELACIONAMENTO COM OUTROS RAMOS DO DIREITO

Como já dissemos, existem correlações do Direito Administrativo com outros ramos do ordenamento jurídico, uma vez que nada em Direito é estanque, bem como, com outras ciências do saber humano. Estas interações estaremos analisando a seguir:

a) Direito Constitucional: Ambos apresentam uma íntima relação, uma vez que o Direito Constitucional determina o arcabouço estatal, anatomia, administração política, fixando em linhas genéricas a forma e o regime de governo, os direitos e garantias individuais, a estrutura dos poderes, enquanto o Direito Administrativo estuda a dinâmica estabelecendo as regras concernentes aos órgãos, agentes e atividades públicas, ou seja, a Administração Pública, enquanto meio para a consecução dos fins do Estado. Alguns estudiosos chegam a ver no Direito Administrativo a Constituição em movimento.

b) Direito Tributário e Financeiro: A interação aqui também é íntima. O lançamento tributário, a efetivação das despesas públicas, os procedimentos para a arrecadação dos tributos, a cobrança dos preços públicos e os julgamentos nos Conselhos de Contribuintes apresentam-se como exemplo de procedimentos e atos administrativos que povoam as atividades que dizem respeito ao Erário Público.

c) Direito Internacional: A afinidade encontra-se no fato do corpo diplomático integrar a Administração, assim como, os Estados celebram tratados e convenções internacionais tendo por objeto o combate aos tóxicos, a saúde pública e demais serviços públicos, visando a reciprocidade de tratamento e o acesso dos cidadãos dos países conveniados. A relação encontra-se também, na anexação de Territórios, nos empréstimos externos, na extradição, entre outros temas.

d) Direito Penal: A interação se dá em dupla mão. Por um lado o Direito Penal arrola os crimes contra a Administração e fornece os conceitos de dolo ou culpa, noções fundamentais no campo do regime disciplinar. O Direito Administrativo, a seu turno, fornece o conceito de patrimônio público, influi, por exemplo, na organização do sistema penitenciário.

e) Direito do Trabalho e Previdenciário: A fiscalização das normas trabalhistas é feita por agentes públicos lotados nos órgãos setoriais do Ministério do Trabalho, órgãos administrativos. Paralelamente, no campo previdenciário, o seguro de acidente do trabalho é monopólio estatal, na figura do INSS, assim como, toda a assistência pública ao assalariado.

f) Direito Eleitoral: A interpenetração se manifesta na requisição de bens (locais de votação) e serviços (mesários, escrutinadores), institutos típicos de direito administrativo, necessário a consecução das diversas etapas do processo eleitoral.

g) Direito Municipal: Ambos operam no setor da organização governamental. O direito Administrativo acaba fornecendo os institutos para que o Município organize seus serviços e servidores no campo jurídico, sempre no que diz respeito aos seus peculiares interesses.

h) Direito Processual (Civil e Penal): A jurisdição administrativa serve-se de princípios tipicamente processuais para nortear o julgamento de seus processos de cunho administrativo, as vezes até mesmo por determinação legal; nas demandas judiciais esta a administração adstrita ao que determina os Códigos Processuais, tendo apenas as prerrogativas legais. Fornece o Processo Penal os princípios da ampla defesa e da natureza para aplicação da pena e instrução dos processos disciplinares.

i) Direito Comercial e Civil: A classificação das pessoas jurídicas e dos bens públicos, o direito de construir, a responsabilidade extra contratual do Estado encontram-se regulados no Código Civil. As Sociedades de Economia Mista e as Empresas Públicas são criadas com base na legislação comercial. As relações do Direito Administrativo com o campo privado, também é grande no que se refere aos contratos e obrigações do Poder Público com os particulares.
Ocorre também o relacionamento do Direito Administrativo com as outras Ciências Sociais, principalmente, a Sociologia, a Economia Política, a Ciência das Finanças e a Estatística, além de manter também íntima relação com as Ciências da Administração e com a Ciência da Administração e com a Política. Esta interação reside no fato de todas terem o mesmo objeto, a sociedade, embora, encaradas em cada qual, sob ótica diversa. Fornecem assim, todas dados e subsídios importantes ao direito administrativo para o seu aperfeiçoamento e ajustamento, cada vez maior, aos fins buscados pelo Estado, seja através de premissas seja através de elementos técnicos.



10) O DIREITO ADMINISTRATIVO E A ORDEM POLÍTICA VIGENTE

O Direito Administrativo sofre a influência, como vimos no item anterior, dos valores constitucionais de ordem política, procurando reproduzi-lo no seu ordenamento administrativo.

Portanto, não se trata de um direito neutro que pretensamente regularia uma burocracia também neutra, totalmente desprovida de valores. O Direito Administrativo varia segundo as concepções de Estado e não é o mesmo, seguramente, num Estado autoritário, que num Estado democrático.



11) O DIREITO ADMINISTRATIVO E OS PODERES DA REPÚBLICA

O Direito Administrativo cuida do regime aplicado à função administrativa. É composto tanto de normas jurídicas, como de princípios jurídicos que atuam com vistas a transformar em manifestações concretas as prescrições abstratas da lei, mantendo sempre os fins por esta descritos.

O Estado moderno, para o completo atendimento dos seus fins, atua em três sentidos - administração, legislação e jurisdição - e em todos eles pede orientação do Direito Administrativo, no que concerne à organização e funcionamento de seus serviços, a administração de seus bens, à regência de seu pessoal e à formalização dos seus atos de administração (Lembre-se que a auto administração, no que diz respeito os poderes legislativo e judiciário, atividades atípicas destes poderes, objetivam assegurar a independência dos Poderes).

Do funcionamento estatal só se afasta o Direito Administrativo quando em presença das atividades especificamente legislativas (feitura de lei) ou caracteristicamente judiciárias (decisões judiciais): funções típicas dos poderes. Destarte, o Direito Administrativo rege toda e qualquer atividade de administração, provenha ela do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário. E, na realidade, assim é, porque o ato administrativo não se desnatura pelo só fato de ser aplicado no âmbito do Legislativo ou do Judiciário, desde que seus órgãos estejam atuando como administradores de seus serviços, de seus bens, ou de seu pessoal.



12) OBJETO

Do conceito do Direito Administrativo fornecido pelo saudoso Hely Meirelles e transcrito no item 4, podemos extrair o seu objeto, na sua visão moderna, ou seja, a regulamentação da estrutura, do pessoal (órgãos e agentes), dos atos e atividades da Administração Pública, praticados ou desempenhados na qualidade de poder público.



13) FONTES

Conceito:

Fonte é o lugar de onde brota, através da terra, a água. Vulgarmente, é o ponto de partida de alguma coisa. Fontes na Ciência Jurídica são as formas pelas quais se revelam o direito. É, em suma, a exteriorização do direito ou a sua formalização.
Classificação:

Podem ser:

a) escritas:

Lei: como fonte primária, isto é, mais importante do direito administrativo, a Lei é a matéria que lhe dá corpo e forma, sendo geradora de direitos e obrigações, impondo-se tanto a conduta humana como a ação estatal, isto é, impo-se inclusive ao próprio ente legislador. A lei a que nos referimos é no sentido amplo (Lato sensu), ou seja, abrange todo o sistema do processo legislativo brasileiro, compreendendo:

Constituição (mais poderosa e eficaz de todas as leis, constituindo-se no padrão de algumas leis e na origem dos direitos fundamentais), Lei ordinárias (tem as características da generalidade, abstração e impessoalidade, sendo marcada pelos atributos da necessidade, ou seja, em alguns casos a Constituição lhe exige como complemento ou garantia de um direito e da imodificabilidade, quer dizer, não podem as Leis ser derrogadas ou abrogadas pelos regulamentos, existentes estes para dispor acerca de situações acidentais e passageiras, ao contrário daqueles que existem para determinar providências permanentes e duráveis, é o que observava Pereira do Rego, já em 1860), as Emendas a Constituição, as Leis Complementares, as Leis Delegadas (comuns na vigência do Parlamentarismo Republicano), as Medidas Provisórias, assim como, os Decretos (Decorrente do Poder Regulamentar), as Instruções (Ato ministeriais baixados para boa execução das leis, decretos e regulamentos, dirigidos a agentes da Administração) e os tratados, entre outros dispositivos que tratam pelo seu objeto do Direito Administrativo (lembre-se que não é fonte do direito administrativo toda e qualquer lei, mas tão só as que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas, ou, em outros termos, as que dispõem sobre relações que interessam a este ramo do Direito), sendo dos âmbitos federal, estadual ou municipal, em razão do federalismo. Devemos lembrar que, nos períodos do abandono do regime democrático, por ocasião dos constantes Golpes de Estado, comuns em nossa história, o Poder Legislativo foi exercido unipessoalmente pelo Chefe do Estado, baixando este atos legislativos extraordinários, por meio de Decretos, Decretos Leis ou Atos Institucionais, dependendo do período, também se nos apresentam como fontes do Direito Administrativo.

Devemos lembrar ainda, que existem Leis Federais de caráter nacional, pois compete exclusivamente a União legislar sobre temas de Direito Administrativo (Desapropriação e Licitação) ou outras que não atingem todo território nacional pelo aspecto especial de seu objeto (Lei do Polígono das Secas e da Amazônia Legal) ou por dizer respeito a União Federal (Reforma Administrativa da União, Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União). As Leis Estaduais e Municipais só valem no interior dos respectivos territórios, sendo válidos em relação aos Estados as observações antes exaradas em relação a União, com suas adaptações.

b) não escritas

· Jurisprudência: Como fonte do Direito Administrativo entende-se como o conjunto de decisões reiteradas num mesmo sentido, proferida pelos Tribunais, Juizes e órgãos de natureza contenciosa, emitidos em relação a casos concretos, obrigando no Brasil, os órgãos e tribunais inferiores, pela força moral que encerram, ao contrário do que ocorre nos EUA, em que tem força coercitiva, os precedentes das Cortes Superiores (Stare Decises), por casos idênticos.

· Princípios: São proposições fundamentais que se encontram na base de toda legislação, formando seu sistema teórico, sendo aplicáveis, no caso do Direito Administrativo, por cima da Lei, informando superiormente toda a atividade legal e administrativa, independentemente de estar ou não contida na Lei. O Conselho de Estado Francês, afirma reiteradamente desde 1945: tais princípios foram, pura e simplesmente, afirmados como aplicáveis, mesmo na ausência de textos, sendo sua violação determinante de nulidade (Na esfera do direito privado os princípios tem caráter apenas subsidiários). A obediência dos princípios, encontra embasamento no art. 37 da Constituição Federal. Celso Antônio Bandeira de Mello chega a afirmar que inobservância dos princípios é mais grave que o descumprimento de quaisquer norma jurídica.

· Costumes: Costume é a reiteração uniforme de comportamento tido como obrigação pela consciência popular, surge espontaneamente da atividade administrativa. No Direito Administrativo, segundo lição de Luiz Castro Neto (in Fontes do Direito Administrativo, São Paulo, CTE, 1977, pág. 87) é fonte...quer quando preenche as omissões da Lei, quer quando serve à sua interpretação e incidência, mas não quando a revoga ou derroga, sempre Secundum Legem. Sua importância reside na deficiência da legislação, para preencher as lacunas do texto legal. As Leis baixadas, todavia, contra os costumes acabam transformando-se em letras mortas. A simples rotina administrativa não se confunde com o costume, não sendo, por isso, na opinião da maioria dos autores, fontes do Direito Administrativo.

· Praxes Administrativa: É a reiteração do mesmo entendimento e interpretação, no silêncio da Lei, tendo influência secundária na formação do direito. Vale como elemento para justificar o procedimento de autoridade na fundação de suas decisões.

· Doutrina: É o elemento construtivo da Ciência Jurídica que se manifesta através da opinião dos doutos. Os romanos diziam: Comunio opinio Doctroun. Sua influência reside hoje, na elaboração da Lei e na interpretação dos diplomas e institutos legais, dando os bons caminhos, assim como, ordenando o próprio Direito Administrativo.

São também fontes do Direito os fatos com força de Lei, dos quais os exemplos mais comuns são os erros de cópia ou impressão ocorridos na publicação. A LICC, diz em seu art. 1° - § 4° que as correções de Lei já em vigor são leis novas, considerando-se fato consumado tudo quanto se praticou até o momento da publicação e correção do erro.


14) INTERPRETAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

É de se supor que a lei seja clara e nessa hipótese não necessite de qualquer trabalho interpretativo. Deve, então, ser aplicada como soam suas palavras. Todavia, na prática, observa-se que as leis, já nascem imperfeitas, por ambigüidade do texto, má redação ou falta de técnica, obrigando a intervenção do intérprete para que seja determinado com precisão o seu verdadeiro sentido, e a extensão de sua aplicação. Chama-se hermenêutica à parte da ciência jurídica que cuida dos meios adequados à interpretação. Sendo que interpretação, no campo deste ramo jurídico, por sua vez, nada mais é do que o processo através do qual se busca captar o sentido das normas legais, atos e contratos.

O estudo de hermenêutica administrativistas não tem correspondido ao progresso verificado nesse ramo. Faz-se uso em grande parte da hermenêutica civilista. Recurso este que embora não seja vedada, uma vez que não estamos diante de direito excepcional, esbarra no fato de que muitos dos princípios privados são inadequados aos interesse públicos.

Não podemos na tarefa interpretativa nos afastarmos da principologia deste ramos do direito, sob pena de não apreendermos o verdadeiro sentido das leis administrativas, que se encontram contidas num Regime Jurídico-Administrativo. Devemos portanto na tarefa de hermenêutica:

· estabelecer o equilíbrio entre os privilégios estatais e os direitos individuais;

· interpretar restritivamente qualquer poder discricionário da administração quando colidam com os direitos individuais;

· reconhecer, segundo Hely citando Santi Romano, a outorga do poder legítimo à Administração e ajustá-lo às finalidades que condicionam a sua existência e a sua utilização

· abrir mão de interpretações extensivas, que estendam a aplicação de uma norma e que criam, normas administrativas novas.

Fica permitido porém, por força da LICC o uso dos princípios gerais e da analogia, visando aplicar o texto da norma administrativa à espécie não prevista, mas compreendida no seu espírito.


15) APLICAÇÃO DAS LEIS ADMINISTRATIVAS

A vigência das Leis Administrativas rege-se pelas disposições legais aplicáveis às normas jurídicas em geral, ou seja, pelo que determina a LICC. A aplicação desta legislação para efeitos didáticos pode ser desdobrada:

a) Vigência no tempo

A lei quanto ao aspecto temporal começa a vigorar 45 dias depois de oficialmente publicada, quando em território nacional e dentro de 3 meses, quando para vigorar nos Estados Estrangeiros. Podem todavia as leis, estabelecer que elas entrem em vigor na data de sua publicação, podendo ter efeitos retroativos ou futuros (90 dias por exemplo), por determinação expressa, uma vez respeitados os atos jurídicos perfeitos e acabados, a coisa julgada e o Direito Adquirido, assegurados na Constituição Federal.

b) Vigência no Espaço

Quanto à aplicação da legislação administrativa no espaço, a lei, como regra geral, alcança as situações acontecidas somente dentro do território do País (Princípio da Territorialidade). Há entretanto, casos em que a lei obriga no exterior (nas embaixadas, legações, consulados e escritórios, no que diz respeito as atribuições dos embaixadores, ministros, cônsules, adidos e outros funcionários brasileiros no Exterior, para aqueles que tenham interesses pelas leis brasileiras). Portanto, a legislação da União vigora no território brasileiro e, em alguns casos fora dele.

Da mesma forma, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios fazem suas leis para vigorarem apenas dentro dos respectivos territórios. Casos há, igualmente, em que as leis estaduais e municipais tem vigência espacial além das fronteiras locais.

c) Aplicação da Legislação Administrativa

A legislação administrativa após a sua vigência tem aplicação imediata sobre fatos ocorridos e sujeitos a seus campo de ação. A lei determina a que casos deve ser aplicada.

d) Término da Vigência

Essa matéria encontra-se regulada no art. 2° da LICC, ou seja, a lei vigora até que outra a modifique ou revogue, salvo quando destinada a vigência temporária. Neste caso vigora até a data determinada em seu próprio texto que figura como verdadeiro termo final da lei. O desuso de um texto legal como já tivemos a oportunidade de frisar não tem o condão de revogá-la.



16) FORMAÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Tendo em vista as diversas etapas porque passou a História da Humanidade podemos dividir e reconhecer a evolução do Direito Administrativo dentro daquela concepção. Temos como noção inicial lembrar que em qualquer fase histórica a humanidade sempre concebeu a noção de administração, embora incipiente no início, sem corresponder a um conjunto de normas jurídicas. O certo é que as atividades administrativas são perseguidas diuturnamente ao contrário das funções legislativas e judiciárias que sofrem interrupções (férias forenses, recessos parlamentares, suspensões de prazos processuais), flutuando ao sabor dos ventos e das contingências políticas. Vejamos:

a) Antigüidade Remota

O poder estava intimidade ligado com as divindade (teocracia) embasando as ordens dos chefes que se impunham aos subordinados, sendo obedecidos sem contestações pela população em razão da figura dos Deuses. O traço característico deste período é a noção forte de hierarquia, instituto do Direito Administrativo Moderno.

b) Antigüidade Clássica

Merece destaque:

· Grécia: Fragmentada em inúmeras Cidades Estados, as Polis, tinham instituições destinadas a defesa e a manutenção da ordem interna e alguns serviços administrativos, bem como, servidores dedicados a formação de jovens e cozinheiros públicos. Nas obras de Aristóteles e de Platão verificamos o germe do Direito Administrativo.

· Roma: Os jurisconsultos Paulo, Gaio e Ulpiano, entre outros, dedicaram estudos ao direito público, embora os romanos fossem pouco desenvolvidos neste ramo do saber jurídico. Nas Institutas e no Digesto temos muitos temas de interesse do Direito Administrativo, dentre eles: coisas públicas, terrenos de marinha e o estado militar.

c) Idade Média

O período das trevas para efeitos de estudo é dividido em:

· Período Feudal: Não oferece clima propício para o Direito Administrativo, embora alguns procurem ver na requisição de recursos humanos e materiais para a guerra disposições administrativas.

· Período Comunal: A administração Comunal acaba favorecendo o surgimento da tese da irresponsabilidade pública, dos Sindicatos, das Corporações de Ofício e da formação dos municípios.

d) Idade Moderna

Com a Revolução Francesa cai o absolutismo e inúmeras alterações ocorrem no panorama histórico-legal em vista da implantação dos princípios revolucionários, ou seja, Liberdade, Igualdade e Fraternidade, permitindo a defesa dos Direitos dos Administrados. Como decorrência surge a pedra fundamental do Direito Administrativo, ou seja, vem a público a Lei do 28 do pluvioso, do ano oitavo, em 1800, que na França, deu uma organização legal a Administração Pública. Em 1817, dentro destes novos ideais é inaugurado na Universidade de Paris, a cadeira de Direito Administrativo contribuindo-se assim para toda a evolução que hoje temos e que teve na figura do Barão de Gérando, seu desbravador.



CONTRIBUIÇÕES BÁSICAS DOS DIREITOS NACIONAIS

Merecem destaque no panorama Mundial os ordenamentos jurídicos administrativos vigentes nos seguintes países:

a) França (Sistema de base romanística)

· Destaque: Além de ser o berço natal do Direito Administrativo contribuiu para sua construção devido a farta elaboração jurisprudencial do conselho de Estado (Contencioso Administrativo) que julga os litígios que envolvem a Administração Pública, fornecendo elemento para formulação dos seus princípios, da teoria da Responsabilidade Civil da Administração e da Nulidade dos Atos Administrativos, entre outras contribuições. Foi em França que incluiu, pela primeira vez o Direito Administrativo no ensino universitário.

· Expoentes: De Gérando, Macarel, Benoit, Laferrière, Berthèlemy, Haurion, Georges Vedel, Jean Rivero.

b) Alemanha (Sistema de base romanística)

· Destaque: Aparece como lei e como ciência após a unificação político-administrativa do país, trazida pela Constituição de 1870, tendo como maior contribuição a atividade sistemática e científica dos doutrinadores, com grande influencia do Direito Civil e do método construtivo preocupado em formular dogmas.

· Expoentes: Otto Mayer, Laband, Forsthoff.


c) Itália (Sistema de base romanística)

· Destaque: O Direito Administrativo desenvolveu-se sob a influência dos autores franceses, embora antes disso já se conhecessem trabalhos referentes a matérias ligadas a Administração Pública. Conseguiu uma feliz harmonia entre o caso concreto e a doutrina.
· Expoentes: Romagnosi, Gianquinto, Neucci, Orlando, Ranelletti, Alessi, Zanobini, Sandulli, Fragola, Perone Carpano, Virga.

d) Inglaterra e Estados Unidos (Sistema do Common Law)

· Destaque: Desenvolvimento bem menor do que no sistema de base romanística. As fontes do Direito nestes países são as decisões judiciais, a equidade e a lei. O judiciário exerce sobre a administração o mesmo controle que exerce sob os particulares. Os servidores são regidos pelo regime privado.

· Expoentes: Goodnow, Willoughby, Bauer (EUA), Blaskstone, Gneist, Griffth & Street, Wade (Inglaterra)

e) Espanha (Sistema de base romanística)

· Destaque: Legislação e doutrina, calcada no exemplo francês, que contribuiu para o aperfeiçoamento dos institutos do Direito Administrativo.

· Expoentes: Posadas, Oviedo, Gendin, Ramon Martins Mateo, Leguina Villa.

f) Outros Países

Além dos já citados, outros expoentes do direito Administrativo que merecem destaque, são:

· Portugal: Marcello Caetano, Freitas do Amaral, Marques Guedes, Robin de Andrade, Gonçalves Pereira.
· Áustria: Antoniolli
· Bélgica: Buttgembach
· Suíça: André Grisel
· Japão: Yorodzu Oda
· Grécia: Stassinopoulos
· Uruguai: Sayagués Laso, Julio Prat
· México: Gabino Fraga
· Chile: Mário T. M. Silva
· Colômbia: Eustorgio Sarriá
· Argentina: Bullrich, Bielsa, Basavilbaso, Marienhoff, Fiorini, Escola, Droni, Vasquez, Gordillo.



17) DIREITO ADMINISTRATIVO NO BRASIL

Podemos também aqui, tendo em vista as etapas porque passou a evolução histórica brasileira, dividir e reconhecer a evolução deste ramo dentro daquela concepção:

a) Período Colonial

Marcada pelo poder absoluto dos donatários que tinha, entre outros, em suas mãos as tarefas de administração de sua Capitania Hereditária, sendo na realidade um pequeno soberano, não estando sujeito a censura de outro poder ou autoridade.

Com a criação do Governo-Geral, embora com a divisão de atribuições, ainda assim muitos poderes estavam contidos nas mãos do Governador, que a partir de 1640, recebeu o título de Vice-rei. O certo é que em todo este período o nosso país esteve atrelado ao Direito Português, sendo que os serviços com maior organização eram os referentes ao fisco.

b) Império

Temos a quatripartição do poder, além dos clássicos (Legislativo, Executivo e Judiciário), vigorou um quarto o Poder Moderador. A administração pública se organizava praticamente pelo Direito Privado, que o Conselho de Estado aplicava, havendo uma equiparação do poder estatal ao simples particular. Criou-se neste período (1851) a cadeira de Direito Administrativo em nossos cursos jurídicos. Os primeiros mestres desta matéria são: José Ignácio Silveira Motta (São Paulo) e João José Ferreira de Aguiar (Pernambuco), verdadeiros sistematizadores e elaboradores doutrinários. Em 1857 foi editada a primeira obra sistematizada, sob o título Elementos de Direito Administrativo Brasileiro de Vicente Pereira do Rego, professor no Recife, sucessor de João José, sob grande influência dos autores franceses. Os tratadistas de maior destaque deste período foram o Visconde do Uruguai e Antônio Joaquim Ribas.

c) República

Com a implantação da República, outros sistematizadores foram aparecendo, agora sob a influência do Direito Americano, onde os republicanos foram buscar o modelo para a nossa Federação. Começa nesta fase, o ramo administrativo a afastar-se dos moldes privados, embora até 1930, pouco se tenha produzido, merecendo destaque, todavia, as obras de Alcides Cruz e Carlos Porto Carreiro. A partir de 1934 se tem um grande surto de evolução com o advento do novo texto Constitucional, que marca o aumento da participação do Estado nos setores referentes a saúde, a higiene, a educação, a economia, a assistência e a previdência social, ampliando o campo de ação do Estado.

Os principais tratadistas que merecem destaques nessa fase de florescimento, são:

· Temístocles Brandão Cavalcanti
· Tito Prates da Fonseca
· Ruy Cirne Lima
· José Cretella Júnior
· Mário Masagão
· Carlos S. de Barros Júnior
· Hely Lopes Meirelles
· Oswaldo Aranha Bandeira de Mello
· Seabra Fagundes
· Toshio Mukay
· Diogo Figueiredo Moreira
· Celso Antônio Bandeira de Mello
· Diogenes Gasparino
· Maria Sylvia Zanella Di Pietro

Com o advento das Revistas de Direito Público (RDP) e de Direito Administrativo (RDA) temos um novo e constante foco para o estudo e divulgação de temas atuais e palpitantes. Merecem destaque ainda, os Pareceres da Procuradoria Geral da República e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, publicados pela Imprensa Nacional.



18) CODIFICAÇÃO

Até o presente momento não se elaborou um Código Administrativo no Brasil, apesar de todo o desenvolvimento atingido por este ramo da Ciência Jurídica. Perduram ainda aqui e em outras partes do mundo a polêmica acerca de saber se é útil ou não codificá-lo, a exemplo do debate histórico travado entre Thibaud e Savigny.

Codificar é reunir em um conjunto metódico, sistemático e harmônico as normas que dispõe acerca de uma dada matéria. Neste ramo três tendências se apresentam em relação a codificação.

· O Direito Administrativo não é suscetível de codificação - Defendida por Mallein, Laferrière, Mantellini, Gioanis e Meucci. Argumentam que o Direito Administrativo é um ramo novo e em constante elaboração que ficaria imobilizado se fosse codificado, levantam também em favor de sua tese a dificuldade de sistematizar a matéria.

· O Direito Administrativo é possível de uma codificação parcial - Defendida por Bielsa.

· Os que propugnam pela codificação total - Defendida por Hely, Diogenes Gasparino, Marcelo Caetano e De Gérando. Argumentam que tal ato facilitaria a compreensão e aplicação das normas assim reunidas. Como exemplo de Codificações Administrativas podemos apresentar o modelo português, onde os Códigos se sucedem desde 1836.

Hoje adota-se aqui o sistema das codificações parciais. O Código de Águas, o Estatuto das Licitações e Contratos Administrativos e o Estatuto dos Servidores Públicos Civis traduzem este movimento, de forma bem clara.
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REGIMES JURÍDICOS
NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA





1) NOÇÕES PRELIMINARES

A Administração pública pode, em sua ação praticar atos utilizando-se de suas prerrogativas de poder público (regime jurídico administrativo) como no caso da desapropriação, requisição de bens, ou atos em que se despe de qualquer privilégio especial, igualando-se ao particular (regime privado), como numa locação ou na contratação de pessoal pelo regime da CLT. Portanto existem dois regimes possíveis quando falamos de Administração Pública no Brasil: o público e o privado.

A aplicação de um regime ou de outro não se dá em razão da maior ou menor importância da atividade ou instituto disciplinado para a coletividade mas em razão do comando legal. Algo tem regime público ou privado porque o legislador assim quis, por opção, consoante autoriza a constituição no caso de concessão de serviços públicos (art. 175), ou por determinação constitucional, como no caso das empresas públicas, que se submetem sempre ao regime privado (art. 173 - § 1°). O regime jurídico-administrativo traz em si a idéia de prerrogativas, de autoridade, de garantias ao administrado, sendo exorbitante e derrogatório do direito comum, como poderemos ver da análise detalhado dos princípios que os instruem e dos poderes que lhe são facultados.

O regime privado, por outro lado traz a noção de bilateralidade, diferenciando-o, em muito da opção anterior que está a sua disposição na seara pública. Devemos lembrar que este regime quando empregado pelo Estado, não se nos apresenta puro, não existindo uma submissão integral a este modelo. Acerca desta temática ensina-nos Maria Sylvia Zanella Di Pietro: ... às vezes, ela (administração) se nivela ao particular, no sentido de que não exerce sobre ele qualquer prerrogativas de poder público, mas nunca se despe de determinados privilégios, como o juízo privativo, a prescrição qüinqüenal, o processo especial de execução, a impenhorabilidade de seus bens; e sempre se submete as restrições concernentes à competência, finalidade, motivo, forma, procedimento, publicidade. Outras vezes, mesmo utilizando o direito privado, a Administração conserva algumas de suas prerrogativas, que derrogam parcialmente o direito comum, na medida necessária para adequar o meio utilizado ao fim público a cuja consecução se vincula por lei.

Um exemplo importante neste sentido é a contratação de servidores pelo regime celetário. Embora se dispa, a administração pública, de privilégios e deva obediência a lei obreira, não podemos falar que um empregado de uma empresa e um servidor celetista do Estado estejam em pé de igualdade. Na administração pública torna-se necessário o concurso público para admissão e presume-se verdadeiros os atos de rescisão, não precisando ser efetuada sua homologação na delegacia do Trabalho ou Sindicato, bem como, o direito da greve sofre temperos.

Assim, podemos afirmar, sem medo, que a principologia do direito administrativo e os poderes de que estão investidos a administração acabam sempre influenciando qualquer regime jurídico utilizado pelos entes públicos (privado ou jurídico-administrativo) e portanto chegam a ser absorvidos no sistema jurídico global, seja impondo desvios ao Direito Comum, seja através da ação legislativa própria (Estatuto) ou de sua aplicação integral, valendo assim, em última análise, como fonte motriz do sistema quando em um dos pólos temos o Estado.



2) PRINCÍPIOS - CÂNONES - PRINCIPOLOGIA

Os princípios constituem um conjunto de posições que alicerçam ou embasam um sistema e lhes garantem validade. No que tange o Direito Administrativo fala-se que estes princípios, guardam como preleciona o valoroso Celso Antônio Bandeira de Mello, uma relação de coerência e unidade compondo realmente um sistema ou regime, o chamado regime jurídico-administrativo. São estes princípios que dão a esta província jurídica identidade, tornando-se peculiar e divisando-a das demais ramificações do Direito. Mão podemos, todavia, perder de vista que como ramo integrante, que é, do direito Público a principologia jurídica administrativa, reproduz as características genéricas do regime publicista, acrescidos de algumas que o especificam dentro dele.

Pela primeira vez na história do Constitucionalismo brasileiro, temos um artigo, o 37, destinado a submeter a Administração Pública direta, indireta e fundacional aos princípios clássicos do Direito Administrativo, arrolando-os de forma exemplificativa. A respeito deste artigo esclarece José Afonso da Silva (1991:561) que os parágrafos e incisos que se seguem ao enunciado abordando especificamente os princípios são normas gerais sobre organização, apesar de que dentre eles aparecem outros princípios não elencados expressamente.

A análise destes princípios clássicos ou não, gerais e particulares, torna-se, agora, oportuno, como noção propedêutica, uma vez que a identificação das futuras tendências deste Ramo Jurídico e de sua evolução, como ciência, depende, em muito, destes estudos. Estas observações tornam-se ainda necessárias, uma vez que facilitam a correta interpretação e análise de seus variados institutos permitindo fixar-lhe a identidade. Com o conhecimento principológico, podemos adentrar nos mais variados rincões do Direito Administrativo pela porta da frente, sem atalhos, conhecendo, no todo, sua filosofia. Vejamos:

a) Supremacia do Interesse Público

Tal princípio encontra-se embasado remotamente nas teorizações existentes acerca do Estado Burguês Moderno. A tese do Contrato Social estampada em John Lock, de que os homens se despiam de sua liberdade individual e através do Estado, objetivavam garantir a segurança (propriedade), limitando a liberdade é o verdadeiro embrião deste princípio. Modernamente seu intento é limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do bem-estar coletivo na prestação dos serviços públicos, garantindo a estabilidade e a ordem social.

Nesta linha mestra do Direito Administrativo, os interesses da coletividade se sobrepõe aos dos particulares, se traduzindo em inúmeros privilégios concedidos aos órgãos encarregados do bem comum, a fim de assegurar a proteção destes interesses. Os principais exemplos de privilégios concedidos a administração, são: os prazos especiais para contestação, no processo civil; a posição de ré, tomada pela Administração Pública, na maioria dos feitos, invertendo o onus probandi e os prazos prescricionais especiais, ..

A posição de supremacia dos interesses públicos, cujo exemplo mais importante é o Poder de Polícia Administrativa, se manifesta na verticalidade (superioridade/unilateralidade) nas relações entre Administração e particular, ao contrário da horizontalidade (Bilateralidade), vigente nos negócios de natureza privada. A Administração constitui os particulares em obrigações por meio de ato unilateral seu, quer dizer, a res publicae se utiliza do Poder Público (o puissance publique dos franceses, o jus imperie dos romanos) para assegurar os interesses públicos, submetendo os particulares a um regime de caráter estatutário ( O elemento volitivo só existe na formação do ato jurídico, os demais atos são de natureza unilateral). Tal supremacia, todavia, deve estar adstrita aos termos da lei, para que não se cometa violências e arbítrios.

Outra manifestação deste princípio são os atributos especiais dos atos administrativos, ou seja, eles são auto exigíveis, auto executáveis e presumem-se legítimos e verdadeiros, uma vez baixados. Podem também, tais atos ser revistos, modificados e revogados pela própria administração, desde que atendidos certos pressupostos.

Destas considerações podemos afirmar, na senda de Celso Antônio, que tal princípios acaba se desdobrando, nos seguintes:

· Princípios da posição privilegiada dos órgãos da Administração Pública nas relações jurídicas;
· Princípios da supremacia dos órgãos da Administração Pública;
· Princípios do estabelecimento unilateral de obrigações aos particulares (Poder de Polícia/verticalidade) e
· Princípios da modificação e resolução unilateral das relações jurídico-administrativo.

Ainda, no que diz respeito aos atos administrativos, que serão analisados nas lições concernentes aquele instituto, temos:

· Princípio da auto-executoriedade dos atos administrativos;
· Princípio da exigibilidade dos atos administrativos;
· Princípio da presunção de veracidade dos atos administrativos;
· Princípio da presunção de legitimidade dos atos administrativos;
· Princípio da revogabilidade pela Administração dos atos administrativos; e
· Princípio da declaração de nulidade dos atos administrativos (Este principio e o anterior, para alguns tratadistas, são fundidos no princípio da auto-tutela).

Devemos lembrar que esta supremacia, desdobrada em todos os princípios supra citados, não é ilimitada sendo fundamental que sempre se estabeleça uma proporcionalidade dos meios aos fins. Segundo esta idéia elevada a condição de princípio geral do direito, a administração não pode e não deve impor constrangimentos aos indivíduos até o ponto de lhes retirar o sustento ou a moradia que lhe são necessários. Quer dizer, não pode impor à liberdade restrições que exceda ao que é necessário para atender através de atos hierárquicos, unilaterais, que se manifesta no caráter estatutário, os fins públicos.

b) Indisponibilidade dos Interesse Públicos ou Finalidade

Estamos também aqui diante de cânone, segundo o qual, todos os serviços, os bens e outros interesses públicos, afetos a Administração, são indisponíveis, pertencem a coletividade. Eles não se encontram a disposição de quem quer que seja (o fim e não a vontade domina a Administração dos interesses públicos), são assim, inapropriáveis, não existindo para atender interesses privados e não se achando entregues ao talante e a vontade do administrador.

O ato que persegue ou favorece interesses privados é nulo por desvio de finalidade (art. 2° - Lei 4717/69). A Administração e as pessoas jurídicas administrativas (Autarquias), tem o dever de curatelar os interesses públicos, nos termos da lei, na condição de servos da vontade pública, devendo toda atividade estatal se dirigir ao atendimento de um interesse público qualificado, não podendo dispor sobre estes livremente, devendo sempre respeito a lei. Fica por este princípio proibido a desapropriação de bens para dá-lo a particulares ou como medida de vingança. Destas idéias decorrem os seguintes princípios:


1. Princípio da Legalidade

A Lei da Ação Popular (Lei 4717/65 - art. 2°) considera nulos os atos lesivos ao patrimônio quando eivados de ilegalidade do objeto. Segundo este princípio a Administração está subordinada aos ditames da Lei (Diogenes Gasparino lembra, suporta a Lei que fizeste) e as exigências do bem comum, sob pena da prática de ato inválido e de expor o administrador a responsabilidade nas esferas administrativo-disciplinar, civil e/ou criminal. A própria Constituição (art. 5° II) diz que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. É na administração legal que encontramos a garantia das liberdades e dos direitos públicos subjetivos, bem como, da separação e divisão harmônica dos poderes. Celso Antônio ensina-nos que: na Administração Pública, não há liberdade pessoal. Enquanto na Administração particular é lícito fazer tudo que a Lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza ... Administrar é aplicar a lei, de ofício. A observância a lei a que se refere este princípio não é só aquele advinda do poder legislativo, como também os regulamentos ( 84, IV) que a própria administração baixa objetivando disciplinar leis e regular seus comportamentos ulteriores. Este princípio também não incide só sobre a atividade administrativa, mas também sobre as atividades legislativa e judiciária, sob as mesmas penas. Devemos ainda lembrar que as leis administrativas são, normalmente de ordem pública e seus preceitos não podem ser relegados pelo administrador, nem mesmo por acordo de vontade. Cumprir a lei é um poder/dever do agente público.

Do princípio da legalidade decorrem outros princípios a serem seguidos, são eles:

a) Princípio da finalidade - Ao ser promulgada, uma lei tem um objetivo que inspirou o legislador. O princípio da finalidade vem limitar o poder discricionário, limitando-o aos objetivos da lei. Essa limitação é ditada pela supremacia do interesse público sobre o individual. Imperioso ressaltar que a administração passa a ter a guarda destes interesses coletivos, que lhe é atribuída por lei, não podendo se omitir de exercer estes poderes.Portanto, deve o administrador praticar os atos para um fim legal, e que esta finalidade seja o bem público, sob pena de estar atuando com abuso de poder.

b) Princípio da razoabilidade - Exige proporcionalidade entre os meios que se utiliza o administrador e a finalidade dentro de um caso concreto, devendo a solução ser a adequada para alcançar a finalidade.

c) Princípio da Proporcionalidade - Refere-se ao ato emanado da Administração ser proporcional ao seu atendimento completo.

d) Princípio da motivação - Advém do dever que incumbe à administração indicar os motivos, previamente, pelos quais decidiu adotar alguma decisão.

e) Princípio da ampla responsabilidade do Estado - Matéria regulada no artigo 37 § 6 da CF, visa proteger os direitos dos particulares frente à atuação dos entes públicos. Ocorre quando o Estado infringe o princípio da legalidade, através de um de seus órgãos, caracterizando um ato ilícito. Também pode ocorrer quando ao atos administrativos tomados, visando o benefício da maioria, venha a causar danos a indivíduo, ainda que os mesmos sejam lícitos.


2. Princípio da Discricionariedade

Em vista do caráter de generalidade próprio de todo o diploma legal, que este não dispõe minuciosamente sobre cada situação, por vezes cabe a administração o dever de apreciar discricionariamente situações concretas objetivando implementar em seus atos a Lei. Não pode, todavia, o administrador se afastar da finalidade legal sob pena de abusar de seu poder, baixando atos viciados. A lei é em última análise o limite do poder discricionário, lembrando-se que atos discricionário não é ato arbitrário.


3. Princípio da Obrigatoriedade do Desempenho da Atividade e Atos Públicos ou Princípio do Poder/Dever

A administração direta ou indireta deve em virtude da lei, perseguir os objetivos para os quais foram criados, no desempenho de suas atividades públicas, não estando este poder dever a disposição dos administradores. Deve a autoridade administrativa sempre tomar todas as providências tendo por fito o bem comum (interesse público).

Quando estamos diante de entidades públicas de substrato corporativo, é conseqüência deste princípio a obrigatoriedade de filiação dos membros indicados em lei a eles para o desempenho da atividade prevista (Ex.: OAB, CREA, CRN, CRC, ...).

Assim, a autoridade não pode renunciar ao exercício das competências que lhe são outorgadas por lei, não podendo deixar de punir quem pratica ato ilícito, não pode deixar de exercer o poder de polícia e os poderes decorrentes da hierarquia. Cada vez que ela se omite no exercício de seus poderes, é o interesse público que está sendo prejudicado.


4. Princípio da Moralidade Pública ou Probidade Administrativa

Por este princípio sintetizado por Haurion, materializado na Constituição Federal e recentemente anotado na doutrina brasileira, os administrados têm direito a uma administração proba, honesta e ética, que objetive dar a cada um que é seu, em que exista uma correta aplicação do dinheiro público, enfim, seriedade e sinceridade no trato da coisa pública. Em outras palavras, deve-se respeitar a moral pública distinguindo o bem do mal, o legal do ilegal, o conveniente do inconveniente, o honesto do desonesto, o lícito do ilícito, o justo do injusto, bem como as regras do bem administrar e os bons costumes.

Cabe observar, como decorrência, que a administração deve obediência além da lei a esta moral, uma vez que nem tudo o que é legal é honesto (diziam os romanos: "non omne quod licet honestun est"), considerando-se em verdadeiro pressuposto de toda ação administrativa, integrando juntamente com o interesse coletivo a legalidade administrativa, consoante já decidiu o TJ/SP (RDA, 89:134). O seu desrespeito importa em atos de improbidade acarretando as sanções do artigo 37 - § 4° da CF/88, além de, dependendo da autoridade envolvida, importar em crime de responsabilidade (CF/88 - art. 85 - V). Este princípio deve ser observado também pelos particulares que se relacionam com a Administração Pública. São freqüentes, em matéria de licitação os conluios entre licitantes, caracterizando ofensa ao referido princípio.


5. Princípio da Continuidade do Serviço Público

Os serviços públicos não podem sofrer solução de continuidade em razão dos anseios coletivos sempre existirem e de ser dever (obrigação) da administração o desempenho contínuo das atividades públicas. Os serviço públicos, por exemplo, de uma escola desenvolvidas em propriedade de um particular, dão a este particular, como único caminho, forçar a desapropriação (indiretamente), já que os serviços públicos não podem ser interrompidos em razão da vontade individual. Dá mesma forma não pode a pessoa administrativa, ser extinta sponte propria, tal somente pode ocorrer por meio de lei. Decorre daí também, o descabimento de greve nos serviços públicos essenciais, o dever da administração de prosseguir os serviços públicos no caso da interrupção destes pela concessionário, com ou sem culpa, a existência dos institutos da suplencia, delegação e substituição para preencher as funções públicas temporariamente vagas e a faculdade que se reconhece a Administração de utilizar os equipamentos e instalações da empresa que com ela pactua. Quem contrata com a administração não pode valer-se do art. 1092 do Código Civil, também em razão deste princípio.


6. Princípio do Controle Administrativo ou Tutela

A administração deve fiscalizar permanentemente os seus agentes para que observem as finalidade definidas na norma legal. O Estado por meio dos órgãos da administração procura manter as pessoas administrativas (Autarquias) em sua conduta, conforme os fins que lhe foram legalmente atribuídos, sem que se afronte e disponha dos interesses públicos, mantendo-se a coerência harmônica do todo administrativo. Tal princípio manifesta-se, através de inúmeros atos, dentre eles: exame dos atos autárquicos, exoneração dos seus administradores, etc. Cretella Júnior lembra que: Criada uma entidade de direito público menor, fica ela sujeita a fiscalização de entidade pública política maior. É graças a este princípio que tem razão de ser os recursos administrativos e hierárquicos impróprios.


7. Princípio da Isonomia (Igualdade) dos Administrados em Face da Administração, da Finalidade ou da Impessoalidade

Previsto na Constituição de 1988, sob este último nome. Este princípio determina que o administrador público somente pratique ato destinado ao seu fim legal que é aquele que a norma posta (lei), expressa ou virtualmente, indica como objetivo do ato, de forma impessoal. Todo o ato administrativo tem por fim o interesse público sem o qual sujeita-se à invalidação, por desvio de finalidade. Portanto, exige-se que o ato seja praticado sempre com finalidade pública, não podendo o administrador criar outros objetivos ou praticá-lo no interesse próprio ou de terceiros, alheios à Administração. Não se pode, na ação administrativa, promover favoritismo ou desvalias em proveito ou detrimento de alguém. Lembre-se, que os atos administrativos são imputados sempre ao órgão ou a entidade da Administração Pública, e não ao funcionário ou administrador que o praticou.

A ação da administração não pode, assim, se pautar no prestígio pessoal do administrado, nos favores que o agente público deve a este e no fato de ser ou não correligionário político. Deve-se portanto, dispensar tratamento igualitário aos administrados, não por meras razões morais, mas pelo fato da própria Constituição assegurar a igualdade de todos, sendo vedado qualquer preferência. A licitação e os concursos públicos são aplicações deste princípio, uma vez, que o patrimônio público e os empregos públicos são da coletividade, não tendo cunho de propriedade particular, devendo ser acessíveis a todos (igualdade das vantagens oferecidas pela Administração). Outra situação que decorre deste princípio é a igualdade das tarifas públicas a todos os cidadãos (igualdade diante dos encargos públicos).

8. Princípio da Inalienabilidade dos Direitos Concernente a Interesses Públicos

Os Direitos e interesses públicos são inalienáveis, não podendo ser transferidos, em nenhuma oportunidade, aos particulares por ato do administrador. Como decorrência, temos: os bens públicos são, como regra, inalienáveis e impenhoráveis. Devemos lembrar que somente através de lei podemos alienar bens e conceder serviços. Neste último caso (concessão) não se transfere o direito relativo a atividade públicas, se transfere apenas o exercício, podendo o poder concedente modificar unilateralmente as condições de sua prestação. É somente a lei que pode dispor sobre a alienação ou não dos direitos concernentes a interesses públicos.

9. Princípio da Especialidade Administrativa

Segundo o qual as autarquias (Pessoas Administrativas) têm competências específicas e delimitadas em lei, sendo-lhe proibido desviar-se dos fins determinantes de sua criação, sob pena de nulidade dos atos praticados. As Autarquias assim não podem receber doações ou legados que contrariem suas finalidades, como por exemplo, se uma autarquia rodoviária (DNER ou DER) recebesse doação para que nela se instalasse um hospital. Esse princípio é aplicável também, em relação as demais pessoas jurídicas que integram a administração indireta, sendo que como decorrência não podem os acionistas, em Assembléia Geral, alterar seus objetivos institucionais.

10. Princípios da Publicidade

Arrolado, também na CF/88. A administração deve em sua gestão atuar as claras para permitir o pleno exercício do regime republicano, não obstaculizando o acesso dos interessados a seus atos concluídos ou não, advindo de órgãos técnicos ou jurídicos, despachos finais ou interlocutórios, bem como, contratos, comprovantes de despesas e prestações de conta. A concepção segredista que por longo tempo perdurou em nosso país, não tem vida possível com o espírito democrático. Deve, a administração, em razão deste princípio promover a divulgação oficial de seus atos para conhecimento e produção de efeitos. Lembre-se que a forma de publicação dos atos da Administração, opera-se ao arbítrio da autoridade competente, observado o ordenamento jurídico vigente. A alteração da forma desses atos deve ter presente a necessidade de demonstração dos seus elementos essenciais, de modo a fornecer informações suficientes à coletividade. (Resumo de Decisões em Consultas - Prejulgados, TCE/SC, 1997, pág. 104, ementa n.° 194, Parecer n.° COG 201/94, Processo 0064/40).

Deve, em suma, promover a publicação de atos concluídos e de contratos administrativos (constando: objeto, valores envolvidos, contratantes, número do processo, pelo menos), bem como, de certos procedimentos (convocação de concursos públicos, concorrências e tomadas de preço - art. 21 da Lei 8666/93), através de órgão oficial, público ou particular contratado para este fim e devidamente escolhido em sede de procedimento licitatório, consoante já decidiu o Tribunal de Contas de Santa Catarina (Resumo de Decisões em Consultas - Prejulgados, TCE/SC, 1997, pág. 105, ementa n.° 196, Parecer n.° COG 739/93, Processo 18.710/30), ou mediante a fixação do ato na sede da Prefeitura ou da Câmara, onde não houver imprensa escrita. Fica vedado a utilização ora de um ora de outro meio, como forma de dificultar o conhecimento burlando o espírito do princípio. O 1° Tribunal de Alçada Civil de São Paulo decidiu na Apelação n.° 33371 neste sentido (RT 597:106). Bem como, não eqüivale a publicação, a divulgação em programa de rádio ou televisão, mesmo que em horário oficial. Ressalvam-se do espírito do princípio apenas os atos referente a Segurança Nacional, as sindicâncias sigilosas, as investigações policiais e os interesses superiores da Administração preservados em processo e previamente declarados sigilosos, nos termos do Decreto n° 79099, de 06/01/77.

Todavia, a regra é de que os atos são públicos devendo ser divulgados, mostrados ou permitido o acesso aos que desejam conhecê-los e obter certidões (CF/88 - art. 5° - XXXIV - c), não cabendo alegações do tipo segredo comercial, como a feita pela DERSA (Sociedade de Economia Mista do Estado de São Paulo) a uma empresa licitante que desejava obter fotocópia de contrato, o que foi entendido como ilegal pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em Mandado de Segurança (Agr. Pet. 220.457, julgado pela 5ª Câmara Civil, em 20/09/73). A publicidade de qualquer ato não deve conter indicações que caracterizem a promoção pessoal de autoridade ou servidor. (CF/88 - art. 37 - § 1°).
Conclusão: Observe-se que estes princípios norteadores impõe-se aos aplicadores do direito, quando decidem questões submetidas à sua apreciação, e que envolvem num dos pólos da relação processual a Administração Pública. Estas mesmas orientações servem para os pedidos de decisões que devam ser pronunciadas dentro do âmbito da administração. São, em suma, por esses princípios que o bom administrador se há de pautar em todos os seus atos.

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PODERES ADMINISTRATIVOS





1) INTRODUÇÃO

A Administração Pública, visando atender ao interesse público, ou seja, objetivando tornar possível o seu funcionamento, é dotada de poderes administrativos proporcionais aos encargos que lhes são atribuídos e que se constituem em seus verdadeiros instrumentos de trabalho para realização de suas tarefas. Por isto mesmo podem ser chamados de poderes do tipo instrumental.

Mas estes poderes da administração pública, no Estado de Direito, são limitados pela lei, isto é, sofrem um freio legal, impeditivo do excesso ou da exorbitância, quer dizer, repele a arbitrariedade e o despotismo.



2) DISTINÇÃO ENTRE PODERES POLÍTICOS E PODERES ADMINISTRATIVOS

Existe uma distinção entre Poderes Políticos e Poderes Administrativos. Por poder político devemos entender como aquele expresso em lei, imposto pela moral administrativa e exigido pelo interesse da coletividade e do qual cada agente administrativo é investido para o desempenho de suas atribuições. Os poderes políticos, são atributos do cargo ou função e não um privilégio da pessoa que o exerce; é o poder que empresta autoridade ao agente público o qual é investido por lei de competência decisória e com força suficiente para impor suas decisões aos administrados. Trata-se, pois, do poder-dever de agir da autoridade, do poder ou da capacidade de exigir. Como o uso do poder é prerrogativa da autoridade, esta deve usá-lo normalmente, evitando o abuso de poder que se constitui na utilização desproporcional de poder ou no emprego arbitrário da força ou mesmo a violência contra o administrado, o que é vedado por lei.

Já os poderes administrativos nascem com a Administração e apresentam-se diferenciados segundo as exigências do serviço público, o interesse da coletividade ou os objetivos das tarefas.



3) OS PODERES ADMINISTRATIVOS: CLASSIFICAÇÃO

Dentro da diversidade de atividade que a Administração Pública tem que operacionalizar para atingir seus fins, os poderes administrativos são classificados em poder vinculado e poder discricionário, segundo a liberdade da Administração para praticar seus atos.

São classificados também, em poder hierárquico e poder disciplinar, quanto ao ordenamento da Administração ou à punição dos que a ela se vinculam; em poder regulamentar, quanto à sua finalidade normativa; e poder de polícia, quanto aos objetivos de contenção dos direitos individuais de que utiliza.



4) PODER VINCULADO

Também chamado poder regrado é aquele que a lei (norma jurídica - Direito positivo) confere à Administração Pública para a prática de ato de sua competência, determinando os elementos e requisitos necessários à sua formalização. É a lei que condiciona e expedição desses atos, aos dados constantes de seu texto e, por isto, se dizem vinculados, significando, na prática, que o agente público fica inteiramente presos ao enunciado da lei, em todas as suas especificações, tornando a liberdade do agente, mínima, pois este somente poderá ficar vinculado ao restrito enunciado da lei.

Também não basta ao agente público apenas praticar o ato administrativo, mas o de praticá-lo com todas as minúcias especificadas na lei. Qualquer omissão ou diversificação na sua substância, nos motivos, na forma, na finalidade ou no tempo tornará o ato inválido, nulo ou anulável, consoante o caso, reconhecido pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário, quando requerido pela parte interessada.

Na verdade, o que caracteriza o ato vinculado é a predominância de especificações da lei sobre os elementos deixados livres para a Administração, uma vez que dificilmente haverá um ato inteiramente vinculado sem uma mínima opção para a Administração flexibilizar sua prática. Tais elementos vinculados serão sempre a competência, a finalidade e a forma. Entre outros que a lei indicar. Quer dizer, o agente terá que ter competência legal para exercer o ato, haverá um objeto público especificado em lei, e terá um procedimento definido legalmente ou por portaria ou edital, sem o qual o ato é nulo. Podemos a título ilustrativo, compará-lo a uma recita de bolo, onde todas as instruções acerca dos ingredientes e modo de preparar são fornecidas, sob pena do resultado ser desastroso.



5) PODER DISCRICIONÁRIO

É aquele que o direito concede à Administração, de modo explícito ou implícito, para a prática de certos atos administrativos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e conteúdo. Segundo Régis Fernandes de Oliveira:

Discricionariedade é a integração da vontade legal feita pelo administrador, que escolhe um comportamento previamente validado pela norma, dentro dos limites de liberdade resultantes da imprecisão da lei, para atingir a finalidade pública. (in Ato Administrativo, 2ª Ed., SP, RT, 1980, pág. 67)

Esclareça-se, de antemão, que poder discricionário não se confunde com poder arbitrário. Discricionariedade é a liberdade de ação administrativa, dentro dos limites permitidos em lei; já o arbitrário é a ação contrária à lei ou que exceda à lei. Todo o ato discricionário, quando autorizado em lei, é, naturalmente, válido, legal; o ato arbitrário é sempre ilegítimo, ilegal. A faculdade discricionária distingue-se da vinculada pela maior liberdade, mobilidade de ação que é conferida ao agente público, uma vez que para sua prática (do ato administrativo) ele não precisa ficar estritamente vinculado à lei e a seus elementos formadores.

Ainda assim, o administrador deverá ter, mesmo para praticar o ato discricionário, competência legal e ainda obedecer a forma legal para realizá-lo, bem como à sua finalidade legal inerente a todo o ato administrativo.

Ato administrativo praticado através de autoridade incompetente e de forma diversa a descrita ou definida em lei, além de estranho ao interesse público, é nulo ou inválido, não legítimo, tornando-se arbitrário. A atividade discricionária encontra plena justificativa em virtude da impossibilidade de o legislador catalogar na lei todos os atos que a prática administrativa exige, pois o ideal é que a lei pudesse ditar todos os atos possíveis, tornando-os vinculados.

Convém observar que não há possibilidade do Poder Judiciário substituir a discricionariedade do Administrador, pela do Magistrado. Por isso que, de modo equívoco, afirma-se na doutrina que o Poder Judiciário não pode apreciar atos discricionários. O Judiciário sempre poderá agir, só que na apreciação do ato discricionário, limitar-se-á a verificar a legalidade do ato, se foram observados os limites da discricionariedade pelo Administrador, sem adentrar em juízos de valor.

Assim, a título exemplificativo, cobrar impostor é ato vinculado, exercido pelo poder vinculado; construir uma estrada, no entanto, a despeito da necessidade, é ato exercido poder discricionário, onde prevalece a oportunidade e a liberdade do agente.



6) PODER HIERÁRQUICO

Na definição de Hely, é o que dispõe o Executivo para distribuir e escalonar as funções de seus órgãos, ordenar e rever a atuação de seus agentes, estabelecendo a relação de subordinação entre os servidores de seu quadro de pessoal.

Não se confundem poder hierárquico com poder disciplinar, adiante apresentado, embora ambos os poderes andem juntos na sustentação da organização administrativa. A hierarquia, considerando a existência de uma organização, como no caso da Administração, exprime a união de poderes disciplinadores, de cuja ordem nasce um sistema de subordinação, no qual cada elemento representativo de determinado poder, de ordem inferior, deve obediência e respeito ao representante do poder que está colocado acima do seu.

No Poder Executivo, a partir da Presidência da República e Vice-Presidência, e logo abaixo dos Ministros de Estados, nota-se perfeitamente a relação de subordinação entre os vários órgãos e, obviamente, entre os agentes públicos, pela distribuição das funções e cargos graduando a autoridade de cada um deles. O mesmo ocorre no Poder Legislativo e Judiciário, naturalmente, na ordenação de seus respectivos serviços administrativos.

O poder hierárquico tem por objetivo ordenar, coordenar, controlar e corrigir as atividades administrativas, no âmbito interno da Administração Pública. Efetivamente, ordena as atividades da Administração, repartindo e escalonando as funções entre os agentes do poder, de modo a viabilizar o desempenho de seus encargos; coordena, entrosando as funções no sentido de obter o funcionamento harmônico de todos os serviços a cargo do mesmo órgão; controla, velando pelo cumprimento da lei e das instituições, acompanhando o desempenho de cada servidor; corrige os erros administrativos, pela ação revisora dos superiores sobre os atos dos inferiores, e assim a hierarquia atua como instrumento de organização e aperfeiçoamento do serviço.

Do poder hierárquico decorrem certas faculdades implícitas ao agente superior, como a de dar ordens (determinar a prática de certos atos ao subordinado), fiscalizar (vigiar permanentemente os atos praticados pelos subordinados visando mantê-los nos padrões legais e regulamentares), delegar (conferir a outrem atribuições que originariamente competem ao delegante), avocar (chamar a si atribuições ou funções originariamente destinadas ao subordinado) e rever atos de inferiores hierárquicos (apreciar os atos em todos os seus aspectos de competência, objeto, oportunidade, etc.).

Finalmente, é de se esclarecer que subordinação não pode ser confundida com vinculação administrativa, pois se aquela decorre do poder hierárquico esta resulta do poder de supervisão sobre a entidade vinculada.

Seabra Fagundes, analisou com grande proficiência um interessante desdobramento do Poder Hierárquico:

"O constrangimento à liberdade física, resultante de ato disciplinar militar, escapa ao controle jurisdicional por meio de habeas corpus. A restrição se explica pelo pelo propósito de fortalecer a disciplina nas Forças Armadas. Excluindo-se o recurso à Justiça contra as medidas tomadas pelos chefes militares, no resguardo da fidelidade aos regulamentos de serviço e ao respeito hierárquico, se exclui o debate sobre o cabimento das penas impostas, o que desprestigiaria, de certo modo, a atuação dos superiores hierárquicos, e se alcança, pela rapidez, a desejada eficiência no sistema de punições internas do serviço." (O Controle dos Atos Administrativos do Brasil, pág. 257, 5ª ed., Forense).



7) PODER DISCIPLINAR

Consiste na faculdade de punir internamente as infrações funcionais dos servidores e demais agentes sujeitos à disciplina dos órgãos administrativos. É uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço.
Lembre-se que a punição com estribo no Poder Disciplinar, não abrange só as faltas relacionadas com o serviço, mas também aquelas previstas em lei, que atentam contra a dignidade do serviço. Porém não se trata de um Poder absoluto. Neste particular temos:

A autonomia do poder disciplinar só se entende com os fatos que constituem, exclusivamente, faltas disciplinares. Assim, faz-se mister que a discricionariedade não venha a ser usada abusivamente, sob pretexto de pena disciplinar, particularmente onde inexiste o ilícito, ou seja ele de existência havida por duvidosa. (RT. 417/361)

O mestre Português Marcelo Caetano observa:

O Poder Disciplinar tem sua origem e razão de ser no interesse e na necessidade de aperfeiçoamento progressivo do serviço público. (in Do Poder Disciplinar, 1932, Lisboa, pág. 25)

Destarte, o poder disciplinar é correlato com o poder hierárquico, embora com ele não se confunda, pois enquanto neste a Administração escalona as funções executivas, naquela ela controla o desempenho dessas mesmas funções.

Também o poder disciplinar não pode ser confundido com o poder punitivo do Estado, realizado através da justiça Penal. O poder disciplinar é exercido como faculdade punitiva interna da Administração, abrangendo apenas as infrações relacionadas com o serviço; já a punição criminal é aplicada com finalidade social, visando reprimir os crimes ou contravenções penais definidas em lei.

Além disso, o superior hierárquico tem o poder-dever de aplicar a pena disciplinar quando devida, pois a condescendência na punição constitui crime contra a administração Pública. Ao subordinado faltoso cabem-lhe as penas previstas no Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União (Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990): advertência, suspensão, destituição de função; demissão, cassação da aposentadoria ou disponibilidade, conforme o art. 127 daquela norma legal.

Hely observa:

A alteração da finalidade expressa na norma legal, ou implícita no ordenamento da Administração, caracteriza o desvio de poder (détournement de pouvoir - sviamento di potere), que rende ensejo à invalidação do ato, por lhe faltar um elemento principal em sua formação: o fim público desejado pelo legislador. (Op. Cit., pág. 129)

Egberto Maia Luz, por sua vez preleciona verbis:

No tocante ao exercício do jus puniendi, que é intrinsecamente elemento fundamental do Direito Administrativo Disciplinar, deve-se constatar que o seu exercício não é ilimitado e quando extravasa da previsão legal e da admissibilidade moral, fica perfeitamente configurada a arbitrariedade, a violência ou o abuso de poder. O agente do poder público que, na suposição, embora bem intencionada, queria preservar o interesse do Estado, agindo em nome deste com rigor excessivo, deve ser por isto responsabilizado convenientemente, porque então estaria concorrendo não só para desnaturar a legítima pretensão punitiva do Estado, como exceder o jus puniendi que lhe é inerente. (in Direito Administrativo Disciplinar (Teoria e Prática). São Paulo, Bushatsky, 1977, pág. 68)

A apuração da falta deverá ser por meio de processo administrativo onde se garanta o direito de defesa do agente faltoso, e o aplicador deverá motivar a sanção imposta. Sendo que a:

A infração disciplinar será punida conforme os antecedentes, o grau de culpa do agente, bem assim os motivos, as circunstâncias e as conseqüências do ilícito. (Lei 6.745, de 28 de dezembro de 1985, artigo 135, parágrafo único)



8) PODER REGULAMENTAR

É a faculdade atribuída ao Chefes do Poder Executivo (Presidente da República, Governadores de Estados e Prefeitos Municipais) de esclarecer ou explicitar a lei para sua correta execução, ou seja, competência para expedir decretos regulamentares. Tais decretos são autônomos e da exclusiva e privativa competência do Chefe do Executivo (CF/88, art. 84, IV).

Seu exercício tem cabimento:

quando a lei a ser cumprida reclama a interferência da Administração, como requisito de sua aplicação. (Celso Antônio Bandeira de Mello, Ato Administrativo e Direitos dos Administrados, SP, RT, 1981, pág. 91)

Tal poder, em suma, nada mais é do que a possibilidade dos Chefes do Executivo:

de explicitar a lei para sua correta execução, ou de expedir decretos autônomos, sobre matéria de sua competência ainda não disciplinada por lei.(Hely Lopes Meirelles, Op. Cit., pág. 89)

Desta forma, o Chefe do Executivo, nas omissões Legislativas, nos vazios da lei ou no surgimento imprevisto de certos fatos, tem o poder de regulamentar, através de decreto (não confundir com Medida Provisória), as normas legislativas incompletas ou que carecem de melhor interpretação. Pois, a faculdade normativa, embora caiba predominantemente ao Legislativo, função típica deste Poder, nele não se exaure, remanescendo boa parte para o Executivo, função atípica do Executivo, uma vez que regulamento é um complemento da lei e não lei em si, muito embora a ela se assemelhe na forma ou conteúdo.



9) PODER DE POLÍCIA

9.1) Noções e Conceito

Além dos poderes políticos exercidos pelo Legislativo, Judiciário e Executivo, no desempenho de suas funções constitucionais, e dos poderes administrativos, o Estado é dotado ainda do poder de polícia administrativa que é uma figura dentre os poderes administrativos, exercido sobre todas as atividades e bens os quais afetam ou possam afetar a coletividade. Para tal poder há competências exclusivas e concorrentes entre as três esferas estatais (U, E, DF e M), dada a descentralização político-administrativa que decorre do nosso sistema constitucional. Contudo, como certas atividades interessam simultaneamente às três entidades estatais, em todo o território nacional, como saúde, trânsito, transportes, etc., o poder de regular e de policiar se difunde entre as Administrações interessadas.

O estudo relativo ao Poder de Polícia antes de tudo, implica, necessariamente, numa análise do regime político do Estado e, de sua estrutura constitucional, no que se refere aos direitos e garantias individuais e ao interesse público consubstanciado nas normas reguladoras de ordem econômica e social. O conceito e a natureza do Poder de Polícia tem sofrido evolução no tempo. Desse modo do Estado absolutista ao Estado Social atual tivemos uma grande caminhada. Sendo assim, o Poder de Polícia moderno tem por destinação institucional a proteção do interesse coletivo, do bem-estar geral.

O poder de polícia se apresenta acima de tudo, como instituto de natureza basicamente administrativa. É o Poder de Polícia que gera a denominada Polícia Administrativa, que, juntamente com a Polícia Judiciária, procuram zelar pela ordem pública, tranqüilidade das pessoas e garantia do exercício dos direitos quer individuais, quer sociais. Devemos ressaltar, que o Poder de Polícia apenas pode atuar onde a lei autoriza, mesmo que o faça de forma discricionária, porém é um discricionário legítimo, porque da essência desta qualidade de ato administrativo.

Segundo Henrique de Carvalho Simas, o Poder de Polícia:

¨ Consiste na faculdade deferida a Administração Pública de condicionar ou restringir o uso e gozo de direitos individuais, notadamente o direito de propriedade, em benefício da coletividade.

Para o jurista lusitano Marcello Caetano, Poder de Polícia pode ser definido como:

¨ a interdição administrativa da autoridade pública no exercício das atividades individuais susceptíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo por objetivo evitar que se produzam, ampliem ou generalizem os danos sociais que as leis procuram prevenir.

Para Caio Tácito:

¨ É o conjunto de atribuições concedidas à Administração para disciplinar e restringir, em favor do interesse público adequado, direitos e liberdades individuais. (Poder de Polícia e seus limites - RDA 27/1)

Digno de nota, por elucidativo o conceito de Cretella Júnior:

¨ É o conjunto de poderes coercitivos, exercidos por agentes do Estado sobre as atividades do cidadão, mediante a imposição de restrições a tais atividades, a fim de assegurar a ordem pública. (in Direito Administrativo, Forense, RJ, 1986, pág. 113)

Devemos entender o Poder de Polícia como a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais em benefício da coletividade ou do próprio Estado.

Ou ainda, segundo Hely:

¨ é o mecanismo de freargem de que dispõe a Administração Pública, para conter os abusos do direito individual.

Em outras palavras, é a faculdade que se reconhece à Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo dos direitos individuais, inclusive os de propriedade, em benefício do bem estar da coletividade. A razão do poder de polícia é o interesse social e o seu fundamento está na supremacia geral que o Estado pode exercer em seu território sobre todas as pessoas, bens e atividades.

Tendo em vista os elementos fornecidos pelas definições de Poder de Polícia antes arroladas, apresenta ele os seguintes traços:

· É Poder exercido pela Administração Pública;
· É limitador dos direitos individuais (objeto);
· Objetiva assegurar o bem-estar coletivo (finalidade);
· Está balizado pela lei sob controle do Poder Judiciário;
· Estende seu campo de ação sobre todas as atividades sociais.

9.2) Limitações

A extensão do Poder de Polícia é atualmente muito abrangente, alcançando desde a proteção à moral e, aos bons costumes, a preservação da saúde pública, a censura de filmes e espetáculos públicos, o controle de publicações, a segurança das construções e dos transportes, até à segurança nacional em particular.

A faculdade de reprimir na lição de Cretella Júnior não é, entretanto, absoluta, limitada, estando sujeita a limites jurídicos: direitos do cidadão, prerrogativas individuais e liberdades públicas asseguradas na Constituição em seu artigo 5°, tais como: liberdade de consciência e de crença (inciso VI e VIII); direito de propriedade (inciso XXIII e XXIV); exercício das profissões (inciso XIII); direito de reunião (inciso XVI), etc.; como também liberdade de comércio e livre concorrência (art. 170), etc., assim como na legislação infra Constitucional, tais como o CCB (direito de construir, direito dos vizinhos, etc.), Código de Águas, Código de Caça e Pesca, etc.

Do mesmo modo que os direitos individuais são relativos, o mesmo acontece com o Poder de Polícia, que, longe de ser onipotente, incontrolável, é circunscrito, jamais podendo por em perigo a liberdade, a propriedade.

Os limites do Poder de Polícia administrativa são portanto demarcados pelo interesse social em conciliação com os direitos fundamentais do indivíduo e assegurados na Constituição e na Legislação Brasileira. Impondo regra geral, o Poder de Polícia em restrição a direitos individuais, a sua utilização não pode ser excessiva ou desnecessária, de modo a não figurar o abuso de poder.

No mesmo sentido, leciona o Prof. Caio Tácito:

¨ O exercício do Poder de Polícia pressupõe, inicialmente, uma autorização legal explícita ou implícita atribuindo a um determinado órgão ou agente administrativo a faculdade de agir. A competência é sempre condição vinculada dos atos administrativos, decorrentes necessariamente de prévia enunciação legal. A sua verificação constitui, portanto, outro limite à latitude da ação da polícia que somente poderá emanar autoridade legalmente habilitada.

Logo, o Poder de Polícia atua somente através de órgãos e agentes devidamente capacitados e munidos de autoridade emanada de texto legal.

Os limites do Poder de Polícia administrativa são demarcados pelo interesse social em conciliação com os direitos fundamentais do indivíduo assegurados na Constituição Federal no seu art. 5°. O ato de polícia assim como todo ato administrativo subordina-se ao ordenamento jurídico que rege as demais atividades da Administração, sujeitando-se inclusive ao controle de legalidade pelo Poder Judiciário, como ensina o Prof. Hely.

O abuso do Poder de Polícia pode ser entendido como a extrapolação, por parte da autoridade, dos limites legais que lhes são traçados para o exercício de sua atividade. O abuso do poder significa, ainda, ultrapassar os limites de sua própria competência. Assim pode ser entendido como ato por qualquer circunstância praticado com infração da lei.

Ensina-nos Armando de O. Marinho:

¨ O desvio de poder corresponde outra maneira de má utilização de sua competência no âmbito de sua própria esfera discricionária. Em matéria de abuso de poder e desvio de poder a grande incidência recai sobre o Poder de Polícia, fato explicável pelas próprias características deste poder. Os instrumentos corretivos são os mesmos para o controle da legalidade dos atos administrativos, acrescidos dos instrumentos de natureza constitucional destinados a garantir e assegurar o livre exercício dos direitos e das garantias individuais.

No mesmo sentido, informa o Prof. Caio Tácito:

¨ Controle jurisdicional dos atos de polícia. A legalidade da ação de polícia é fiscalizada mediante o controle jurisdicional da Administração, cabendo ao Poder Judiciário declarar a nulidade dos atos administrativos viciados de excesso ou abuso de poder. Por meio de Habeas Corpus ou mandado de segurança, nos casos de certeza e liquidez do direito violado ou ameaçado e, nos demais casos, por meio de ação cominatória ou anulatória ou, ainda, pelos remédios possessórios, possibilita-se a garantia jurisdicional contra a legalidade administrativa.


9.3) Atributos

O Poder de Polícia tem atributos específicos. São eles:

· auto-executoriedade: não precisa do Poder Judiciário para ser implementado;
· Coercitividade: obrigatoriedade;
· Discricionário (em princípio): livre escolha de usá-lo ou não, visando sempre sua perfeita aplicação e o atendimento dos fins colimados.

9.4) Modos (Meios) de Atuação

Preferencialmente, a polícia administrativa atuará de forma preventiva, através de ordens, proibições e normas limitadoras e sancionadoras do comportamento dos indivíduos que convivem na sociedade. Geralmente, no uso dos bens e no exercício das atividades, o controle do Poder de Polícia é materializado por alvarás.

Alvará:

¨ é o instrumento da licença ou da autorização para a prática de ato, realização de atividade ou exercício de direito dependente de policiamento administrativo. (Hely Lopes Meirelles, Op. Cit., pág. 99)

O alvará, se definitivo, chama-se licença; o alvará precário, é a autorização. O Poder de Polícia vem revestido de sanções, que são elementos de coação e intimidação. Manifestando-se através de:

· Multas
· interdição
· fechamento, etc.

Outro meio de atuação do poder de polícia é a fiscalização das atividades sujeitas ao controle da Administração. Lembre-se da impossibilidade de delegação destes instrumentos aos particulares. Vejamos:

MULTA - INFRAÇÃO DE TRÂNSITO - IMPOSIÇÃO E COBRANÇA POR PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO (CET) - INADMISSIBILIDADE - ATIVIDADE TÍPICA DO ESTADO - RENOVAÇÃO DE LICENÇA DO VEÍCULO DETERMINADA, BEM COMO A RESTITUIÇÃO DOS VALORES COBRADOS - Sendo a polícia geral ou polícia de ordem pública, onde inclusive o policiamento de trânsito ou fiscalização de trânsito, atividade jurídica tipica do Estado, torna-se absolutamente impossível a delegação do correspondente poder de polícia a particular ou paraestatal. (TJSP - Ap. 228.863-1/ 4 - 7ª C. - Rel. Des. Rebouças de Carvalho - J. 02.08.95) (RT 721/103)


9.5) Condições de Validade

Para ser válido o Poder de Polícia deve ser:

· proporcional as infrações
· respeito a lei (forma, ...)

Neste sentido tem sentenciado as cortes do País:

MULTA ADMINISTRATIVA - Sanção sumariamente imposta pela autoridade no exercício do poder de polícia. Primeira defesa do autuado (art. 101 do Dec. Estadual nº 8.468/76). Caracterização como recurso hierárquico próprio. Necessidade de garantia da instância recursal mediante prévio recolhimento do valor da penalidade, conforme previsto no art. 10, parágrafo único, da Lei Estadual nº 997/86. Exigência que não ofende o art. 5º, LV (ampla defesa) e LXXIV (Assistência Judiciária), da CF. (TJSP - Ap. 155.864-2 (reexame) - 12ª C. - Rel. Des. Carlos Ortiz - J. 29.05.90) (RT 657/94)

EXPLORAÇÃO MINERAL - AMEAÇA A ÁREA ESPELEOLÓGICA - SUSPENSÃO DA ATIVIDADE - PATRIMÔNIO CULTURAL - DIREITO DE PROPRIEDADE - DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL - A suspensão de atividade exploratória em área espeleológica, em caráter temporário, até parecer do DNPM, é medida cautelar administrativa, que se inclui no âmbito do Poder de Polícia, com a finalidade de conter os excessos contrários aos superiores interesses da coletividade. Portanto, providência dessa ordem constitui medida de vigilância ou forma de acautelamento ou preservação, que o atual Estatuto Fundamental confere ao Poder Público, com a colaboração da comunidade, com o precípuo objetivo de proteger o patrimônio cultural brasileiro, se aí se incluem sítios de valor científico, como grutas e cavernas. A proteção que a lei confere ao direito de propriedade não dá ao proprietário a faculdade de destruir patrimônio valioso como área espeleológica, que pertence à União, é certo, ex vi do art. 20, X, da CF, mas que o Município tem especial interesse de proteger, por integrar o patrimônio estético e paisagístico da comunidade local e por estar autorizado por dispositivo constitucional expresso. (TJMG - AC 78.597/4 - 4ª C. - Rel. Des. Caetano Carelos - J. 03.08.89) (JM 108/167).
9.6) Espécies

A cada restrição de direito individual, expressa ou implícita na lei, corresponde equivalentemente o poder de polícia administrativa para a Administração Pública que deve fazer cumpri-la. A extensão desse poder é hoje muito ampla, abrangendo, como já vimos, desde à proteção da saúde pública, a censura de filmes e espetáculos públicos, o controle de publicações, segurança das construções e transportes, até à segurança nacional em particular. Daí a razão da formação de polícia sanitária, polícia de costumes, polícia florestal, de trânsito, ambiental, e tantas outras, e da cobrança de taxas, tributos específicos vinculados ao exercício da fiscalização de tais atividades.

Vejamos:

a) Polícia de Costumes: entre os instrumentos moralizantes de que dispõem a Administração Pública, estão a interdição de locais, a cassação de alvarás e a vigilância. A competência para a realização da polícia de costumes é dos três graus federativos.

b) Polícia da Comunicação: mesmo extinta a censura (art. 220, § 2° da CF/88), subsiste a polícia de comunicação, controlando as diversões e espetáculos públicos.

c) Política Sanitária: visa a defesa da saúde humana, coletivamente considerada.

d) Polícia de Viação: os meios de transporte trazem considerável perigo ao homem. A polícia de viação estabelece os limites ao direito individual à utilização dos meios de transporte.

e) Polícia de Comércio e Indústria: compreende as várias atuações administrativas limitadoras do comércio ambulante, feiras livres e mercados, sendo maciçamente municipal.

f) Polícia das Profissões: as profissões liberais e técnico-científicas estão submetidas a condições legais para seu exercício cujo cumprimento tem que ser fiscalizado.

g) Polícia Ecológica: fiscaliza o cumprimento da legislação de proteção ao meio ambiente.

h) Polícia Edilícia: estabelece limitações de toda espécie nas cidades a fim de tornar mais segura e digna a vida em áreas urbanizadas.

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ATOS ADMINISTRATIVOS





1) NOÇÕES GERAIS

A exteriorização da vontade humana com reflexos na ordem jurídica é o que chamamos de ato jurídico.
Os atos jurídicos pelos quais a Administração Pública executa suas funções denominam-se atos administrativos. Assim como o Poder Legislativo tem seus atos próprios que são a discussão e elaboração de leis e o Judiciário também os seus, que são as sentenças ou decisões judiciais, os órgãos executivos da Administração, através de suas autoridades, praticam atos administrativos. Logo, três são as categorias de atos:

· atos legislativos;
· atos judiciais e
· atos administrativos



2) CONCEITOS

Muitos são os conceitos elaborados pela doutrina acerca de ato administrativo, vejamos alguns deles:

¨ Ato Administrativo é toda manifestação da vontade do Estado, por seus representantes, no exercício regular de suas funções, ou por qualquer pessoas que detenha nas mãos, fração de poder reconhecido pelo Estado, que tem por finalidade imediata criar, reconhecer, modificar, resguardar ou extinguir situações jurídicas subjetivas, em matéria administrativa. (Cretella Júnior)

¨ Ato administrativo é toda manifestação de vontade da Administração Pública, que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria. (Hely Lopes Meirelles)

¨ Ato administrativo é toda manifestação lícita da vontade da Administração Pública, destinada à aquisição, à conservação, à transferência, à modificação ou à extinção de direitos. (Valmir Pontes)

¨ Atos administrativos são os atos jurídicos que o Estado pratica para a realização dos seus fins, exceto os contenciosos. (Mário Masagão)

Para nós ato administrativo é toda manifestação lícita da vontade da Administração Pública, exarada por intermédio de seus representantes, no exercício regular de suas funções, ou por qualquer pessoa que detenha nas mãos fração de poder reconhecido pelo Estado, que tem por finalidade imediata criar, reconhecer, modificar, transferir, adquirir, resguardar, extinguir situações jurídicas subjetivas em matéria administrativa, de natureza não contenciosa, assim como, impor obrigações aos administrados em geral ou a si própria. Trata-se da mesma idéia contida no art. 81, para ato jurídico, aditado da finalidade pública.

Este conceito restringe-se ao ato administrativo do tipo unilateral, ou seja, àquele que se forma com a vontade única da Administração, e que é o ato administrativo típico. Há ainda os atos administrativos bilaterais, constituídos pelos Contratos Administrativos, estudados mais adiante.

Por outro lado, não se deve confundir atos administrativos com atos da Administração. Oswaldo Aranha Bandeira de Mello (in Princípios Gerais de Direito Administrativo , Vol. I, Ed. Forense. 1969, pág. 412) ensina com grande proficiência que a Administração pratica inúmeros atos que não interessa considerá-los como atos administrativos e que se em resumo são:

a) atos regidos pelo Direito Privado, como locação de imóvel para uma repartição pública (A Administração Pública se nivela ao particular, atos marcados pela bilateralidade);

b) atos materiais, como pavimentar uma rua, praticar uma operação cirúrgica através de um médico funcionário, etc.

c) atos políticos ou atos de governo, em funções típicas como tomar a iniciativa de uma lei, oferecer um indulto, sancionar ou vetar uma lei, etc.



3) FATO ADMINISTRATIVO

O ato administrativo típico, como vimos, é sempre manifestado pela vontade da Administração no desempenho de suas funções, produzindo efeitos de natureza jurídica, o que o distingue de fato administrativo.

Fato administrativo é toda realização no campo material da Administração em cumprimento de alguma decisão administrativa, manifestando-se numa utilidade para o administrado, tal como a construção de uma estrada, ponte ou instalação de um serviço público, dentre outros. Pertence ao mundo dos fatos, ao domínio das técnicas e só reflexamente interessa ao Direito.



4) ELEMENTOS OU REQUISITOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

A vontade manifestada para declarar um direito ou formar um vínculo jurídico, necessita, segundo as regras do Direito Civil da capacidade legal, isto é, de um agente capaz para realizar o ato jurídico, de objeto lícito e da observância da forma prescrita ou não defesa em lei.

Porém o ato administrativo é um ato jurídico especial, típico do direito administrativo, motivo pelo qual seus elementos formativos não se restringem aos elementos clássicos exigidos na esfera privada, reclamando, ainda, a coexistência de outros elementos componentes.

Na esfera administrativa, podemos dizer que os cinco elementos essenciais a formação do ato administrativo, que constituem os seus verdadeiros requisitos, dos quais dependem a validade do ato administrativo são:

a) Competência

Da mesma forma que ocorre com os atos jurídicos para os quais é necessário a capacidade do agente, isto é, seja ele dotado de consciência, vontade e condições reconhecias pela lei como aptas ao exercício dos atos da vida civil, o primeiro elemento ou requisito essencial do ato administrativo é a competência do gente. No ato administrativo exige-se, além disso, ou seja, adite-se ao cumprimento dos requisitos exigidos pelo Código Civil Brasileiro, que haja competência administrativa. Expressão esta que designa o complexo do poder público atribuído aos titulares da administração para o exercício das funções decorrentes de seu cargo, isto é, poder funcional (dado por lei e por ela limitado) para desempenho específico de função ou atribuição.

Para a prática do ato administrativo é necessário, ou melhor, imprescindível portanto que o agente disponha deste poder legal para praticá-lo, ou seja, de poder específico no limite de suas funções, conferido em lei ou por esta previsto ou limitado. Lembra Celso Antônio Bandeira de Mello que não é competente quem quer, mas quem pode. A competência é sempre elemento vinculado do ato administrativo, vez que, sendo praticado por autoridade incompetente será nulo, inválido.

Por outro lado, a competência administrativa, como requisito de ordem pública, é intransferível e improrrogável pela vontade dos interessados. Pode, porém, ser delegada e avocada, desde que em conformidade com as normas reguladoras pertinentes.

b) Finalidade (objetivo)

O ato administrativo só pode ter um fim público, determinado pela lei, não cabendo ao administrador qualquer direito de escolha. Fim este que atenda de forma vinculada um interesse ou finalidade pública.

Quando o ato administrativo apresenta finalidade diversa daquela prevista em lei ou contraria implicitamente aos princípios que regem o serviço público, ocorre desvio de poder, vício que pode provocar a invalidação do ato administrativo.

c) Forma

A forma, isto é, o revestimento da manifestação pública, constitui o terceiro elemento essencial constitutivo do ato administrativo, através do qual a vontade da administração se exterioriza.

Em principio todos os atos administrativos devem ser solenes, escritos e expressos, constituindo ressalvas as formas não solenes, orais e tácitas, cabíveis apenas em caso de urgência, de transitoriedade da manifestação da vontade ou de irrelevância do assunto para a Administração. Nas demais hipóteses deve-se observar o ato escrito em forma legal (decreto, portaria, ofício, resolução, etc.). Trata-se de um grande diferencial com o Direito Privado, vez que, enquanto que entre os particulares suas vontades podem manifestar-se livremente, no direito administrativo a forma é essencial, tendo em vista que a manifestação coletiva do Estado, quando exteriorizada e formalizada, representa a vontade coletiva do grupo social, merecendo, destarte, proteção maior.

A forma convém afirmar não se confunde com o procedimento que é o conjunto de operações exigidas para o aperfeiçoamento, a formação, do ato final. A forma é estática e o procedimento dinâmico. A não observância da forma prevista, acarreta a inexistência do ato, constituindo pois, outro elemento vinculado do ato administrativo.

d) Motivo (o porque?)

O motivo ou causa é a situação de direito ou de fato, que determina ou autoriza a realização do ato administrativo.

No plano administrativo, podem ocorrer duas hipóteses:

· a lei prevê que, ocorrida uma situação ou fato deve ser praticado o ato administrativo
· ou, então, deixa ao administrador escolher entre várias alternativas evidentemente não contrárias à lei, uma delas uma vez ocorrido o fato ou situação.

A motivação do ato administrativo, diante desta duas hipóteses, pode estar vinculada à lei ou pode ficar confiada à discricionariedade do administrador. Na primeira hipótese, fica o titular da administração obrigado a justificar o surgimento do ato, através do que se chama motivação do ato, expondo de maneira circunstanciada as causas e particularidades que ensejaram o seu aparecimento, sob pena de resultar um ato inválido ou, pelo menos, invalidável.

Casos há, entretanto, nos quais, por questões de conveniência ou oportunidade, não fica o administrador obrigado a mencionar as causas geradoras do ato que elabora, tal como a exoneração de um servidor comissionado demissível ad nutum.

A motivação deve estar sempre ligada a um interesse público qualquer, sendo que o administrador não pode praticar atos administrativos sem um motivo, sem uma causa, inclusive na segunda hipótese. Todavia, não se deve confundir motivo com motivação, como preleciona Celso Antônio Bandeira de Mello (in Elementos de Direito Administrativo, 3ª Ed, Malheiros, 1992, SP, pág. 125). Motivação, segundo ele, é a exposição dos motivos, a fundamentação na qual são enunciados os fatos em que o agente se estribou para decidir, é a causa do ato administrativo, enquanto motivo, como se viu, é o pressuposto de fato que autoriza ou exige a prática do ato (externo do ato, antecedendo-o).

e) Objeto (Sobre quem incide o ato)

O objeto, ou o conteúdo do ato administrativo constitui, em última análise, as situações jurídicas criadas, modificadas ou extintas pelo ato.

Todo ato administrativo tem portanto, um objeto representado pelos verbos: criar, modificar ou comprovar situações jurídicas referentes a pessoas, coisas ou atividade sujeitas à ação do Poder Público. O objeto do ato administrativo deve ser lícito, ou seja, não contrário a qualquer norma legal, possível, isto é, exeqüível pela administração, moral, vale dizer, consentâneo com os aspectos éticos do direito, ajustado aos critérios de moralidade pública e, finalmente, certo, ou ainda possuir características de precisão e certeza quanto aos efeitos em relação às pessoas, coisas, tempo, lugar, prazo, etc.


5) MÉRITO

Mérito é a valoração dos motivos e escolha do objeto.


6) CARACTERÍSTICAS DO ATO ADMINISTRATIVO (ATRIBUTOS)

Possui o ato administrativo algumas características, atributos, que o diferenciam dos atos jurídicos privados, dando-lhes características próprias, e que são a presunção de legitimidade, a imperatividade e a auto executoriedade.

a) Presunção de Legitimidade

Todo o ato administrativo, qualquer que seja sua categoria ou espécie, nasce com a presunção de legitimidade, independentemente da norma legal que a estabeleça, em virtude do princípio da legalidade da Administração.

Por esta presunção juris tantum, a execução dos atos administrativos fica imediatamente autorizada, mesmo havendo vício ou defeito que os levem à invalidade. O ato administrativo pressupõe sempre um ato válido e, se acabado, perfeito.

O ato administrativo é perfeito quando completa o ciclo necessário à sua formação, ou seja, após esgotadas todas as fases necessárias a sua produção. É válido quando expedido em conformidade com as exigências ao sistema normativo, isto é, quando atendido todos os requisitos estabelecidos pela ordem jurídica.

Outra conseqüência da presunção de legitimidade é a transferência do ônus da prova de invalidade do ato administrativo para quem a invoca. A prova do defeito apontado contra o ato ficará sempre a cargo do impugnante e, até prova em contrário, o ato terá plena eficácia. A eficácia é a idoneidade que se reconhece ao ato administrativo para produzir seus efeitos específicos.

Assim, todo o ato é eficaz quando os efeitos que lhes são próprios não dependem de qualquer evento posterior, como uma condição suspensiva, termo inicial ou ato controlador a cargo de outra autoridade.

Observa-se então que o Ato Administrativo deve ser perfeito, válido e eficaz. Do que resulta poder ser:

a) perfeito, válido e eficaz = quando, concluído o seu ciclo de formação, encontra-se plenamente ajustado às exigências legais e está disponível para produzir seus efeitos;

b) perfeito, invalido e eficaz = quando, concluído seu ciclo de formação e, apesar de não se achar de acordo com as exigências normativas, encontra-se produzindo os efeitos que lhes são próprios;

c) perfeito, válido e ineficaz = quando, concluído seu ciclo de formação e estando adequado aos requisitos de legitimidade, ainda não se encontra disponível para produzir seus efeitos típicos.

b) Imperatividade

É o atributo do ato administrativo que impõe a coercibilidade (= imposição, a obrigatoriedade) para o seu cumprimento ou execução, estando ele presente em todos os atos. Decorre da própria existência do ato administrativo, sem depender da sua validade ou não, visto que as manifestações de vontade do Poder Público trazem em si a presunção de legitimidade.

Assim, o ato administrativo, dada sua imperatividade, deve ser sempre cumprido, sob pena de sujeitar-se à execução forçada pela Administração ou pelo Judiciário. Lembre-se, no entanto que, nem todos os atos administrativos possuem tal característica, veja por exemplo os Atos Anunciativos.

c) Auto executoriedade

Consiste na possibilidade presente que certos atos administrativos ensejam de imediata e direta execução pela própria Administração, independentemente de ordem judicial. De fato, a Administração não poderia bem desempenhar sua missão de autodefesa dos interesses sociais se, a todo momento, ao encontrar resistência natural do particular, tivesse que recorrer ao Judiciário para remover a oposição contra a atuação pública.

Assim, as prestações típicas como as decorrentes do poder de polícia, em atos de fiscalização, por exemplo, podem ser exigidas e executadas imediata e diretamente pela Administração, sem mandado judicial. Contudo, o reconhecimento da auto executoriedade tomou-se mais restrito em face do art. 5°, LV, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), que assegura o contraditório e ampla defesa inclusive contra os procedimentos administrativos. Mesmo assim, parece-nos, deve ser ela reconhecida sempre.



7) CLASSIFICAÇÃO

De modo geral, os atos administrativos podem ser classificados, quanto aos seus destinatários, em gerais e individuais; quanto ao seu alcance, em internos e externos; quanto ao seu objeto, em atos de império, de gestão e de expediente; e quanto ao seu regramento, em atos vinculados e atos discricionários, segundo divisão do Prof. Hely Lopes Meirelles.

7.1) Quanto aos seus Destinatários

a) Atos Gerais ou Regulamentadores - São os atos administrativos expedidos sem destinatários determinados, com finalidade normativa, alcançando todos os sujeitos que se encontrem na mesma situação de fato em relação aos seus preceitos. São os regulamentos, instruções normativas, circulares, ordens de serviços, etc.

b) Atos Individuais ou Especiais - São, ao contrário, todos aqueles que se dirigem a determinados destinatários (um ou mais sujeitos certos), criando-lhes uma situação jurídica particular. Ex.: Decretos de desapropriação; atos de nomeação; de exoneração, etc.


7.2) Quanto ao seu Alcance

a) Internos - São atos administrativos destinados a produzir efeitos no âmbito das repartições públicas, destinados ao pessoal interno, como portarias, instruções ministeriais, etc., destinados aos seus servidores. Podem ser mesmo assim, gerais ou especiais, normativos, ordenatórios, punitivos, etc., conforme exigência do serviço.

b) Externos ou de Efeitos externos - São todos aqueles que alcançam os administrados, os contratantes e, em certos casos, até mesmo os próprio servidores, provendo sobre seus direitos, obrigações, negócios ou conduta perante a Administração. Tais atos só entram em vigor após sua publicação em órgão oficial (diário oficial) dado seu interesse público.

7.3) Quanto ao seu Objeto

a) De império ou atos de autoridade - São todos aqueles atos que a Administração pratica usando de sua supremacia sobre o administrado ou sobre o servidor, impondo-lhes atendimento obrigatório. É o que ocorre nas desapropriações, nas interdições de atividade e nas ordens estatutárias. Podem ser gerais ou individuais, internos ou externos, mas sempre unilaterais, expressando a vontade onipotente do Estado.

b) Atos de Gestão - São os que a Administração pratica sem usar de sua supremacia sobre os destinatários, tal como ocorre nos atos puramente de administração dos bens e serviços públicos e nos atos negociais com os particulares, como, por exemplo, as alienações, oneração ou aquisição de bens, etc., antecedidos por autorizações legislativas, licitações, etc.

c) Atos de Expediente - São os que se destinam a dar andamento aos processos e papéis que tramitam pelas repartições públicas, preparando-os para a decisão de mérito a ser proferida pela autoridade competente. São atos de rotina interna, sem caráter vinculante e sem forma especial, praticados geralmente por servidores subalternos.


7.4) Quanto ao seu Regramento

a) Vinculados ou Regrados - São aqueles para os quais a lei estabelece os requisitos e condições de sua realização, limitando a liberdade do administrador que fica adstrita aos pressupostos do ato legal para validade da atividade administrativa. Desviando-se dos requisitos das normas legais ou regulamentares, fica comprometida a ação administrativa, viciando-se a eficácia do ato praticado que, assim, toma-se passível de anulação. A fiscalização, v.g., ou a lavratura de auto de infração, pelo agente competente, é ato vinculado. Ex.: cobrar impostos, conceder isenção ou anistia, entre outros.

b) Discricionários - São aqueles atos que a Administração pode praticar escolhendo livremente o seu conteúdo, o seu destinatário, a sua conveniência, a sua oportunidade e o modo da sua realização. A rigor, a discricionariedade não se manifesta no ato em si, mas no poder que Administração tem de praticá-lo quando e nas condições que repute mais convenientes ao interesse público. Não se confunde com ato arbitrário. Discrição é liberdade de ação dentro dos limites legais; arbítrio, é ação que excede à lei e por isto, contrária a ela. O ato discricionário, quando permitido pelo direito, é legal e válido; o ato arbitrário, porém, é sempre ilegítimo e inválido. Manifesta-se em função do poder da Administração em praticá-lo nas condições que julgar conveniente: abrir um concurso público escolhendo o número de vagas, pavimentar uma estrada, etc.


7.5) Quanto a Natureza

a) Simples - O que resulta da manifestação de vontade de um único órgão, unipessoal ou colegiado.

b) Complexo - São os atos que se formam pela conjugação de vontades de mais de um órgão administrativo. Em outra palavras são aqueles que, realizados por um órgão, requerem, para a sua validade - e não para a formação da vontade - a aprovação de outro órgão; os que dependem de pareceres de órgãos consultivos, preceituados em lei; os que se compõem de atos elementares, como seja uma concorrência pública, cuja decisão pelo Ministério ou Secretaria de Estado requer uma série de atos elementares precedentes e autônomos, aos quais essa decisão está de certa forma vinculada. (Cf. Direito Administrativo, Tito Prates, pág. 371)

c) Composto - Que resulta da vontade única de um órgão, mas depende da verificação por parte de outro, para se tornar exeqüível. Ex.: autorização que depende de visto de uma autoridade superior.


7.6) Quanto ao Fim

a) Declaratório de Direito - São os atos que declaram a legalidade de uma situação já existente e de conseqüência irremovíveis diante do Direito.

b) Constitutivo de Direito - São os atos que dão estabilidade jurídica a um fato até então de resultados aleatórios.



8) ESPÉCIES DE ATOS ADMINISTRATIVOS

Pelos caracteres comuns que os assemelham e pelos traços individuais que os distinguem, os atos administrativos podem ser analisados pelas seguintes espécies classificatórias:

8.1) Atos Normativos

Os atos administrativos normativos são aqueles que contém um comando geral do Executivo, visando a correta aplicação da lei, tendo como objetivo direto o de explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados. São eles:

8.1.1) Decretos - Em sentido próprio e restrito são atos administrativos da competência exclusiva dos Chefes do Poder Executivo (federal, estadual e municipal), destinados a prover situações gerais ou individuais, abstratamente previstas pela legislação, de modo expresso, implícito ou explícito. De modo geral, o decreto é normativo e geral, podendo ser específico ou individual, e é sempre hierarquicamente inferior à lei, por isso não podendo contrariá-la. Admite-se duas modalidades:

a) Decreto Independente ou Autônomo: é o que dispõe sobre matéria ainda não regulada especificamente em lei. A doutrina aceita esses provimentos administrativos "praeter legem" (atoa que completa ou complementa a lei) para suprir a omissão do legislador, desde que não invadam as reservas, da lei, i.é, as matérias que somente a lei pode regular

b) Decreto Regulamentar ou de Execução: o que visa a explicar a lei e facilitar-lhe a execução, tomando claro seus mandamentos e orientando sua explicação. É o tipo de decreto que aprova, em texto à parte, o regulamento a que se refere.

8.1.2) Regulamentos - São atos administrativos postos em vigência por decreto, para especificar os mandamentos da lei, ou prover situações ainda não disciplinadas por lei.

Quatro, portanto, são as características do regulamento:

· é ato administrativo, e não legislativo;
· é ato explicativo ou supletivo da lei;
· é ato hierarquicamente inferior à lei;
· é ato de eficácia externa.

Logo, embora o regulamento não possa modificar a lei, por subordinar-se a ela, tem a missão de explicá-la e prover sobre os detalhes não abrangidos pela lei editada pelo Legislativo. Se contrariar a lei, toma-se írrito (sem efeito) e nulo.

8.1.3) Regimentos - São atos administrativos normativos de atuação interna, destinados a reger o funcionamento de órgãos colegiados e de corporações legislativas. Como ato regulamentar interno, o regimento só se dirige aos que devem executar o serviço ou realizar a atividade funcional regimentada, sem obrigar aos particulares em geral. Distinguem-se dos regulamentos independentes e de execução que disciplinam situações gerais entre a Administração e os administrados, estabelecendo relações jurídicas. Os regimentos destinam-se, a prover o funcionamento dos órgãos da Administração; atingindo o pessoal interno a eles vinculados.

8.1.4) Resoluções - São atos administrativos normativos expedidos pelas altas autoridades do Executivo (Ministros, Secretários de Estado, etc.), ou pelos presidentes de tribunais, órgãos legislativos e colegiados administrativos, para disciplinar matéria de sua competência específica e determinar a conduta de seus agentes. Por exceção, admitem-se resoluções individuais. As resoluções, normativas ou individuais, são sempre atos inferiores ao regulamento e ao regimento, não podendo inová-los ou contrariá-los, mas tão-somente complementá-los e explicá-los. Têm efeitos internos e externos, conforme o campo de atuação. Emanam do Poder hierárquico.

8.1.5) Deliberações - São atos normativos ou decisórios emanados de órgãos colegiados. Quando normativas são atos gerais; quando decisórias são atos individuais. As gerais são sempre superiores às individuais. As deliberações devem sempre obediência ao regulamento e ao regimento que houver para a organização e funcionamento do colegiado. Quando expedidos em conformidade com as normas superiores são vinculantes para a administração e podem gerar direitos subjetivos para seus beneficiários.


8.2) Atos Ordinatórios

São todos aqueles que visam disciplinar o funcionamento da Administração e a conduta funcional de seus agentes. São provimentos, determinações ou esclarecimentos que se endereçam aos servidores públicos a fim de orientá-los no desempenho de suas atribuições. Emanam do poder hierárquico e podem ser expedidos por qualquer chefe de serviço aos seus subordinados, nos limites de sua competência. São inferiores aos atos normativos, porque não criam direitos nem obrigações. Constituem-se em:

8.2.1) Instruções - São ordens escritas e gerais a respeito do modo e forma de execução de determinado serviço público, expedidas pelo superior hierárquico visando orientar os subalternos no desempenho de suas atribuições, assegurando a unidade de ação no organismo, objetivando a execução das leis, decretos e regulamentos (CF/88, art. 87, § único, II). Obviamente, não podem contrariar tais epécies normativas. São de âmbito interno.

8.2.2) Circulares - São ordens escritas de caráter uniforme, expedidas a determinados funcionários ou agentes administrativos incumbidos de certos serviços ou atribuições, e de menor generalidade que as instruções.

8.2.3) Avisos - São atos emanados dos Ministros de Estado sobre assuntos afetos a seus ministérios. Foram largamente usados no tempo do Império, mas hoje restringem-se com mais freqüência aos ministérios militares, ordenando serviços.

8.2.4) Portarias - São atos administrativos internos, pelos quais os chefes de órgãos, repartições ou serviços, expedem determinações gerais ou especiais aos seus subordinados, ou designam servidores para funções e cargos secundários. Também é por portarias que se iniciam sindicâncias e processos administrativos, assemelhando-se, nesse caso, à denúncia no processo penal.

8.2.5) Ordens de Serviços - São determinações especiais dirigidas aos responsáveis por obras ou serviços públicos autorizando o seu início, ou então, contendo imposições de caráter administrativo, ou especificações técnicas sobre o modo e a forma de sua realização.

8.2.6) Ofícios - Segundo Hely:

¨ São comunicações escritas que as autoridades fazem entre si, entre subalternos e superiores, e entre Administração e particulares, em caráter oficial.

À luz desse conceito, deduzimos que:

· Somente autoridades (de órgãos oficiais) produzem ofícios, e isso para tratar de assuntos oficiais.
· O oficio pode ser dirigido a: outras autoridades; particulares em geral (pessoas, firmas ou outro tipo de entidade).
· Entidades particulares (clubes, associações, partidos, congregações, etc.) não devem usar esse tipo de correspondência.
· No universo administrativo, o oficio tem sentido horizontal vertical ascendente, isto é, vai de um órgão público a outro, de uma autoridade a outra, mas, dentro de um mesmo órgão, não deve ser usado pelo escalão superior para se comunicar com o escalão inferior (sentido vertical descendente).
· Não se confundem com requerimentos e petições.

8.2.7) Despachos - São decisões administrativas que as autoridades executivas ou legislativas e judiciárias, em funções administrativas proferem em papéis, requerimentos e processos sujeitos à sua apreciação. Tais despachos não se confundem com as decisões judicias proferidas, portanto, pelos juizes e tribunais do Poder Judiciário investidos da função jurisdicional.


8.3) Atos Negociais

São aqueles que visam a concretização de negócios jurídicos públicos, de interesse da Administração e do próprio administrado, regidos pelo direito privado (civil e comercial), ou seja, são declarações de vontade da autoridade administrativa, destinadas a produzir efeitos específicos e individuais para o particular interessado, mas não se confundem com contratos administrativos. Classificam-se em:

8.3.1) Licença - É ato administrativo vinculado e definitivo, pelo qual o Poder Público, verificando que o interessado atendeu a todas as exigências legais, faculta-lhe o desempenho de atividades ou a realização de fatos materiais antes vedados ao particular, como p. ex., exercício de uma profissão, construção de um edifício em terreno próprio, etc.

8.3.2) Autorização – É o ato administrativo discricionário e precário pelo qual o Poder Público torna possível ao pretendente a realização de certa atividade, serviço, ou a utilização de determinados bens particulares ou públicos, de seu exclusivo ou predominante interesse, que a lei condiciona aquiescência prévia da Administração, tais como o uso especial de bem público, o porte de arma, o trânsito por determinados locais, etc.

8.3.3) Permissão - É o ato administrativo negocial, discricionário e precário, pelo qual o Poder Público faculta ao particular a execução de serviços de interesse coletivo, ou uso especial de bens públicos, a título gratuito ou remunerado, nas condições estabelecidas pela Administração. Não se confunde com concessão nem com autorização, a concessão é contrato administrativo bilateral; a autorização é ato unilateral. Pela concessão contrata-se um serviço de utilidade pública; pela autorização, consente-se uma atividade ou situação de interesse exclusivo ou predominante do particular. Pela permissão, faculta-se a realização de uma atividade de interesse concorrente do permitente, do permissionário e do público (permissão para explorar o transporte coletivo). É permissível a permissão condicionada, ou seja, a dada sob condições, limitando o próprio Poder Público na faculdade de, discricionariamente, revogá-la a qualquer tempo, fixando a norma legal, o prazo de sua vigência e/ou assegurando outras vantagens ao permissionário, como incentivo para a execução do serviço.

8.3.4) Aprovação - É o ato administrativo pelo qual o Poder Público verifica a legalidade e o mérito de outro ato, ou de situações e realizações materiais de seus próprios órgãos, de outras entidades ou de particulares, dependentes de seu controle, e consente na sua execução ou manutenção. Pode ser prévia ou subseqüente, vinculada ou discricionária, consoante os termos em que é instituída, pois em certos casos limita-se a confrontar os requisitos da lei.

8.3.5) Admissão - É o ato administrativo vinculado pelo qual o Poder Público, verificando a satisfação de todos os requisitos legais pelo particular, defere-lhe determinada situação jurídica de seu exclusivo ou predominante interesse, como ocorre no ingresso aos estabelecimentos de ensino mediante concurso de habilitação (vestibular). O direito à admissão, desde que reunidas todas as condições legais, nasce do atendimento dos pressupostos legais, que são vinculantes para o próprio poder que os estabelece.

8.3.6) Visto - É o ato administrativo vinculado pelo qual o Poder Público controla outro ato da própria Administração ou do administrado, aferindo a sua legitimidade formal para dar-lhe exeqüibilidade. Não se confunde com espécies afins, como autorização, homologação, etc., porque nestas há exame de mérito, e no visto incide sempre sobre um ato anterior e não alcança o seu conteúdo.

8.3.7) Homologação - É o ato administrativo de controle pelo qual a autoridade superior examina a legalidade e a conveniência de ato anterior da própria Administração, de outra entidade ou de particular, para dar-lhe eficácia.

8.3.8) Dispensa - É o ato administrativo que exime o particular do cumprimento de determinada obrigação até então exigida por lei, como p. ex., a prestação de serviço militar. É normalmente discricionário.

8.3.9) Renúncia - É o ato administrativo pelo qual o Poder Público extingue unilateralmente um crédito ou um direito próprio, liberando definitivamente a pessoa obrigada perante a Administração. Tem caráter abdicativo, por isso não admite condição e, uma vez consumada, é irreversível.

8.3.10) Protocolo Administrativo - É o ato negocial pelo qual o Poder Público acerta com o particular a realização de determinado empreendimento ou atividade, ou abstenção de certa conduta no interesse recíproco da Administração e do administrado que assinou o instrumento protocolar. Este ato é vinculante para todos os que o subscrevem. Inclui-se aí o protocolo de intenção.


8.4) Atos Enunciativos

São aqueles que, mesmo não contendo norma de atuação ou ordem de serviço ou qualquer relação negocial entre o Poder Público e o particular, enunciam uma situação existente, sem qualquer manifestação de vontade da Administração. São todos aqueles em que a Administração se limita a certificar ou a atestar um fato, ou emitir uma opinião sobre determinado assunto, sem se vincular ao seu enunciado. Entre os atos mais comuns desta espécie destacam-se:

8.4.1) Certidões - São cópias ou fotocópias fiéis e autenticadas de atos ou fatos constantes de processo, livro ou documento que se encontre nas repartições públicas. Podem ser de inteiro teor ou resumidas, desde que retratem fielmente o que expressa o original. As certidões administrativas, desde que autenticadas têm o mesmo valor probante do original, como documentos públicos que são, conforme dispõe o Código Civil, art. 136, II; e Cód. Processo Civil, arts. 364 e 365, III, e seu fornecimento independe do pagamento de taxas (CF/88, art. 5°, inciso XXXIV, b), constituindo-se num dever constitucional.

8.4.2) Atestados - São atos pelos quais a Administração comprova um fato ou uma situação de que tenha conhecimento por seus órgãos competentes. A certidão refere-se a atos ou fatos permanentes, deferindo do atestado, que se refere a ato ou fato transitório, não constante de livros, papéis ou documentos.

8.4.3) Pareceres - Os pareceres administrativos são manifestações unilaterais emitidas por órgãos técnicos, denominados consultivos, quando solicitados, jamais ex officio, sobre assuntos submetidos à sua consideração, e tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subseqüente, pois o que subsiste como ato administrativo não é o parecer em si, mas o ato de sua aprovação, que poderá vir revestido de modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva.

A palavra contudo pode ser entendida em três concepções:

a) Concepção Primitiva: parere (ser manifestado) - opinião ou manifestação do pensamento - VOTO - ou opinião in stricto sensu

b) Concepção Genérica: Opinião escrita ou verbal emitida por pessoa sobre determinado assunto, analisando as razões justas e injustas que foram argüidas no pedido, ou apresentadas para apreciação, com conclusão própria do parecerista

c) Concepção restritiva (jurídica): opinião emitida por um jurisconsulto sobre uma questão de ordem jurídica, com bases legais, doutrinária e jurisprudencial, concluindo por uma solução que deve ser adotada. Sempre é emitida à vista de controvérsias.

Divide-se em:

· Parecer Normativo que é aquele que, ao ser aprovado pela autoridade competente, é convertido em norma de procedimento interno, tomando-se impositivo e vinculante para todos os órgãos hierarquizados à autoridade que o aprovou. É ato individual e concreto, para o caso que o propiciou (exigência de parecer antes de determinada aprovação).

· Parecer Técnico é aquele proveniente de órgão ou agente especializado na matéria, não podendo ser contrariado por leigo ou mesmo por superior hierárquico. Nesta modalidade de parecer não prevalece a hierarquia administrativa pois no campo da técnica não há subordinação.

Os pareceres podem ser portanto:

· Facultativos: São os solicitados à vista da ausência de norma legislativa ou regulamentar que obrigue ou proíba.
· Obrigatórios: São os que exigidos por normas jurídicas, em determinados casos, e não existe disciplinamento.

· Vinculantes: São os obrigatórios que vinculam a sua eficácia e cumprimento para casos semelhantes ou assemelhados.

Quanto a Técnica de elaboração o parecer apresenta a seguinte organização formal básica:


PARECER: número de referência
ASSUNTO: Matéria a ser analisada
INTERESSADO: órgão, entidade ou pessoa solicitante
ORIGEM: órgão ou entidade onde se originou o processo
PROCESSO: 01234567890

EMENTA: resumo das conclusões.


RELATÓRIO: Destinatário, por exemplo, Prezado Senhor Coordenador.

Anotação sobre o conteúdo do processo (objeto do pedido, documentos apensados, informações prestadas, despachos, diligências realizadas, outras manifestações, ...

Observações do relator sobre falhas ou irregularidades existentes nos autos administrativos.

Fundamentação ou enquadramento jurídica sobre o conteúdo do pedido (contra ou a favor) com as considerações do relator.

Transcrição de doutrinas e jurisprudências (se houver).

Conclusão (sujeita à melhor interpretação da autoridade a que se subordina o Relator: Eis nosso parecer que submetemos a elevada autoridade de Vossa Excelência ou Eis o parecer, salvo melhor juízo).

Data.
Assinatura do Relator ou Parecerista.


Obs.: Certa similitude com a sentença - CPC - art. 458

8.4.4) Apostilas - São atos enunciativos ou declaratórios de uma situação anterior criada por lei. Ao apostilar um título a Administração não cria um direito, uma vez que apenas reconhece a existência de um direito criado por lei. Eqüivale a uma averbação.


8.5) Atos Punitivos

São aqueles que contém uma sanção imposta pela Administração a todos os que infringem normas ou disposições legais, regulamentares ou ordinatórias dos bens ou serviços públicos. Visam punir ou reprimir as infrações administrativas ou a conduta irregular dos particulares ou mesmo dos servidores, perante a Administração. São eles:

8.5.1) Multa Administrativa - A multa administrativa é toda a imposição ou penalidade pecuniária a que se sujeita o administrado a título de compensação do dano presumido da infração. Nesta categoria entram, inclusive, as multas fiscais, modalidades do Direito Tributário.

8.5.2) Interdição de Atividade – É o ato pelo qual a Administração proíbe alguém a praticar atos sujeitos ao seu controle ou que incidam sobre seus bens. Naturalmente, não se confunde com a interdição judicial de pessoas ou de direitos. A interdição administrativa baseia-se no poder de polícia administrativa ou no poder disciplinar da Administração sobre seus servidores e funda-se em processo regular com ampla defesa ao interessado.

8.5.3) Destruição de Coisas - É o ato sumário da administração pelo qual se inutilizam alimentos, substâncias, objetos ou instrumentos imprestáveis ou nocivos ao consumo ou de uso proibido por lei. É típico de polícia administrativa e, via de regra, urgente, dispensando processo prévio, ainda que exija sempre auto de apreensão e de destruição em forma regular.

8.5.4) Atos de Atuação Interna - Referem-se aos outros atos praticados pela Administração visando a disciplinar seus servidores, segundo o regime estatutário a que estão sujeitos. Aqui o Poder age com larga margem discricionária, tanto na apuração das infrações, como na graduação da pena.



9) TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES

Por princípio, as decisões administrativas devem ser motivadas formalmente, vindo a parte dispositiva precedida de uma explicação ou exposição de fundamentos de fato e de direito, não só por razões de boa administração, como porque toda autoridade ou Poder em um sistema de governo representativo deve explicar legalmente ou juridicamente suas decisões. Só assim, poder-se-á aquilatar o grau de interesse público de cada ato administrativo.

Desta forma, se a lei exige a prática de atos diante de certos motivos, ela legitima o ato, pela vinculação. Porém, quando não há de ser declarado o motivo, porque é discricionário o ato, se a administração o declarar, ele acaba se vinculando aos motivos declarados e se se apurar que tais motivos invocados não estão dentro da realidade, ou são improcedentes, por não coincidirem com a situação de fato, o ato será nulo. A teoria dos motivos determinantes, ainda na lição de Hely Lopes Meirelles, nos demonstra que:

...os atos administrativos, quando tiverem sua prática motivada, ficam vinculados aos motivos expostos, para todos os efeitos jurídicos. Tais motivos é que determinam e justificam a realização do ato, e , por isso mesmo, deve haver perfeita correspondência entre eles e a realidade. Mesmo os atos discricionários, se forem motivados, ficam vinculados a esses motivos como causa determinante de seu cometimento e sujeitam-se ao confronto da existência e legitimidade dos motivos indicados. Havendo desconformidade entre os motivos determinantes e a realidade, o ato é inválido. (Op. Cit., pág. 175)

Caio Tácito, em conhecido estudo sobre esta, adverte:

"... nos atos vinculados, a motivação é obrigatória; nos discricionários, é facultativa, mas, se for feita, atua como elemento vinculante da Administração Pública, como determinante do ato administrativo. Se tal motivo possui um vício de nulidade, nulo é o ato administrativo praticado." (A Inexistência dos Motivos nos Atos Administrativos. In: Revista de Direito Administrativo. São Paulo: v. 36. p.78-81).

É portanto plena a incidência da teoria dos motivos determinantes, ainda mais porque, em direito administrativo:

"uma vez enunciados pelo agente os motivos em que se calçou, ainda quando a lei não haja expressamente imposto a obrigação de enunciá-los, o ato administrativo só será valido se estes realmente ocorreram e o justificavam." (Celso Antônio Bandeira de Mello, in Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1993, p.184).

Em matéria de motivação importante pela pertinência a seguinte manifestação jurisprudencial para que não se tenha falso entendimento acerca desta temática:

MANDADO DE SEGURANÇA - ATO ADMINISTRATIVO MOTIVAÇÃO - Embora deferida ao administrador certa dose de subjetivismo na prática de determinado ato, é indispensável a respectiva motivação para que seja possível examiná-lo à luz do princípio da razoabilidade. Inexistente a motivação, o ato será írrito. Sentença confirmada em reexame necessário. (TJPR - Reex. Nec. 43.324-9 - Ac. 12.277 - 1ª C. Civ. - Rel. Des. Pacheco Rocha - DJ 05.02.96)



10) REVOGAÇÃO E ANULAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

10.1) Revogação

Revogação é a supressão de um ato administrativo perfeito, legítimo e eficaz, realizada pela Administração e somente por ela (jamais o Poder Judiciário) por não mais lhe convir. Toda revogação pressupõe, portanto, um ato legal e perfeito, mas inconveniente ao interesse público. Obviamente, se o ato for ilegal e ilegítimo não ensejará revogação, mas sim, anulação.

Na lição do Prof. Cretella Júnior, revogação é:

¨ ...a manifestação unilateral da vontade da administração que tem por escopo desfazer, total ou parcialmente, os efeitos de outro ato administrativo anterior praticado pelo mesmo agente ou seu inferior hierárquico por motivo de conveniência ou de oportunidade.

Lembre-se que somente pode ser revogado ato existente, portanto, legal e perfeito. Revogado será o ato que a Administração, somente a administração, julgar não mais ser conveniente ao interesse público. A revogação funda-se no poder discricionário que tem a administração para rever sua atividade interna e encaminhá-la adequadamente à realização de seus fins específicos. Em princípio, todo ato administrativo é revogável, respeitados determinados limites e restrições. A revogação opera seus efeito ex nunc (da data em diante), vez que o ato é válido até a data da revogação, tanto para a administração pública, como em relação a terceiros que com ela se relacionem.

10.2) Anulação

Anulação é a declaração de invalidade de um ato administrativo ilegítimo ou ilegal, feita pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário. Difere, pois da revogação consoante lição de Armando de O. Marinho, pois:

Enquanto que na revogação a Administração se vale do poder discricionário para eliminar da ordem jurídica o ato inoportuno ou inconveniente, apesar de sua perfeição e validez, na anulação o Poder Público, reconhecendo que faz baixar ato ilegal, contrário à ordem jurídica ou a texto expresso da lei, suprime-o, fazendo cessar seus efeitos.

Em suma, reconhecendo que praticou um ato contrário ao Direito vigente, cabe à Administração anulá-lo imediatamente, para restabelecer a legalidade administrativa.

É importante salientar que o conceito de ilegalidade ou ilegitimidade, para fins de anulação de ato administrativo, não se restringe somente à violação frontal da lei, mas abrange, igualmente, o abuso, por excesso ou desvio de poder, ou por relegação dos princípios gerais de direito, eis que aí padece de vício de ilegitimidade, tomando-se inválido pela própria Administração, ou mesmo pelo Judiciário, via anulação.

Os efeitos da anulação dos atos administrativos retroagem às suas origens, são ex tunc invalidando as conseqüências passadas, presente e futuras do ato anulado, porque o ato é nulo ou inexistente, não gerando direitos ou obrigações para as partes, reconhecida e declarada a nulidade do ato, pela administração ou pelo judiciário, o pronunciamento de invalidade que não admite convalidação. Desfaz todos os vínculos entre as partes, recompondo as coisas ao seu estado natural.



11) CONTROLE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

Para o controle dos atos administrativos há dois caminhos: um interno, através da própria Administração Pública; outro externo, através do Poder Judiciário.
A própria Administração tem uma faculdade de invalidar os atos administrativos, muito mais ampla que o Poder Judiciário, que não pode jamais adentrar a conveniência e a oportunidade do ato (seu mérito), devendo limitar-se ao exame de sua legalidade.

A Súmula 473 do STF preceitua:

¨ A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvados, em todos os casos, a apreciação judicial.

A administração, entretanto, poderá revogar ou anular seus próprios atos, desfazendo-os. O Judiciário somente pode anular o ato administrativo, jamais revogá-lo. O Professor Seabra Fagundes preleciona:

¨ Ao Poder Judiciário é vedado apreciar, no exercício do controle jurisdicional, o mérito dos atos administrativos. (...) O mérito é de atribuição exclusiva do Poder Executivo, e o Poder Judiciário nele penetrando, faria obra de administrador, violando, com isso, o princípio de separação e independência dos poderes. (O Controle dos Atos Administrativos, pág. 116/7)

O Poder Judiciário, por sua vez, vem decidindo:

não compete ao julgador perquerir da justiça ou injustiça do ato atacado, eis que, do contrário, haveria invasão franca das atribuições inerentes ao Poder Executivo. Isto é ponto pacífico. (TFR, Embargos à Apelação n.° 3.244, Rel. Min. Macedo Ludolf, in RDA 34/229) AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Esgoto doméstico. Ação visando o tratamento prévio dos detritos lançados nas águas de rios. Ato administrativo que necessita de exame de conveniência e oportunidade pelo Poder Executivo. Impossibilidade de invasão de tal esfera pelo Poder Judiciário. (TJSP - AC 179.965-1 - 3ªC. - Rel. Des. Mattos Faria - J. 15.12.92) (RJTJESP 143/14)


12) CIÊNCIA DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

Os interessados e os que postulam quaisquer direitos perante o poder público têm acesso aos respectivos processos para conhecerem os despachos, informações e demais atos referentes aos seus interesses. A repartição, entretanto, poderá exigir as identificações pessoais respectivas para que este acesso seja autêntico e cercado das garantias necessárias. Havendo na espécie o exercício de mandato, ao mandatário deve ser facilitado o conhecimento de as fases do procedimento administrativo.

Neste aspecto, a Constituição Federal estabelece taxativamente, em seu art. 5°:

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
(...)
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas;
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;

Como vemos, o mandamento constitucional é claro e abrangente, envolvendo as repartições administrativas em geral, não importando se federais, estaduais ou municipais.


14) EFEITOS DO ATO ADMINISTRATIVO

O ato administrativo de caráter definitivo, decidindo uma questão que se refira a direitos de terceiros, terá efeitos a partir da sua aplicação no órgão oficial respectivo, se outra forma não estiver prevista nas leis ou regulamentos de sentido normativo.
O prejudicado com qualquer decisão administrativa poderá recorrer contra o ato para a autoridade ou órgão superior, indo até ao poder judiciário para ver aí o seu direito discutido e reconhecido, se for o caso.

Lemos no art. 5° da CF/88:

XXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
XLV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;


15) ATOS DO PODER LEGISLATIVO E PODER JUDICIÁRIO

No âmbito do Poder Judiciário, editam-se atos judiciais jurisdicionais e não jurisdicionais e atos administrativos materiais. Os primeiros são atos típicos do Poder Judiciário; o segundo são atos administrativos editados pelo Judiciário, trata-se das funções atípicas deste poder: auto administração

Quando estes atos produzem dano ao particular, vai-se indagar se o Estado é responsável. A responsabilidade do Estado por atos judiciais é matéria de relevância no campo do Direito. Ato judicial é, antes de tudo, ato público. O magistrado é equiparado, para esses efeitos, ao servidor público.

Pelos prejuízos que os atos judiciais, quer jurisdicionais quer não jurisdicionais, causem ao administrado, responderá o Estado, quer se prove a culpa ou dolo do magistrado, quer os danos sejam ocasionados pelo serviço da administração da Justiça, que é, primordialmente, um serviço público do Estado. Se houver culpa ou dolo do julgador, o Estado responde pelos prejuízos causados, exercendo depois o Direito de regresso contra o causador do dano.



16) LEGALIDADE X FINALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

De Palestra proferida pelo douto Celso Antônio Bandeira De Mello, no Seminário sobre a Uniformização da Jurisprudência Administrativa, promovido pela Procuradoria Geral do Estado de Santa Catarina, em 05 de junho de 1986 colhe-se a seguinte pérola:

Legalidade e finalidade compõe o binômio básico do Direito Administrativo. É a idéia de que os agentes, aqueles que atuam na realização dos fins do Estado, não elegem aqueles fins, porque esses fins são eleitos primeiro a nível constituinte, depois a nível de legislação ordinária, pelo Poder Legislativo, e que, ao operarem para buscar esses fins, não agem como senhores da coisa pública, não dispõem de poderes em nome próprio. Não é porque sou o leão, não é porque sou o mais forte, apesar dessa lamentável propaganda do leão do imposto de renda, o que é uma agressão, uma violência, um desacato, uma violência a todo cidadão, um insulto.
Os autores italianos, quase que sem exceção, insistem na distinção entre o interesse público primário e o chamado interesse secundário, que é o interesse que se pode também encarnar no aparelho do Estado como se encarnaria em qualquer centro subjetivado de direitos e obrigações de qualquer pessoa.
O Estado existe para a busca do interesse público, que é o interesse primário, de tal sorte que o interesse secundário só pode ser procurado pelo Estado na estrita medida em que coincidir com o interesse primário. É pela busca do interesse primário que ele pode, digamos assim, assumir como um subproduto atender o interesse secundário, mas não pode buscá-lo tendo em vista o interesse secundário pura e simplesmente. Exemplos aclararão esse discrime entre interesse primário e interesse secundário.Renato Alessi nos propõe os seguintes dois exemplos que nós podemos centuplicar, multiplicar, se pensarmos então no Brasil. Renato Alessi diz:
Enquanto pessoa, enquanto sujeito de direito, o Estado, o aparelho estatal, poderia ter interesse de pagar miseravelmente a seus servidores deixando-os nos limites de subsistência para que não morram e possam continuar com sua força de trabalho a servir o Estado. Com isto, enquanto sujeito, enquanto pessoa, ele despenderia menos, estaria mais rico, mais abastecido. Mas, não é este o interesse público primário, não é este o interesse público propriamente.
Este é o interesse que qualquer sujeito poderia ter, se não existissem, por exemplo, as leis trabalhistas, se não existisse o salário mínimo, os empresários poderiam, digamos, do ponto de vista jurídico, afora à parte qualquer questão moral, buscar esse interesse de pagar simplesmente no limite de subsistência do indivíduo. Diz ele:
O Estado poderia ter interesse de tributar desmedidamente os administrados e assim ele abarrotaria seus cofres de recursos. Ele seria um Estado rico, ainda que o povo fosse miserável; enquanto pessoa, enquanto sujeito, é claro que pode existir esse interesse para um sujeito. Mas esse não é o interesse público primário. Em outras palavras, NÃO É PARA ISSO QUE EXISTE O ESTADO. De que valeria um Estado rico com uma população pobre? Estaria o Estado cumprindo a sua razão de existir? ... Mas, pensemos no Brasil, pensemos no caso brasileiro, onde se tem a impressão de que o Estado imagina, o poder público imagina, que o seu dever é buscar o interesse secundário e não o interesse primário. ... Veja-se: nas desapropriações que faz o Estado, ele oferece o mais irrisório dos valores que ele possa oferecer, o mais irrisório deles; ... Quando alguém sofre um dano, quando alguém sofre uma lesão causada pelo Estado, por mais evidente que seja o nexo de causalidade entre a conduta estatal e o dano ocorrente e às vezes até além de existir este nexo, existe culpa e até dolo, por mais evidente que seja, o Estado como primeira realização, a administração resiste ferozmente a pagar. ... Eu creio que, do ponto de vista lógico, ninguém negará que o Estado existe para cumprir um interesse público, que o Estado existe, que a administração existe para atender às finalidades legais no seu espírito, no seu objetivo. Mas como imaginar que esse direito se possa operacionalizar enquanto se persistir em construir todo o Direito Administrativo ao redor das idéias do poder, e não ao redor das idéias de dever e de finalidade? Como esperar que isto se implemente realmente na medida em que se aceita que o Estado pode atuar, é o único sujeito de direito a quem se reconhece a possibilidade de agir violando o princípio geral de direito básico de lealdade e o da boa-fé? O Estado faz isso diariamente com o cidadão. (Revista N.º 1, da PGE/SC, IOESC, 1986, p.17-25)


5
DAS LICITAÇÕES





1) NOÇÕES GERAIS

Todo contrato administrativo, seja ele de obras, de fornecimento de materiais ou de prestação de serviços, quando forem firmados com terceiros, tendo em vista o interesse público e para resguardar a moralidade administrativa, exige licitação prévia, a qual só é dispensável, inexigível ou proibida nos casos expressamente previstos em lei. Assim, em regra geral, a licitação é o antecedente necessário do contrato administrativo e o contrato é o conseqüente lógico da licitação.



2) CONCEITO

Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse, mediante uma sucessão ordenada de atos vinculantes, tanto para a Administração como para os licitantes, proporcionando igual oportunidade a todos os interessados e atuando assim, como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos.



3) FINALIDADE DA LICITAÇÃO

A licitação tem dupla finalidade, segundo o art. 3° da Lei 8.666/93:

· a obtenção do negócio jurídico mais vantajoso
· o resguardo dos direitos dos possíveis contratantes



4) OBJETO DA LICITAÇÃO

Entende-se por objeto da licitação a obra, serviço, compra, alienação, locação ou concessão, as quais serão, por fim, contratadas com o particular vencedor da licitação. Para efeitos legais considera-se, no objeto da licitação, as seguintes definições, todas extraídas da Lei n° 8.66/93:

a) Obra: É toda construção, reforma, fabricação ou ampliação, realizada por execução direta ou indireta.

b) Serviço: É toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a Administração, tais como: demolição, conserto, instalação, montagem, operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnico-profissionais.

c) Compras: É toda aquisição remunerada de bens para fornecimento de uma só vez ou parceladamente.

d) Alienação: É toda transferência de domínio de bens a terceiro.

e) Obras, Serviços e Compras de Grande Vulto: São aqueles cujo valor estimado seja superior a 25 (vinte e cinco) vezes o limite estabelecido na alínea c do inciso I do art. 23 da Lei 8.666/93 (um bilhão de cruzeiros), ou seja, 25 bilhões à época, ou o equivalente hoje a pouco mais de R$ 9.000 (nove mil reais).

f) Seguro Garantia: é o seguro que garante o fiel cumprimento das obrigações assumidas por empresas em licitações e contratos.

g) Execução Direta: é a que é feita pelos órgãos e entidades da Administração, pelos próprios meios.

h) Execução Indireta: a que o órgão ou entidade contrata com terceiros uma série de regimes diversos arrolados pela lei (ver item 12 deste capítulo)

i) Projeto Executivo: É o conjunto dos elementos necessários e suficientes à execução completa da obra, de acordo com as normas pertinentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.

j) Administração Pública: É a constituída pela administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas.

l) Administração: É o órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente.

m) Contratante: É o órgão ou entidade signatária do instrumento contratual.

n) Contratado: É a pessoa física ou jurídica signatária de contrato com a Administração Pública.



5) OBRIGATORIEDADE

Conforme a CF/88, art. 37, XXI, a licitação é obrigatória para todas as entidades públicas, estatais e autárquicas e igualmente, para as paraestatais, sendo dispensada apenas nos casos previstos em lei.

O dispositivo infra constitucional que dispões acerca da matéria é a lei 8.666, de 21 de junho de 1993 (publicada no DOU em 22/06/93), e alterado pela Lei n° 8.883, de 08 de junho de 1994, a qual, em seu art. 3°, determinou a republicação integral daquele diploma no DOU no prazo de 30 dias. Assim a lei 8.666/93 foi republicada no DOU de 07 de julho de 1994, já com todas as alterações estabelecidas pela lei 8.883/94.



6) PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO

A licitação está sujeita a determinados princípios, cujo descumprimento descaracteriza o instituto licitatório, invalidando o processo seletivo.

Os princípios que regem a licitação, qualquer que seja a sua modalidade, são:

a) Procedimento Formal - que impõe a vinculação da licitação às prescrições legais que regem minudentemente todos os atos e fases do certame. Tais prescrições decorrem da lei e do regulamento ou do próprio edital ou convite que complementa as normas superiores, em cada caso específico.

b) Publicidade de seus Atos - A licitação não é sigilosa, sendo públicos e acessíveis todos os atos de seu procedimento, devendo ocorrer tanto erga omnes como erga partes. Publicidade esta que abrange desde os avisos de sua abertura até o conhecimento do edital e seus anexos, o exame da documentação e das propostas pelos interessados, e o fornecimento de certidões de quaisquer peças, pareceres ou decisões com elas relacionadas. Por isto impõe-se a abertura dos envelopes em público e a publicação oficial das decisões dos órgãos julgadores (Grupo Executivo de Licitação) e do respectivo contrato, ainda que resumidamente. Tal Publicidade deve ser feita na Imprensa Oficial, que nada mais é do que o veículo oficial de divulgação da Administração Pública, sendo para a União, o Diário Oficial da União (DOU) e, para os Estados, DF e para os Municípios, o que for definido nas respectivas leis (DOE ou jornal local).

c) Igualdade entre Licitantes (Isonomia) - é o princípio impeditivo da discriminação entre os participantes no certame, quer através de cláusulas que, no edital ou convite, comprometa, restrinja ou frustre seu caráter competitivo, favorecendo uns em detrimento de outros, em função da sede, domicílio ou da naturalidade dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, quer mediante julgamento faccioso ou tendencioso, que desiguale os iguais ou iguale os desiguais. Com supedâneo neste princípio, é verbia gratia, vedado dispensar tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer outra, entre empresas brasileiras ou estrangeiras, inclusive no que se refere a moeda, modalidade e local de pagamentos, mesmo quando envolvidos financiamentos de agência internacionais, como o Banco Mundial e o BIRD. Tal igualdade porém devemos sublinhar não é absoluta, sendo inclusive assegurado, no texto legal, em igualdade de condições, critérios de desempate. Isto é, tem privilégio, sucessivamente, os bens e serviços produzidos ou prestados por empresas brasileiras de capital nacional; os produzidos no País, ou produzidos ou prestados por empresas brasileiras (mesmo com capital misto, não nacional).

d) Sigilo na Apresentação das Propostas - guarda perfeita consonância com os princípios anteriores, pois ficaria em posição vantajosa o proponente que tomasse conhecimento das propostas de seus concorrentes.

e) Vinculação ao edital ou convite - É o princípio básico de toda a licitação. O edital é a lei interna da licitação, segundo a qual a Administração estabelece as regras, a forma e o modo de participação dos licitantes, vinculando os mesmos aos seus termos. Desta feita, só pode a Administração aceitar propostas que sejam compatíveis com as peças convocatórias do procedimento licitatório.

f) Julgamento objetivo das propostas - estribado no edital, nos termos específicos das propostas e na probidade administrativa, devendo ser julgada em estrita conformidade com os princípios da legalidade, da moralidade, da isonomia e da publicidade, o administrador público escolherá a melhor proposta com base em fatos concretos;

g) Adjudicação compulsória ao vencedor - impede que a Administração, ao concluir o processo licitatório, atribua esse objeto a outrem que não o legítimo vencedor. Porém deve-se salientar contudo, que mesmo tendo ocorrido uma licitação e havendo o respectivo vencedor, a Administração não é obrigada a imediatamente contratar. Só lhe é vedado contratar com outrem enquanto for válida a licitação



7) LOCAL DE REALIZAÇÃO DA LICITAÇÃO

As licitações devem ser efetuadas no local onde se situar a repartição interessada, salvo motivo de interesse público, devidamente justificado, o que não impede a habilitação de interessados residentes ou sediados em outros locais.



8) PROCEDIMENTO

O procedimento da licitação inicia-se na repartição interessada com a abertura de processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado, em que a autoridade competente determina sua realização, definindo de forma suscinta seu objeto, indicando os recursos, etc. Tudo isto a Administração leva ao conhecimento público através de edital.

Oportunamente serão juntados a este processo os seguintes documentos:

a) edital ou convite e respectivos anexos, quando for o caso;

b) comprovante das publicações do edital resumido;

c) ato de designação da comissão de licitação, do leiloeiro administrativo ou oficial, ou do responsável pelo convite;

d) original das propostas e dos documentos que às instruíram;

e) atas, relatórios e deliberações da Comissão Julgadora;

f) pareceres técnicos ou jurídicos emitidos sobre a licitação, dispensa ou inexigibilidade;

g) atos de adjudicação do objeto da licitação e da sua homologação;

h) recursos eventualmente apresentados pelos licitantes e respectivas manifestações e decisões;

i) despacho de anulação ou de revogação da licitação, quando for o caso, fundamentado circunstanciadamente;

j) termo de contrato ou instrumento equivalente, conforme o caso;

l) outros comprovantes de publicação; e

m) demais documentos relativos à licitação.

Para habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-financeira e regularidade fiscal. Aduz o parágrafo único desse art. 38 que, sempre que o valor estimado para uma licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas for superior a 100 (cem) vezes ao limite da modalidade concorrência, o processo licitatório será iniciado, obrigatoriamente, com uma audiência pública pela autoridade responsável com antecedência mínima de 15 dias úteis da data prevista para a publicação do edital e divulgada, com antecedência mínima de 10 dias úteis da sua realização, pelos mesmos meios previstos para a publicidade da licitação, à qual terão acesso e direito a todas as informações pertinentes e a se manifestar todos os interessados.



9) MODALIDADES DE LICITAÇÃO

De acordo com o art. 22 da nova Lei n°. 8.666, de 21/06/93, são as seguintes as modalidades de licitação:

a) Concorrência: é a modalidade de licitação, para contratos de grande valor, entre quaisquer interessados, cadastrados ou não, que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução do projeto. Nesta modalidade licitatório, haverá sempre, esta fase de habilitação preliminar para comprovar-se a qualificação dos interessados.

Os requisitos peculiares da concorrência são a universalidade, a ampla publicidade, habilitação preliminar e o julgamento através de comissão.

Poderá haver nesta modalidade, os certames internacionais (concorrências internacionais), sujeitos aos mesmos procedimentos de qualquer concorrência, salvo a exigência imposta às firmas internacionais partícipes da prova de autorização para funcionamento no Brasil. Devem as licitações internacionais se ajustar as diretrizes estabelecidas pelos órgãos responsáveis pela política monetária e pela política do comércio exterior.

b) Tomada de Preços: é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação. O limite de valor é inferior ao da concorrência e superior ao do convite.

O que distingue a tomada de preços da concorrência, no entanto, é a exigência da habilitação prévia dos licitantes através dos registros cadastrais (em assentamentos próprios nas repartições).

c) Convite: é a modalidade de licitação, para compras de pequeno valor, entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados, mediante solicitação escrita, em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.

O convite saliente-se não exige publicação na imprensa oficial porque é feita diretamente aos escolhidos pela Administração. Em função dos valores envolvidos, a legislação indica quando cabe a concorrência, a tomada de preço e a carta convite, sendo certo que é lícito recorrer à forma de maior complexidade quando o vulto do eventual negócio permite a utilização de procedimento mais simples.

É inútil indicar aqui os valores dos limites de cada tipo de licitação, dada a sua grande mobilidade. Os valores que a Lei 8.666/93 exprimiu em quantidades fixas de moeda são periodicamente alteráveis pelo Poder executivo, na conformidade dos índices oficiais.

Temos ainda:

d) Concurso: é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, predominantemente de criação intelectual, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores (nunca se oferece preço), conforme critérios constantes de edital publicado na impressa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias. Embora na qualidade de modalidade especial de licitação, sujeita-se aos princípios de publicidade e de igualdade entre os participantes, visando sempre a escolha do melhor trabalho.

e) Leilão: é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis ou semoventes inservíveis para a Administração ou de produtos legalmente apreendidos, abandonados nas alfândegas ou áreas alfandegadas ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis, cuja aquisição haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação. A administração Pública pode valer-se de dois tipos diversos:

· o leilão comum, privativo de leiloeiro oficial
· leilão administrativo, realizados pela própria administração



10) CRITÉRIOS DE JULGAMENTO

Na fixação de critérios para julgamento das licitações levar-se-ão em conta, no interesse do serviço público, as condições de: qualidade, rendimento, preços, condições de pagamento, prazos outras pertinentes, estabelecidas no edital.



11) CRITÉRIOS PARA HABILITAÇÃO

Na habilitação às licitações, exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa: à personalidade jurídica, à capacidade técnica e à idoneidade financeira



12) REGIMES DE EXECUÇÃO

As licitações para obras ou serviços admitirão os seguintes regimes de execução:

a) Empreitada por preço Global: quando o contrato compreende preço certo e total;

b) Empreitada por preço Unitário: quando por preço certo de unidade determinada;

c) administração contratada: formalizada na prática mediante:

· Tarefa - quando se ajusta mão-de-obra para pequenos trabalhos por preço certo, com ou sem fornecimento de materiais;
· Empreitada Integral - quando se contrata um empreendimento em sua integralidade, compreendendo todas as etapas das obras, serviços e instalações necessárias, sob inteira responsabilidade da contratada até a sua entrega ao contratante em condições de entrada em operação atendidos os requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e operacional e com as características adequadas às finalidades para que foi contratada;

Convém lembrar que independentemente de sua modalidade a execução deve estar em conformidade com o projeto básico. Que segundo estabelece a própria lei nada mais vem a ser do que o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto de licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica e adequado tratamento do impacto ambiental (RIMA) do empreendimento e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução.



13) FORMAS DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

As obrigações decorrentes de licitação ultimada, constarão de:

a) contrato bilateral;
b) outros documentos hábeis, tais como cartas contratos, empenhos de despesas, autorizações de compra e ordens de execução de serviço.

Será facultada a qualquer participante da licitação o conhecimento dos termos do contrato a ser celebrado.

Será facultativa, a critério da autoridade competente, a exigência da prestação de garantia por parte dos licitantes, segundo os seguintes modalidades: caução em dinheiro, em títulos de dívida pública ou fidejussória, fiança bancária e seguro-garantia.



14) PENALIDADES

Os fornecedores ou executores de obras ou serviços estarão sujeitos: multa, prevista nas condições de licitação, suspensão do direito de licitar por prazo fixado pela autoridade competente segundo a gradação que for estipulada em função da natureza da falta e declaração de inidoneidade para licitar na Administração, que será publicada no órgão oficial.

A autoridade imediatamente superior àquela que proceder à licitação pode anulá-la por sua própria iniciativa.



15) COMISSÃO DE LICITAÇÃO

A administração deve criar uma Comissão, permanente ou especial, com a função de receber, examinar e julgar todos os documentos e procedimentos relativos às licitações e ao cadastramento de licitantes.

Compete à Comissão Permanente, denominada na prática como Grupo ou Comissão Executiva de Licitação, acompanhar todas as etapas do procedimento licitatório, sempre em ato público previamente designado, do qual será lavrada ata circunstanciada da sessão.



16) OBRIGATORIEDADE, DISPENSA E INEXIGIBILIDADE DAS LICITAÇÕES

As licitações são obrigatórias na execução de obras e contratação de serviços, segundo os projetos básicos e executivos, serviços de publicidade, compras, alienações, etc., definidos entre as finalidades da licitação. Quer dizer, as obras e serviços somente poderão ser licitados quando houver projeto básico aprovado pela autoridade administrativa competente, e disponível para exame dos interessados no processo licitatório, inclusive com orçamento detalhado em planilhas com a composição detalhada de todos os seus custos unitários, bem como, quando houver previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento das obrigações decorrentes de tais obras e serviços. Da mesma forma, nenhuma compra será feita sem a adequada caracterização de seu objeto e indicação dos recursos orçamentários para seu pagamento.

A licitação é dispensável nos seguintes casos (art. 24):

a) para obras e serviços de engenharia de valor inferior a 5% (cinco por cento) do limite estabelecido para a modalidade de licitação denominada convite, desde que não se refiram a parcela de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras ou serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente.

b) para outros serviços e compras de valor até 5% do limite estabelecido para a modalidade convite, e para alienações nos casos previstos em Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de só vez.

c) Nos casos de guerra ou grave perturbação da ordem.

d) em casos de emergência ou calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança das pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras ou serviços que possam ser concluídas no prazo de 180 dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos.

e) quando não acudirem interessados à licitação e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as condições pré estabelecidas.

E ainda:

f) quando a União tiver de interferir no domínio econômico para regular ou normalizar o abastecimento,

g) quando as propostas apresentarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais compradores

h) Para aquisição, por pessoas jurídicas de direito público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgãos ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico em data anterior à vigência da Lei 8.666193.

i) Quando houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, em casos estabelecidos pelo Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional.

j) Para compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da Administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia.

l) Na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento, em conseqüência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições oferecidas pelo licitante vendedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido.

m) nas compras de hortifrutigranjeiros, pão e outros gêneros perecíveis, no tempo necessário para a realização dos processos licitatórios correspondentes, realizadas diretamente com base no preço do dia.

o) na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético profissional e não tenha fins lucrativos.

p) para a aquisição de bens ou serviços nos termos de acordo internacional específico aprovado pelo Conselho Nacional, quando as condições ofertadas forem manifestamente vantajosas para o Poder Público.

q) para a aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos, de autenticidade certificada, desde que compatíveis ou inerentes às finalidades do órgão ou entidade.

r) para a impressão dos diários oficiais, de formulários padronizados de uso da Administração, e de edições técnicas oficiais, bem como para a prestação de serviços de informática a pessoa jurídica de direito público interno, por órgãos ou entidades que integrem a Adm. Pública, criados para esse fim específico.

s) para a aquisição de componentes ou peças de origem nacional ou estrangeira, necessários à manutenção de equipamentos durante o período de garantia técnica, junto ao fornecedor original desses equipamentos, quando tal condição de exclusividade for indispensável para a vigência da garantia.

t) nas compras ou contratações de serviços para o abastecimento de navios, embarcações, unidades aéreas ou tropas e seus meios de deslocamento, quando em estada eventual de curta duração em portos, aeroportos ou localidades diferentes de suas sedes, por motivo de movimentação operacional ou de adestramento, quando a exigüidade dos prazos legais puder comprometer a normalidade e os propósitos das operações e desde que seu valor não exceda ao limite da modalidade convite.

u) para as compras de materiais de uso pelas Forças Armadas, com exceção de material de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante parecer de comissão instituída por decreto.

v) na contratação de associações de portadores de deficiência física, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgãos ou entidades da Administração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento de mão-de-obra, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado.

É inexigível a licitação (art. 25) quando houver inviabilidade de competição, em especial:

a) para aquisição de materiais, equipamentos ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro de comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes.

b) para a contratação de serviços técnicos - assim considerados os relativos a estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; de pareceres, perícias ou avaliações em geral; assessorias ou consultarias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços; patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; treinamento e aperfeiçoamento de pessoal; e de restauração de obras de arte e bens de valor histórico, conforme art. 13 da Lei 8.666193 - com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação.

c) para contratação profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empréstimo exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública (cantor, músico, etc.).

A Lei considera de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato. Tratam-se dos melhores em suas áreas de atuação, por exemplo Ivo Pitangui, Hely Lopes Meirelles, ...
Caso haja, comprovadamente, superfaturamento nas hipóteses acima elencadas sobre inexibilidade, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.

Todo processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento (este, assim entendido, como aquele provocado por insuficiência financeira ou comprovado motivo de ordem técnica, previsto no final do parágrafo único do art. 8°, justificado em despacho circunstanciado da autoridade) deverá ser instruído, no que couber, com a caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso; a razão da escolha do fornecedor ou executante; ou a justificativa do preço.


17) REVOGAÇÃO E ANULAÇÃO (FUNDAMENTOS, INICIATIVA E EFEITOS DECORRENTES)

A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada, nos termos do art. 41, acrescentando que qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital discriminatório ou omisso em pontos essenciais da licitação por irregularidade na aplicação desta Lei, devendo protocolar o pedido até 5 (cinco) dias úteis antes da data fixada para abertura dos envelopes de habilitação, devendo a Administração julgar e responder à impugnação em até 3 (três) dias úteis. Tal impugnação também podem ser opostas pelos próprios licitantes, envolvidos no certame.

Nos termos do art. 48, serão desclassificadas:

a) as propostas que não atendam às exigências do ato convocatório da licitação;

b) propostas com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexeqüíveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação.

Quando todos os licitantes forem inabilitados ou todas as propostas forem desclassificadas, a Administração poderá fixar aos licitantes o prazo de oito dias úteis para a apresentação de nova documentação ou de outras propostas escoimadas das causas referidas no dito art. 48, facultada, no caso de convite, a redução deste prazo para três dias úteis.

Já o art. 49 prescreve que a autoridade competente para a aprovação do procedimento somente, no exercício de atos próprios do auto controle administrativo, poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado. Mas, a anulação do procedimento licitatório por motivo de ilegalidade não gera obrigação de indenizar; e a nulidade do procedimento licitatório induz à do contrato, na aplicação da velha máxima o principal segue o acessório, ressalvado, em ambos os casos, o previsto no parágrafo único do art. 59, que trata da declaração de nulidade do contratado administrativo, dispondo que a nulidade não exonera a Administração do dever de indenizar o contrato pelo que este houver executado até a data em que for declarada tal nulidade, e por outros prejuízos regularmente comprovados, constando que não lhe seja imputável, promovendo-se a responsabilidade de quem lhe deu causa.

No caso de desfazimento do processo licitatório, fica assegurado o contraditório e a ampla defesa, assegurado na CF/88, em seu artigo 5°. A administração, por derradeiro, não poderá celebrar contrato com preterição de ordem de classificação das propostas ou com terceiros estranhos ao procedimento licitatório, sob pena de nulidade.

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CONTRATOS ADMINISTRATIVOS





1) NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

Contrato genericamente falando é todo o acordo de vontade, negócio jurídico, firmado livremente entre as partes, para estabelecer e criar direitos e obrigações recíprocas.

A teoria geral dos contratos é a mesma, tanto para contratos privados, isto é, civis e comerciais, como para os contratos de natureza pública, de que são espécies os chamados contratos administrativos e os acordos internacionais. Entretanto, podemos observar que os contratos administrativos são disciplinados por meio de normas e princípios próprios do direito público, passando o direito privado a ser aplicado de modo supletivo e nunca substituindo ou derrogando as normas privativas da administração.

Trata-se portanto, de um instituto de direito privado que encontra na seara pública um disciplinamento específico, estabelecido pela Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993.



2) PROCESSO DE CONTRATAÇÃO

O Processo de Contratação na esfera pública divide-se em duas fases:

· Fase Interna: Planejamento administrativo
· Fase Externa: Constituída seqüencialmente pela Licitação, Contração e Execução



3) CONCEITO

Contrato Administrativo é todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e Particulares, em que haja um acordo de vontade para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada.

No conceito clássico de Hely Lopes Meirelles, Contrato Administrativo é o ajuste que a Administração Pública, agindo nessa qualidade, firma com particular ou outra entidade administrativa, para consecução de objetivos de interesse público, nas condições estabelecidas pela própria Administração (direta ou indireta). Cabe lembrar que através dos contratos administrativos se objetiva a participação do ser privado na realização dos anseios coletivos, estando sempre em jogos:


Interesse Coletivo Primário
(Sociedade)


-----------------------------------------------------------------------

Interesse Público Secundário Interesse Privado
(administração Contratante) (Contratada)




4) CARACTERÍSTICAS

Podemos deste conceito supra transcrito pinçar os seguintes elementos característicos do contrato administrativo:

a) Consensualidade: porque consubstancia-se num acordo de vontades e não num ato unilateral e impositivo da Administração (contrato administrativo é portanto diverso de ato administrativo);

b) Comutatividade/Bilateralidade: porque realiza-se entre pessoas que se obrigam a prestações mútuas (recíprocas) e encargos e vantagens equivalentes excluindo-se desta forma, as vantagens ou desvantagens ilegítimas;

c) Formalidade: o instrumento que formaliza o contrato administrativo é o termo, lavrado em livro próprio da repartição contratante, ou a escritura pública, em casos exigidos por lei, como os relativos a direitos reais sobre imóveis. Contrato verbal constitui uma excepcional exceção por dependerem da comprovação documental subseqüente e de registros nos órgãos de controle interno, além da necessidade de cláusulas especiais exigidas por lei;

d) Onerosidade: porque os serviços serão remunerados na forma convencionada e jamais gratuitos;

e) Incessibilidade: pois é sempre realizado intuitu personae, vez que deve ser executado pelo próprio contratado (particular que contrata com o Poder Público) vedadas, em princípio, a sua substituição por outrem ou a transferência do ajuste. Trata-se de uma obrigação personalíssima.

Além dessas características substanciais, e de requer como todo pacto objeto lícito e forma prescrita e não defesa em lei, o contrato administrativo possui uma outra que lhe é própria, embora externa, qual seja a exigência de prévia licitação, só dispensável nos casos previstos em lei, como veremos no capítulo próprio.



5) NATUREZA JURÍDICA

Os contratos firmados com a administração e entidades particulares são de Direito Público, ou de Direito Privado? Alguns autores negam a existência do contrato de Direito Público. Gianini, por exemplo, chega a afirmar que tal denominação é pura metáfora, concluindo: Nele aparecem todos os requisitos do contrato? Então é contrato de Direito Privado. Hoje em dia, porém, não se põe em dúvida a natureza do contrato de Direito Público, regulando as relações entre a Administração e o particular.

É preciso, não obstante, distinguir duas espécies: contratos de administração e contratos administrativos. A primeira fórmula contém sentido mais genérico, abrangendo toda e qualquer espécie de acordo havido entre a Administração e o particular, sem indagar se o contrato é de Direito Público ou de Direito Privado.

A segunda expressão encerra sentido mais restrito, podendo-se dizer que contrato administrativo é uma espécie de contrato de Direito Público. Embora sujeito aos princípios gerais da teoria dos contratos, como já foi afirmado, possui o contrato administrativo características próprias, porque obedece a normas específicas do seu conceito e de sua destinação, além de depender de aprovação posterior.

Os pactos contratuais de natureza administrativa individualizam-se dos contratos de direitos privado, vez que:

· a prestação fornecida pelo particular deve estar destinada a assegurar o funcionamento de um serviço público (interesse público);
· as partes, figurando num dos pólos a Administração, por cláusula expressa ou não, concordam em submeter o contrato ao regime especial do direito público.

Em conseqüência, os contratos a que faltem uma das condições mencionadas acima não são contratos administrativos, mas contratos de direito privado. Assim, não basta o simples acordo de vontades entre a Administração e o particular para a existência do contrato administrativo, mas é preciso, ao mesmo tempo, que esse ajuste se destine à execução de obras ou serviços de interesse público.

A simples presença do Poder Público na relação contratual pode caracteriza um contrato de Direito Privado, como é o caso da aquisição de um prédio para a instalação de uma repartição pública, ou a locação de um imóvel, ou da venda de um bem público, etc.

Nesses casos, ou em quaisquer outros da mesma natureza, onde não apareça na relação contratual a finalidade de prestação de serviço de interesse coletivo, ou a realização de uma obra pública o que existe é tão só um contrato de Direito Privado, que apenas impropriamente pode ser chamado de contrato administrativo, por ser uma das partes a Administração Pública.

Exemplo típico de contrato administrativo é o contrato de concessão de serviço público. Podemos ainda citar os contratos de fornecimento, os contratos de obras públicas e outras espécies semelhantes, que se caracterizam pelo fato de a Administração poder impor a sua vontade, agindo, publicas utilitatis causa, e segundo princípios de Direito Público.



6) PECULIARIDADES

Além das características antes arroladas, o contrato administrativo têm peculiaridades que os contratos comuns não ostentam. Constituem elas, genericamente, as chamadas cláusulas exorbitantes e derrogatórias do direito comum, explícitas ou implícitas em todo o contrato administrativo.

Cláusulas exorbitantes são aquelas que excedem do direito comum para consignar uma vantagem ou uma restrição à Administração ou ao contratado. Tal cláusula não seria lícita num contrato privado, sendo lá chamadas de leonina, porque desigualaria as partes na execução do avençado, porém, é absolutamente válida no contrato administrativo, desde que decorrente de lei ou dos princípios que regem a atividade administrativa. As cláusulas exorbitantes podem consignar as mais diversas prerrogativas no interesse do serviço público, entre as quais a ocupação do domínio público, o poder expropriatório e a atribuição de arrecadar tributos, concedidos ao particular contratante para a cabal execução do contrato.

As principais cláusulas exorbitantes podem ser assim enumeradas:

a) Possibilidade de Alteração e Rescisão Unilateral do Contrato: é inerente à Administração e podem ser feitas ainda que não previstas em lei ou consignadas em cláusula contratual. Significa dizer que nenhum particular que contratar com a Administração adquire o direito à imutabilidade do contrato ou à sua integral execução e nem mesmo às suas vantagens, pois isto implicaria em subordinar o interesse público ao interesse privado do contratado.

b) Reequilibrio Econômico e Financeiro: a equação econômica ou financeira do contrato administrativo é a relação estabelecida entre as partes, isto é, o equilíbrio entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração do objeto do ajuste. Tal relação encargo/remuneração deve ser mantida até o fim do contrato para que o contratado não venha a sofrer indevida redução nos lucros normais do empreendimento.

c) Correção Monetária e Reajuste dos Preços e Tarifas: é a medida convencionada entre as partes contratantes para evitar que, em razão das elevações dos preços de mercado ou da desvalorização da moeda, ou mesmo aumento geral de salários no período da execução do contrato, venha a romper-se o equilíbrio financeiro do ajuste.

d) Inoponibilidade da Exceção de Contrato não Cumprido: trata-se do princípio jurídico contratual denominado EXCEPTIO NON ADIMPLETI CONTRACTUS (exceção do contrato não cumprido) estando incluso no elemento peculiar dos contratos administrativos e é normalmente invocada nos ajustes de direito privado, não se aplica, em princípio, aos contratos administrativos, quando a falta é da Administração. Esta, no entanto, pode argüir exceção em seu favor, diante da inadimplência do particular contratante. A doutrina, porém, vem atenuando o rigor da inoponibilidade contra a Administração, especialmente nos casos de inadimplência do Poder Público quando cria um encargo insuportável e extraordinário para o contratante.

e) Controle do Contrato: é um dos poderes inerentes da Administração e por isso implícito no contrato, dispensando cláusula expressa. Consiste no poder que tem a Administração em controlar uma obra pública ou serviço contratado, supervisionando-os, acompanhando-os ou fiscalizando-os, a fim de adequá-los às suas exigências.

f) Aplicação de Penalidades Contratuais: outra de suas prerrogativas e que resulta do controle do contrato, aplicando-se sempre, que, verificada a infração por parte do contratante, a Administração investindo-se do poder da auto-executoriedade, acaba exercendo-a. Vão desde as advertências e multas até a rescisão unilateral do contrato, suspensão provisória ou declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração.



7) CLÁUSULAS LEGAIS

Os contratos têm como sujeitos a parte Contratante que constitui o órgão ou entidade signatária do contrato, e da parte ou partes Contratada(s) que são as pessoas física e/ou jurídica que se obriga(m) com a Administração contratante.

O contrato administrativo divide-se basicamente em cabeçalho, onde será indicado o tipo de contrato e as partes contratantes, preâmbulo, com data, local e identificação dos representantes das partes e as cláusulas pactuadas. Nestas últimas, os contratos devem estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, definindo direitos, obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vincula.

São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

a) o objeto e seus elementos característicos;

b) o regime de execução ou a forma de fornecimento:

c) o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base, e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;

d) prazos de início de etapas de execução, de conclusão, de entrega, de observação e de recebimento definitivo, conforme o caso;

e) o crédito pelo qual correrá a despesa, com a indicação da classificação funcional programática e da categoria econômica;

f) as garantias oferecidas para assegurar sua plena execução, quando exigidas;

g) os direitos e as responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores das multas;

h) os casos de rescisão;

i) o reconhecimento dos direitos da Administração, em caso de rescisão administrativa, provocada por inexecução total ou parcial do contrato;

j) as condições de importação, a data e a taxa de câmbio para conversão, quando for o caso;

k) a vinculação ao edital de licitação ou ao termo que a dispensou ou a inexigiu, ao convite e à proposta do licitante vencedor;

l) a legislação aplicável à execução do contrato e especialmente aos casos omissos;

m) a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.



8) TEORIA DA IMPREVISÃO

Sempre que sobrevêm eventos extraordinários, imprevistos e imprevisíveis, onerosos, retardadores ou impeditivos da execução do contrato, a parte atingida fica liberada dos encargos originários e o ajuste há que ser revisto ou rescindido, pela aplicação da teoria da imprevisão, provinda da cláusula rebus sic stantibus, nos seus desdobramentos de força maior, caso fortuito, fato do príncipe, etc.

Ensina-nos José Carlos Ferreira de Oliveira que:

Deve-se aos canonistas e aos glosadores dos séculos XIV a XVI a formulação da cláusula rebus sic stantibus em contraposição ao velho princípio pacta sunt servanda, segundo o qual sempre se deveria respeitar o contrato firmado entre as partes, quaisquer que fossem os fatos ocorridos posteriormente. Visando os criadores da referida cláusula minorar os efeitos ruinosos da execução dos contratos que gerassem obrigações sucessíveis ou dependentes do futuro, quando as condições de fato, contemporâneas da formação do vínculo, já tivessem se alterado completamente. Inspirou-se a doutrina em superiores princípios de direito: boa-fé, comum intenção das partes, amparo do fraco contra o forte, interesse coletivo. (Revista dos Tribunais, Vol. 320, pág. 21/30)

A teoria da imprevisão consiste portanto no reconhecimento de que eventos novos, imprevistos e imprevisíveis pelas partes e a elas não imputáveis, refletindo sobre a economia ou a execução do contrato, autorizam sua revisão, para ajustá-lo às circunstâncias supervenientes.

A revisão do contrato e de seus preços, pela aplicação da teoria da imprevisão, pode ser determinada por norma legal para todos os contratos de uma certa época e para certos empreendimentos, como pode ser concedida pelo Judiciário ou pela própria Administração em cada caso específico submetido à sua apreciação e não se confunde com reajustamento contratual de preços.

A teoria da imprevisão pode ser apresentada segundo os seguintes desdobramentos:

a) Caso Fortuito e Força Maior: são eventos que, por sua imprevisibilidade e inevitabilidade, criam para o contratado impossibilidade intransponível de execução normal do contrato. Caso fortuito é o evento da natureza (tempestade, inundação, etc.) que, por sua imprevisibilidade e inevitabilidade, cria para o contratado impossibilidade de regular execução do contrato. Força maior é o evento humano (uma greve que paralise os transportes ou a fabricação de certo produto indispensável, etc.) que impossibilita o contratado da regular execução do contrato.

b) Fato do Príncipe: é toda a determinação estatal, positiva ou negativa, geral, imprevista ou imprevisível que onera substancialmente a execução do contrato e, uma vez intolerável e impeditiva, obrigará o Poder Público contratante a compensar integralmente os prejuízos suportados pela outra parte. Caracteriza-se por um ato geral do Poder Público, como a proibição de importar determinado produto, etc., e o fundamento da teoria do fato do príncipe é o mesmo que justifica a indenização do expropriado por utilidade pública.

c) Fato da Administração: É toda ação ou omissão do Poder Público que incidindo direta e especificamente sobre o contrato, retarda ou impede sua execução. Equipara-se a força maior e ocorre, por exemplo, quando a Administração deixa de entregar o local da obra ou serviço, ou não providencia as desapropriações necessárias, atrasa pagamentos, etc.

Caio Tácito contudo observa que:

A teoria da imprevisão é, contudo, uma ressalva extraordinária à regra do cumprimento obrigatório dos contratos. A sua invocação pressupõe um estado de crise, uma transfiguração inaudita da matéria de fato, que submeta o empreiteiro, inesperadamente, a um prejuízo intolerável. Não é demais lembrar o conselho de Gaston Jèse, quanto à sobriedade da terapêutica: la teoria de la imprevisión es un teoria excepcional; por eso que es preciso aplicarla en forma restrictiva y no extensiva. (in Boletim de Licitações e Contratos, Setembro/93, pág. 370/3)

Observe-se assim, que para a boa aplicação da teoria da imprevisão deve ser comprovado que:

a) os fatos acarretadores do desequilíbrio econômico e financeiro do contrato tenham sido totalmente imprevisíveis e suas conseqüências insuportáveis para o contratado;

b) as bases pactuadas correspondiam à situação da época em que o ajuste foi efetuado;

c) o aumento de preços ou de outras condições financeiras contratuais tenha sido tão sensível que haja produzido efetivo prejuízo ao contratado.

d) o contratante tenha se beneficiado com a alteração assim ocorrida,

e) as prestações contratuais da parte prejudicada estejam rigorosamente em dia.

Os tribunais vem firmando:

Cláusula rebus sic stantibus. A cláusula aplica-se aos contratos de empreitada. A cláusula só ampara o contratante contra alterações fundamentais, extraordinárias das condições objetivas, em que o contrato se realizou. Ela não visa, porém, eliminar riscos de negócio, riscos inerentes ao próprio sistema econômico vigente no país. No caso, a recorrente não perdeu, deixou apenas de ganhar aquilo que, pelo seu cálculo, seria seu justo lucro. Mas a doutrina da imprevisão não objetiva reajustá-lo. Ainda no caso em apreço não era imprevisível o aumento do salário mínimo. Recurso conhecido e provido para julgar a ação improcedente. (STF, RE n.° 56.960, 2ª Turma, Rel. Min. Hermes Lima, DJ. 08.12.64, pág. 4.488)


É lícito o pedido de reajustamento de preço de obra pública quando o custo dos materiais e da mão-de-obra aumentou de forma a alterar substancialmente as obrigações contratuais. (TFR, AC. n° 2.946, Pleno, Rel. Min. Mourão Russel, RDA, Vol. 37, 1954)



9) REAJUSTE, CORREÇÃO MONETÁRIA, INDENIZAÇÃO E REVISÃO

Faz-se necessário distinguir esquematicamente:

FUNÇÃO DA CLÁUSULA DE REAJUSTE: Tentar evitar que o contrato venha a ter sua equação econômica rompida, na fase de execução, ruptura essa decorrente de elevação de custos.

FUNÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA: Restabelecer o poder aquisitivo da moeda, dentro ou fora do prazo de pagamento.

FUNÇÃO DA INDENIZAÇÃO: Reparar perdas e danos causados por comportamento de uma das partes contratantes.

FUNÇÃO DA REVISÃO: Restabelecer o equilíbrio econômico ou financeiro do contrato, contenha este ou não cláusula de reajuste.



10) ANULAÇÃO, DENÚNCIA, RESCISÃO E DISTRATO CONTRATUAL

A inexecução total ou parcial do contrato enseja a sua rescisão, com as conseqüências contratuais previstas na lei e nos regulamentos pertinentes, como dispõe o art. 77, da Lei n° 8.666/93.

A inexecução, também chamada inadimplência do contrato é o descumprimento de suas cláusulas, no todo ou em parte, que pode ocorrer por ação ou omissão, culposa ou não, de qualquer das partes, caracterizando o retardamento (mora) ou o descumprimento total do ajustado.

O desfazimento do contrato Administrativo, pode ter os seguintes fundamentos:

a) Anulação: feita pelo Poder Judiciário mediante provocação da parte;

b) Denúncia: forma mais usual de desfazimento. Invoca-se o interesse público, razão suficiente para que se descontinua a relação;

c) Rescisão: provocada pelo não cumprimento de obrigação assumida. Como conseqüência da inexecução tem-se a rescisão do contrato e pode acarretar para o inadimplente, conseqüência de ordem civil e administrativa, como a responsabilidade civil que é a obrigação de reparar o dano patrimonial. Segundo o art. 78, da Lei 8.666/93, constituem motivos para a rescisão do contrato, os seguintes:

· o não cumprimento de cláusulas contratuais, especificações, projetos ou prazos;
· o cumprimento irregular de cláusulas contratuais, especificações, projetos ou prazos,
· a lentidão do seu cumprimento, levando a Administração a comprovar a impossibilidade da conclusão da obra, do serviço ou do fornecimento, nos prazos estipulados;
· o atraso injustificado do início da obra, serviço ou fornecimento;
· a paralisação da obra, do serviço ou do fornecimento, sem justa causa e prévia comunicação à Administração;
· a subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratante com outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como fusão, cisão ou incorporação, não admitidas no edital e no contrato;
· o desatendimento das determinações regulares da autoridade designada para acompanhar e fiscalizar sua execução e a de seus superiores;
· cometimento reiterado de faltas na sua execução anotadas;
· decretação de falência ou declaração de insolvência civil;
· dissolução da sociedade ou o falecimento do contratado;
· alteração social; modificação da finalidade ou estrutura da empresa que prejudique o contrato; e outras razões de interesse público de alta relevância e conhecimento.

Os casos de rescisão contratual - que pode se dar por ato unilateral e escrito da Administração, amigável, i. é, por acordo entre as partes, ou judicialmente - serão formalmente motivados nos autos do processo, assegurado o contraditório e a ampla defesa.

d) Distrato: resultante da vontade das partes.

e) Renúncia: é o ato unilateral da Administração Pública extinguindo um direito seu e desobrigando de forma definitiva e irreversível o particular. Para que seja possível depende de lei autorizativa.



11) REVISÃO E REAJUSTAMENTO DO CONTRATO

Revisão do Contrato é a modificação das condições de sua execução e pode ocorrer por interesse da própria Administração ou pela superveniência de fatos novos que torne inexeqüível o ajuste inicial. Ex.: exigência de novos processos técnicos; aumentos de encargos ajustados, etc.

Trata-se de casos de Alterações Contratuais, previstas no art. 65 da Lei 8.666, segundo o qual os contratos podem ser alterados (faculdade), com as devidas justificativas, unilateralmente pela Administração, nos casos em que houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos; ou quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa do seu objeto; ou então, por acordo das partes, quando conveniente a substituição da garantia de execução; ou quando necessária a modificação do regime de execução da obra ou serviço, ou fornecimento, por mudança técnica; ou quando necessária a modificação da forma de pagamento, por imposição de circunstâncias supervenientes, mantido o valor inicial atualizado.

Caso haja alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado, a Administração deverá restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial, através de aditamento contratual (cf. § 6° do art. 65).


12) CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVO

Os Contratos podem ser classificados segundo sua execução em:

· de execução imediata
· de execução diferida ou adiada
· de execução continuada
· de execução repetidas (periódicas ou salteadas)


13) ESPÉCIES DE CONTRATOS ADMINISTRATIVOS:

São eles:

a) Contrato de Obra Pública

É todo o ajuste administrativo que tem por objeto uma construção, uma reforma ou ampliação de imóvel destinado ao público ou ao serviço público. Em sentido administrativo é toda a realização material a cargo da Administração ou de seus delegados.

A obra Pública pode ser classificada em quatro modalidades de empreendimento:

· equipamento urbano (ruas, praças, estádios, monumentos, calçamentos, canalizações, redes de energia e comunicação, viadutos, túneis, etc.);
· equipamento administrativo (instalações e aparelhamento para o serviço administrativo em geral);
· empreendimentos de utilidade pública (ferrovias, rodovias, pontes, aeroportos, canais, obras de saneamento, represas, usinas, etc.);
· edifícios públicos (sedes de governo, repartições públicas, escolas, hospitais, presídios, etc.),

b) Contrato de Serviço

É todo o ajuste administrativo que tem por objeto uma atividade prestada à Administração para atendimento de suas necessidades ou de seus administrados. Distingue-se da obra, pela predominância da atividade sobre o material empregado, quer dizer, é a atividade operativa que define e diversifica o serviço. São eles: demolição, conserto, fabricação, operação, conservação, manutenção, trabalhos técnico-profissionais, etc.

c) Contrato de Fornecimento

É o ajuste administrativo pelo qual a Administração adquire coisas móveis (materiais, produtos industrializados, gêneros alimentícios, etc.) necessárias à realização de suas obras ou à manutenção de seus serviços. Podem-se dividir em contrato de fornecimento integral, ou fornecimento parcelado, ou fornecimento contínuo, configurando o primeiro o verdadeiro contrato de compra e venda do Direito Civil ou Comercial.

d) Contrato de Trabalhos Artísticos

São aqueles que visam à realização de "obras de arte", em qualquer dos campos das chamadas "belas-artes' ou "artes-maiores", caracterizando-se por serviços profissionais especializados de pintura, escultura, ajardinamento, etc.
e) Contrato de Concessão

É o que a Administração delega ao particular para a execução remunerada de serviço ou de obra pública ou lhe cede o uso de um bem público, para que o explore por sua conta e risco, pelo prazo e condições preestabelecidas contratualmente.

f) Contrato de Gerenciamento

É aquele em que o Governo atribui ao gerenciador a condução de um empreendimento, reservando para si a competência decisória final e responsabilizando-se pelos encargos financeiros da execução das obras e serviços projetados, com os respectivos equipamentos para sua implantação e operação.



14) DURAÇÃO DOS CONTRATOS

A duração dos contratos administrativos sujeitam-se a regra geral do art. 57, ou seja, a duração é adstrita à vigência dos respectivos créditos.

Porém existem ressalvas a esta regra geral:

· Sendo Contratos por objeto, onde o prazo é moratório (entrega de uma ponte): Projetos cujos produtos estejam contemplados nas metas e estabelecidas no Plano Plurianual, sem prazo de duração (art. 57, I). Não cabe prorrogar prazo nos contratos de objeto.
·
· Sendo Contratados por prazo, onde o tempo é extintivo (por n meses): Prestação de serviços contínuos, cuja duração poderá ser de 60 meses (art. 57, II) e Aluguel de equipamentos e utilização de programas de informática, cuja duração poderá ser de até 48 meses (art. 57, IV).



15) CLÁUSULA PENAL

Cláusula Penal é uma convenção contratual na qual as partes se obrigam a pagar uma determinada multa no caso de violação do contrato (ver CCB. Art. 916 usque 927). Pode ser:

MORATÓRIA: O credor tem o direito de exigir o cumprimento da obrigação e a pena convencionada.

COMPENSATÓRIA: O credor tem o direito de optar entre o cumprimento da obrigação e a pena convencionada.

MULTA PENITENCIAL (Falsa Cláusula Penal): O devedor tem o direito de optar entre o cumprimento da obrigação e a pena convencionada.

Os Tribunais tem afirmado que:

Contrato. Rescisão. Pedido de pagamento da multa referente a todo o contrato que não foi cumprido. Multa deve ser calculada somente na proporção da parte não cumprida mais a correção monetária. Recurso provido em parte. (Apelação Cível n° 221.867-1/1, Apel.: Constroe Empreiteira de Obras Ltda., Apda.: Municipalidade de Cravinhos, Rel.: Toledo César, in Boletim de Licitações e Contratos, julho de 1996, pág. 360)

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ADMINISTAÇÃO PÚBLICA
E ORGANIZAÇÃO GOVERNAMENTAL






1) NOÇÕES GERAIS

O Estado, modernamente, é criação do homem, para instrumentar a realização das necessidades comuns e identidades nacionais. Por isso que o Estado, criação do indivíduo, há de se relacionar com o indivíduo com o máximo respeito às suas garantias e direitos. Naturalmente, esses direitos e garantias individuais são bem definidos num estatuto maior (Constituição), que exprime os poderes e os deveres do Estado, bem como a proteção dos indivíduos.Normalmente quando se fala em administração pública, a primeira idéia que surge é a do complexo de atividades exercido pelos agentes governamentais em obediência ao comando do Governo ou a suas diretrizes, isto é, o conjunto de órgãos e entidades que exercem funções administrativas.

Não se pode confundir governo e administração. O Governo é formado pelo conjunto de Poderes estabelecidos na Constituição (Executivo, Legislativo e Judiciário) e seus respectivos órgãos para dar andamento às diretrizes traçadas pela política que norteia os negócios públicos, em manifestação à sua soberania, enquanto a administração cuida de organizar as funções necessárias aos serviços públicos e por em prática os objetivos do Governo. A Administração é o conjunto de órgãos instituídos aos quais se confere funções de controle, comando, execução, de caráter administrativos.

Segundo o conceito de Hely Lopes Meirelles, Administração Pública, em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade.

Numa visão global, a Administração é, pois, todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de seus serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas. A administração não pratica atos do governo; pratica, tão-somente, atos de execução, com maior ou menor autonomia funcional, segundo a competência do órgão e de seus agentes. São os chamados atos administrativos, que por sua variedade e importância, merecem estudo em capítulo especial. (Op. Cit.)

Complementa dizendo que governo é atividade política e discricionária, enquanto que a administração é atividade neutra, normalmente vinculada à lei ou à norma técnica; ou ainda, que governo é conduta independente; administração é conduta hierarquizada.

Efetivamente, a Administração Pública é o instrumental de que dispõe o Estado (pessoa jurídica de direito público interno - conforme nosso Código Civil; ou então território juridicamente organizado, constituído por leis próprios, comandado por pessoas soberanamente cujo poder é emanado do próprio povo) para por em prática as alternativas políticas e sociais preconizadas pelo Governo.

Em suma, a Administração Pública, em Direito Administrativo, tanto serve para designar as pessoas ou agentes e órgãos governamentais, como a atividade administrativa em si. No primeiro caso, designando órgãos e pessoas, deve ser escrita com letra maiúsculas, e no segundo, designando, a atividade, com minúsculas.


2) CARACTERÍSTICA, MODOS DE ATUAÇÃO E REGIME JURÍDICO

A Administração Pública é formada por muitas entidades, mas a estruturação político-constitucional triparte (divide em três) os Poderes do Estado, para a realização da tarefa administrativa, em Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário.Cada um desses poderes administrará (realizará a suas tarefas) em uma distinta área. O Executivo executará as leis e realizará obras e serviços, para o atendimento das necessidades da população. O legislativo administrará a fiscalização da atividade do Executivo e do Judiciário e, ainda, traçará as regras (lei) de convivência social. O judiciário prestará o serviço de resolver todos os conflitos entre os interesses das pessoas, aplicando a lei correta para cada caso; atuará, ainda, no controle dos atos administrativos tanto do Legislativo, quando do Executivo.

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SERVIÇOS PÚBLICOS




1) NOÇÕES GERAIS

A prestação de serviços públicos constitui a manifestação básica da atividade estatal. É o Estado colocando-se a serviço da comunidade, através da execução de atividades voltadas para o interesse da sociedade. A coletividade tem inúmeras necessidades, algumas das quais são vitais e outras apenas secundárias. Prover, porém, toda esta gama de necessidades é uma tarefa do Estado, seja através de ações diretas ou indiretas.



2) CONCEITO

O conceito de serviço público, na doutrina, não é uniforme sendo quando muito genérica sua noção. Segundo Hely Lopes Meirelles, a idéia de serviço público:

...flutua ao sabor das necessidades e contingências políticas, econômicas, sociais e culturais de cada comunidade, em cada momento histórico. (in Direito Administrativo Brasileiro, RT, 13° Ed., 1987, pág. 672)

Porém, a idéia mediana que se forma em torno da expressão serviço público é, no sentido de retratar, toda aquela utilidade prestada por órgãos públicos. Compartilhamos, porém, do mesmo entendimento de Hely Lopes Meirelles, no sentido de que é serviço público todo aquele prestado pela Administração Pública ou por quem esta delegar, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou complementares da sociedade, ou simplesmente aquele prestado por conveniência do Estado.

O Professor Diogo de Figueiredo Moreira Neto define serviços públicos como

¨ a atividade da Administração que visa a assegurar de modo permanente, contínuo e geral, a satisfação das necessidades, essenciais ou secundárias, da coletividade, assim por lei considerada, e sob as condições impostas unilateralmente pela administração.

Por sua vez, Raphael Bielsa define serviços públicos, como sendo:

¨ ...toda atividade pública ou privada regulada pelo Poder Público, que se realiza com o fim de satisfazer de forma geralmente contínua, as necessidades coletivas.

Independente do conceito adotado, podemos arrolar, no atual estágio da sociedade brasileira, como exemplos de serviços públicos: o policiamento, a saúde pública, a defesa contra o inimigo externo, comunicações, transportes, dentre muitos outros.



3) PRINCÍPIOS

São princípios que norteiam os serviços públicos:

· Continuidade - deve sempre existir, sendo prestado diuturnamente sem interrupções
· Generalidade - deve estar ao alcance de todos
· Aperfeiçoamento - deve ser direcionado no sentido de sempre introduzir melhorias e técnicas novas, em proveito do usuário.
4) COMPETÊNCIA DA UNIÃO, ESTADOS E MUNICÍPIOS PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS


A competência para a realização de serviços públicos decorre da competência de cada uma das esferas de governo (Federal, Estadual, Municipal) fixadas na Constituição Federal. A União (Governo Federal) tem sua competência para a realização de serviços públicos fixada, em sua maioria, no artigo 21.

A competência dos Estados-membros é residual, conforme se depreende da leitura do parágrafo primeiro do artigo 25. A competência dos municípios está fixada no artigo 30 da Carta Magma. É relevante observar que, não obstante ser residual a competência dos Estados-membros, cabe a eles, por norma expressa no parágrafo segundo do artigo 25, explorar diretamente ou mediante concessão os serviços de gás canalizado.



5) CLASSIFICAÇÃO

O saudoso Professor Hely Lopes Meirelles, levando em conta a essencialidade, adequação, formalidade e destinatários, classifica os serviços públicos em: próprios e impróprios; serviços públicos e de utilidade pública; administrativos e industriais.

Outros mestres nos apresentam outros critérios. Da leitura dos doutrinadores vejamos as principais classificações que nos fornecem elementos práticos para o entendimento e fixação da extensão do conceito de serviços públicos:

a) Serviços Públicos Propriamente Dito: aqueles que a Administração presta diretamente à comunidade, em reconhecimento à sua essencialidade e necessidade para a sociedade: defesa, saúde, segurança, etc. São os serviços próprios do Estado.

b) Serviços de Utilidade Pública: são os que a Administração, não pela essencialidade, mas reconhecendo sua conveniência para a sociedade, presta-os diretamente ou através de terceiros ou concessionários, ou ainda, permissionários ou autorizados, nas condições regulamentadas e sob seu controle, ainda que por conta e risco dos prestadores, mediante remuneração dos usuários. Ex.: os serviços de transporte coletivos, de energia elétrica, fornecimento de gás, serviços telefônicos, etc.

c) Serviços Administrativos: os que a Administração executa para atender suas necessidades internas ou preparar outros serviços que serão prestados ao público, tais como os de imprensa oficial, serviços de estações experimentais e outros.

d) Serviços Industriais e Comerciais: são aqueles através dos quais o Estado produz renda pela produção de bens ou serviços, sendo remunerado mediante o pagamento por parte do usuário de tarifas ou preços públicos. Neste grupo são considerados aqueles serviços impropriamente prestados pelo Estado por se constituírem em atividades típicas da iniciativa privada, e só explorada pelo Poder Público quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definido no art. 173 da CF/88.

e) Serviços Próprios do Estado: São os que se relacionam com a atividade do Poder Público, usando a Administração de sua supremacia sobre os administrados (atos de império), limitando interesses particulares em proveito do bem comum e por isso só podem ser prestados por este, de forma direta. Ex.: polícia, segurança

f) Serviços Impróprios do Estado: São os que satisfazem interesses comuns dos membros da comunidade não dizendo respeito à sobrevivência deles. São remunerados, e prestados por órgãos do Estado ou por entes descentralizados (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações do governo) ou prestados através de permissão, autorização ou concessão.




6) MODOS E FORMAS DE PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO OU DE UTILIDADE PÚBLICA

O Professor Temístocles Brandão Cavalcanti assevera-nos:

A complexidade das funções do Estado, quer quanto à soma de atividades que exerce, quer quanto à sua variedade, trouxe como conseqüência imediata a sobre carga de seus serviços, pela incapacidade de adaptar a sua máquina administrativa à multiplicidade de serviços a seu cargo. (in Tratado de Direito Administrativo, 5° Ed., SP, Freitas Bastos, Vol. II, pág. 83)

Movido por tais motivações o Estado acaba por transferir seguidamente, a outras pessoas jurídicas a execução de muitos serviços públicos objetivando basicamente a celeridade e eficiência destes. Estas pessoas jurídicas que irão titularizar interesses coletivos das mais variadas ordens, podem regular-se por princípios de Direito privado ou público, podendo ou não ter prerrogativas especiais. Tudo isto a depender da necessidade pública do serviço que irão desempenhar.

Vejamos as modalidades de sua execução:

a) Execução Direta: é a realizada por pessoa jurídica de Direito Público (União, Estado, Município, Distrito Federal), isto é, através de órgão integrantes de sua própria estrutura, marcado pela linha de subordinação dos inferiores com os mais graduados ou, descentralizadamente, através de suas autarquias (pessoas jurídicas de Direito Público, arrolados pelo Decreto Lei 200/67 na Administração Indireta); é a forma de execução adotada para as atividades essenciais (serviços Públicos em sentido estrito) do Estado. No caso de execução por autarquias, temos aquilo que denominamos tecnicamente de execução direta descentralizada.

b) Execução Indireta: é a realizada por pessoas jurídicas de Direito Privado, chamadas paraestatais: empresas públicas, sociedade de economia mista, fundações criadas pela Administração, organizadas pelo Estado ou por ele reconhecida para prestações de atividades não essenciais (serviços de utilidade pública).

c) serviços delegados: através da concessão, permissão, serviços autorizados, prestação reconhecida (associações profissionais, associações de moradores do bairro, etc.), convênios administrativos e consórcios administrativos.


· Direta: Centralizada: U, E, M. DF

Descentralizadamente: autarquias
Empresas Públicas
Sociedade de Economia Mista

Entidade Paraestatal Fundações
Serviços Sociais Autônomos
· Indireta:
Concessionárias
Permissionárias
Autorização
Outras Formas


Esquematizado estas formas de prestação de serviços públicos, temos:

· A prestação do serviço público pode ser centralizado, descentralizado ou desconcentrado, como deduzimos das lições anteriores.

· A prestação de serviços centralizada é a realizada pelo próprio Poder Público, através de suas repartições, em seu nome e sob sua responsabilidade.

· O Serviço descentralizado é o transferido para autarquias e paraestatais. A transferência pode ocorrer por delegação ou outorga. A primeira é feita por ato administrativo, portanto revogável a qualquer instante. A outra, outorga, é realizada por lei, o que lhe confere características de definitividade.

Por fim, serviço desconcentrado é o serviço centralizado, mas distribuído entre vários órgãos da mesma entidade para facilitar a realização e obtenção por parte dos usuários.



7) ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA

Quando o Governo ao invés de prestar serviço público ou de utilidade pública diretamente por seus órgãos e repartições, preferir atuar por intermédio de outras pessoas, indiretamente, teremos a chamada Administração Indireta ou Administração Descentralizada.

A Administração Pública INdireta, segundo dispositivo do Decreto-Lei n° 200/67, pode ser desempenhada pelas Autarquias, ou pelas Empresas Públicas ou ainda, pelas Sociedades de Economia Mista.

Vejamos estas entidade uma a uma:

a) Autarquias: Segundo o Decreto-Lei 200/67, em seu art. 5° - I, Autarquia é o serviço público autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração, que requeiram, para seu funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada.

Deste conceito podemos retirar as principais características das autarquias que são: criação ou extinção por lei, personalidade jurídica de direito público, patrimônio próprio, capacidade de auto-administração e responsabilidade por seus atos, submetimento a controle do Poder Público, seus patrimônio são considerados bens públicos (impossibilitando a execução sobre eles) e desempenho de funções tipicamente públicas.

Embora seja identificada como Poder Público, a autarquia não é integrante da estrutura direta da presidência da república ou de seus congêneres a nível estadual e municipal, se instituídas por Estados e Municípios. A idéia mais feliz para o entendimento desta modalidade de pessoa jurídica é o comparativo da Terra com seu satélite natural, a lua. Da mesma forma, a Autarquia gravita ao redor do estado, sem se confundir com este, vez que dotado de personalidade jurídica própria. Trata-se na prática de um serviço público retirado da estrutura administrativa do Estado (Administração direta), que por requerer tratamento especializado ganha maior desembaraço administrativo e liberdades, mediante a atribuição de uma personalidade jurídica diversa do Estado, mas paralela a este, levando consigo uma parcela de todos os poderes do instituidor. É, em outras palavras, uma forma de descentralização administrativa, através da personificação de um serviço público retirado da Administração centralizada.

Não nos esqueçamos, porém que apesar dessa relativa liberdade e desembaraço, a autarquia submete-se a vigilância, orientação e controle do Poder Público, mas sem subordinação hierárquica, sujeitas apenas ao controle finalístico de sua administração e da conduta de seus dirigentes.

Trata-se da sujeição ao controle político (escolha da nominata de seus dirigentes, pelo Chefe do Poder Executivo), ao controle Administrativo (Supervisão ministerial, se federal ou supervisão da Secretaria se for estadual ou municipal) e ao controle financeiro, com a obrigação de prestação de contas ao Tribunal de Contas. O pessoal das autarquias também é considerado servidor público, sujeitando-se ao Estatuto do Servidor Público Civil da União (Lei n.° 8.112/90).

Quanto as suas finalidades, as autarquias podem desempenhar atividades econômicas, educacionais, financeiras, previdenciárias, e outras outorgadas pela entidade estatal matriz (nunca deve desempenhar atividades industriais ou econômicas).

São exemplos de autarquias:

· Federais: Banco Central do Brasil (BACEN), Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Superintendência de Seguros Privados (SUSEPE), Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), Superintendência de Abastecimento e Preços (SUNAB), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ...

· Estaduais: Administração do Porto de São Francisco do Sul (APSFS), Imprensa Oficial do Estado de Santa Catarina (IOESC), Junta Comercial do Estado de Santa Catarina (JUCESC), Departamento de Transportes e Terminais (DETER), Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina (IPESC), Departamento de Estradas de Rodagem de Santa Catarina (DER/SC), Departamento de Edificações Obras Hidráulicas (DEOH), ...

b) Entidades Paraestatais: São pessoas jurídicas de direito privado, constituídas sob a forma de sociedades civis ou comerciais, cuja criação é autorizada por lei específica, para realização de obras, serviços ou atividades de interesse coletivo, de que o Estado detenha o controle acionário (CF/88 art. 173). A expressão Paraestatal deve ser entendida como ente personalizado, disposto paralelamente ao Estado, ao lado dele.

São espécies destas entidades:

· Empresas Públicas: São pessoas jurídicas criadas pelo Poder Público, como se fossem empresas Privadas, aos mesmos moldes das firmas particulares.

Assim o é, para que o Poder Público tenha maior liberdade e desembaraço para gerir, isto é, administrar, certas atividades de interesse público, agindo como se fosse um investimento particular.

Estas entidades devem ser criadas por lei, com controle exclusivo do poder público, mas com personalidade de direito privado, regendo-se suas atividade pelos preceitos comerciais.

Veja que o Decreto-Lei 200/67 (art. 5° - II) define a Empresa Pública como A entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criada por lei para a exploração de atividade econômica que o governo seja levado a exercer por força de contingência ou conveniência administrativa, podendo revestir-se de qualquer das formas admitidas em direito.

Os trabalhadores das empresas públicas não serão funcionários públicos, mas sim celetistas(regidos pela CLT), mas não poderão igualmente acumular cargos na Administração Pública direta ou indireta, são equiparados aos funcionários públicos para efeitos penais (cometem crimes típicos dos funcionários públicos, embora não o sejam no sentido técnico do direito administrativo) e o seu ingresso dar-se-á mediante concurso público (CF/88 - art. 37, II).

São Empresas Públicas: Serviço Federal de Processamento de Dados (SERPRO), Caixa Econômica Federal (CEF), Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), etc.

· Sociedades de Economia Mista: são pessoas jurídicas de direito privado, de que participa o Poder Público, associando-se a particulares (por isso que é mista), para juntos explorarem alguma atividade econômica ou serviço de interesse coletivo. Atividade ou serviço este que será outorgado ou delegado pelo Poder Público.

O Decreto Lei 900/69, define a Sociedade de Economia Mista, com a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, criado por lei para a exploração de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União ou a entidade da Administração Indireta.

Observe-se que, em função do conceito retro transcrito, a União, ao constituir uma Sociedade de Economia Mista deverá, obrigatoriamente, observar a forma de uma sociedade anônima (S/A). E poderá fazê-lo se houver lei autorizando a criação, devendo o capital social ser constituído por bens públicos e subscrições de particulares.

Importante, ainda, é que a União, Estados ou Municípios instituidores, deverão manter a maioria das ações com direito a voto, naturalmente deverão deter o controle acionário da entidade, podendo escolher sua presidência, diretoria, enfim, exercer sua administração.

O pessoal (trabalhadores) das sociedades de economia mista serão celetistas, sujeitos a regime previdenciário de todo trabalhador comum, Entretanto, embora não sejam funcionários públicos, ficam a exemplo das empresas públicas sujeitos à proibição de acumulação de cargos na administração direta ou indireta, para efeitos penais serão considerados funcionários públicos e o seu ingresso dar-se-á mediante concurso público (CF/88 - art. 37, II).

São Sociedades de Economia Mista: Banco do Brasil (BB), Banco Meridional do Brasil (BMB), Rede Ferroviária Federal (REFSA), Petróleos Brasileiros S/A (PETROBRAS), Centrais Elétricas Brasileiras (ELETROBRAS), Banco do Estado de Santa Catarina (BESC), etc.

· Fundações Públicas: Uma Fundação é um conjunto de bens, uma universalidade ou complexo destes, que são dados para que sejam explorados e, com o rendimento auferido, seja cumprido uma determinada finalidade, que não objetiva lucro. Por sua vez, a Fundação Pública é um conjunto de bens Públicos dados pelo Estado, devendo esses bens ser explorados, e com o rendimento auferido, ser realizado um interesse público pré definido por lei.

Hodiernamente, o Poder Público vem constituindo Fundações para realização de certos interesses coletivos, como na área de educação, ensino, pesquisa, assistência social, etc.

Segundo o Decreto-Lei 200/67 (art. 5° - IV) Fundação Pública é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgão ou entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por recursos da União e outras fontes.

As Fundações Públicas, em verdade, são meros entes de cooperação, com personalidade jurídica de direito privado, embora constituídas pelo Poder Público. Submetem-se, também, a disciplina e fiscalização do Ministro de Estado, a que estão vinculados, sendo regidas pelas regras do Direito Civil (privado).

Em sentido diametralmente oposto temos algumas decisões judiciais, vejamos:

Fundações Públicas. Conceitos. Como públicas são conceituadas pela atual Constituição Federal todas as fundações criadas e mantidas pelo Poder Público, qualquer que seja a personalidade jurídica de que é dotada pelo ato da sua constituição. (Valdete do Rosário Alves X Fundação Hospitalar de Santa Catarina - Maternidade Darcy Vargas, Acórdão - 1ª T - n° 2898/92, TRT/SC/AG-PET 6860/91)

Partindo desta posição, cuja senda é defendida por Hely Lopes Meirelles (in Direito Administrativo Brasileiro, 16ª ed., págs. 310/1) seus bens seriam impenhoráveis, cabendo nas execuções contra elas o regime das precatórias.

A própria Constituição de 1988 encampando esta tese (natureza pública) instituiu as denominadas Fundações Públicas ora chamando-as de Fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público(art. 71, II, III e IV; 169, parágrafo único; 150, § 2°, 22, XXVII), ora de Fundação Pública (Art. 37, XIX e 19 das Disposições Transitórias), ora Fundações mantidas pelo Poder Público(Art. 37, XVII), ora simplesmente, Fundação(Art. 113, II).

Com esse tratamento, a Carta da República transformou essas Fundações em entidade de Direito Público, integrantes da Administração Indireta. O STF, embora na vigência da Constituição anterior, determina que tais fundações seriam espécie do gênero autarquia.

Lembre-se que a criação de uma Fundação Pública depende de autorização legal, ou seja, deve ser instituída mediante uma lei autorizativa própria.

Sendo o patrimônio cedido pelo Poder Público, esse patrimônio deve ser considerado público, embora sua destinação seja especial e esteja sujeito à administração autônoma da fundação. Assim, tal patrimônio pode ser utilizado, onerado e alienado segundo as regras estatutárias da Fundação, sem os entraves burocráticos e legais próprios aos bens públicos em geral.

Os empregados serão funcionários públicos, nos termos do artigo 1° da Lei 8112/90 (Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União).

São exemplos de Fundações Públicas: a Fundação Getúlio Vargas, a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , a Universidade de Brasília (UnB), Instituto de Pesquisas Econômica Aplicada (IPEA), a extinta Legião Brasileira de Assistência (LBA), etc.

· Serviços Sociais Autônomos: Estamos nos referindo ao SESI, SENAI, SESC, SENAC, CENAFOR, etc. Tais entidades são dotadas de personalidade jurídica de direito privado, mantidas e administradas pela Confederação Nacional da Indústria ou do Comércio, tendo, no entanto, a arrecadação de sua fonte de renda proveniente das empresas, vinculada a um percentual recolhido junto com as contribuições previdenciárias, integrando o conceito da modalidade tributária chamada contribuições sociais, razão por que se submete seus orçamentos à aprovação da Presidência da República e a prestação de contas ao Tribunal de Contas da União.

Para concluir, esta exposição acerca da administração indireta convém lembrar que o elemento distintor entre as modalidades apresentadas não é o objeto explorado, vez que, a título de exemplo, o BACEN (autarquia), o BB (Sociedade de Economia Mista) e a CEF (Empresa Pública), exploram o mesmo objeto mas com naturezas diversas. A forma e as características das entidades é que devem ser analisadas unicamente a título de enquadramento.



8) SERVIÇOS DELEGADOS

A gestão dos serviços públicos permite também diferentes formas de delegação. São elas: concessão, permissão, autorização, convênios e consórcios administrativos.

a) Concessão

A concessão ocorre quando a Administração Pública entrega a terceiros, estranhos à máquina administrativa do determinado serviço público seu desempenho, o qual será explorado sob a fiscalização do Poder Público. Em contrapartida, há uma remuneração, em forma de tarifa.

A escolha do concessionário (quem explora o serviço) é feita através de licitação e é formalizada através do contrato de concessão do serviço. O serviço concedido continua sendo público e o concessionário se obriga a mantê-lo de forma adequada.

b) Permissão

A permissão do serviço público, ao contrário da concessão não é bilateral. Ela é formalizada mediante um ato simples e unilateral do Poder Público. Seus atributos básicos são a descricionaridade.

Esses atributos distinguem a Permissão da Concessão. Ou seja, a permissão deriva de um ato da Administração Pública (Discricionariedade) e pode ser cassada a qualquer tempos (precariedade).

O exemplo mais comum de permissão é a exploração dos transportes coletivos urbanos, embora eles possam ser constituídos mediante outras formalidades. O permissionário cobra uma tarifa dos usuários para remunerar seus serviços.

c) Autorização

Há, ainda, os serviços que dependem de autorização do Poder Público. São realizados por particulares sob a fiscalização da Administração Pública em caráter precário, sem regulamentação específica e discricionário, tendo o autorizado menos estabilidade do que a permissão. A remuneração de tais serviços é feita por tarifas fixadas pelo Poder Público.

Esses serviços não se beneficiam das prerrogativas das atividades públicas, só auferindo as vantagens expressamente deferidas no ato de autorização. É exemplo de Autorização os serviços de taxi.

d) Convênios Administrativos

Nos Convênios Administrativos, faz-se acordo por entidades públicas de qualquer espécie, entre si, ou entre entes públicos e particulares para realização de atividades de interesse recíproco. Um exemplo seria Convênio firmado entre o Estado de Santa Catarina e a OAB/SC para prestação de serviços de advocacia dativa.

e) Consórcios Administrativos

Os consórcios Administrativos são ajustes entre entidades estatais, autarquias ou paraestatais da mesma espécie, para realização de objetivos comuns. Um exemplo é o serviço de reciclagem de lixo operacionalizado por Florianópolis e São José, em regime de consórcio.




9) LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Constituição Federal – Art. 21

Art. 21. Compete à União:
I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;
II - declarar a guerra e celebrar a paz;
III - assegurar a defesa nacional;
IV- permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente;
V - decretar o estado de sítio, o estado de defesa e a intervenção federal;
VI - autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico;
VII - emitir moeda;
VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e de previdência privada;
IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;
X - manter o serviço postal e o correio aéreo nacional;
XI - explorar, diretamente ou mediante concessão a empresas sob controle acionário estatal, os serviços telefônicos, telegráficos, de transmissão de dados e demais serviços públicos de telecomunicações, assegurada a prestação de serviços de informações por entidades de direito privado através da rede pública de telecomunicações explorada pela União;
XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:
a) os serviços de radiodifusão sonora, de sons e imagens e demais serviços de telecomunicações;
b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos;
c) a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária;
d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território;
e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros;
f) os portos marítimos, fluviais e lacustres;
XIII - organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios;
XIV - organizar e manter a polícia federal, a polícia rodoviária e a ferroviária federais, bem como a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal e dos Territórios;
XV - organizar e manter os serviços oficiais de estatística, geografia, geologia e cartografia de âmbito nacional;
XVI - exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão;
XVII - conceder anistia;
XVIII - planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações;
XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso;
XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos;
XXI - estabelecer princípios e diretrizes para o sistema nacional de viação;
XXII- executar os serviços de polícia marítima, aérea e de fronteira;
XXIII- explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições:
a) toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional;
b) sob regime de concessão ou permissão, é autorizada a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos medicinais, agrícolas, industriais e atividades análogas;
c) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa;
XXIV - organizar, manter e executar a inspeção do trabalho;
XXV - estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa.
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.
§ 1º São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.
§ 2º Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão a empresa estatal, com exclusividade de distribuição, os serviços locais de gás canalizado.
§ 3º Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;
V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transportes coletivo, que tem caráter essencial;
VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental;
VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;
VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

9
A FUNÇÃO PÚBLICA:REGIME
JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS





1) FUNÇÃO PÚBLICA

O Estado, na consecução de seus objetivos, isto é, na satisfação das necessidades coletivas, não pode prescindir da colaboração do trabalho humano e o cidadão é chamado constantemente a contribuir neste sentido.

A forma mais comum de prestação de serviço humanos ao ente estatal é mediante o ingresso profissional na função pública que, entendida em seu sentido restrito, outra coisa não é senão o conjunto de atribuições deferidas pelo Estado a seus servidores.

Etmologicamente, função significa exercício, desempenho. A idéia de função está ligada à de atividade. Tanto que José Cretella Júnior a define como sendo a:

¨ atividade exercida por órgãos públicos para a realização dos fins do Estado.

É necessário notar-se que, a par da função pública stricto sensu, há função pública em seu significado amplo, isto é, aquela realizada por particulares que não integram um organismo público e nem a prestam em caráter profissional. É o que ocorre quando alguém exerce uma função eleitoral ou compõe o corpo de jurados.



2) AGENTES PÚBLICOS

De uma maneira geral, todas as pessoas que trabalham para o Estado, nas suas diversas esferas: U, E, M, DF, são agentes e denominam-se SERVIDORES.

Os agente públicos, entendido como todos os que prestam serviços ao Estado com vínculo de emprego, seja ele estatutário ou celetista, podem ser agentes de fato ou de direito, consoante seja sua condição regular de servidor público.

O agente de direito é aquele que se investiu na função ou cargo, com observância das exigências e/ou requisitos necessários, consubstanciados na Legislação, mediante concurso público de provas ou de provas e títulos, constituindo assim uma situação jurídica perfeita. Aquele que assumiu o cargo/emprego ou função sem observância legal, não teve uma situação jurídica perfeita e está constituído num agente de fato.

Este provimento irregular, que constitui-se uma exceção, decorre de defeito do ato de contratação, onde o servidor é considerado agente putativo, ou seja ele não tem ciência do defeito ou vício do ato de sua nomeação ou contratação, porém esta não é feita ao abrigo da lei.



3) ESPÉCIES DE AGENTES PÚBLICOS

É a CF/88 que traça os princípios básicos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional, de quaisquer das esferas de Poder da República, em seu art. 37. A Carta Suprema institui, no citado dispositivo, o regime jurídico único para todos os servidores públicos, os quais poderão ter regimes diversificados, celetista ou estatutário, porém um único para as Autarquias, um outro único para as Fundações e um único para a Administração Direta, consoante entendimento da doutrina, desde que respeitem o que dispõe os incisos I, II, XVI e XVII do mesmo artigo constitucional. Porém, por ocasião da Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990, sucessora da Lei n° 1.711/52, o regime único adotado a nível federal foi o mesmo no âmbito das autarquias, fundações e administração direta.

Vejamos uma a uma as divisões de vínculo jurídico de trabalho a que estão sujeitos a grande massa de servidores públicos.

a) Funcionários Públicos: São os servidores legalmente investidos nos cargos públicos da administração direta e sujeitos às normas Estatutárias da entidade estatal a que pertencem, vez que U, E, DF e M poderão, legislar acerca da matéria, de forma concorrente.

Os servidores autárquicos e fundacionais estatutários, também chamados funcionários autárquicos e fundacionais - são os que exercem, cargos nas autarquias e nas fundações instituídas e mantidas pelo poder público, com o advento do novo Estatuto dos Servidores Civis da União seu vínculo, a nível federal, passou a ser o mesmo dos servidores integrantes da Administração Direta.

O certo é que, independentemente do rincão em que estejamos, não há um contrato entre o Poder Público, independentemente se personalizado (Autarquias e Fundações Públicas) ou despersonalizado (Administração Pública Direta) e o funcionário estatutário, nem há discussão e acerto das condições de trabalho, remuneração, etc. Tudo é estabelecido unilateralmente, por leis e regulamentos, desde as condições de exercício das funções públicas, até os deveres e os direitos dos funcionários.

Mais do que isso, a lei é quem fixa e altera vencimentos e exige requisitos de eficiência, capacidade, sanidade física e mental, moralidade, etc. Isto é, o regime estatutário existe no interesse do serviço público, sendo que as suas cláusulas e condições poderão ser alteradas por lei, sem necessidade de aquiescência do trabalhador. Isto porém, não quer dizer que o Servidor não adquira direitos. Obviamente os adquire e, sempre que no regime da lei anterior o servidor satisfazer certas condições para a aquisição de um direito, nenhuma lei nova poderá prejudicar seu patrimônio jurídico (direito adquirido). Mas, se o direito ainda não foi adquirido, a lei nova sempre poderá alterar a situação, sem que se fale em expectativa de direito.

Nisso consubstancia-se o Regime Estatutário: não há contrato, mas submissão a Lei, que sempre poderá alterar as relações entre o Servidor Público e a Administração Pública, mesmo que seja para prejudica-lo (desde que ele ainda não tenha adquirido um direito, definitivamente), o importante é a fidelidade ao interesse do serviço público e sua eficiência.

b) Regime Especial: Os servidores admitidos para serviços temporários e os contratados para funções de natureza técnica especializada, muitas vezes, não ocupam cargos públicos e devem possuir, por força de mandamento constitucional, regime jurídico próprio, estabelecido em lei especial, isto é, diversa da que rege os funcionários públicos (art. 37 - IX da Constituição da República, que adiante será estudado).

c) Regime da CLT: Os servidores contratados no regime da CLT, também chamados empregados públicos - são os que prestavam, serviços à administração direta ou à autárquica, mediante contrato de trabalho nos termos e condições da legislação trabalhista (CLT - Decreto-Lei 5.452, de 01/05/43), forma banida por ocasião do advento do Regime Jurídico Único.

Porém, nas empresas públicas e sociedades de economia mista, por ditame constitucional (CF/88 - 173 - § 1°), seus empregados sujeitam-se a CLT, mesmo vínculo vigente na esfera privada.

Os militares, Juizes (LOMAN), Promotores de Justiça (LOMP) e agentes políticos (Deputados, Senadores, Ministros de Estado, Mandatários Supremos) de um modo geral não se sujeitam ao vínculo estatutário do regime jurídico único, mas a um conjunto de leis especiais que regulamentam cada uma das categorias de per si.

De qualquer sorte, não se há de perder de vista que todos eles, Estatutários ou não, civis ou militares, administrativos ou com estafe político, serão sempre considerados funcionários públicos para efeitos criminais e de responsabilização civil.



4) DISTINÇÃO ENTRE CARGO PÚBLICO E FUNÇÃO PÚBLICA

A organização geral do funcionalismo é uma exigência da Constituição (art. 37,I) que determina que todo o cargo público só pode ser criado por lei.

Não há como se confundir cargo com função pública. A idéia de função pública está relacionada com atividade, atribuição, conforme demonstrado no item primeiro deste trabalho. Cargo, por sua vez, no seu sentido etimológico, pode ser traduzido como incumbência.

Sob o aspecto material representa o lugar onde o servidor desempenha sua atividade específica.

Cargo público é portanto,

¨ o lugar instituído na organização do funcionalismo, com denominação própria, atribuições específicas, e estipêndio correspondente, para ser provido e exercido por seu titular, na forma estabelecida em lei. Ex.: Auditor Fiscal do Tesouro Nacional (AFTN), Técnico do Tesouro Nacional (TTN), Fiscal de Mercadorias em Trânsito, Agente Administrativo, Procurador do Estado, etc.

Função pública é

¨ a atribuição ou conjunto de atribuições que a Administração confere a cada categoria profissional ou individualmente a determinados servidores de serviços eventuais.


Todo o cargo tem função, mas pode haver função sem cargo. As funções do cargo são definitivas, como ensina Hely Lopes Meirelles, enquanto as funções autônomas são provisórias. Daí porque as funções permanentes da Administração devem ser desempenhadas por titulares de cargos e, as transitórias, por servidores designados, admitidos ou contratados precariamente.

Os cargos são distribuídos em classes (agrupamento de cargos da mesma profissão e com idênticas atribuições, responsabilidades e vencimentos) e carreira (agrupamento de classes da mesma profissão ou atividade, escalonadas segundo a hierarquia do serviço). O conjunto de carreiras e cargos isolados constitui o quadro permanente do serviço dos diversos órgãos da Administração.

Assim, cargo de carreira é escalonado em classes, para acesso privativo de seus titulares, até a mais alta hierarquia profissional. Já o cargo de chefia é o que se destina à direção dos serviços.

Um quadro administrativo, portanto é composto de cargos de carreira e cargos isolados, considerados aqueles como de caráter dinâmico que possibilitam ascensão do funcionário na escala hierárquica. Contrario sensu os cargos isolados não oferecem condições de promoção.

O magistério superior, por exemplo, é uma carreira, porque resulta do agrupamento das classes seguintes: professores assistentes, adjuntos e titulares.



5) DIREITO DO TITULAR DO CARGO PÚBLICO

Entre os direitos do titular do cargo público está o da estabilidade, mas esta restringe-se ao exercício, às prerrogativas da função, pois o cargo não é apropriável pelo servidor.

A administração, por isto mesmo, pode alterar os cargos públicos ou os serviços, independentemente da aquiescência de seu titular, como já vimos, visto que este não tem direito adquirido à imutabilidade de suas atribuições. Hely Meirelles doutrina:

O funcionário tem direito adquirido à permanência no funcionalismo, mas nunca adquirirá direito ao exercício da mesma função, no mesmo lugar e nas mesmas condições, salvo os vitalícios, que constituem uma exceção constitucional à regra estatutária.

Segue dizendo o mestre:

Enquanto subsistir o cargo, como foi provido, o seu titular terá direito ao exercício nas condições estabelecidas pelo Estatuto, mas se se modificar a estrutura, as atribuições, os requisitos para o seu desempenho, lícita é a exoneração, a disponibilidade, a remoção ou a transferência de seu ocupante, para que outro o desempenhe na forma da lei. O que não se admite é o afastamento arbitrário ou abusivo do titular, por ato do Executivo, sem lei que o autorize. (Op. Cit., pág. 365)

Temos, a título de exemplo, na carreira de Auditor Fiscal do Tesouro Nacional uma mudança de nomenclatura de cargos e atribuições, onde os cargos de Fiscais de Tributos Federais e Controladores de Arrecadação, forma extintos em 1985 e transformados no atual AFTN, consoante Decreto-lei n° 2.225/85, sem que isto tenha causado qualquer furor nos tribunais.



6) SELEÇÃO DE PESSOAL PARA TRABALHAR NA SEARA PÚBLICA

O critério de seleção, conforme a natureza do cargo, pode variar, a saber:

a) a regra geral é a do concurso público, estando dispensável dessa exigência o provimento dos cargos em comissão e outros indicados em lei, como o caso dos agentes políticos: Ministros dos Tribunais Superiores, Deputados, Senadores;

b) para alguns destes cargos de Ministro, a nomeação depende de aprovação do Senado Federal;

c) outros cargos são providos mediante eleição, como os de Deputado e Senador, etc.

d) em alguns casos, como o dos Desembargadores e Juizes do TSE, a nomeação é de escolha condicionada, dando-se preferência a um dentre os constantes da respectiva lista.

e) há certos cargos, ainda, que são providos mediante a chamada preparação profissional específica, como os de carreira diplomática, para os quais se exige o curso do Instituto Rio Branco;

f) de livre escolha, os cargos de provimento em comissão e alguns de mandato administrativos, como os Ministros de Estado e alguns membros de Conselhos, demissionários ad nutum

g) existe, por derradeiro, o critério de seleção relacionado com a condição de Ex-Combatente, cujo aproveitamento no serviço público independente da exigência de concurso, basta ter integrado o contingente brasileiro da FEB na 2ª Grande Guerra.



7) CONCURSO

Sempre foi problema de difícil solução a escolha das pessoas físicas que preencheriam os cargos da Administração Pública.

A modalidade de escolha por concurso público, estatuída na Constituição Federal (art. 37, II), assegura igual oportunidade a todos que preencham os requisitos legais (Art. 37, I - isonomia) evitando o apadrinhamento, empreguismo e o nepotismo, práticas fisiológicas comuns no dia a dia da administração pública, que em nada contribuem para a qualidade do serviço público.

Benílton de Lima Souza, promotor de Justiça na Comarca de São José de Mipibú (RN) , em matéria publicada na internet na Home Page do Jus Navigandi, sob o título CONTRATAÇÃO SEM CONCURSO PÚBLICO ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, observou:

Decorridos mais de oito anos da promulgação da intitulada "Carta Cidadã" o tema ora proposta afigura-se à primeira vista totalmente sem propósito, partindo-se do preceito constitucional de que "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração".

Entretanto, verifica-se hodiernamente que os gestores da coisa pública continuam burlando a legislação, efetuando contratações sem o devido concurso, valendo-se para tanto do inciso IX, do artigo 37 da Lei Maior, onde se encontra a previsão para contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público.

Em regra, fizeram constar em legislação municipal dispositivo que autorizem tais contratações, limitaram um prazo, e assim vão abarrotando o quadro do funcionalismo, sem nenhum critério, a não ser o da livre conveniência do administrador, para não dizer "apadrinhamento". Tem-se uma interpretação totalmente esdrúxula daquela que foi a intenção do legislador constituinte, vez que esse visou com tal previsão atender situações de caráter excepcionais.

Surge daí a importância capital do Ministério Público, eis que, como guardião da Constituição deve permanecer sempre atento a tais desmandos, fazendo uso dos seguintes remédios:

a) recomendar aos administradores públicos a realização de concurso, que deve ser antecedido por um plano de cargos e salários dos servidores públicos municipais, bem como reservar o percentual para os portadores de deficiência; e

b) com o não atendimento à recomendação e conseqüente continuidade dos desmandos, cabível ação civil pública para anulação de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa, com fundamento nas Leis 7.347/85, 8.429/92 e 8.625/93, observada também a lei estadual do Ministério Público de cada região.

Imprescindível também o acompanhamento do certame em todas as suas fases, pois alguns montam toda uma estrutura para realizá-lo, aparentando estar presente todos os aspectos legais, entretanto, o que se tem na verdade é um jogo de cartas marcadas, onde os aprovados são previamente listados. É necessário que se verifique a idoneidade da empresa organizadora do concurso e se a composição da comissão obedece aos dispositivos que lhe são próprios, garantindo inclusive a participação de representação dos servidores. É sem dúvida uma árdua missão, como aliás é todo o trabalho do Promotor de Justiça, principalmente, em Comarcas pequenas, em que imperam maus costumes e vícios seculares, mas que precisam de um freio, o qual, ao meu ver é traduzido no "Parquet".

Não se perca de vista que a regra constitucional do concurso público é dirigida tanto aos servidores regidos pela CLT, os celetistas, como aos estatutários. Para ambos há exigência constitucional de que a investidura em cargo ou emprego público seja sempre precedida da aprovação em Concurso Público. O concurso deverá ser unicamente de provas, de provas ou de títulos, vedado o concurso só de títulos. O Estatuto dos Servidores Federais estabelece que o ato administrativo típico para a convocação de um concurso público é o EDITAL.

A Administração Pública, porém, é livre, para convocar ou não um concurso, determinar o número de vagas de irá prover, estabelecer as bases do certame e os critérios de julgamento, sendo neste particular totalmente discricionário, tendo apenas, necessariamente que garantir a igualdade a todos os candidatos. Tem da mesma forma o poder de a qualquer momento, alterar as condições do concurso, desde que não beneficie a candidato ou a um grupo. Aberto porém o certame e escolhido suas regras o procedimento é totalmente vinculado, no que tange suas etapas.

É muito importante notar que os candidatos, mesmo inscritos, não têm direito à realização do concurso, que pode ser suspenso ou cancelado pela Administração Pública, mesmo após sua realização. Os concorrentes não tem direito, mas mera expectativa de direito. Da mesma forma, a provação no concurso não gera direito à nomeação. Todavia, o aprovado tem direito a ser nomeado com preferência sobre qualquer outro cuja classificação for inferior. Em outros termos, a Administração Pública não é abrigada a nomear nenhum dos aprovados, nem mesmo o primeiro colocado, mas apenas, na hipótese de nomear alguém, deverá obedecer à ordem de classificação, sob pena de nulidade do ato.


8) PROVIMENTO

O preenchimento de cargo público por pessoa estranha ao funcionalismo é denominado provimento originário. Portanto, diz-se que o concurso é o procedimento seletivo pelo qual se realiza o provimento de certos cargos públicos efetivos.
O provimento de cargos públicos comissionados, independe de procedimento seletivo, vez que o cargo pode ser preenchido por quem o administrador desejar, servidor público ou pessoa estranha ao funcionalismo. Preenchimento derivado, finalmente, é o preenchimento de cargo público por quem já é membro do funcionalismo.



9) NOMEAÇÃO

O Provimento originário de um cargo público é feito pela nomeação de seu titular. Nomeação é o ato administrativo mediante o qual se atribui determinado cargo a pessoa geralmente estranha aos quadros do funcionalismo.



10) ESTÁGIO EXPERIMENTAL OU PROBATÓRIO

É o período, de vinte e quatro meses, durante o qual o admitido nos quadros do funcionalismo mediante concurso, ou seja em caráter efetivo, fica em observação a fim de que a Administração verifique se o servidor preenche os requisitos necessários ao eficiente exercício do cargo público. Caso tal fato não ocorra, isto é, caso o servidor seja considerado inapto para o cargo, ele será exonerado (exoneração não é punição), ou se estável, reconduzido ao cargo anteriormente ocupado.



11) ESTABILIDADE

A estabilidade do funcionário nomeado por concurso se verifica aos dois anos de efetivo exercício e somente poderão der demitidos, observado o seguinte:

a) os vitalícios (Juizes, Promotores), mediante sentença do Poder Judiciário;

b) os efetivos, mediante processo disciplinar onde se assegure o contraditório e ampla defesa ou através de sentença judicial

c) os comissionados, quando cessa a comissão, decorrente da vontade do poder que o nomeou

d) os celetistas, em qualquer ocasião, mediante as indenizações de lei.

A Constituição Federal veda a estabilidade de Funcionário que não tenha sido admitido em Concurso Público, independentemente do tempo de exercício. Faz-se necessário lembrar que tal regra tem apenas uma exceção: são estáveis independentemente de concurso público aqueles servidores que tivessem mais de 5 anos de efetivo exercício na data da promulgação da CF/88.



12) POSSE

Ato solene pelo qual a pessoa nomeada pela Administração Pública, para o provimento de determinado cargo público, declara aceitar-lhe as atribuições. Tal solenidade pode inclusive dar-se por procuração, não caracterizando início do exercício das atribuições do cargo, mas mero termo de declaração.

Tal instituto não se confunde, com a nomeação, que é um ato unilateral da Administração, enquanto que a posse é ato unilateral do nomeado aceitando sua nova condição.

A nomeação para cargo público efetivo e, a seguir, a posse são requisitos necessários para a investidura no mesmo.



13) EXERCÍCIO

É a prática pelo funcionário dos atos relativos ao cargo público para o qual foi nomeado. É o efetivo trabalho. O exercício das funções inerentes ao cargo público completa a investidura do funcionário nesse cargo.



14) VACÂNCIA

É a condição do cargo público sem titular. A vacância pode ser originária, quando o cargo público vago nunca foi provido ou derivada, quando a vaga surgiu por motivo de promoção, transferência, aposentadoria, falecimento, exoneração ou demissão do titular.



15) EXONERAÇÃO

É o desligamento do funcionário público do cargo que ocupa, rompendo o vinculo jurídico que une o funcionário ao Estado. Pode ocorrer por iniciativa da Administração Pública, quando não satisfeitas as condições do estágio probatório e quando tendo tomado posse, o servidor não entra em exercício no prazo estabelecido em lei, ou por iniciativa do funcionário, que requer seu desligamento dos quadros de pessoal do ente estatal. Não tem condão punitivo.



16) DEMISSÃO

É ato punitivo mediante o qual a Administração Pública exclui um funcionário de seus quadros, exercendo o Poder Disciplinar e depurando as suas fileiras de um servidor nocivo ao serviço. É a mais grave das penas disciplinares.

Para evitar impropriedades conceituais importante a observação de Ivan Barbosa Rigolin acerca das diferenças entre demissão (16) e exoneração (15):

Demissão é pena, aplicável ao servidor faltoso, pela administração; exoneração não é pena, consistindo na dispensa do servidor, dada pela Administração a pedido ou para câmbio normal de ocupante de cargo ou emprego livremente exonerável (em comissão). O confronto das redações do inc. II do art. 37 (exoneração) e do § 2° do art. 41 (demissão) evidencia a natureza de cada um desses institutos. A demissão sempre enseja processo prévio, se o cargo ocupado for de provimento efetivo, ou agora, se o emprego for permanente. É pacífica a jurisprudência superior sobre a necessidade de processo administrativo para demissão do funcionário, mesmo que ainda em estágio probatório bienal (mantido pelo art. 41 desta Carta); e, assim, o mesmo se deve concluir quanto aos empregados permanentes, se admitidos por concurso, pois a eles também a estabilidade se estende, exigindo interpretação analógica, extensiva ou indutiva quanto à proteção enquanto no estágio probatório. Demissão, hoje, portanto, enseja sempre processo administrativo prévio.

Exoneração, por outro lado, é a simples dispensa, nos casos em que ela é livremente procedível pela autoridade, de um servidor, como numa função temporária tornada desnecessária (art. 37, IX) ou num cargo ou emprego de confiança (art. 37, II); não se há, nunca, neste caso, de falar em processo administrativo.(O Servidor na Constituição de 1988, Saraiva, 1989, pág. 184/5)



17) APOSENTADORIA

Prolongamento ininterrupto de descanso, com remuneração, integral ou proporcional, durante toda a vida do agente. Em certos casos previstos em lei a mesma pode ser interrompida e até mesmo haver sua cassação como espécie de penalidade disciplinar.

A Constituição prevê uma grande variedade de tipos de aposentadorias para os servidores, podendo agrupar-se as mesmas em torno das seguintes idéias: invalidez permanente, compulsoriamente aos setenta anos e após o decurso de um determinado espaço de tempo.

Os proventos destas modalidades de aposentadoria serão integrais ou proporcionais, consoante o caso. Para os efeitos de aposentadoria os períodos de tempo de serviço prestados à União, aos Estados, aos Municípios, bem como suas administrações indiretas, da mesma forma o serviço prestado a iniciativa privada., são computados reciprocamente, somando-se, desde que não tenham sido cumulativos.



18) INSTITUTOS PECULIARES DO REGIME JURÍDICO ESTATUTÁRIO

Para que se possa entender a legislação, é necessário conhecer os significados dos diversos termos jurídicos utilizados nas leis e regulamentos administrativos próprios:

a) Remoção: deslocamento de funcionário de uma repartição para outra sem alteração de seu "status" dentro do quadro a que pertence.

b) Substituição: processo pelo qual o superior hierárquico ocupa o cargo de inferior hierárquico, ou vice versa, executando os atos da competência do substituído, tudo em nome da continuidade do serviço.

c) Promoção: é a passagem de cargo inferior para outro superior na hierarquia funcional.

d) Acesso: elevação de funcionário, dentro do respectivo quadro, a cargo de mesma natureza de trabalho, maior complexidade e maiores atribuições. Instituto declarado inconstitucional pelo STF.

e) Transferência: é a mudança de cargo ocupado por funcionário público.

f) Reintegração: é o ato vinculado mediante o qual a Administração Pública reconduz um funcionário ao seu cargo com direito a indenização, tendo em vista a sua irregular exclusão dos quadros do funcionalismo. É uma garantia da estabilidade.

g) Aproveitamento: utilização de funcionário estável o qual estava em disponibilidade.

h) Disponibilidade: Direito que tem o servidor estável de permanecer recebendo seus proventos, quando o seu cargo foi extinto por lei.

i) Reversão: retorno ao serviço público de funcionário que estava inativo.



19) DIREITOS DO TITULAR DO CARGO

Os direitos do titular do cargo se restringem ao seu exercício, às prerrogativas da função, e aos vencimentos e vantagens decorrentes da investidura, sem que o funcionário tenha propriedade do lugar que ocupa, visto que o cargo é inapropriável pelo servidor, como já tivemos a oportunidade de analisar.

Enquanto subsistir o cargo, como foi provido, o seu titular terá direito ao exercício nas condições estabelecidas pelo Estatuto, mas se modificar a estrutura, as atribuições, os requisitos para o seu desempenho, licita é a exoneração (se não estável), a disponibilidade, a remoção ou a transferência de seu ocupante, para que outro o desempenhe na forma da nova lei.

A Constituição da República, ao se referir (nos artigos 37 usque 41) ao funcionalismo, não esgota os direitos a serem reconhecidos aos servidores públicos, permitindo que outros se lhes ajunte, mas em hipótese alguma esses direitos poderão ir ao ponto de contrariar a finalidade do serviço público ou de prejudicar o seu funcionamento.

De modo geral, podemos dizer que os servidores públicos têm os mesmos direitos reconhecidos aos cidadãos, eis que cidadãos também o são, apenas com algumas restrições exigidas para o desempenho da função pública.

Por fim, podemos ressaltar que os direitos oriundos da função pública consubstanciam-se:

a) Vantagens do cargos: A lei Quanto às vantagens econômicas, a lei n° 8.112 estabeleceu os seguintes princípios:

· não haverá serviços gratuitos;
· o vencimento obedecerá ao padrão fixado em lei;
· direito a ser indenizado por despesas que faz em favor do serviço mediante: ajuda de custos (art. 53 a 57), diárias (arts. 58 e 59) e transportes (art. 60)
· concessão de gratificações ou adicionais;
· vencimento do cargo
· direito ao salário-família, na forma estabelecida em lei;

Além das vantagens econômicas já enumeradas, o Estatuto do Servidores Públicos Civis estabelece outras vantagens de caráter social e que visam ao bem-estar do funcionário em todos os seus sentidos. Dessa forma tem funcionário público federal direito a férias de 30 dias contínuos, depois do primeiro ano de exercício, proibida a acumulação de períodos salvo necessidade imperiosa do serviço e mesmo assim pelo prazo máximo de dois anos. Também prevê o referido Estatuto licenças de natureza diversas, como as seguintes:

· para tratamento de saúde;
· por motivo de doença em pessoa da família;
· por motivo de afastamento do cônjuge;
· para o serviço militar;
· para atividade política;
· prêmio por assiduidade (banida por MP do Estatuto dos Servidores Públicos da União);
· para tratar de interesses particulares (prêmio);
· para o desempenho de mandato classista;
· à gestante, à adotante e Licença paternidade
· por acidente em serviço.

b) Sindicalização e Greve: A Sindicalização (livre associação sindical) e a greve, antes proibidos ao funcionário público, passaram a ser direitos garantidos pela CF/88 - arts. 37, VI e VII. (Tal matéria é regulada no art. 240 do Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União.) Convém, porém, observar que o direito de greve assegurado aos servidores públicos, não tem a amplitude de que se reveste o direito de greve dos trabalhadores do setor privado. O exercício está condicionado ao que preceitua legislação complementar. Deve-se compatibilizá-lo com a continuidade dos serviços públicos.



20) DEVERES DOS FUNCIONÁRIOS

Como não existem direitos sem obrigações correspondentes, todo funcionário público, tão logo seja empossado, assume para com o Poder Público obrigações que deverão ser cumpridas rigorosamente sob pena de ser punido de conformidade com o que dispõe a Lei.

Os estatutos modernos, na lição do ilustre Hely Lopes Meirelles, impõem uma série de deveres aos funcionários, como requisitos para o bom desempenho de seus cargos e regular funcionamento dos serviços públicos.

Dentre esses deveres destacam-se, por sua constância na legislação dos povos cultos, o de lealdade à Administração, e o de obediência às ordens superiores legais. O dever de lealdade, ou dever de fidelidade exige de todo funcionário a maior dedicação ao serviço e o integral respeito às leis e às instituições constitucionais, identificando-o com os superiores interesses do Estado.

Tal dever proíbe que o servidor atue contra os fins e os objetivos legítimos da administração, sob pena de praticar infidelidade funcional, ensejando aplicação da mais grave punição, isto é, a demissão que representa o desligamento compulsório do serviço público.

Quanto ao dever de obediência, cabe ao funcionário respeitar as ordens legais de seus superiores e fielmente executá-las. Esse dever decorre da chamada subordinação hierárquica e assenta no princípio disciplinar, que informa toda organização administrativa.


21) RESPONSABILIDADES E PENALIDADES

A responsabilidade, em sentido amplo, pode ser compreendida como o dever jurídico, imposto a cada um, de responder por ação ou omissão imputável, que importe na lesão de outrem, protegido pela lei.

Por esse motivo, o Estatuto dispõe que, pelo exercício irregular de suas funções, isto é, de suas atribuições, o funcionário responde pelos danos causados à Fazenda Pública que uma vez apurados e imputados a ele em sede de procedimento administrativo, além do apenamento cabível a espécie, deverão ressarcir tais danos, mediante descontos mensais que não poderão ultrapassar a 10% dos vencimentos normais (art. 46), sendo ainda o servidor responsabilizado penal e civilmente, por tais atos.

Tais sanções de natureza civil, penal e administrativa poderão cumular-se, sendo contudo independentemente entre si, vez que a primeira corre nas varas cíveis e pode advir como pena a obrigação de indenizar, a segunda no juízo criminal e pode resultar na imposição de penas privativas de liberdade e a última, na própria administração, podendo advir as seguintes penalidades:

· advertência
· repreensão
· suspensão
· multa
· destituição
· demissão
· cassação de aposentadoria ou disponibilidade

A lei contudo estabelece que a responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria.



22) PROCESSO DISCIPLINAR

a) Conceito: A Administração Pública, para registro e controle de seus atos, conduta de seus agentes e atividades particulares sujeitas à sua fiscalização, utilizam-se de expedientes denominados processos administrativos. A mesma expressão é utilizado para caracterizar o litígio interno entre o administrado e a administração (ex. Contencioso tributário) ou entre este e qualquer um de seus servidores. Neste sentido, utilizaremos a expressão processo administrativo, só nesta segunda acepção.

Segundo o Estatuto a autoridade que conhecer irregularidade no serviço público deverá determinar a sua verificação em processo administrativo. Esse procedimento de cunho interno da administração terá início por ordem dos Ministros ou Secretários, bem como, dos Chefes de Repartição, realizando-se através da instalação de uma comissão designada pela respectiva autoridade e composta de três membros. A doutrina vem salientando que:

É princípio corrente, em direito administrativo, que a apreciação da responsabilidade disciplinar com o correspondente poder corretivo, cabe, precipuamente, à autoridade administrativa superior. (in Parecer n° 514-Z, da lavra de Ministro Gonçalves de Oliveira, Pareceres da Consultoria Geral da República, Vol. 89, pág. 45)

Assim, processo administrativo é o conjunto de atos praticados na esfera administrativa para a averiguação de infrações administrativas praticadas por seus agentes, que deverá preceder quaisquer punições disciplinares. A punição de servidor público será portanto, sempre antecedida de um processo administrativo, onde será assegurado o contraditório e a mais ampla defesa, regras aliás que não se coadunam com o mero respeito ao procedimento definido em lei. Os tribunais entendem que tais postulados constitucionais devem ser assegurados milimetricamente aos servidores processados.

b) Representação das Partes: No processo administrativo, as partes podem postular pessoalmente ou através de advogado legalmente constituído.

c) Recurso ao Judiciário: Todo o processo administrativo poderá ser revisto juridicamente. Isto é, a decisão administrativa final sobre um processo poderá ser submetida ao Poder Judiciário por quem se considerar por ela prejudicado.

d) Revisão: O funcionário acusado goza do direito ao contraditório e da ampla defesa, consoante já sublinhado. Verificada a culpa procedimentalmente falando, fatos ou circunstâncias fortes para justificar a inocência do funcionário poderão ser aduzidos para pedido de revisão, a qual poderá ser solicitada pelo próprio interessado ou por aquelas pessoas constantes do seu assentamento no serviço público, inclusive mediante advogado.

A revisão do processo reconhecendo a impunibilidade do funcionário acarretará o direito à reintegração do cargo com o pagamento de todas as suas vantagens, caso a pena aplicada tenha sido a de demissão.

e) Certidões: É relevante ressaltar o direito à certidão constante em processo administrativo, assegurado no inciso XXXIV do art. 5° da CF/88.

f) Prisão Administrativa: A prisão administrativa, prevista no art. 58 do Decreto-Lei 220/75 não foi recepcionada pela nova ordem constitucional advinda em 1988, posto que a Carga Magna atual, em seu art. 5°, inciso LXI, assegura que ninguém será preso, salvo em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade JUDICIÁRIA competente. No caso sub examem a ordem de prisão advinha da autoridade administrativa, portanto totalmente incompatível o comando legal com a nova ordem constitucional.



23) ACUMULAÇÃO DE CARGOS

A CF/88, regulando hipótese de acumulação de cargos, proibiu-a quando remunerada, estabelecendo as seguintes exceções, em seu artigo 37:

· a de dois cargos de professor;
· a de um cargo de professor com outro técnico ou científico;
· a de dois cargos privativos de médico

Além destas acumulações legais a Carta Constitucional prevê que Juizes de Direito e Promotores de Justiça podem acumular somente um cargo de professor.

A proibição de acumular se estende a cargos, funções ou empregos em autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, independentemente se Federais, Estaduais ou Municipais e será permitida a acumulação, nos casos acima, se houver compatibilidade de horários.

Somos pelo entendimento que cargo de provimento em comissão não é técnico ou científico, logo não pode ser acumulado. O Tribunal de Contas de Santa Catarina decidiu:

É vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, para o exercício de dois cargos de Professor; de um cargo de Professor e um outro técnico ou científico; de dois cargos privativos de médico.

Pelo princípio da inacumulabilidade, é proibido as acumulações de empregos públicos, abrangendo inclusive a prestação de serviços.

É incompatível o exercício do cargo de Secretário Municipal ou de Diretor de Departamento, conjuntamente com outro cargo de médico, por ser o primeiro exercido por agente político, caracterizando, assim a acumulação indevida. (in Resumo de Decisões em Consultas Prejulgados, TCSC, 1997, pág. 40, ementa 036, Câmara Municipal de Ascurra, Processo n.° 08.549/13 Parecer n.° DMU 040/91, Decisão em 04/11/91)

A acumulação remunerada de cargos envolvendo cargo comissionado é vedada pelo artigo 37, inciso XVI da Constituição Federal (in Resumo de Decisões em Consultas Prejulgados, TCSC, 1995, pág. 56, ementa 307, Prefeitura Municipal de Imbituba, Processo n.° 10086/33 Parecer n.° COG-394/93, Decisão em 11/08/93)

No que tange a acumulação de proventos decorrentes da aposentadoria com remuneração de cargo em que o servidor está na ativa mereceu a seguinte manifestação do Supremo Tribunal Federal:

Validade do ato administrativo desta Corte que condicionou a posse de oficial da reserva remunerada do Exército, no cargo de Técnico Judiciário do Quadro da Secretaria do Tribunal, à renúncia concomitante aos proventos da reserva remunerada.
O Plenário desta Corte, recentemente, ao julgar o RE 163.204, firmou o entendimento de que, em face da atual Constituição, não se podem acumular proventos com remuneração na atividade, quando os cargos efetivos de que decorrem ambas essas remunerações não sejam acumuláveis na atividade.
Improcedência da alegação de que, em se tratando de militar que aceita cargo civil permanente, a única restrição que ele sofre é a prevista no § 3° do art. 42: a de ser transferido para a reserva. A questão da acumulação de proventos com vencimentos, quer se trate de servidor público militar quer se trate de servidor público civil, se disciplina constitucionalmente de modo igual: os proventos não podem ser acumulados com os vencimentos.
Não sendo os proventos resultantes da reserva remunerada acumuláveis com os vencimentos do cargo de técnico judiciário, se o impetrante quiser tomar posse neste, deverá necessariamente optar por sua remuneração, porquanto não se pode exercer cargo público gratuitamente, o que implica dizer que terá de renunciar à percepção dos proventos resultantes da inatividade militar. (MS 22.182.8-RJ, julgado em 05/04/95, Rel. Min. Moreira Alves, DJU 10.08.95, RT 721/307)



24) ISONOMIA DE VENCIMENTOS

A Constituição Federal estabelece em seu artigo 39, § 1°: A lei assegurará, aos servidores da administração direta, isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados do mesmo Poder ou entre servidores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ressalvadas as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho.

É bom aditar que, o Congresso Nacional delegou ao Presidente da República, através de sua Resolução n° 1, de 30/07/92, publicada no DOU de 31.07.92, poderes para rever e instituir gratificações dos servidores, visando a isonomia. Eis o seu artigo 1°:

São delegados ao Presidente da República, com fundamento no art. 68 da Constituição Federal e para o fim específico de assegurar a isonomia nela referida no parágrafo 1° do art. 39, assim como observado o disposto no inciso IV do art. 37, os poderes necessários para, mediante leis, rever e instituir gratificações de atividades a serem atribuídas às categorias de seus servidores, civis e militares, que não possuam vantagens de idêntica natureza.



24) ESTATUTÁRIO X JUSTIÇA DO TRABALHO

Com o advento do Regime Único, na Administração Pública Direta, nas autarquias e nas Fundações Públicas, o regime jurídico de trabalho adotado a nível federal, para seus servidores, como vimos, foi o Estatutário, sendo banido em tais esferas o Celetista. A lei 8.112/90, em seu artigo 240, alínea e, assegura ao servidor público civil o direito de ajuizamento, individual e coletivo, frente à Justiça do Trabalho, nos termos da Constituição Federal, o qual foi vetado pelo Presidente da República, veto derrubado pelo Congresso Nacional, numa demonstração clara e indiscutível de que a intenção do legislador é atribuir competência à Justiça do Trabalho para processar e julgar dissídios individuais e coletivos entre servidores públicos e a União. A CF/88, por sua vez, dispõe em seu artigo 114, caput:

Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.

Em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, movida contra as alíneas d e e do citado art. 240, foi deferida a suspensão cautelar pelo STF da eficácia das disposições contidas nas alíneas d e da locução e coletivamente da alínea e. Com isto, ainda que liminarmente, foi afastada a possibilidade de ajuizamento de dissídio coletivo dos funcionários públicos civis da União, mas mantido o direito de ajuizar ações individuais na Justiça especializada.

José Ajuricaba da Costa e Silva, Ministro da Justiça do Trabalho, em tese apresentada no V Seminário sobre Direito Constitucional do Trabalho realizado em São Paulo, de 27 a 29 de outubro de 1991, considerou que:

AS JCJs, face à decisão do Supremo Tribunal Federal que rejeitou a liminar na ação direta de inconstitucionalidade do Artigo 240, alínea e, da Lei n.° 8.112/90, que dispôs sobre competência de foro somente para os servidores federais, são atualmente competentes para apreciar os dissídios individuais dos funcionários públicos civis da União; (...).

Nesta senda se posta a seguinte manifestação:

Merece acolhida a insurgência. A limitação do pedido aos servidores celetistas fere o princípio de igualdade de direitos, previsto no art. 5° da Constituição Federal. Ademais, o art. 114 do mesmo diploma legal ampliou de forma absoluta a competência da Justiça do Trabalho, atribuindo-lhe o poder de julgar e conciliar os dissídios individuais e coletivos surgidos entre trabalhadores e empregadores. Não foi por obra do acaso que o legislador constituinte substituiu a expressão "empregado" por "trabalhador", mas para, ampliando a competência desta Justiça, atribuir-lhe a solução não só dos litígios oriundos da relação empregatícia, mas de toda e qualquer relação de trabalho. E, com a possibilidade, garantida constitucionalmente, de se organizarem em sindicatos, os servidores públicos passaram a ter seus dissídios julgados por esta Justiça Especializada. Tendo poderes para julgar os dissídios coletivos, por óbvio, estende-se, também, a esta Justiça, os poderes para julgamento dos dissídios individuais. Assim, acolho a preliminar para que sejam incluídos na lide os autores relacionados à fl. 166.
Pelo exposto, acolho a preliminar de competência da Justiça do Trabalho e determino o retomo dos autos à origem para julgamento da ação com relação a todos os reclamantes. (Acórdão - 2ª Turma - n° 0188/92 - TRT/SC/RO - V 3775/91, Alda Isabel da Silveira Mello e outros X UFSC - Rel.: Juíza Júlia Mercedes Cury Figueiredo, Revista do TRT, 12ª região, Florianópolis)

Em sentido oposto, temos a decisão do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Conflito de Competência n° 1.580, de Rondônia, Processo n° 90.0012647-9, em que foi Relator o Ministro Eduardo Ribeiro, do seguinte teor:

Firma-se a competência pela natureza da lide. Se esta diz respeito a pretensões derivadas de vínculo estatutário, nada se pretendendo com base na legislação do trabalho, a competência é da justiça comum, não importando que a causa tenha sido rotulada de reclamação trabalhista. O art. 114 da Constituição afastou a possibilidade de submissão à Justiça Federal, de litígios trabalhistas envolvendo a União, como ocorria na vigência do texto anterior. Não importou ampliação da competência da Justiça especializada para questões pertinentes aos servidores estatutários.

Dignas de nota também os seguintes arrestos:

O art. 114 da Constituição da República estatui: "compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas." Nota-se, o dispositivo tem por objeto a competência para conciliar e julgar "dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores." Evidencia-se subjacente à hipótese relação jurídica disciplinada pelas leis trabalhistas, ou seja, entre o empregador e os chamados celetistas. Essa extensão, data venia, não se altera com a referência a - "entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta". Assim é porque, não obstante o regime único, persistem, apesar do caráter subsidiário, relações jurídicas com a administração pública direta e indireta, regidos pela CLT, ou regime especial, distinto do estatutário. Há mesmo quem sustenta que o regime único não alcançou todos os servidores. Ao contrário, somente os que haviam prestado concurso público de provas e títulos, exigência ainda contemplada pela Constituição. De outro lado, interpretação lógico-sistemática da Lei Maior impõe considerar serem da competência da Justiça Federal "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho" - art. 109, I. Extrai-se, então, data venia, esta conclusão: todas as ações, havendo o interesse referido, como regra, atraem a competência da Justiça Federal. Abrem-se quatro exceções: falência, acidente do trabalho e as causas sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. Sabe-se, a Justiça Federal é Justiça Comum, como a Justiça dos Estados. A Justiça do Trabalho é, porém, Justiça especial. Logo, para esta somente vão as causas expressamente mencionadas. A outra, sim, abarca as causas remanescentes.

NOTA: Indica o relator, em abono de sua tese, o precedente do STF, no RE 135.322-B-SP, Rel. Min. Ilmar Galvão (STJ -- unân. da 3.a Seç., publ. em 8-2-93 Conflito de Competência 3297-O-SC -- Min. Vicente Cernicchiaro - Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal em Santa Catarina X SUNAB -- Marcello Macedo Reblin e Luiz Carlos de Assis)

A Justiça do Trabalho possui, exata e estritamente, a competência objeto de atribuição inscrita no art. 114 da Constituição Federal. A circunstância de poderem ser solvidas outras controvérsias decorrentes de relação de trabalho - além das que envolvem empregados e empregadores e, independente da natureza jurídica destes, que são regidas pela legislação trabalhista - exige, antes de mais nada, que uma lei ordinária assim venha a dispor e que, efetivamente, se tenha uma relação de trabalho, com esta natureza, capaz de ter suas dissidências sujeitas à solução jurisdicional da Justiça Especializada. As questões de direito subjetivo público inerentes ao regime de direito administrativo que envolve Servidor Público Civil e Ente Público Estadual, ou Municipal, não podem ser dirimidas pela Justiça do Trabalho; a relação jurídico-administrativa entre estes não se constitui em relação de trabalho na acepção daquele art. 114 da Carta Magna, pois o pressuposto deste dispositivo fundamental é a contratualidade que não tem existência jurídica na relação de direito público, também conhecida como relação de direito administrativo. Nesta, a norma - lei - define e impõe obrigações públicas positivas e negativas, consubstanciando o chamado Estatuto, que difere substancialmente da relação contratual - submissa ao direito privado. Sendo imprescindível atribuição legal e natureza de relação de trabalho, a Justiça do Trabalho não pode decidir ações de estatutário estaduais ou municipais, versando direitos inerentes à relação de direito administrativo. (TRT- 3ª. R -- unân. da 1ª T., publ. em 26/11/92 -- RO 2411/91 -- Juiz Antônio Guimarães - Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor x Nilce Lopes Florencio)

A Súmula 97 do STJ estabelece, por sua vez, que o tempo em que o servidor público era Celetista, os direitos deverão ser pleiteados com estribo na CLT e ajuizado o dissídio na Justiça do Trabalho.
Danton de Almeida Segurado, em matéria publicada na Revista LTr observou:

será difícil a um Juiz Presidente de uma JCJ, após julgar uma questão de um trabalhador de empresa privada, onde aplicou os princípios protecionistas do Direito do Trabalho, julgar uma reclamação de natureza estatutária de um servidor público (...) (LTr - 56-10/1182)

O entendimento de Danton Segurado é compartilhado por Hely Lopes Meirelles.

Trata-se de matéria que jurisprudencialmente se firmou no sentida da incompetência da Justiça do Trabalho quando a matéria é servidor público. No caso dos agentes Federais a problemática é discutida na órbita da justiça federal (CF/88 - art. 109 - I) e no caso dos agente municipais e estaduais na justiça estadual.



25) DO ARTIGO 37 - IX DA CF/88

O art. 37, IX da CF/88 dispõe:

a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

De acordo com tal dispositivo Constitucional três são as condições básicas para a contratação do agente público por tempo determinado:

· existência de uma lei genérica, estabelecendo os casos da contratação, a exemplo do que fez o Governo Federal quando editou a Lei n.° 8.745/93 e não leis casuísticas;
· que o serviço (mais que o agente) a ser executado tenha natureza temporária;
· que não se possa de outra maneira dar conta do serviço.

Caso não se observem essas condições, as contratações firmadas ingressam na órbita da inconstitucionalidade.

A respeito da primeira das condições arroladas, isto é, uma lei única, genérica, veja-se a observação de Vera Loureiro Winter:

Quanto à competência para editar referida lei é de cada pessoa jurídica de direito público, com capacidade política, interessada. Cada qual, no exercício de sua autonomia, é que dirá, em face das peculiaridades de seus serviços, quais as situações ensejadoras da contratação de pessoal temporário, observados os parâmetros estabelecidos no mesmo inciso IX do art. 37, devendo a lei indicar as situações e às autoridades administrativas a verificação diante da situação concreta de sua aplicação à previsão abstrata na hipótese da norma.

O prazo de vigência deve ser o estritamente necessário ao atendimento da necessidade temporária especialmente qualificada. (Revista do Ministério Público do Trabalho, n° 9, março de 1995, pág. 93)

No mesmo passo, Sérgio Luiz Barbosa Neves, Procurador do Estado (RJ), que se reportando à lei referida no dispositivo constitucional, sempre, invariavelmente, alude aos casos, tendo-a , pois, como genérica. Exemplo: Assim, os Estados e Municípios podem e devem editar as suas próprias leis, estabelecendo os casos de contratação por tempo determinado.

E acrescenta:

As funções rotineiras da Administração Pública só podem ser exercidas por pessoas legalmente investidas em cargos públicos, na forma do art. 37, II, salvo os cargos de livre nomeação e exoneração. (Revista da Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região, n° 2, outubro de 1993, pág. 109 e seguintes.

O Juiz do Trabalho Jony Carlo Poeta observou:

Dessa forma, os Municípios no âmbito de sua competência privativa deveriam promulgar lei contemplando os caos em que seria possível a contratação excepcional, que por sua própria origem estariam dispensados do exame prévio.

Todavia, não foi isto que o Município de Araranguá realizou, uma vez que editou a Lei n.° 1.151/89 que em seu artigo 91 simplesmente reproduziu o ditame constitucional acima transcrito fazendo referência ao mesmo, vejamos:

Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a contratar pessoal, por prazo determinado, para atender as necessidades de excepcional interesse público, em regime especial, nas áreas da saúde e bem estar social, educação e administração, conforme prevê o artigo 37, IX, da Constituição Federal, até a realização do competente concurso público.

Ora, salta aos olhos a ineficácia do dispositivo retro, uma vez que não disciplinou o artigo 37, inciso IX da Constituição da República, mas tão-somente reproduziu seus termos, não definindo quais os casos em que poderia ocorrer a contratação excepcional, ao invés disto preferiu abranger a possibilidade de contratação sem concurso para todos os setores da Administração Pública. Assim, se considerarmos por este prisma, a referida lei é inquinada de inconstitucionalidade, já se analisado sob a ótica de que realmente visou regulamentar o artigo 37, IX da Carta Política (entendimento que deve prevalecer, face aos princípios que norteiam a Administração Pública), resta declarar a inexistência de lei a regulamentar a contratação excepcional prevista no inciso IX, do mesmo Diploma Legal no Município de Araranguá, pois como visto, o artigo 91 da Lei n.° 1.151/89 simplesmente copiou o mandamento constitucional e de forma alguma o regulamentou. ( JCJ de Araranguá, autos n.° 0851/95, Ação Civil Pública, Ministério Público do Trabalho X Município de Araranguá)

No que tange a Temporariedade colhe-se em Adilson de Abreu Dallari que:

está absolutamente claro que não mais se pode admitir pessoal por prazo determinado para exercer funções permanentes, pois o trabalho a ser executado precisa ser, também, eventual ou temporário, além do que a contratação somente se justifica para atender a um interesse público qualificado como excepcional, ou seja, uma situação extremamente importante, que não possa ser atendida de outra forma. (Regime Constitucional dos Servidores Públicos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990, pág. 124)

Confirmando o indispensável caráter temporário do serviço a ser prestado, ensina Celso Antônio Bandeira de Mello que tal serviço deve:

desgarrar da normalidade das situações e presumir admitido apenas provisoriamente, eis que demandado em circunstâncias incomuns.(Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994, pág. 136)

Para o já citado Sérgio Barbosa Neves, uma das finalidades do art. 37, IX, é

conferir à Administração Pública maior agilidade na contratação de pessoal para fazer frente a uma situação urgente, emergencial e efêmera.

Em outro momento, grava o antecedente articulista, o pressuposto autorizador desse tipo de contratação, a temporariedade da necessidade a ser atendida, exemplificando com um surto epidêmico que é de natureza temporária e eventual.

Eis uma decisão, num caso de ação civil pública, cuja transcrição é pertinente, vez que se enquadra a todas as funções essenciais do Estado:

A atividade na área de educação não está enquadrada na hipótese restrita do artigo 37, IX, da CF/88, uma vez que a sua atividade laboral não visa a atender a necessidade temporária de excepcional interesse público; isso não porque o magistério estadual não seja atividade de excepcional interesse público; mas porque não se caracteriza como sendo atividade a merecer contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária. (TST, ROAR n° 0000533, Rel. Min. Prates de Macedo, DJU de 07/12/89, pág. 18035)

No que tange ao excepcional interesse público, a dicção de Sérgio Neves, refere-se à emergencialidade e à urgência de uma situação que refoge à rotina administrativa, sendo, portanto, de exceção.

Ratificando a excepcionalidade da contratação por tempo certo, assenta Celso Ribeiro Bastos que é de:

excepcional interesse a sua necessidade quando for premente, imperiosa para que determinado serviço funcione em condições satisfatórias mínimas. E é premente a necessidade quando, se não atendida mediante contratação de pessoal temporário, não haja outra forma de igual eficácia para evitar o perecimento ou grave prejuízo para o serviço. (in Comentários à Constituição do Brasil, Vol. III. São Paulo: Saraiva, 1992. Pág. 102)

Não é difícil concluir, portanto, que a situação de excepcionalidade é a que resulta de circunstâncias imprevisíveis pela Administração e não a que, pela sua inércia, tenha dado causa a uma hipótese de emergência, com a omissão de realizar concursos públicos para provimento dos cargos vagos ou de nomear os aprovados em concurso público, caso já realizados.

Lembre-se que a CLT, em seu artigo 445, dispõe: O contrato de trabalho por prazo determinado não poderá ser estipulado por mais de 2 (dois) anos (...)

Frise-se que muitas das legislações aprovadas com estribo no artigo Constitucional, ora sobre análise, adotam o regime celetista.

Daí a pergunta e se for estipulado tais contratações temporárias por mais de dois anos, quais as conseqüências?

Conforme ensina Orlando Gomes, é ponto pacífico na doutrina e na jurisprudência, acolhido em nossa legislação, que a superação do prazo de 2 (dois) anos tem por efeito específico converter o contrato por prazo determinado em contrato por prazo indeterminado. Eis que ao primeiro contrato por prazo determinado não se segue outro com a mesma duração. (Curso de Direito do Trabalho, Rio de Janeiro: Forense, 1990, pág. 197).

E assim ocorrendo no âmbito trabalhista, o que antes não incidiria por força do prazo determinado do contrato, passa então a incidir, como é o caso do aviso-prévio e da multa de 40% sobre os depósitos do FGTS, dentre outras conseqüências.

Frise-se também que a contratação temporária é a exceção e a contratação por concurso público a regra. Ensina Hely Lopes Meirelles que o concurso público é:

o meio técnico posto à disposição da Administração para obter moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, consoante determina o art. 37, II, da CF/88. Pelo concurso afastam-se, pois, os ineptos e os apaniguados, que costumam abarrotar as repartições, num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulo de políticos que se alçam e se mantém no poder leiloando empregos públicos.

Neste sentido o MS n.° 5.241, da Capital.

O Mesmo Jony Carlo Poeta observa noutro trecho do citado decisum:

É sabido que, após a promulgação da constituição da República em 05/10/88, tanto a Administração Direta como a Indireta estão expressamente proibidas de proceder a contratação de empregados sem a prévia aprovação em concurso público.

(...)

Tal medida se justifica por vários pontos, quer da melhoria e ascensão do serviço público a ser prestado à toda população que já estava cansada de ser mal atendida por seus operadores, quer pelo fim do apadrinhamento e moralização nas contratações de servidores e empregados públicos que deixam de lado os requisitos parentesco e favor político para dar lugar à eficiência e competência, requisitos estes indispensáveis para o bom andamento dos serviços a serem prestados à sociedade.

Compondo o réu a Administração Direta, estava proibido de proceder a contratação de pessoal sem a prévia aprovação em concurso público, sob pena de nulidade da contratação (art. 37, parágrafo 2° da CF), salvo os caso de cargos em comissão.
A própria Carta Política prevê a possibilidade de contratação de empregados por tempo determinado para atender a necessidades temporárias de excepcional interesse público (art. 37, IX), todavia condiciona o regramento destas contratações à lei a ser editada e, como restou acima decidido não existe lei a regulamentar este dispositivo constitucional.

Por estes motivos de ordem constitucional e moral, declaro nulos todos os contratos individuais de trabalho celebrados a partir de 05/10/88, inclusive. Por conseqüência, devem ser afastados do serviço público municipal todos os empregados cujos contratos acima foram considerados nulos.

Outras Cortes do país vem sublinhando:

Nulidade do contrato. Servidor público admitido sem concurso - Artigo trinta e sete, inciso dois, da Constituição Federal. O provimento de cargos ou empregos na administração pública pressupõe prévio ato de investidura ou admissão. O contrato realidade não pode se sobrepor à ordem constitucional consubstanciada na exigência de concurso público. Todavia, a contratação irregular de servidor público torna impossível a recondução das partes ao status quo ante e, neste caso, o trabalhador tem direito aos salários do período trabalhado a título de indenização, mas a nenhuma outra parcela de natureza trabalhista. Revista provida. (Recurso de Revista n.° 0168524, MG, 3ª Região, Min. Regina Fátima Abrantes Rezende Ezequiel, julgado em 10/04/96, DJ 03/05/96, pág. 14207)
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DOMÍNIO PÚBLICO





1) NOÇÕES GERAIS

Antes de examinarmos a matéria concernente a dominialidade pública precisamos, primeiro, tecer alguns comentários sobre o que devemos entender por coisas e bens.

Coisa é tudo aquilo que constitui ou pode constituir objeto do direito.

Já a palavra bens designa tudo aquilo que pode gerar utilidade prática na vida material (real) ou imaterial, quer dizer, aquilo que pode constituir objeto de fruição humana.

Cretella Júnior, observa que bens são as coisas que podem constituir objeto de tutela jurídica.

A coisa, para nós, é o genérico, tudo aquilo que existe no mundo. Bem é a coisa passível de apropriação e gozo, a espécie. Os bens ideais ou denominados imateriais são constituídos por atividades, por comportamentos humanos, denominados prestações pela doutrina dominante. Podemos concluir dizendo que bem é coisa categorizada, matizada de juridicidade, com que trabalha o jurista.

É o objeto de direito, isto é, tudo aquilo que, sendo útil e externo à pessoa, forma o conteúdo de um interesse desta pessoa e, pois, da relativa tutela jurídica, consoante a lição do citado administrativista.



2) PATRIMÔNIO PÚBLICO

2.1) Noção:

O Patrimônio Público é formado por bens de toda natureza e espécie que tenham interesse para a Administração e para toda comunidade administrada. Tais bens, denominados bens públicos, sofrem uma intensa classificação e destinação legal para sua correta administração, utilização e alienação, conforme veremos doravante.

2.2) Conceito

Bens Públicos, conceitualmente e em sentido amplo, segundo o magistério de Hely, são todas as coisas corpóreas ou incorpóreas, móveis ou imóveis e semoventes, e ainda créditos, direitos e ações que pertençam a qualquer título, às entidades estatais, autárquicas e paraestatais.

São, em outras palavras, as coisas materiais ou imateriais, assim como as prestações, vinculadas às pessoas jurídicas públicas que objetivam fins públicos e estão sujeitas a um regime jurídico especial, derrogatório ou exorbitante do direito comum.

Sendo assim, os bens públicos integram a dominialidade pública ou o chamado domínio público. Neste sentido, a dominialidade pública compreende o conjunto dos bens destinados à satisfação das necessidades públicas.

2.3) Administração de Bens Públicos

Os bens públicos, é bom que se interiorize, ou se destinam ao uso comum do povo ou ao uso especial da administração. Em qualquer desses casos o Estado interfere com o seu poder de administrador, disciplinando e policiando a conduta do público e dos usuários especiais, a fim de assegurar a conservação dos bens e possibilitar a sua normal utilização, tanto pela coletividade, quanto pelos indivíduos, como ainda pelas repartições públicas.

No conceito de administração de bens se compreende normalmente o poder de utilização e conservação das coisas administradas, diversamente da idéia de propriedade, que contém, além desse, o poder de oneração e disponibilidade e a faculdade de aquisição. Daí porque os atos triviais de administração, ou seja, de utilização e conservação do patrimônio, independem de autorização especial, ao passo que os de alienação, oneração e aquisição, como veremos, exigem, em regra lei autorizativa e licitação prévia para o contrato respectivo.

2.4) Classificação dos Bens.

Em nosso sistema federativo, os bens públicos podem ser da União, dos Estados e dos Municipais, conforme a entidade política a que pertençam, ou o serviço autárquico ou paraestatal a que se vinculem.

Contudo, todos os bens públicos são bens nacionais por integrarem o patrimônio da Nação, na sua unicidade estatal, embora politicamente pertençam a cada uma das entidades públicas referidas e que os adquiriu ou os mantém incorporados em seu acervo ou patrimônio.

O Código Civil Brasileiro (CCB - art. 66) divide os bens públicos em três categorias:

a) Bens de Uso Comum ou Bens de domínio Público: Devemos entender como contidos nesta espécie classificatória todos aqueles bens públicos a que se reconheça fruição à coletividade em geral, sem discriminação de usuários ou ordem especial para uso. São, como a própria lei exemplifica, os mares, os rios, as estradas, as ruas, as praças e todos os locais abertos à utilização pública.

b) Bens de Uso Especial ou do Patrimônio Administrativo: são aqueles especialmente destinados à execução dos serviços públicos, por isso mesmo considerados instrumentos da realização desses serviços. Estes bens são também chamados bens patrimoniais indisponíveis. São especiais porque passíveis de uso especial por particulares, desde que sua utilização, consentida pela Administração, não os leve à inutilização ou destruição. Não precisam necessariamente integrar a Administração, mas constituem seu aparelhamento administrativo. São exemplos os edifícios públicos, as escolas, hospitais e Bibliotecas públicas, os terrenos a serviço do Governo das três esferas de poder.

c) Bens Dominiais, Dominicais ou do Patrimônio Disponível: São os que, embora integrando o domínio público, como os demais, deles se diferenciam pela possibilidade que têm de serem utilizados em qualquer fim, até mesmo para serem alienados pela Administração. Sobre tais bens a Administração exerce poderes de proprietário, do ponto de vista constitucional e administrativo. São exemplos as terras devolutas, ações, etc.

Todos os bens vinculados ao Poder Público por relações de domínio ou de serviço, ficam sujeitos à sua administração. Daí o dizer-se que uns são bens do domínio Público, e outros, bens do patrimônio administrativo.

2.5) Regime Jurídico Relativo aos Bens Públicos: Origem da Dominialidade

Quanto ao tema podemos afirmar que o regime jurídico dos bens públicos apresenta-se como um conjunto de regras com a característica de globalidade e autonomia, rejeitando em bloco o direito privado.

Referindo-se aos bens que fazem parte da dominialidade pública, seu regime jurídico superpõe-se às regras do direito de propriedade, tais como as coloca o direito civil, posto que estão em jogo princípios específicos, que se distinguem na seara pública, cuja sistemática, ao contrário do direito privado não se estriba na bilateralidade das relações jurídicas.

Diante destas diferenças os bens públicos são prestigiados pelas cláusulas da inalienabilidade, imprescritibilidade e pela não oneração que lhes conforma o regime jurídico próprio, ao contrário das regras civilistas.

Vejamos a razão de ser desses atributos, que têm embasamentos constitucionais e legais, além de encontrarem plena justificação na praxes administrativa:

A inalienabilidade dos bens públicos, assegurada, em nosso Direito, desde a Constituição Imperial de 1824 (art. 15, n° 15), é o atributo daquilo que não pode ser transferido, disposto ou alienado: que não passa de um domínio para outro. É a qualidade que impede a transferência (venda, doação, permuta), a terceiros, de bens assim considerados. A inalienabilidade, apesar disso, pode ser levantada, isto é, retirada de certo bem público mediante lei, conforme autoriza o art. 67 do CCB.

Pela imprescritibilidade é protegida a propriedade dos bens públicos, quando terceiros visam adquiri-la através de usucapião. Os bens públicos, qualquer que seja a espécie ou natureza, não podem ser usucapidos, salvo as exceções legais. Aliás, essa vedação está expressamente consignada em dois dispositivos da Constituição Federal. Com efeito, no § 3° do art. 183, e no parágrafo único do art. 191, o constituinte estabeleceu: Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. O dispositivo está preordenado para proteger os bens imóveis contra os atos de aquisição pelo instituto da usucapião, sem vedar, como se poderia supor num rápido exame, a aquisição de bens por esse modo pelo Poder Público. Por último, diga-se que a proteção só alcança os bens imóveis. Os móveis, então, poderiam ser usucapidos.

A impenhorabilidade resguarda os bens públicos, não permitindo que sobre eles recaia penhora. A esse respeito, prescreve o Código de Processo Civil que os bens inalienáveis são absolutamente impenhoráveis (art. 649, I). Por essa razão é que não se inicia pela penhora o processo de execução contra a Administração Pública, nem o executório quando é movido por pessoa jurídicas de direito público contra outras entidades da mesma espécie serão estribadas na Lei de Execução Fiscal. O processo no caso, observa o que estabelece o art. 100 da Constituição Federal, de onde decorre tal atributo. Admite-se, entretanto, o seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito, desde que ocorram certas condições processuais. Os tribunais vem decidindo acerca da matéria:

O fato de serem impenhoráveis os bens públicos, não significa que a Prefeitura não possa ser executada judicialmente. Aplicam-se, na hipótese, os artigos 730 e 731 do CPC. - Decorrendo, todavia, mais de 5 anos entre o lançamento do tributo e o ajuizamento da cobrança, observado o critério do artigo 174 do CTN, o crédito extingue-se pela prescrição, ainda que de natureza previdenciária. (TRF/2a. Reg. Remessa Ex-Officio n. 90.02.09882-0 - Rio de Janeiro - Ac. 1a. T. - unân. - Rel.: Des. Fed. Clélio Erthal - j. em 31.03.92 - Fonte: DJU II, 07.04.92, pág. 8301, Bonijuris 11954). Processual Civil. Tributário. Fazenda Pública. Execução de seus débitos. 1. O Instituto Nacional da Seguridade Social - INSS é entidade autárquica federal e, como tal, inclui-se no conceito de Fazenda Pública. 2. Excetuados os créditos de natureza alimentar contra a Fazenda Pública(art. 100 da C.F.) sujeitam-se os demais a requisição com observância da ordem cronológica dos precatórios (art. 730 - I - CPC) 3. Agravo provido. (in D.O.E. de 12.11.90, pág. 128, Rel. juiz Sérgio Lazzarini, 3ª T., TRF da 3ª Região)

Da conjugação da Impenhorabilidade e inalienabilidade exsurge a impossibilidade de oneração dos bens públicos. O administrador público (Prefeito, Governador, Presidente) não pode gravar livremente os bens os quais estão sob sua guarda, conservação e aprimoramento. Em outras palavras, esses agentes, porque não são donos desses bens, não podem onerá-los. Inexiste, pois, em tese, a possibilidade de serem os bens públicos gravados com penhora, hipoteca ou anticrese. Destarte, sobre tais bens não pode incidir qualquer dessas garantias, pois só quem pode alienar a propriedade pode hipotecar, dar em anticrese e empenhar, conforme estatui o art. 756 do Código Civil, e ditas autoridades não são seguramente, as proprietárias desses bens. Qualquer dessas garantias o Administrador Público só pode oferecer se expressamente autorizado por lei. Igualmente se pode dizer em relação à concessão de uso e à concessão de direito real de uso, institutos que propiciam o ajuste da transferência do uso de bem público. Estes só podem ser celebrados se preexistir lei autorizadora.

2.6) Aquisição dos Bens Públicos

O Estado no desempenho normal de sua administração, adquire bens de toda espécie e os incorpora ao patrimônio público para a consecução de seus fins. Essas aquisições ou são feitas contratualmente, pelos instrumentos comuns do direito privado, sob a forma de compra, direta ou mediante procedimento licitatório, permuta, doação, dação em pagamento, ou se realizam compulsoriamente por desapropriação ou adjudicação em execução de sentença, ou, ainda, se efetivam por força de lei na destinação de áreas públicas nos loteamentos e nas concessões de domínio de terras devolutas.

2.7) Formas de Utilização dos Bens Públicos por Terceiros

Os bens de uso especial do Estado poderão ser usados por particulares, desde que haja algum interesse público nesse uso.

As formas administrativas mais usuais para o uso são:

a) Autorização de uso é ato unilateral, discricionário e precário pelo qual a Administração consente na prática de determinada atividade individual incidente sobre um bem público. É feita sem forma ou requisitos especiais para sua efetivação pois visa apenas atividades transitórias e irrelevantes do Poder Público, bastando um ato escrito e revogável a qualquer tempo.

b) Permissão de uso é o ato negocial, unilateral, discricionário e precário, através do qual a Administração faculta ao particular a utilização individual de determinado bem público. Pode ser com ou sem condições, gratuito ou remunerado, por tempo certo ou indeterminado, conforme for estipulado. Ex.: Permissão para funcionamento de bancas de revistas, quiosques em praças públicas, etc.
c) Cessão de uso é a transferência gratuita da posse de um bem público de uma entidade ou órgão, para outro, a fim de que o cessionário o utilize nas condições estabelecidas no respectivo termo, por tempo certo ou indeterminado. É ato de colaboração entre repartições públicas onde cede seus bens inservíveis a outra que deles precisa. Assemelha-se ao comodato.

d) Concessão de uso é o contrato administrativo pelo qual o Poder Público atribui a utilização exclusiva de um bem de seu domínio para um particular, para que este o explore segundo a destinação específica. Também é dada para conceder a exploração de serviços (transportes urbanos, etc.)
e) Enfiteuse ou aforamento é o instituto civil que permite ao proprietário atribuir a outrem o domínio útil de imóvel, pagando a pessoa que adquire ( o enfiteuta) ao senhorio direto, uma pensão ou foro, anual, certo e invariável (CCB, art. 678). Consiste pois na transferência do domínio útil de um imóvel público, a posse, uso e gozo perpétuos da pessoa que irá utilizá-la daí por diante.


2.8) Formas de Alienação de Bens Públicos

Alienação, nada mais é do que toda transferência, gratuita ou onerosa, de propriedade de um bem, seja por venda, permuta (troca), doação, dação em pagamento (entrega de um bem que não seja dinheiro para saldar uma dívida em substituição da prestação antes devida), investidura (incorporação de uma área pública remanescente e inaproveitável por um proprietário de terreno particular confinante que ficou afastado do novo alinhamento da rua em virtude de outro traçado urbano), legitimação de posse ou concessão de domínio (utilizada para conceder terras devolutas da União, Estados ou Municípios).

Embora o art. 67 do CCB estabeleça, como regra geral, a inalienabilidade dos bens públicos, verdade é que, quaisquer que sejam eles, poderão ser alienados, desde que a Administração satisfaça prévios requisitos para sua transferência, seja para o setor privado ou para outro ente público.

O que a lei quer dizer é que os bens públicos são inalienáveis apenas enquanto destinados ao uso do serviço, ou seja, enquanto tiverem destinação pública específica e só serão alienáveis, dependendo naturalmente, da existência do interesse público, devidamente justificado.

A alienação de bens imóveis sujeita-se à legislação própria, exigindo-se autorização legislativa, avaliação prévia, licitação, etc. Já para os bens móveis e para os semoventes (burros, bois, cavalos,...) não há normas rígidas, exigindo-se apenas avaliação prévia e regular processo de baixa no patrimônio. Há, ainda, uma forma excepcional de alienação de bem público, restrita a terras devolutas, que é a denominada legitimação de posse.


2.9) Titularidade dos Bens Públicos

Antes de tudo, devemos esclarecer que titular é o sujeito de direito. Os titulares dos bens públicos são as pessoas jurídicas de direito público. E os beneficiários são o povo e por vezes os próprios agentes públicos, note-se, verbia gratia, os apartamentos funcionais.

Na Administração, beneficiários desses bens são as pessoas do povo, o cidadão contribuinte, os administradores públicos.

Na lição de José Cretella Júnior, os titulares dos bens do patrimônio indisponível, ou seja, dos bens de uso especial, são as pessoas jurídicas de direito público a quem pertençam estes bens, que são, em geral, edifício ou terrenos e os móveis desses edifícios, bem como as construções sobre esses terrenos.

O beneficiário por vezes é o povo e a utilização é quase sempre feita pela pessoa jurídica de direito público a que se acham vinculados esses bens.

Na verdade, os bens do patrimônio disponível ou bens dominicais podem ser designados pelo verbo pertencer. Isto porque eles pertencem, ou seja, são bens do domínio privado do Estado. Logo, o Estado é titular desses bens e pode vendê-los, aliená-los, na medida em que o Estado é proprietário.

2.10) Afetação e Desafetação

Afetação é o ato ou fato pelo qual se dá a um bem de propriedade pública uma destinação especial. Afetar é destinar, consagrar, batizar determinados bens para fins específicos. Difere, portanto, da aquisição (quando o bem passa a fazer parte do patrimônio da Administração Pública) ou da incorporação (quando o bem se torna de domínio público). Pela afetação, o bem passa a ser regulado por regime jurídico diverso do que vigora no campo do direito privado. Desafetação é o ato que produz efeitos contrários à afetação.

2.11) Os Bens Públicos do Estado Brasileiro

Segundo a CF/88, os bens públicos são destacados em seus artigos 20 et 26, verbis:

Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;
II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei;
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;
IV - as ilhas fluviais e lacustres nos zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as áreas referidas no art. 26, II;
V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;
VI - o mar territorial;
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;
VIII - os potenciais de energia hidráulica;
IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;
X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos;
XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.
§ 1º É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como órgãos da administração direta do União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.
§ 2º A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei.
(..)
Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados:
I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União;
II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros;
III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União;
IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União.

Destes dois dispositivos constitucionais faz-se necessário aclarar o que seja:

· Terras Devolutas: Segundo o Decreto-Lei n° 9.760, de 05.09.46, terras devolutas são as que, não sendo próprias nem aplicadas a algum uso público, não se incorporam ao domínio privado.

· Plataforma Continental: é o prolongamento das terras continentais sob o mar, até a profundidade aproximada de 200 metros, a partir da qual o solo submarino descendente abruptamente para as regiões pelágicas (oceânica) e abissais. Na Constituição anterior era denominada plataforma submarina. Sua extensão pode até superar o mar territorial e é rica em minerais e fauna e flora marinha.

· Mar Territorial: está fixado numa faixa de 200 milhas marítimas de largura, medidas a partir do beira-mar do litoral continental e insular do Brasil, adotado como referência em nossas costas náuticas (Dec.-lei n° 1.098/70). No mar territorial, inclusive seu leito, subsolo e espaço aéreo, o Brasil exerce todos os seus direitos de soberania e domínio.

· Terrenos de Marinha: Conforme o Decreto-Lei n° 9.760, de 05.09.46, acima referido, terrenos de marinha são os que têm profundidade de 33 metros (medidos horizontalmente, para a parte da terra, da linha do preamar médio de 1831), situados na costa marítima, nos rios e lagos navegáveis, bem como nas ilhas onde se faça sentir a influência das marés.

2.12) Patrimônio Histórico

O Poder do Estado é exercido ainda sobre os bens e locais particulares, de interesse público, tais como, obras, monumentos, recantos naturais, documentos, etc., que passam a integrar o patrimônio histórico e cultural ou artístico da Nação, os quais passam ao domínio público, mediante o tombamento.

O Patrimônio Histórico e artístico cultural abrange todos os bens, móveis e imóveis, existentes no País, cuja conservação seja de interesse público, por sua vinculação a fatos memoráveis da história da pátria, ou por seu excepcional valor artístico, arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou ambiental, no magistério de Hely Lopes Meirelles.

Tombamento, por sua vez, é a declaração do valor histórico, pelo Poder Público, ou do valor artístico, paisagístico, turístico, cultural, etc., de coisas ou locais que, por essa razão devem ser preservados, de acordo com inscrição em livro próprio, conforme prevê o art. 216, § 1° da CF/88.


2.13) Dominialidade dos Recurso Minerais

A matéria nos é disciplinada pelo Código de Minas. Elias Bedran assevera-nos:

A preocupação do legislador na feitura do código (de minas), foi transferir à União a propriedade das jazidas ou minas enquanto tivessem elas valor comercial, isto é, que compensasse a sua exploração. Em hipótese negativa, a propriedade do subsolo, continua, apadrinhada pelo direito comum que é o Código Civil.



E assim:

... é que o Código de Minas, incorporando a propriedade das jazidas e minas ao domínio da União, introduziu o princípio da dominialização das riquezas minerais entre nós. (A mineração à luz do direito brasileiro. Comentário, doutrina e jurisprudência. Vol. 1. Rio de Janeiro: Alba, 1957, pág. 53)

Seguindo a mesma orientação o professor Attílio Vivácqua, em obra de fôlego incisivamente destaca que:

A propriedade mineral, ou resulta do desdobramento do domínio do superficiário ou da concessão governamental, constitue-se e funciona, cada vez mais, fora do sistema privatístico. Ela deixou definitivamente de ser um capítulo do Código Civil. Na quase totalidade das nações civilizadas, as minas fazem parte do domínio público, numas pela transformação histórica dos bens da coroa em bens do Estado, ou em conseqüência da remodelação do regime político, no sentido socialista, como na Rússia, noutras, por motivos e circunstâncias atinentes à defesa nacional, e ainda em virtude de fatores de ordem econômica e social. (A nova política do subsolo e o regime legal das minas. Rio de Janeiro: Panamericana, 1942, pág. 443)

E, adiante, ressalta com propriedade:

A liberação da mina das mãos do proprietário territorial, e sua elevação à categoria de bem público, tem justamente por escopo colocar seu aproveitamento à disposição de maior número de mineradores. Estes, para empreenderem uma indústria como a mineração, que em seus amplos moldes exige fortes recursos financeiros e técnicos, precisam de segurança de uma propriedade mineral. (Op. Cit.)

Tecendo considerações acerca da acessoriedade ou não dos recursos minerais em relação ao solo, preleciona o emérito Professor Pontes de Miranda em parecer de sua lavra:

No sistema da Constituição de 1891, antes da lei n.° 4.265, de 15 de janeiro de 1921 (art. 5.°), a propriedade das jazidas minerais ou, melhor, das minas era, como a de produtos orgânicos, direito incluído no de domínio. A mina, era, portanto, parte integrante essencial. (O Código Civil, art. 61, n.° 1, revelou bem parca previsão terminológica, atribuindo relação de acessoriedade aos produtos orgânicos). Os produtos orgânicos ou são partes integrantes ou se separam e são coisas à parte; e, sendo coisas à parte, podem ser pertenças. A mina era parte integrante essencial do solo. Chama-se parte integrante essencial parte integrante que não pode ser objeto de direito real separado. Não posso alienar o edifício (no direito brasileiro) sem o terreno; no direito que foi o nosso entre 1891 e 1921, a mina sendo parte integrante essencial, não era suscetível de direito real em separado. No texto da Constituição de 1946, o art. 152 disse que as minas e demais riquezas do subsolo, bem como as quedas de água, constituem propriedade distinta da do solo para o efeito de exploração ou aproveitamento industrial. Naturalmente, é a lei que dá os limites ao conteúdo do direito de propriedade, inclusive das minas; ... (Pontes de Miranda e Francisco Campos. Direitos Minerais sobre minas conhecidas antes de 1934. Pareceres dos Drs. Pontes de Miranda e Francisco Campos in Separata da Revista dos Tribunais, Vol. 343, São Paulo, maio de 1964, pág. 13)

Ensina o Professor Francisco Campos acerca do tema também em parecer:

Resulta dos citados dispositivos constitucionais, de 1934 e 1937, modificados pelo art. 21 do ato das Disposições Transitórias da Constituição de 1946, que as minas em lavra, ainda que transitoriamente suspensa, em 16 de julho de 1934, não foram incluídas no domínio público pelos atos constitucionais que incorporam as riquezas minerais a esse domínio. As minas referidas no § 62 do art. 119 da Constituição de 1934 continuam no domínio privado, como decorre do preceito constitucional que exime a sua lavra de qualquer concessão ou autorização. Criou-se para as riquezas minerais um regime exorbitante do direito comum e análogo ao do domínio público que só poderá ser utilizado mediante concessão ou autorização. (Op. Cit.)



Willian Freire a seu turno observa:

Após 21 anos de experiência da última Carta Política e do Código de Mineração, os constituintes de 1988 introduziram, o regime do domínio federal. Os depósitos minerais passaram a propriedade da União, que obrigatoriamente concede sua exploração ao particular. Assumiu-se posição idêntica a de vários países de tradição mineira, que têm suas reservas como bens inalienáveis da União, a exemplo da Constituição Chilena, de 1980 (art. 24), disposto que o Estado tem o domínio absoluto, exclusivo, inalienável e imprescindível sobre todas as minas exceto as argilas superficiais, não obstante propriedade das pessoas físicas e jurídicas sobre as áreas em que estiveram situadas.O regime de domínio federal encerra maior preocupação com a transformação do depósito mineral em riqueza do que com a titularidade da mina. Não se transfere uma propriedade dominial sobre a mina, mas apenas o direito de explorá-la.(Comentários ao Código de Mineração. Rio de Janeiro: Aide, 1995, pág. 18/9).


No que tange a dominialidade dos recursos minerais temos todo um vocabulário que lhe é próprio. Vejamos:

· Jazida: Considera-se jazida toda massa individualizada de substância mineral ou fóssil, aflorando à superfície ou existente no interior da terra, e que tenha valor econômico. (Código de Mineração, art. 4.°)

· Mina: ... e mina, a jazida em lavra, ainda que suspensa. (Código de Mineração, art. 4.°)

· Mineral: Elemento ou composto químico formado, em geral, por processos inorgânicos e, qual tem uma composição química definida e ocorre naturalmente na crosta terrestre.

· Minério: Mineral ou associação de minerais, dos quais se podem extrair metais ou substâncias não metálicas por processo físico, químico ou térmico e com vantagem econômica.

· Minas manifestadas: São aquelas minas conhecidas, que já existiam anteriormente ao advento do Código de Minas de 1934, e que foram manifestadas. É a mina em lavra, ainda que transitoriamente suspensa a 16/07/37 e que tenha sido manifestada na conformidade do artigo 10 do Decreto n.° 24.642 de 10/07/54 e de Lei n.° 94 de 10/09/35. A mina manifestada tem sua origem na necessidade de respeito ao direito adquirido, oriundo da teoria acessionista consagrada pela Primeira Constituição da República (art. 72 § 17, alínea a). Destarte, distingue-se as jazidas e minas conhecidas das desconhecidas ou nas manifestadas pela singularidade das primeiras serem de propriedade de seus mineradores, enquanto que as segundas são da união.

· Mina Concedida: Quando o direito de lavra é consubstanciado em decreto outorgado pelo Governo Federal.

· Superficiário: Tal termo é usado na doutrina e jurisprudência para indicar o proprietário posseiro do terreno onde se encontra encravada a mina. O legislador preferiu as expressões proprietário do solo e posseiro e apenas uma vez usou a expressão superficiário, qual seja, o art. 38, item IV do Código de Mineração (Decreto-Lei n.° 227, de 28 de janeiro de 1967) e em seu correspondente regulamento (Decreto n.° 62.934, de 2 de julho de 1968) no art. 48, IV.

· Direito Minerário: Direito minerário, segundo Sérgio Gomes Muñoz é precisamente o conjunto de normas jurídicas aplicáveis à exploração e beneficiamento das substâncias minerais, e que regula a atividade dos concessionários e da mineração em geral. (Manual de Derecho de Mineria, pág. 15) Apesar de inúmeros pontos de contato do direito minerário ou direito mineral com vários ramos do direito público e do direito privado, pois recorre aos princípios de direito constitucional; de direito civil e principalmente de direito administrativo, o certo é que o direito mineral, atualmente, pode ser encarado como um direito autônomo, estruturado, e constituído por princípios, normas próprias, que lhe conferem características especiais de autonomia e independência.

· Pesquisa Mineral: Entende-se por pesquisa (art. 14 do Código de Mineração, Decreto-Lei n.° 227, de 28/02/67) a execução dos trabalhos necessários à definição de uma jazida, sua avaliação e a determinação da exeqüibilidade de seu aproveitamento econômico.

· Lavra: Segundo o art. 36 do Código de Mineração: Entende-se por lavra o conjunto de operações coordenadas objetivando o aproveitamento industrial da jazida, desde a extração de substâncias minerais úteis que contiver, até o beneficiamento das mesmas.


11
INTERVENÇÃO DO
ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO





1) NOÇÃO INTRODUTÓRIA

A propriedade privada não é mais absoluta. Seu gozo, fruição e disposição não podem se opor aos interesses gerais. Mesmo em países como o nosso, em que a CF assegura a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, ela não é um direito absoluto e subjetivo do proprietário, vez que está condicionada a uma função social (CF/88 - 170, III), ou seja, é um direito individual condicionado ao bem-estar da comunidade. E bem-estar social é o chamado bem-estar, o bem do povo em geral, expresso sob todas as formas de satisfação das necessidades comunitárias.

Domínio econômico, por sua vez, é o conjunto de bens e riquezas dos particulares, a serviço das atividades de fins lucrativos, voltados ao interesse social e ao desenvolvimento nacional.

A CF/88 diz claramente:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias.
§ 2º As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.
§ 3º A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.
§ 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.
§ 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

O Pode Público dispõe de vários meios de intervenção na propriedade privada ou no domínio econômico de terceiros, entre os que abaixo se destacam.



2) FORMAS DE ATUAÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

O Nosso regime econômico é o de liberdade de iniciativa, porém esta liberdade não é ilimitada de modo a prejudicar o interesse da coletividade. Como salienta o Prof. Moreira Neto, a Constituição vigente traça os próprios princípios fundamentais do ordenamento econômico:

· liberdade de iniciativa;
· função social da propriedade;
· epressão ao abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos mercados, eliminação da concorrência e aumento arbitrário dos lucros.

Com o advento da CF/88, a possibilidade de interferência do Estado na ordem econômica ficou mais restrita, como se vê no art. 173, retro transcrito, que faz uma enumeração exaustiva, só é admissível a atuação supletiva do Estado na atividade econômica naqueles casos ali expressos.

Exigindo o interesse público, o Poder Público intervém no domínio econômico, onde atua através do monopólio, da repressão ao abuso do poder econômico, do controle de abastecimento dos mercados, pelo tabelamento de preços e a criação de empresas paraestatais.

Essa intervenção só pode ser feita pela União ou por delegados, mediante lei, nos casos arrolados no texto Constitucional.



3) MONOPÓLIO

Monopólio é a exclusividade na exploração ou utilização de determinados serviços ou mesmo atividades. O monopólio estatal é a reserva para o Poder Público de determinado setor do domínio econômico. Em sentido econômico, monopólio significa controle da produção e de preços, poder este resultante da atuação exclusiva no mercado (caso do petróleo e combustíveis, no Brasil, ou dos serviços de correios e telégrafos). Melhor dizendo, segundo a Constituição constitui monopólio da União (só ela pode explorar), consoante 177:

· a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos;

· a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro;

· a importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores;

· o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem;

· a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados.

Além destes, a União detém ainda o monopólio das seguintes atividades:

· Emissão de moedas;
· Serviço Postal e Correio Aéreo Nacional
· Serviço de Telecomunicações
· Serviços e Instalações de energia elétrica
· Navegação aérea, aeroespacial e infra estrutura aeroportuária
· Serviços de transportes ferroviários e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras que transponham os limites dos Estados ou Territórios
· Serviço de transporte rodoviário interestadual e intermunicipal de passageiros
· Portos marítimos, fluviais e lacustres, dentre outros, conforme a CF/88.



4) REPRESSÃO AO ABUSO DO PODER ECONÔMICO

A atividade econômica não pode prejudicar o bem-estar social, mas deve ter em vista o desenvolvimento nacional e a justiça social. O abuso do poder econômico ocorre se houver:

a) dominação dos mercados ou eliminação da concorrência, através de trustes, cartéis, coalizões, holdings);

b) aumento dos preços sem causa justa;

c) especulação para elevar preços através de ocultação, destruição, de bem de produção ou consumo;

d) organização de grupos econômicos para impor preços, subordinação de operações;

e) concorrência desleal através de exigência de exclusividade de propaganda, ajuste de preços nas concorrências públicas.

Encarrega-se da repressão ao abuso do poder econômico, a Secretaria Especial de Política Econômica, sucessora do antigo Conselho Administrativo de Defesa Econômica, que procede à abertura de inquérito administrativo onde se apuram os fatos; se provados, será fixado prazo para os infratores cessarem a atividade nociva, impondo-lhes multa. Se os infratores não cessarem a atividade o caso vai para a órbita do Pode Judiciário (Justiça Federal).

Exemplo de ação administrativa recente neste sentido ocorreu na desaprovação, por parte do CADE, da fusão da Colgate com a Kolynos, sob o argumento de que a Colgate, ao comprar a Kolynos, se tornou dona de 78% do mercado nacional de pasta de dente. A Revista Veja em matéria atinente a tal fato observou:

Nesses casos, era hábito do CADE aceitar o negócio, desde que o comprador prometesse produtividade, empregos ou preços baixos. Desta vez, o órgão entendeu que a forma mais eficaz de proteger o consumidor é estimular a concorrência. Com isso, a Colgate deverá vender a marca Kolynos, alugá-la por vinte anos ou ficar sem explorá-la por quatro anos - para que outra marca possa ganhar o mercado. (in Veja, Editora Abril, Edição n.° 1463, ano 29, n° 39, de 25 de setembro de 1996, pág. 103)



5) CONTROLE DE ABASTECIMENTO

Destina-se a não deixar faltar matéria-prima, produtos e serviços necessários ao consumo, é exercido mediante a atuação do Departamento de Abastecimento e Preços. A intervenção consiste na compra, armazenamento de bens, desapropriação de bens ou requisição de serviços.



6) TABELAMENTO DE PREÇOS

Compete ao governo fixar preços e disciplinar o sistema de seu controle, para evitar abusos; compete-lhe também fixar taxas. A União segue uma política nacional de preços, estabelecida pelo CIP - Conselho Interministerial de Preços.



7) INTERVENÇÃO NA PROPRIEDADE PRIVADA

7.1) Conceito

A intervenção na propriedade privada pode ser conceituada como sendo toda ação do Estado que, compulsoriamente, restringe ou retira direitos dominiais do proprietário. Hely Lopes Meirelles (Op. Cit., pág. 502) afirma que:

¨ entende-se por intervenção na propriedade privada todo ato do poder público que compulsoriamente, retira ou restringe direitos dominiais privados, ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de interesse público.


7.2) Meios interventivos

Vários são os meios que podem ser utilizados pelo Estado para intervir na propriedade privada, fundamentando-se em todos os casos na necessidade ou no interesse de utilidade pública, expresso em lei federal autorizando o ato interventivo. Entre nós, esses meios são graduados em função dos poderes que encerram, variando desde os mais brandos (limitação administrativa, a ocupação temporária, a servidão administrativa e o tombamento, que não retiram o domínio), passando pelos intermediários (requisição, que ora retira o domínio, ora não) e indo até os mais drásticos (desapropriação, que sempre retira o domínio).

Diogo de Figueiredo Moreira Neto, esquematicamente os classifica em meios de:

· intervenção ordinária: ocupação temporária, a servidão administrativa, tombamento, requisição, desapropriação, limitação administrativa.

· Intervenção Sancionatória: Multa, Interdição, Destruição de coisas, confisco

Comenta o citado autor:

Para classificação dos instrumentos jurídicos de intervenção do Estado na propriedade e atividades privadas quanto à executoriedade podemos dizer que:

todos os institutos são executórios, salvo poucas exceções como a servidão administrativa e a desapropriação que para serem impostas, na falta de concordância do proprietário dos bens declarados de interesses coletivo, demandam o desencadeamento de ação especial. Agora, quanto à modalidade sancionatória, não serão executórios a multa a certos tipos de destruição de coisas e de confisco.

Vejamos as modalidades de per si:

a) Ocupação Temporária

A referida forma de ocupação pode ser definida como forma de intervenção ordinária, concreta do Estado na propriedade privada, limitativa do uso, gratuita, transitória e delegável. É admitida genericamente pelo art. 170, II da CF/88. Os exemplos mais comuns são a ocupação de prédios particulares com vista à instalação de serviços eleitorais e, ainda, a ocupação de terrenos particulares para depósito de equipamentos e materiais, enquanto são feitas obras no logradouro, variedade em que é comum a delegação a empreiteiros e concessionários de obras e serviços públicos.

b) Destruição de Coisas

É intervenção sancionatória de último grau, da qual resulta a perda da propriedade pela inutilização ou perecimento do seu objeto, em razão da atividade do Estado.

c) Confisco

É intervenção sancionatória de último grau, pela qual se transfere ao Estado o objeto da propriedade privada. Em razão do sistema de direitos e garantias constitucionais, sua admissão excepcional, de direito estrito, tem assento na própria CF/88, art. 5°, XLVI, sendo porém vedado a utilização da tributação para tal fim.

d) Servidão Administrativa

É admitida, genericamente, pelo art. 170, III, e, implicitamente no art. 5° XXXIX da CF/88. É o ônus real de uso, imposto pela Administração à propriedade particular, para assegurar a realização e conservação de obras e serviços públicos ou de utilidade pública, mediante indenização dos prejuízos efetivamente suportados pelo proprietário.

É pois, como se depreende da idéia conceitual um ônus real incidente sobre um bem particular e com a finalidade de permitir uma utilização pública. Elas não se confundem com as servidões civis de direito privado, que é direito real de um prédio sobre outro, para serventia privada. A servidão administrativa é um ônus real de uso imposto pela Administração a determinados imóveis particulares, verbia gratia, restringir as edificações até uma determinada altura.

e) Tombamento

É previsto no art. 126, § 1° e 5°, da CF/88, e designa intervenção ordenatória concreta do Estado na propriedade privada, limitativa de exercício de direitos de utilização e de disposição, gratuita, permanente e indelegável, destinada à preservação, sob regime especial de cuidados, dos bens de valor histórico, arqueológico, artístico ou paisagístico.
f) Multa

É uma imposição pecuniária aplicada aos transgressores de preceitos administrativos. Não deve ser confundida com a sanção penal, pois a multa é resultante de ato administrativo e a sanção penal é aplicada após a existência de sentença criminal. O instituto da multa também não se confunde com tributo, vez que consoante a definição do art. 4° do CTN, este não constituição sanção por ato ilícito.

g) Interdição

É uma imposição que restringe em casos concretos o exercício de direitos sobre a propriedade ou a prática de certas atividades. A interdição administrativa não se confunde com a interdição civil de proteção aos incapazes, nem com a interdição penal, esta, uma pena criminal acessória fundada no jus puniendi do Estado sobre a pessoa do delinqüente.

h) Limitações Administrativa

É uma forma suave de intervenção na propriedade. É conceituada como toda imposição do Estado de caráter geral, que condiciona direitos dominiais do proprietário, independentemente de qualquer indenização.

Sendo as limitações administrativas preceitos de ordem pública não admitem acertos ou composições sobre seus respectivos conteúdos. Conteúdos estes que se concretizam sob as três modalidades seguintes: ato positivo, negativo ou permissivo do poder público. Pelo primeiro o administrado-proprietário está obrigado a fazer o que lhe exige a Administração Pública. Dessa espécie de limitação administrativa, são exemplos: a obrigação de construir muro no alinhamento (limite da propriedade particular ou pública com o logradouro público) e a obrigação de manter o imóvel urbano roçado e limpo. Através da segundo, o administrado-proprietário é compelido a não fazer alguma coisa. Deve portanto, abster-se, trata-se em outras palavras de uma obrigação negativa, de não fazer.

São exemplos dessa modalidade de limitação administrativa: a não construção além de certo número de pavimentos e o não desmatamento acima de determinado percentual da área de dada floresta. Pela terceira e última dessas modalidades o administrado-proprietário é obrigado a permitir que em seus domínios seja feita alguma coisa. São dessa espécie as obrigações de permitir vistorias em elevadores, pára-raios, ... e o ingresso de agentes públicos na propriedade particular para certos fins, a exemplo dos sanitários.

Dada a sua natureza, a limitação administrativa há de ser:

· geral
· instituída em razão de um interesse público relevante
· sem remover a disposição da propriedade.

Com efeito, não se tem tal intervenção se a imposição visar uma propriedade certa, determinada. Há de recair sobre todas as propriedades com tais ou quais características. Assim, se não se quer uma imposição dessa espécie mas, ao contrário, pretende-se a submissão de certa propriedade a um interesse público, deve-se recorrer à servidão administrativa (ver item d) ou a desapropriação (estudada seqüencialmente), conforme o exigir o interesse público, pois não se está, ante a falta da generalidade, na presença de uma limitação administrativa. Tampouco se tem como caracterizar tal imposição limitativa da propriedade particular, se apartada do interesse público que lhe dá sustentação. Destarte, não pode prevalecer a limitação que impede a construção de motéis e drive-in, com a finalidade precípua de prestigiar a política desta ou daquela igreja. Por fim, diga-se que a limitação administrativa não pode promover o aniquilamento da propriedade, isto é, a total impossibilidade de sua adequada utilização econômica. Por apresentarem as característica acima são inindenizáveis. São instituídas por lei de qualquer das entidades políticas (União, Estados-membro e Municípios). São assim, de competência concorrente e legítimas enquanto se mantiverem dentro dos campos de atuação de cada uma dessas entidades.

As limitações administrativas não se confundem com as restrições de vizinhança, com a servidão predial, com a servidão administrativa ou com a desapropriação, embora algumas vezes essa confusão ocorra. As limitações administrativas não se confundem com as restrições de vizinhança em razão das distintas finalidades de cada uma dessas imposições. As limitações administrativas são editadas em benefício do bem-estar social, enquanto os direitos de vizinhança são estabelecidos para a proteção da propriedade privada e com garantia de segurança, conforto, sossego e saúde dos que a utilizam. As limitações administrativas protegem a coletividade; as restrições de vizinhança prestigiam os vizinhos. Distingue-se a limitação administrativa da servidão predial, dado que a instituição desta, por convenção ou usucapião, visa a submissão de um prédio particular a outro (CCB, art. 695), a exemplo da servidão de trânsito. É restrição individualizada, estabelecida em função de alguém, ao contrário, portanto, da limitação, que, como já frisamos, não é instituída a favor de ninguém; é genérica. Tampouco se confunde com a servidão administrativa, visto que esta é ônus real, quase sempre indenizável, que atinge determinada propriedade, pública ou privada, para propiciar um serviço de interesse coletivo (passagem subterrânea, por terreno particular ou público, de dutos para o transporte de óleo, água e gás, dando origem aos oleodutos, aquedutos e gasodutos, ou a passagem por terrenos, públicos ou particulares, de linhas de transmissão de energia elétrica), enquanto a limitação é geral e gratuita. Sem grande dificuldade vê-se que a limitação administrativa não se confunde com a desapropriação. Esta retira a propriedade; aquela não. Aquela recai sobre todas as propriedades; esta não.

i) Desapropriação

· Noção

Um rápido exame de nossas Cartas Constitucionais revela que ao longo da evolução histórica do Constitucionalismo brasileiro sempre se garantiu de um lado o direito de propriedade, porém de outro nunca se proibiu a desapropriação. Esses dois direitos, o de propriedade do administrado e o de desapropriar do Estado, como ocorre em outros países, sempre conviveram em nosso ordenamento jurídico. Segundo observa Sérgio de Andréa Ferreira:

Nossa tradição constitucional, evidencia, em normas expressas, a convivência de duas noções: ao mesmo tempo que se garante o direito de propriedade, ressalva-se, sempre, a possibilidade de desapropriação. (Direito Administrativo, pág. 191)

Em termos atuais, essa convivência está explicitada nos incisos XXII e XXIV do art. 5° da CF/88. O primeiro prescreve que é garantido o direito de propriedade enquanto o segundo estabelece que a lei fixará o procedimento para a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos.

Essa faculdade constitucional para desapropriar é necessária dado que nem sempre o Estado pode alcançar os fins a que se propões realizando-os pelos meios que o Direito Privado oferece e regula. O proprietário do bem necessário, útil ao de interesse social para o Estado resiste às suas pretensões de compra, por não querer vender ou por não lhe interessar o preço oferecido, impedindo, com essa resistência a realização do bem comum. Nesses casos, como em outros, só a desapropriação restaura a prevalência do interesse público sobre o interesse particular.

Deve-se sublinhar contudo que dentre os atos de intervenção estatal na propriedade a desapropriação é a mais severa forma de manifestação do poder de império, ou seja, da soberania interna do Estado no exercício de seu domínio eminente sobre os bens existentes no território nacional. De acordo com o ensinamento do Prof. Hely Lopes Meirelles, o poder expropriatório, embora discricionário nas opções de utilidade pública e de interesse social, só é legitimamente exercitável nos limites traçados pela CF e nos casos expressos em lei, observado o devido procedimento legal.

· Conceito

Vários são os conceitos formulados pelos autores em razão do ordenamento considerado. Com base no nosso ordenamento - art. 5°, XXIV, e 184, ambos da CF, pode-se conceituar a desapropriação como sendo o procedimento administrativo pelo qual o Estado, compulsoriamente, retira de alguém certo bem por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social e o adquire, originariamente, para si ou para outrem, mediante prévia e justa indenização, paga em dinheiro, salvo os casos que a própria Constituição enumera.

É um ato de império da Administração Pública, pela qual esta, por necessidade, utilidade pública ou interesse social, mediante prévia e justa indenização, transfere ou subtrai o direito sobre bens do patrimônio particular para o seu. (Raul A. Mendes)

A desapropriação, assim conceituada, também é chamada de expropriação. O Poder Público é o expropriante ou desapropriante e o proprietário do bem é o expropriado ou desapropriado. O bem, durante o procedimento expropriatório, é qualificado de expropriante ou desapropriando.

O poder desapropriante cabe a qualquer entidade de direito público e até seus delegados, como os concessionários de serviços públicos. É através da desapropriação que o Estado se vale para remover obstáculos à execução de suas obras ou serviços públicos, ou para propiciar a implantação de planos de urbanização, ou preservar ambientes contra a devastação.

· Objeto da Desapropriação

De acordo com o art. 5°, XXIV, da CF/88, temos que: tudo o que objeto de apropriação sob o regime privado é, em princípio desapropriável.

Logo, não importa, assim, se são bens móveis ou imóveis, corpóreos, fungíveis ou infungíveis, gravados ou não com ônus reais, aqui incluídos os enfiteuticados, sendo expropriáveis qualquer dos direitos, o do nu-proprietário ou do enfiteuta.

No que diz respeito ao bem público, temos que se o bem público está afetado à máxima utilização pública, que é o uso comum, tornou-se insuscetíveis de desapropriação porque se, por hipótese, fosse desapropriável, desafetaria o bem, o que só é possível por via legal.

Se o bem público está afetado à utilização especial, ou se é dominical, o que prevalece é, então, a hierarquia jurídica do expropriante, pois se presume implícita a hierarquia da utilidade pública a que atenderá o bem; obedecer-se-á à seguinte ordem: 1°) União (desapropriará de todos); 2°) Estados-membros; 3°) Municípios; 4°) Autarquias Federais; 5°) Autarquias Estaduais; 6°) Autarquias Municipais; 7°) Paraestatais Federais; 8°) Paraestatais Estaduais e 9°) Paraestatais Municipais.

Nessa ordem de preferência é possível às pessoas de grau superior desapropriar bens de uso especial e dominicais das pessoas de grau inferior, porém é de se ressaltar que mesmo que obedecida a essa graduação, a que não apresentar finalidade pública é viciada e, desse modo, nula.

· Espécies

Duas são as espécies de desapropriação. Uma, consubstanciada no inciso XXIV do art. 5° da CF/88, chamada de ordinária. Outra, fundada no art. 184 e parágrafos dessa Constituição é a denominada extraordinária. Difere uma da outra essencialmente pelas seguintes notas:

a) na ordinária a indenização deve ser prévia, justa e em dinheiro, enquanto na extraordinária a indenização, embora prévia e justa, é paga em títulos da dívida agrária com cláusula de conservação do valor real;

b) a ordinária pode incidir sobre qualquer bem; a extraordinária só sobre imóveis rurais que não estejam cumprindo sua função social;

c) a ordinária pode ser concretizada pela União, Estado-membro, Município, Distrito Federal e outras pessoas a quem a lei reconheça tal competência; a extraordinária só pela União ou seus delegados.

A doutrina, por sua vez, tem classificado a desapropriação em direta e indireta. Direta é a desapropriação que conservou todo o procedimento expropriatório. Nessa tem-se um ato declaratório e uma fase executória. Indireta é a desapropriação que não observou o procedimento expropriatório. Aqui não há o ato declaratório nem a fase executório, pois obriga o proprietário esbulhado a pleitear, administrativa ou judicialmente, o ressarcimento. É, na realidade, apossamento administrativo. É verdadeiro esbulho. A impropriedade dessa classificação reside, porém, no fato de não existir, para a chamada desapropriação indireta, qualquer regime legal, como há para a desapropriação direta. A doutrina e a jurisprudência criaram-na como forma de satisfazer o interesse do particular esbulhado, que não pode, dada a destinação pública que lhe foi atribuída pelo Poder Pública, retomar o bem objeto do apossamento. Por esse mecanismo, verdadeira desapropriação às avessas, o proprietário esbulhado consegue a competente indenização.

A desapropriação ordinária pode ser amigável e judicial quando se leva em conta o procedimento para determinar-se a justa indenização. Se esta é acordada entre o expropriante e o expropriado, diz-se amigável. Se, por qualquer motivo, é buscada no Judiciário diz-se judicial. Na amigável, a indenização pode ser posterior à transferência do domínio e não precisa ser em dinheiro. Tudo depende de acordo. Na judicial nada disso pode acontecer. Observe-se que a ação expropriatória pode extinguir-se por acordo. Esse, depois de firmado pelas partes, é homologado pelo juiz. Aqui também pode a indenização ser posterior à transferência do domínio e o pagamento em bens ou em bens e dinheiro. Em suma, tudo pode ser acertado na desapropriação amigável. O mesmo pode ser dito em relação à expropriação extraordinária.

· Requisitos Constitucionais

A CF/88, nos arts. 5°, XXIV, e 184 e parágrafos, fixa de forma clara e precisa os requisitos da desapropriação para as espécies que regula. Para a desapropriação ordinária (art. 5°, XXIV) esses requisitos são:

a) necessidade pública, utilidade e interesse social;
b) prévia e justa indenização em dinheiro.

Para a desapropriação extraordinária (art. 184 e parágrafos) esses requisitos são:

a) interesse social;
b) justa e prévia indenização, paga em títulos da dívida agrária com cláusula de preservação do valor real;
c) pagamento das benfeitorias necessárias e úteis em dinheiro;
d) processo expropriatório do rito sumário.

· Realização da Desapropriação

A desapropriação direta se realiza por meio de um procedimento administrativo. O procedimento visa a cumprir em duas etapas distintas os requisitos constitucionais da desapropriação, implícitas no art. 5°, XXIV, da Constitucional - declaração e indenização, ou seja:

a) a declaração de necessidade ou utilidade pública ou do interesse social, individuando o bem a ser expropriado; e
b) pagamento da prévia e justa indenização ao expropriado.

j) Requisição

Em situação de urgência, ou não, e quase sempre sem o caráter de definitividade, a Administração Pública, com ou sem indenização posterior, pode utilizar bens e serviços particulares, valendo-se de atos e medidas auto-executórias, cuja obtenção, pelos procedimentos comuns, porque demorados ou dependentes da vontade do particular prejudica a eficiência administrativa. É a requisição. Pode ser definida como a utilização, quase sempre transitória e auto-executória pela Administração Pública, de bens e serviços particulares, mediante determinação da autoridade competente (civis ou militares) e com ou sem indenização posterior, em razão ou não de perigo público. Seu fundamento político, é o estado de necessidade público. Tem, entre nós, dois fundamentos constitucionais. Um, genérico, previsto no inciso III do art. 170 (função social da propriedade). Outro, específico, ficando no inciso XXV do art. 5°, embora essa disposição pareça sempre exigir uma situação de urgência, de perigo público. Tal utilização, como ato ou medida auto-executória que é, independe de prévia autorização judicial. Os abusos, no entanto, podem ser obstados por mandado de segurança. Seu controle é, por conseguinte, a posteriori.

Pode recair, como vimos, sobre bens e serviços. Os bens podem ser móveis, imóveis e semoventes. Se incidir sobre bens consumíveis (gênero alimentícios, roupas, cobertores), é definitiva. Nesse caso, há transferência dominial e a correspondente indenização posterior, sem, no entanto, caracterizar uma desapropriação. Da desapropriação difere porque a indenização é a posteriori, isto é, não é prévia como exige a Constituição para a expropriação, e porque independe, para a sua concreção, do auxílio do Judiciário. Se recair sobre bens inconsumíveis (terrenos, prédios, máquinas, veículos), é transitória. Finda, nesse caso, a utilização, devolve-se o bem ao proprietário e satisfaz-se, de modo completo, o prejuízo causado. Os serviços objetos da requisição podem ser quaisquer, desde que sua prestação satisfaça as necessidades do Poder Público requisitante. Assim, pode o Estado (U, E, DF e M) requisitar os serviços de combate a incêndio de uma empresa privada ou o serviço de pessoas para a prestação do serviço militar ou do serviço eleitoral (recepção de voto por necessários no dia da eleição e contagem do voto por escrutinadores no dia da apuração).
As requisições podem ser civis e militares. A competência legislativa para umas e outras é da União (CF/88, art. 22, III). Essa exclusividade de legislar não impede que Estados-membros e Municípios, nos termos da lei, façam requisições civis. As civis, não por prestigiarem as autoridades públicas, são também chamadas de administrativas e se destinam a evitar um dano à vida, à saúde e aos bens da coletividade ou a minorar os seus efeitos, ou, ainda, a facilitar a prestação de certos serviços públicos (serviço eleitoral, Tribunal do Júri). Dessas tem-se, como exemplo, as que podem ser feitas por funcionários florestais em caso de incêndio rural, conforme autoriza o art. 25 do Código Florestal (Lei n° 4.771/65). Podem, também destinar-se a instalação e execução de um dado serviço público, a exemplo da requisição de prédios particulares (escolas, salões) para a instalação das mesas receptoras de votos no dia de eleição ou para a respectiva apuração. As militares predestinam-se a garantir a segurança interna e a manter a soberania do Estado (Hely Lopes Meirelles, Op. Cit., pág. 596). Ambas, desde que ocorra uma necessidade pública (inundação, epidemia), podem ser utilizadas em período de paz. Em tempo de paz, a requisição de serviços está regulada pela Lei Delegada Federal n° 4/62, e a de bens e serviços essenciais ao abastecimento da população está disciplinada no Decreto-Lei n° 2/66, ambas em vigor em vigor em tudo que não contrariar a CF/88. As requisições civis e militares, em época de guerra, estão reguladas pelo Decreto-Lei Federal n° 4.812/42, também em vigor naquilo que não afrontar a CF/88. Concretiza-se por ato administrativo da autoridade civil ou militar competente.


12
A REFORMA ADMINISTRATIVA:
DIRETRIZES EPRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS





1) REFORMA ADMINISTRATIVA

O Decreto-lei n° 200, de 25 de fevereiro de 1967, estabeleceu que a Administração Federal fosse objeto de uma reforma de profundidade para ajustá-la às disposições daquela lei e, em especial, às diretrizes e princípios fundamentais nela enunciados (art. 145). O Decreto-lei n° 200/67 determinou, ainda, que a Reforma Administrativa iniciada com a referida lei fosse realizada por etapas, "à medida que se forem ultimando as providências necessárias à sua execução. (art. 146).

A orientação, coordenação e supervisão das providências relativas à reforma administrativa ficaram com o Ministério do Planejamento (hoje Secretaria de Planejamento, órgão de assessoramento direto do Presidente da República).

Os princípios fundamentais a que devem obedecer as atividades da Administração Federal são:
a) planejamento;
b) coordenação;
c) descentralização;
d) delegação de competência; e
e) controle.

A ação governamental deve obedecer a planejamento, que nada mais é do que o estabelecimento de diretrizes e metas que deverão orientar a ação governamental, visando promover o desenvolvimento econômico-social do Pais e a segurança nacional. Essa ação se desenvolve segundo planos e programas elaborados e compreende a elaboração e atualização dos seguintes instrumentos básicos:

a) plano geral do Governo;
b) programas gerais, setoriais e regionais, de duração plurianual;
c) orçamento-programa anual;
d) programação financeira de desembolso.

Desta forma, as atividades da Administração Publica deverão adaptar-se aos programas aprovados pela Presidência da República, isto é, não são permitidos desvios que comprometam os limites financeiros de desembolso ou afronte a respectiva programação.

O Principio da coordenação tem por fim entrosar as atividades da administração para evitar a duplicidade de atuação, a dispersão de recursos, a divergência de soluções e outros males característicos da burocracia. A execução dos planos e programas de governo é objeto de permanente coordenação, exercida em todos os níveis da Administração, mediante a atuação de chefias individuais, a realização sistemática de reuniões com a participação das chefias subordinadas e a instituição e funcionamento de comissões de coordenação em cada nível administrativo.

Através da coordenação pretende-se a harmonização de todas as atividades da Administração Pública, evitando-se desperdícios. Economiza-se, portanto, recursos materiais e humanos,

O princípio da descentralização é o que tem por objeto o descongestionamento administrativo, afastando do centro (o Estado) e atribuindo a uma pessoa distinta, poderes de administração, constituídos do exercício de atividades públicas ou de utilidade pública. Desta forma, em seu próprio nome, o ente descentralizado age por outorga do serviço ou atividade pública, bem como por delegação de sua execução.

A Reforma Administrativa recomenda que a execução das atividades da Administração Federal sejam amplamente descentralizadas, dispondo que tal princípio seja posto em prática em três planos principais:

a) dentro dos quadros da Administração federal, distinguindo-se claramente o nível de direção (órgãos centrais ou regionais) do de execução (órgãos locais) , o que, tecnicamente, seria descentralização administrativa, que significa a repartição de funções entre os vários órgãos de uma mesma Administração (por exemplo, atividades de planejamento, supervisão, coordenação e controle aos órgãos que compõem a estrutura central de direção e solução de casos individuais aos órgãos locais, ao nível de execução).

b) da Administração Federal para a das unidades federadas (Estados-membro), mediante convênio, o que seria realmente descentralização;

c) da Administração Federal para a órbita privada, mediante contratos ou concessões, o que constitui também descentralização na sua verdadeira acepção.

A decisão de casos individuais (administração casuística) compete, em principio, ao nível de execuções especialmente aos serviços de natureza local, que estão em contato com os fatos e com o público. À estrutura central de direção compete o estabelecimento das normas, critérios, programas e princípios, que os serviços responsáveis pela execução são obrigados a respeitar na solução dos casos individuais e no desempenho de suas atribuições.

A descentralização distingue-se da "desconcentração", que vem a se constituir na distribuição ou repartição de funções entre vários órgãos da mesma entidade estatal (União, Estados, DF, Municípios). A aplicação da descentralização está condicionada, em qualquer caso, aos ditamos de interesse público e às conveniências da segurança nacional.

Constitui instrumento de descentralização administrativa, mais empregado a delegação de competência com o objetivo de assegurar maior rapidez e objetividade às decisões, situando-as na proximidade dos fatos, pessoas ou problemas a atender. É facultado ao Presidente da República, aos Ministros de Estado e, em geral, às autoridades da Administração federal, delegar competência para a prática de atos administrativas. O ato de delegação deve indicar, com precisão, a autoridade delegante, a autoridade delegada e as atribuições objeto da delegação. Exemplo: o Presidente da República em decreto delegou competência aos Ministros de Estado para a concessão de aposentadoria a funcionários; assim, a aposentadoria é concedida tendo em vista o ato de delegação, na administração federal por portaria de Ministro do Estado.

O controle das atividades da Administração Federal é exercido em todos os níveis e em todos os órgãos. Porém, devem ser suprimidos os controles que se evidenciarem como puramente formais ou cujo custo seja evidentemente superior ao risco.



2) REFORMA ADMINISTRATIVA DE 1992

Imbuída do espírito do enxugamento da máquina administrativa do Estado, a reforma de 1992, operacionalizou a fusão de alguns ministérios e de secretarias, a extinção de outros, além de propor a extinção de órgãos específicos.

A Administração Pública Federal compõem-se, dentro desta nova sistemática, de órgãos como a Presidência da República com seus Ministérios, além de órgãos de assessoramento imediato (Conselho de Governo; Estado Maior das Forças Armadas, etc.) e de assistência direta e imediata ao Presidente (Secretaria de Assuntos Estratégicos; Secretaria de Administração Federal; etc.), consoante dispõe a Lei n° 8.490, de 09 de novembro de 1992, que dispõe sobre a organização da República e dos Ministérios. De acordo com o art. 14 desta Lei, são os seguintes os atuais Ministérios:

a) da Justiça;
b) da Marinha;
c) do Exército;
d) das Relações Exteriores;
e) da Fazenda;
f) dos Transportes;
g) da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária;
h) da Educação e do Desporto;
i) da Cultura;
j) do Trabalho;
l) da Previdência Social;
m) da Aeronáutica;
n) da Saúde;
o) da Indústria, do Comércio e do Turismo;
p) de Minas e Energia;
q) da Integração Regional;
l) das Comunicações;
m) da Ciência e Tecnologia;
n) do Bem-Estar Social;
o) do Meio Ambiente.

E, como dispõe o parágrafo único deste artigo, são considerados Ministros de Estado, além dos titulares dos Ministérios supramencionados, mais o da Casa Civil da Presidência da República, da Secretaria-Geral da Presidência da República, da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Coordenação da Presidência da República, da Casa Militar da Presidência da República, do Estado Maior das Forças Armadas, da Secretaria de Assuntos Estratégicos e da Secretaria da Administração Federal.


· Administração Federal Direta:

A Administração Federal Direta é constituída dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios, consoante o já estudado.
A Presidência da República é o órgão supremo e independente, representante do Poder Executivo da União, enfeixando todas as atividades administrativas superiores de âmbito federal, de política, planejamento, coordenação e controle do desenvolvimento sócio-econômico do País e da segurança nacional.

É constituída de:

a) Casa Civil, a qual compete assistir direta e imediatamente ao Presidente da República no desempenho de suas atribuições, em especial na coordenação da ação governamental e no relacionamento com o Congresso Nacional;

b) Secretaria-Geral, cuja competência é a de assistir direta e imediatamente ao Presidente da República no desempenho de suas atribuições e, especificamente, na coordenação das ações administrativas da Presidência, através de serviços de secretaria particular e ajudância de ordens;

c) Secretaria de Planejamento, Orçamento e Controle, destinada a assistir ao Presidente da República na coordenação do sistema de planejamento e orçamento, formulação de estudos e pesquisas sócio-econômicas, elaboração e acompanhamento dos planos nacionais e regionais de desenvolvimento, do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e das leis orçamentárias anuais, bem como na supervisão dos sistemas cartográfico e estatístico nacionais.

d) Casa Militar, que compete assistir, direta e imediatamente ao Presidente, sobre assuntos referentes à administração militar, zelar pela sua segurança e pela dos titulares de órgãos essenciais da Presidência, bem como das respectivas residências e dos palácios presidenciais.

Os Ministérios são órgãos autônomos da cúpula da Administração federal, situados logo abaixo da Presidência da República. Os Ministérios são chefiados por Ministros de Estado, auxiliares imediatos do Presidente de República, cabendo-lhes, dentre outras, as seguintes atribuições: orientação, coordenação (supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência, referendando os atos e decretos assinados pelo Presidente da República; expedir instruções para execução das leis, decretos e regulamentos; apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério; praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República.

Veremos, a seguir, as áreas de competência dos Ministérios:

a) Ministério da Justiça: ordem jurídica, nacionalidade, cidadania, direitos políticos, garantias constitucionais; segurança pública; Polícia Federal, Rodoviária e Ferroviária Federal e do Distrito Federal; administração penitenciária; estrangeiros; documentação, publicação e arquivo dos atos oficiais; defesa da ordem econômica; índios; ouvidoria-geral; defesa dos direitos do consumidor. A Polícia Federal dentre outras atribuições, exerce as funções de polícia marítima, aérea e de fronteiras.

b) Ministério da Educação e do Desporto: educação; ensino civil e do magistério; política nacional do desporto e fomento e supervisão do desenvolvimento dos desportos no País.

c) Ministério das Relações Exteriores: política internacional; relações diplomáticas; programas de cooperação nacional; prestação de serviços consulares; participação em negociações comerciais, econômicas, financeiras, técnicas e culturais com países e entidades estrangeiras.

d) Ministério da Saúde: política nacional de saúde e coordenação do Sistema Único de Saúde; saúde ambiental; ações de promoção, proteção e recuperação da saúde individual e coletiva, inclusive a dos trabalhadores e dos índios; as informações de saúde; os insumos críticos para a saúde; vigilância da saúde, especialmente drogas, medicamentos e alimentos; pesquisa científica e tecnológica e ordenação da formação de recursos humanos na área da saúde.

e) Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária: política agrícola abrangendo produção, comercialização, abastecimento, armazenagem e garantia de preços mínimos: produção e fomento agropecuário; mercado, comercialização e abastecimento agropecuário, inclusive com formação de estoques reguladores estratégicos; informação agrícola; defesa sanitária vegetal e animal; fiscalização de insumos utilizados nas atividades agropecuárias e da prestação de serviços no setor: classificação e inspeção de produtos e derivados animais e vegetais; proteção, conservação e manejo do solo e água voltados ao processo produtivo agrícola e pecuário; pesquisa tecnológica em pecuária e agricultura; reforma agrária, meteorologia e climatologia; desenvolvimento rural, cooperativismo e associativismo; energização rural, agroenergia e eletrificação rural; assistência técnica e extensão rural.

f) Ministério do Trabalho: assuntos do trabalho e sua fiscalização; mercado de trabalho e política de empregos; política salarial, de imigração, formação e desenvolvimento profissional; relações do trabalho; segurança e saúde no trabalho.

g) Ministério da Previdência Social: previdência social e previdência complementar.

h) Ministério da Fazenda: moeda, crédito, instituições financeiras, capitalização, poupança popular, seguros privados e previdência privada aberta; política e administração tributária e aduaneira; fiscalização e arrecadação; administração orçamentária e financeira, controle interno, auditoria e contabilidade públicas; administração das dívidas públicas interna e externa; administração patrimonial; negociações econômicas e financeiras com governos e entidades estrangeiras e internacionais; preços e tarifas públicas e administradas; fiscalização e controle do comércio exterior.

i) Ministério dos Transportes: assuntos relacionados com transporte ferroviário, rodoviário e aquaviário; marinha mercante, portos e vias navegáveis; participação nos transportes aeroviários na forma da lei.

j) Ministério do Exército: administração dos negócios do Exército e a preparação para o cumprimento de sua desatinação constitucional; propor a organização e providenciar o adestramento e o aparelhamento das forças terrestres; orientar e realizar pesquisas e desenvolvimento de interesses do Exército: propor medidas concernentes às Polícias Militares e Corpos de Bombeiros.

k) Ministério da Marinha: administrar os negócios da Marinha de Guerra, preparando-a para o cumprimento de sua desatinação constitucional, defesa da Pátria e garantia dos poderes constituídos, da lei e da ordem; propor a organização e providenciar o aparelhamento e adestramento das forças navais, aeronavais e do Corpo de Fuzileiros Navais; ordenar e realizar pesquisas e desenvolvimento de interesse da Marinha; estudar e propor diretrizes para a Política Marítima Nacional; medidas correlatas de interesse da defesa nacional; a segurança da navegação marítima, fluvial e lacustre; a Política Naval.

l) Ministério da Aeronáutica: administrar os negócios da Aeronáutica; preparação para o cumprimento de sua destinação constitucional (cfe. Marinha e Exército); estudar e propor diretrizes para a Política Aeroespacial; propor a organização e providenciar o aparelhamento e o adestramento da Força Aérea Brasileira; orientar, coordenar e controlar as atividades da aviação civil, privada ou comercial, bem como a desportiva, estabelecer, equipar e operar, diretamente ou por concessão ou autorização, a infra-estrutura aeronáutica, inclusive os serviços de apoio necessários à navegação aérea; orientar, incentivar e realizar pesquisas e desenvolvimento de interesse da Aeronáutica; operar o Correio Aéreo Nacional.

m) Ministério da Cultura: atuar no planejamento, coordenação e supervisão das atividades culturais, formulação e execução da política cultural e proteção ao patrimônio histórico e cultural do País.
n) Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo: desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços; propriedade industrial, marcas e patentes; transferência de tecnologia; metrologia, normalização e qualidade industrial; comércio exterior; turismo; apoio à micro, pequena e média empresa; registro de comércio.

o) Ministério de Minas e Energia: geologia; recursos minerais e energéticos; regime hidrólogico e fontes de energia hidráulica: mineração, metalurgia e petróleo; combustível, energia elétrica e nuclear.

p) Ministério das Comunicações: telecomunicações, mediante administração, outorga, controle e fiscalização do espectro de radiofreqüências; serviços postais.

q) Ministério do Bem-Estar Social: assuntos relacionados à assistência social; assistência à criança, ao adolescente e ao idoso; formulação e execução de políticas de habitação e saneamento; radicação de populações, ocupação de territórios e migrações internas; promoção humana; habilitação e reabilitação de pessoas portadoras de deficiência, com promoção de sua integração à comunidade.

r) Ministério da Ciência e da Tecnologia: formulação e implementação da política de pesquisa científica e tecnológica; planejamento, coordenação, supervisão e controle das atividades da Ciência e Tecnologia e formulação e execução da política de desenvolvimento da informática e Automação.

s) Ministério da Integração Regional: visa a integração e desenvolvimento, através de órgãos específicos, das diferentes regiões do País.

t) Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal: planejamento, coordenação, supervisão e controle das ações relativas ao meio ambiente; formulação e execução da política nacional do meio ambiente; articulação e coordenação das ações da política integrada para a Amazônia Legal com vistas à melhoria da qualidade de vida das populações amazônicas; articulações, com os demais Ministérios, órgãos e entidades da Administração Federal, de ações de âmbito internacional e interno, relacionadas com a política nacional do meio ambiente e com a política nacional integrada para a Amazônia Legal; preservação, conservação e uso racional dos recursos naturais renováveis; implementação de acordos internacionais na área de sua competência.

· Administração Federal Indireta

A Administração Federal Indireta é a constituída dos serviços atribuídos a pessoas jurídicas diversas da União, públicas ou privadas, vinculadas a um Ministério, mas administrativa e financeiramente autônomas.

Assim, pode-se afirmar que a Administração Federal Indireta é o conjunto de entidades personalizadas, de direito público ou privado que, vinculadas a um determinado Ministério, prestam serviços públicos ou de interesse público. Vejamos algumas a título exemplificativo:

a) Autarquias:

- Banco Central do Brasil - BACEN;
- Comissão de Valores Mobiliários - CVM;
- Superintendência Nacional do Abastecimento - SUNAB;
- Superintendência de Seguros Privados - SUSEP;
- Fundo Nacional de Desenvolvimento - FND,

b) Fundações publicas:

- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA;
- Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

c) Empresas publicas:

- Casa da Moeda do Brasil - CMB;
- Serviço Federal de Processamento de Dados - SERPRO;
- Caixa Econômica Federal - CEF;
- Companhia Nacional de Abastecimento - CNA; e
- Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES;

d) Sociedades de Economia Mista:

- Banco do Brasil S/A - BB;
- Instituto de Resseguros do Brasil - IRB;
- Banco Meridional do Brasil S/A BMB;
- Banco da Amazônia S/A - BASA;
- Banco do Nordeste do Brasil S/A - BNB; e
- Centrais de Abastecimento do Amazonas S/A.


13
CONTROLE DA
ATIVIDADE ADMINISTRATIVA





1) NOÇÕES GERAIS

Entre a Administração e os Administrados travam-se relações das mais variadas naturezas, onde aquela está na maior parte delas em posição vantajosa. Contudo o Poder Público deve atuar (art. 37, da CF/88), em todas as suas manifestações, com legitimidade, isto é, segundo as normas pertinentes a cada ato por ele próprio editadas e de acordo com a finalidade e o interesse coletivo na sua realização. Até mesmo nos atos discricionários a conduta de quem os pratica há de ser legítima, conforme as opções permitidas em lei e as exigências do bem comum. Ultrapassando a sua competência ou infringindo as normas legais, o agente público vicia o ato de ilegitimidade, expondo-o à anulação.



2) CONCEITO DE CONTROLE

Controle, em tema de Administração Pública, é a faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro (heterocontrole) ou de sua própria atuação (autocontrole), visando confirmá-lo ou desfazê-la, conforme seja ou não legal, conveniente, oportuna e eficiente. No âmbito da Administração Direta ou centralizada, o controle decorre da subordinação hierárquica e, no campo da Indireta ou descentralizada, resulta da vinculação administrativa nos termos da lei instituidora das entidades que a compõem. Daí por que o controle hierárquico é pleno e ilimitado, e o controle das autarquias e das entidades paraestatais em geral, sendo apenas um controle finalístico é sempre restrito e limitado aos termos da lei que o estabelece.



3) CLASSIFICAÇÃO

Tais controles podem ser:

a) interno, quando realizado pela entidade ou órgão responsável pela atividade controlada, no âmbito da própria Administração,

b) externo, o realizado por órgão estranho a Administração responsável pelo ato controlado, como por exemplo, a apreciação das contas do Executivo e do Judiciário, pelo Legislativo,

c) prévio ou preventivo, o que antecede a conclusão operatividade do ato, como requisito para sua eficácia, v.g.: a liquidação da despesa, para oportuno pagamento. ou, autorização do Senado Federal para o Estado-membro ou um Município contrair empréstimo externo, etc.,

d) controle concomitante ou sucessivo, que é o que acompanha a realização do ato para verificar a regularidade de sua formação, como por exemplo, a realização de uma auditoria durante a execução do orçamento; fiscalização de um contrato em andamento, etc.
e) subseqüente ou corretivo, feito a posteriori e efetiva-se após a conclusão do ato controlado com fim de corrigi-lo nos eventuais defeitos ou dar-lhe eficácia, como a homologação do julgamento de uma concorrência; o visto das autoridades superiores em geral;

f) controle de legalidade ou de legitimidade, que objetiva verificar unicamente a conformação do ato ou do procedimento administrativo com as normas legais e demais preceitos que o regem. Pode ser realizado tanto pela Administração Pública como pelo Poder Judiciário.

h) controle de mérito, que é todo aquele que visa à comprovação da eficiência, do resultado, da conveniência ou oportunidade do ato controlado, mediante critérios técnicos e científicos de aferição do resultado e comprovação da eficiência. Sua realização, em razão disso, está a cargo da Administração Pública. Não cabe esse controle ao Judiciário. A revogação de uma permissão de uso de bem público, por não mais convir ao permitente, é controle de mérito, como é de mérito a desativação de uma caldeira considerado obsoleta.

É bom lembrar também que um ato do Executivo, sujeito a controle externo e prévio do Legislativo, pode ser submetido posteriormente ao controle interno e concomitante da própria Administração e, a final, sujeitar-se a controle de legalidade do Judiciário, caso seja argüido de lesivo ao direito individual do postulante de sua anulação, ou ao patrimônio público.



4) ESPÉCIES

Os tipos e formas de controle da atividade administrativa variam segundo o Poder, órgão ou autoridade que o exercita, ou o fundamento, o modo e momento de sua efetivação. Assim, temos o controle da própria Administração sobre seus atos e agentes, chamados controle administrativo, auto controle ou executivo. Depois, vem o do Poder Legislativo sobre determinados atos e agentes do Executivo (controle parlamentar ou legislativo) e, finalmente, a correção dos atos ilegais de qualquer dos Poderes, pelo Poder Judiciário (controle judiciário ou judicial).

Vejamos cada um deles:

a) Controle Administrativo ou Autocontrole

É todo aquele que o Executivo e os órgãos de administração dos demais Poderes exercem sobre suas próprias atividades, visando mantê-las dentro da lei, segundo as necessidades do serviços e as exigências técnicas e econômicas de sua realização, pelo que é um controle de legalidade e de mérito.

O controle administrativo deriva do poder-dever de autotutela que a Administração tem sobre seus próprios atos e agentes e que é exercido pelos órgãos superiores sobre os inferiores (controle hierárquico próprio das chefias e Corregedorias), com auxílio de órgãos incumbidos do julgamento de recursos (controle hierárquico impróprio) ou ainda de órgãos especializados em determinadas verificações (controle técnico de auditorias, etc.), integrantes da mesma Administração, caracterizado como controle interno.

É através do controle administrativo que a Administração pode anular, revogar ou alterar os seus próprios atos e punir os seus agentes com as respectivas penalidades estatutárias, quando considerados atos ilegais ou ineficientes.

Os meios de controle administrativo dividem-se em fiscalização hierárquica e recursos administrativos, embora a lei possa especificar outras modalidades mais adequadas para certos órgãos da administração direta e indireta.

A fiscalização hierárquica é exercida pelos órgãos superiores sobre os inferiores da mesma Administração, visando ordenar, coordenar, orientar e corrigir suas atividades e agentes. Exercita-se permanentemente e sem descontinuidade em todos os órgãos do Executivo e tem como características a permanência e automaticidade. É dever-poder de chefia e o chefe que não a exerce comete inexação funcional.

Os recursos administrativos caracterizam-se como todos os meios hábeis de propiciar o reexame de decisão interna pela própria Administração. Assim, no exercício de sua jurisdição a Administração aprecia e decide as pretensões de seus administrados e de seus servidores, aplicando o direito que entenda cabível, segundo a interpretação de seus órgãos técnicos e jurídicos. Os referidos meios hábeis de propiciar o reexame da atividade administrativa são a representação, a reclamação e o pedido de reconsideração.
Representação administrativa é a denúncia formal e assinada de irregularidades internas ou de abuso de poder na, prática de atos administrativos, feita por quem quer que seja à autoridade competente para conhecer e coibir tal ilegalidade apontada. O direito de representar é garantido constitucionalmente (art. 5.", XXXIV, a) e é incondicionado, imprescritível e independente do pagamento de taxas e pode ser exercido por qualquer pessoa, a qualquer tempo e em quaisquer circunstâncias. Quem, no entanto, fizer denúncia com falsidade de imputação poderá sofrer ação de responsabilidade civil e criminal.

Reclamação administrativa é a oposição expressa a atos da Administração que afetam direitos e interesses legitimes do administrado. O direito de reclamar é amplo e se estende a toda pessoa física ou jurídica que se sentir lesada ou ameaçada de lesão pessoal ou patrimonial por atos ou fatos administrativos. Pedido de Reconsideração é a solicitação da parte dirigida à mesma autoridade que expediu o ato para que o invalide ou o modifique nos termos da pretensão do requerente. Deferido ou indeferido, total ou parcialmente, não admite novo pedido nem possibilita nova modificação.

Cumpre observar, por fim, o que se deve entender por coisa julgada administrativa que, na verdade, não tem o alcance da coisa julgada judicial, tratando-se apenas de urna preclusão de efeitos internos visto que o ato administrativo não deixa de ser um simples ato de decisão, sem força conclusiva, como o ato jurisdicional do Poder Judiciário.

Por outro lado, a Administração Pública, para registro de seus atos, controle da conduta de seus agentes e solução de controvérsias dos administrados, utiliza-se de diversos procedimentos que recebem a denominação comum do processo administrativo. Mas, inicialmente há que se distinguir os dois conceitos:

Processo é o conjunto de atos coordenados para a obtenção de decisão sobre uma controvérsia no âmbito judicial ou administrativo. Procedimento é o modo de realização do processo, ou seja, é o rito processual. Assim, o processo pode realizar-se por diferentes procedimentos, embora haja inúmeros procedimentos administrativos que não constituem um processo, propriamente dito, como as licitações e os concursos.. O caracteriza um processo mesmo é o ordenamento de atos para a solução de um contraditório; e o que tipifica o procedimento de um processo é o modo específico do ordenamento desses atos.

Processo Administrativo é então o gênero que se reparte em várias espécies, dentre as quais destacam-se o processo disciplinar e o processo fiscal ou tributário, chamado de contencioso tributário. Além do mais, o processo administrativo está sujeito a certos princípios, entre os quais:

· legalidade objetiva, no qual só pode ser instaurado com base na lei e para preservação dela, a

· oficialidade, que é o princípio pelo qual sempre se atribui o processo à Administração, oficialmente, ainda que tenha sido provocado por particular;

· informalismo, pelo qual o processo administrativo dispensa ritos sacramentais e formas rígidas,

· verdade material ou liberdade da prova, o qual autoriza a Administração a valer-se de qualquer prova de que autoridade julgadora ou processante tenha conhecimento, desde que a faça transladar para o processo

· garantia do processo. assegurado pela Constituição (art. 5°, LV) em decorrência do princípio do devido processo legal ("due process of taw "), também garantido pela CF/88 (art. 5°, LIV), do direito anglo norte americano, garantindo o direito do contraditório (de defesa).

O Processo Administrativo Disciplinar, também chamado impropriamente de inquérito administrativo, é o meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinadas repartições públicas. O processo disciplinar é sempre necessário para imposição da pena de demissão ao funcionário estável (CF/88, art. 41 § 1°) e, segundo a jurisprudência, também para o funcionário efetivo, mesmo em estágio probatório. E é instaurado por portaria da autoridade competente e poderá ser revisto a qualquer tempo por parte do interessado, sempre que surgirem fatos novos ou que outras circunstâncias justificarem a inocência do acusado, ou que a pena a ele aplicada for considerada inadequada.

O Processo Administrativo Tributário ou Fiscal, é todo aquele que se destina à determinação, exigência ou dispensa do crédito tributário e também de consulta sobre a aplicação da legislação tributária, previsto na respectiva legislação fiscal (na federal, pelo Decreto n° 70.235, de 06/03/72).

b) Controle Legislativo ou Parlamentar

É o controle exercido pelos órgãos parlamentares ou legislativos, tanto federais, como estaduais e municipais, ou seja, pelo Congresso Nacional, Assembléias Legislativas, Câmara Legislativa (DF) e Câmara dos Vereadores (dos Municípios).

No regime federativo brasileiro, os Poderes do Estado não se confundem nem se subordinam, mas se harmonizam, cada qual realizando sua atribuição precípua. Cabe ao Executivo a realização das atividades administrativas, mas em algumas delas depende da cooperação do Legislativo, dada a relevância do ato e suas extensas repercussões políticas internas ou externas, que só o Parlamento está em condições de bem valorar e decidir sobre sua legitimidade e conveniência. O instrumento mais conhecido posto a cargo do Poder Legislativo para atos de controle é a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

O controle do Legislativo sobre o Executivo é de efeito indireto, não cabendo ao Congresso anular os atos administrativos ilegais e nem tem hierarquia sobre as autoridades executivas, mas a Constituição Federal de 1988 ampliou sensivelmente as atribuições do Legislativo para a fiscalização e controle dos atos da Administração em geral (direta ou indireta) nos termos do inciso X do art. 49.

Além dessas, há outras missões de controle político deferidas ao Congresso Nacional sobre a Administração, tais como: a de aprovação de tratados e convenções internacionais (art. 49, I); autorização ao Presidente da República para declarar a guerra e fazer a paz (art. 49, II); aprovação ou suspensão de intervenção federal ou de estado de sítio (art. 49, IV), julgamento das contas do Presidente da República (art. 49, IX); a fiscalização financeira e orçamentária da União (art. 70 e 71), nessa parte auxiliado pelo Tribunal de Contas da União (TCU - órgão técnico de apoio ao Poder Legislativo, que integra a sua estrutura), além de outras funções, como as privativas do Senado Federal (art. 52 da CF/88), como a de escolher Magistrados, Membros do TCU, Governador de Território, Presidente e Diretores do Banco Central, Procurador-Geral da República e titulares de outros cargos.

O Congresso Nacional tem também, em termos amplos, de fiscalização financeira e orçamentárias sobre a Administração, auxiliado pelo TCU (art. 70 a 75, da CF), em seu controle externo. Os Tribunais de Contas do Brasil (tanto o TCU, como o dos estados-membros, do DF e dos Município - atualmente só o Município de São Paulo o tem) exercem funções técnicas opinativas, verificadoras e de jurisdição administrativas em relação ao controle dos gastos dos respectivos Poderes, por meio de auditoria (controle a posteriori).

c) Controle Judiciário ou Controle Judicial

· Conceito:

É controle de legalidade exercido privativamente pelos órgãos do Poder Judiciário, em caráter definitivo, visando compor os conflitos de interesse que lhe são submetido, tendo como objeto processual as controvérsias versando sobre os atos administrativos do Executivo, do Legislativo e do próprio Judiciário, quando realiza atividade administrativa.

· Características:

O controle jurisdicional é externo, provocado, direto e repressivo (realizado a posteriori). É externo por se realizar por órgão que não integra a estrutura organizacional da Administração Pública. É provocado porquanto não atua de ofício, atuando apenas ante a provocação daqueles que se sintam por eles lesados É direto porque incide, precípua e imediatamente, sobre os atos e atividades administrativas.

Além disso, é, notadamente, repressivo, dado incidir sobre medida que já produziu ou está produzindo efeitos, quer dizer, é exercido a posteriori. Extraordinariamente, pode ser preventivo. É o que ocorre, por exemplo, com a ação declaratória, o habeas corpus e o mandado de segurança preventivos. Por essas medidas previne-se a atuação da Administração Pública havida por ilegal.

· Objetivo e Extensão

É bem de ver que a competência do Poder Judiciário para a revisão de atos administrativos ou atividades administrativas restringe-se, pois, unicamente ao controle da legalidade e da legitimidade do ato impugnado, confirmando um e outra, se legais, ou os desfazendo, se contrários ao Direito. Entende-se por legalidade aqui, a conformidade do ato com a norma que o rege, e, por legitimidade a conformidade do ato com a moral administrativa e com o interesse coletivo (princípios da moralidade e da finalidade), indissociáveis de toda a atividade pública. O controle jurisdicional, no entanto, não ocorre em matérias de conteúdo discricionário para a Administração Pública, vez que os aspectos de conveniência e oportunidade não podem ser objeto da análise jurisdicional, que não adentra nos juízos de valor. Em suma, a autoridade jurisdicional pode dizer o que é legal ou ilegal, mas não pode dizer o que é oportuno ou conveniente e o que é inoportuno ou inconveniente. Segundo o insigne Seabra Fagundes:

Ao Poder Judiciário é vedado apreciar, no exercício do controle jurisdicional, o mérito dos atos administrativos.
...........................................................................................................................
O mérito é de atribuição exclusiva do Poder Executivo, e o Poder Judiciário nele penetrando, faria obra de administrador, violando, com isso, o princípio de separação e independência dos poderes. (O Controle dos Atos Administrativos, pág. 116/7)

No mesmo sentido, sustenta o ilustre Lafayette Pondé:

O controle judicial é um controle de legalidade: verifica apenas se o ato é legal, ou ilegal. Na primeira hipótese, há de ser mantido o ato. Não há como o possa desfazer o judiciário, a menos que, subvertendo a ordenação constitucional, desfaça este a lei em que se fundou o ato. Mas se o ato é ilegal, o judiciário, longe de invadir a órbita administrativa impedirá que a Administração, ela própria usurpando a competência mesmo do legislativo, revogue a lei, pois a tanto equivaleria a subsistência do ato ilegal.(RDA 35/1954).

O antigo Tribunal Federal de Recursos, no julgamento dos embargos à apelação 3.244, seguindo o voto do Min. Macedo Ludolf, assim se manifestou:

não compete ao julgador perquerir da justiça ou injustiça do ato atacado, eis que, do contrário, haveria invasão franca das atribuições inerentes ao Poder Executivo. Isto é ponto pacífico. (RDA 34/229)

· Fundamento

É o próprio exercício da função jurisdicional, isto é, de determinar o direito aplicável a cada caso.
· Atos Sujeitos a Controle Especial pelo Judiciário

Os atos que sujeitos ao controle especial do Poder Judiciário são: os atos políticos, os atos legislativos e os atos interna corporis, nos quais a Justiça os aprecia com maiores restrições quanto aos motivos ou à via processual adequada.

Os atos políticos são os que, praticados por agentes do Governo, no uso de competência constitucional, fundam-se na ampla liberdade de apreciação da conveniência ou oportunidade de sua realização, sem se aterem a critérios jurídicos preestabelecidos. São atos governamentais por excelência, e não apenas de administração, os quais conduzem negócios públicos e não serviços públicos. O Executivo pratica ato político, v. g., quando veta um projeto de lei, ou quando nomeia um Ministro de Estado, ou ainda quando concede indulto, pois aí sempre entra a conveniência ou não do Estado em praticá-lo. Mas, como ninguém pode contrariar a Constituição, segue-se que qualquer ato do Poder Público poderá ser examinado pelo Judiciário, ainda mais quando argüido de inconstitucional ou de lesivo de direito de alguém.

Os atos legislativos, quer dizer, as leis propriamente ditas (normas em sentido formal e material) não ficam sujeitas a anulação judicial pelos meios processuais comuns, porém, podem ser anuladas pela via especial da ação direta de inconstitucionalidade (ADIN), tanto para a lei em tese como para os demais atos normativos, pois que estes, enquanto regras gerais abstratas, não atingem os direitos individuais e permanecem inatacáveis por ações ordinárias ou, mesmo, por mandado de segurança. Contudo, as leis e decretos de efeitos concretos podem ser invalidados em procedimentos comuns, em mandado de segurança ou em ação popular, porque já trazem em si os resultados administrativos objetivados, como por exemplo, as leis que criam um Município, ou as que extinguem vantagens para os servidores públicos, ou as que concedem anistia fiscal, entre outras.

O atual processo legislativo previsto na Constituição (arts. 59 a 69), de observância obrigatória em todas as Câmaras, bem como as normas regimentais próprias de cada corporação, estão sujeitas ao controle judicial visando resguardar-lhe a legalidade de sua tramitação e legitimidade da elaboração da lei. Assim também o processo de cassação de mandato pelas Câmaras Legislativas, vinculados às respectivas leis, tomou-se passível de controle de legalidade pela Justiça Comum.

Os interna corporis também são vedados à revisão judicial comum, mas é preciso que se entenda em seu exato conceito, e nos seus justos limites, o significado de tais atos. Em sentido técnico jurídico (conforme Hely L. Meirelles), interna corporis não é tudo que provém do seio da Câmara ou de suas deliberações internas, mas apenas aquelas questões ou assuntos que digam respeito direta e imediatamente com a economia interna da corporação Legislativa, com seus privilégios e com a formação ideológica da lei que, por sua própria natureza são reservados a exclusiva apreciação e deliberação do Plenário da Câmara, como os atos de escolha da Mesa (eleições internas), cassação de mandatos, concessão de licenças, etc.

· Sistemas

São os regimes de controle da legalidade dos atos e das atividades administrativas, adotados pelo Estado com o fito de mantê-los, se legítimos, ou de desfazê-los, se ilegais. A doutrina costuma distinguir três sistemas:

a) Sistema de administração-juiz: As funções de julgar e administrar, nesse sistema, encontravam-se integradas no mesmo órgão ou atividade. Nesse sistema, que não existe mais em nossos dias, quem executa também julga. A título de alegoria o Filme O Juiz, com Silverst Staloni, nos dá uma boa idéia deste sistema.

b) Sistema de Jurisdição Única: As funções de julgar e administrar, no sistema de jurisdição única, também chamado de sistema judiciário ou inglês, em razão de suas origens, são desempenhadas por órgãos distintos, pertencentes a Poderes diversos. Assim, os órgãos do Executivo administram, enquanto os do Judiciário julgam. Por esse sistema, todos os litígios são resolvidos, em caráter definitivo, pelo Judiciário. Desse modo, tanto os conflitos entre particulares como entre os particulares e o Estado ou entre duas entidades públicas são solucionados por juizes e Tribunais do Poder Judiciário. Através do Judiciário, portanto, resolvem-se todos os litígios, sejam quais forem as partes interessadas ou a matéria de direito ou de fato que se discute.

Afeiçoa-se ao princípio da tripartição das funções do Estado. Com efeito, por esse princípio cada Poder há de exercer função própria. Quem for encarregado, de uma não pode desempenhar outra. Nisso está seu fundamento. Existe na Inglaterra, seu local de nascimento, nos Estados Unidos da América do Norte e no Brasil, entre outros países. No Direito brasileiro, vigora a regra: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito" (CF, art. SP, XXXV).

Suas decisões fazem coisa julgada.

c) Sistema de jurisdição dual: Também chamado sistema de jurisdição dupla, sistema do contencioso administrativo ou sistema francês, em razão de sua origem. Tal sistema consagra duas ordens jurisdicionais. Uma dessas ordens cabe ao Judiciário, outra a organismo próprio do Executivo, chamado de Contencioso Administrativo. O Contencioso Administrativo incumbe-se de conhecer e julgar, em caráter definitivo, as lides em que a Administração Pública é parte (autora ou ré) ou terceira interessada, cabendo a solução das demais pendências ao Poder Judiciário. Nesse sistema, vê-se que a Administração Pública tem uma Justiça própria, localizada fora do Judiciário. Do mesmo modo que o sistema de jurisdição única, também se funda no princípio da separação dos Poderes. Essa separação impede o julgamento de um Poder por outro. Suas decisões, como as do Judiciário, fazem coisa julgada.

Nasceu na França e é hoje acolhida na Itália, na Alemanha Ocidental e no Uruguai, entre outros países. No Brasil, durante o Império, tentou-se sua instituição e na Constituição de 1967 previu-se um mecanismo com esse nome, mas sem seus principais atributos, que nunca chegou a ser implantado.

· Instrumentos do Controle Jurisdicional

Os meios de controle judiciário dos atos administrativos de qualquer dos Poderes são as vias processuais de procedimento ordinário, sumaríssimo ou especial de que dispõe o titular do direito lesado ou ameaçado de lesão, para poder obter a anulação do ato ilegal em ação contra a Administração Pública, como a ação de mandado de segurança individual regra esta excepcionada pela ação popular e pela ação civil pública, onde o direito defendido não é apenas de um titular mas da própria coletividade, ou seja, de interesses difusos, além da já mencionada ação direta de inconstitucionalidade.

A quase unanimidade destes instrumentos de controle jurisdicional de Administração Pública são exercitados na instância civil, enquanto o habeas corpus, também instrumento desse controle, é utilizado na instância penal.

Na verdade, contra a Fazenda Pública cabem quaisquer procedimentos judiciais contenciosos aptos a impedir, reprimir ou invalidar ato ilegal ou abusivo contra o cidadão ou seu patrimônio, mas há ações especiais e rápidas, entre as quais as seguintes:

Mandado de Segurança Individual que é o meio constitucional, writ dos ingleses, posto à disposição de toda a pessoa física, jurídica e órgão com capacidade processual (Assembléia Legislativa, Câmara de Vereadores) para proteger direito individual próprio, liquido e certo, não amparado por habeas corpus, lesado ou ameaçado de lesão por ato de qualquer autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça (CF/88, art. 5.°, LXIX).

O instituto do mandado de segurança está regulado pela Lei n.° 1.533, de 31/12/51 e é ação civil de rito sumário especial, sujeita a normas procedimentais próprias. As disposições do CPC só supletivamente lhe são aplicáveis. Suas partes, na relação jurídico-processual que se instaura com a impetração, são o impetrante, isto é, o titular do direito lesado ou ameaçado de lesão, o impetrado, ou seja, a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de poder, também chamada de autoridade coatora, e o Ministério Público (Parquet), além, por certo, dos litisconsortes, do impetrante ou impetrado.

São atos de autoridade, suscetíveis dessa medida, todos os que consubstanciam uma ação ou omissão da Administração Pública, ou de quem lhe faça as vezes, no desempenho de suas funções ou a pretexto do seu desempenho. Por outro lado, entende-se como autoridade coatora aquela que pratica o ato impugnado. Assim, não é coatora a autoridade que recomenda a prática do ato ou expede normas para a sua edição e execução. Apesar disso, não se considera coator o agente público subalterno, responsável pela mera execução material do ato. Diga-se, ainda, que não se impetra a medida contra quem não pode atender, por falta de competência, a determinação judicial.

"Direito líquido e certo", na bem elaborada definição de Hely Lopes Meirelles (Direito administrativo, cit., p. 614), "é o que se a apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração", ou, de forma mais simples, "é o que se apoia em fatos incontroversos, fatos incontestáveis", na lição de Carlos Mário da Silva Velloso (Mandado de segurança, RDP, 55/56:333).

Para a interposição da ordem o impetrante tem somente cento e vinte dias, contados da data do ato a ser impugnado. Esse é o prazo para a impetração. Após o seu decurso, esta não mais caberá. Nesse caso, a defesa do direito há de se fazer pelas vias ordinárias.

O mandado de segurança é ação judicial que admite, quando relevantes os fundamentos da impetração, e se concedida a ordem final, esta for ineficaz, a suspensão liminar, pelo prazo de noventa dias, da medida tomada pela Administração Pública e que se quer ver impugnada. A liminar, quando concedida, tem efeito mandamental e imediato, não podendo ser obstada na sua execução por qualquer recurso comum, salvo pelo Presidente do Tribunal competente para a apreciação da decisão inferior. Poderá ser mantida ou cassada na sentença do mandamus, isto é, na decisão do mandado de segurança.

Impetrada a segurança, a autoridade coatora é notificada para, no prazo de dez dias, oferecer as informações sobre a matéria versada pelo writ. Atendido, ou não, o pedido de informações e com o transcurso do prazo, ouve-se o Ministério Público. Após, ocorrerá a sentença. Da decisão, conforme a circunstância, cabem os recursos: agravo de petição, recurso ordinário, recurso extraordinário, além, é evidente, dos embargos de declaração. Se a sentença conceder a segurança, é obrigatório, por parte do juiz, o recurso de ofício.

Mandado de Segurança Coletivo é uma inovação da CF/88 (art. 5.°, LXX), e também remédio posto à disposição de partido poli tico com representação no Congresso Nacional, ou de organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída, e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa do interesse de todos os seus membros ou associados, inclusive quanto ao direito líquido e certo, mas coletivo e não individual, tratado na Lei n.° 8.437,de 01/07/92.

Ação Popular: É o instrumento judicial posto à disposição de qualquer cidadão (eleitor) por via constitucional (art. 5° LXXIII) para obter a invalidação de atos, contratos e outros medidas da Administração Pública e de suas autarquias, das entidades da administração indireta ou das entidades subvencionadas pelos cofres públicos, ilegais e lesivos aos respectivos patrimônios, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Está prevista no inciso LXXIII do art. 59 da Constituição Federal, e regulada pela Lei federal n° 4.717/65, no que não afrontar a Constituição Federal. Não é medida posta a serviço de pessoa jurídica. Só o cidadão, portador de título de eleitor, pode usá-la.

A ação popular é de rito ordinário, com as modificações introduzidas pela sua lei regulamentadora. São partes na relação jurídico-processual que se estabelece, como sujeito ativo, o cidadão, isto é, a pessoa física no gozo de seus direitos políticos, ou seja, o eleitor, como sujeito passivo, um dos mencionados no art. 6°, o Ministério Público e os litisconsortes, se houver.

Pela ação popular o autor não protege direitos próprios, mas interesses da comunidade. O beneficiário é o povo, titular do direito subjetivo a um governo honesto, conforme ensina Hely Lopes Meirelles. Pode ser repressiva ou preventiva na defesa do patrimônio público, que é entendido como sendo os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético ou histórico. Por essa razão a Constituição Federal o isenta de custas judiciais e da sucumbência, salvo comprovada má-fé (art. 5°, LXX III).

O juízo competente para conhecer e julgar a ação popular é o indicado pelo art. 5° da Lei da Ação Popular, que prescreve: "Conforme a origem do ato impugnado, é competente para conhecer da ação, processá-la e julgá-la o juiz que, de acordo com a organização judiciária de cada Estado, o for para as causas que interessam à União, ao Distrito Federal, ao Estado ou ao Município".

A condenação do réu nessa ação consistirá na invalidação da medida impugnada, com a conseqüente restituição dos bens ou valores, ou, ainda, no pagamento de perdas e danos. Por essa ação o então Prefeito de São Paulo, Paulo Salim Maluf, foi condenado a ressarcir o tesouro municipal pela ilegal e lesiva doação de carros a jogadores de futebol que haviam ganho o campeonato mundial nessa modalidade esportiva, em 1970.

Ação Civil Púbica, disciplinada pela Lei n° 7.347, de 24/07/85, é o instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e a qualquer outro interesse difuso ou coletivo (art. 1°). Não se presta para amparar direito individual e nem a reparar prejuízos causados a particulares pela conduta comissiva ou omissiva do réu.

A ação pode ser proposta pelo Ministério Público, União, Estados, Municípios, autarquia, empresa pública, fundação, sociedade de economia mista ou associação que esteja constituída há pelo menos cinco anos e inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico, e paisagístico, consoante estabelece o art. 5° da citada lei, contra as pessoas físicas e jurídicas, e estas públicas (União, Estado-membro, Município, Distrito Federal e autarquia), privadas (sociedade mercantil e industrial) ou governamentais (sociedades de economia mista, empresa pública, fundação) responsáveis por fatos, atos e situações que violem normas de proteção ao meio ambiente e ao consumidor.

A ação civil pública deve ser proposta no foro do local onde ocorrer o dano, conforme estabelece o art. 2° da referida lei. Nesse foro também deve ser ajuizada qualquer medida cautelar. O rito dessa ação é o ordinário, e admite liminar quando solicitada pelo autor. Com a liminar fica suspensa a atividade que ensejou a medida. A responsabilidade do réu é objetiva, isto é, não há necessidade de o autor demonstrar que o réu agiu com dolo ou culpa. É suficiente a demonstração do dano que esse foi causado pelo réu. Ao réu, em defesa, só cabe, dada a natureza de sua responsabilidade, demonstrar que não é o responsável pelo fato, ato ou situação que causa lesão ao meio ambiente ou ao consumidor, ou que o fato, o ato ou a situação lesiva não aconteceu, ou, finalmente, que seu comportamento não é lesivo e sua conduta é legal e está autorizada pela autoridade competente.

A sentença poderá condenar o réu a uma obrigação de fazer não fazer, ou a uma indenização.

Aos membros da Ministério Público cabe promover o inquérito e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, consoante dispõe o art. 129, III, da Constituição. Apesar disso, terceiros também podem propor essa ação, nos termos do § 1° desse artigo.

Mandado de Injunção: Nem todas as normas constitucionais são auto-aplicáveis. Algumas, e são muitas, dependem de regulamentação complementar. A falta dessa complementação legal pode ser o motivo que inibe o destinatário de fruir o benefício consignado na regra constitucional. Assim ocorre com certos direitos assegurados no art. 7° da Constituição Federal aos trabalhadores urbanos e rurais, a exemplo dos direitos a um piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho, à licença-paternidade, consignados, respectivamente, nos incisos V e XIX. Quando isso ocorrer, diz o inciso LXXI do art. 5° da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de Injunção". O mandado de Injunção é ação civil constitucional de natureza mandamental, posto à disposição de quem se sentir prejudicado por falta de norma legal ou regulamentadora que torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes a direitos e liberdades, à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Se houver a regulamentação, entendemos não caber a impetração. O impetrado é o Poder Público federal, estadual, distrital e municipal, que deveria ter promovido a complementação legal e não o fez.

Habeas-data é, igualmente, o meio constitucional posto à disposição de toda a pessoa física ou jurídica para lhe assegurar o conhecimento de registros concernentes ao postulante e existentes em repartições públicas ou particulares, acessíveis ao público, ou para retificação de seus dados pessoais (art. 5°, LXXII, a e b)..

A CF/88 acolheu este instituto já conhecido de outros, povos, por força de suas Cartas Constitucionais, de que são exemplos a Constituição portuguesa de 1976 (art. 35) e da Espanhola de 1978 (art. 105), ou em razão de suas leis ordinárias, como ocorre na França e nos Estados Unidos da América do Norte.

Obviamente que só caberá "habeas corpus" se houver recusa por parte da autoridade administrativa em fornecer as informações desejadas pelo particular postulante. A retificação, cremos, pode visar uma correção ou uma complementação O inciso referido deixa entrever que o mesmo direito pode ser conseguido por processo sigiloso, judicial ou administrativo.

Pode ser impetrado por qualquer pessoa física ou jurídica, nacional ou estrangeira. São sujeitos passivos da impetração as pessoas públicas ou privadas. Estas só se mantiverem registros ou bancos de dados de natureza pública (Serviço de Proteção de Crédito). O rito processual, dada a grande semelhança desse instituto com o mandado de segurança, é o instituído para este writ, com a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.

Ação direta de Inconstitucionalidade (ADIN) de lei ou ato normativo federal ou estadual, prevista na Constituição/88, em seu art. 102, I, a, como competência originária do STF, é procedimento especial regulamentado pela Lei n° 4.337, de 01/06/64, com alteração dada pela Lei n° 5.778, de 15/05/72, que pode ser ajuizada a qualquer tempo pelo Procurador-Geral da República ou por qualquer das autoridades, das entidades ou dos órgãos que a própria CF/88 enumera em seu art. 103, contra a lei em tese ou qualquer ato normativo, antes mesmo de produzir seus efeitos concretos.

Há ainda a medida cautelar (CF/88, art. 102, I, p) e outras ações especiais ou ordinárias contra atos da Administração.



5) A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM JUÍZO

Em juízo, a Administração Pública recebe a denominação de Fazenda Pública. Assim, é a Fazenda Pública federal, estadual ou municipal que como ré ou autora, comparece para defender os interesses públicos. De regra tem foro próprio e juízo privativo, nos termos da Constituição Federal, da Lei de Organização da Justiça Federal e das Leis de Organização da Justiça Estadual.

A União, suas autarquias e empresas públicas, em primeira instância, demandam perante a Justiça Federal, sediada na capital de cada Estado-membro, salvo as exceções, e, em segunda instância, junto ao Tribunal Regional Federal, onde vão ter os recursos ordinários. A ação decorrente das relações de trabalho entre a União, as autarquias federais, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as fundações federais e seus respectivos servidores, independentemente da natureza do vínculo que os liga a uma dessas entidades, processa-se perante a Justiça do Trabalho, onde também são decididos os recursos eventualmente interpostos.

Os Estados federados, nas causas de competência da Justiça Estadual, litigam na respectiva capital, em juízo, privativo ou comum, salvo em relação às ações reais e aos mandados de segurança, cujo foro é, respectivamente, o da situação do bem ou da sede da autoridade coatora. Os seus servidores celetistas demandam perante a Justiça do Trabalho (Junta de Conciliação e Julgamento) ou no juízo comum do local de trabalho.

Na Comarca, demandam os Municípios que, conforme a organização judiciária estadual, podem ter, ou não, juízo ou Vara privativa. O Município da Capital de São Paulo tem Vara privativa, por exemplo.

A representação da Fazenda Pública federal, em juízo, é feita por seus Procuradores e advogados. Os advogados da Fazenda Pública não carecem de qualquer procuração judicial para o desempenho de suas atribuições junto aos órgãos do Judiciário, por se presumir incita na nomeação. Necessitam de autorização legislativa para confessar, transigir ou desistir, dado excederem tais atos dos poderes de guarda, conservação e aprimoramento dos bens, interesses e direitos da Administração Pública. Assim é, em razão da indisponibilidade desses interesses.

Como autora, ré, assistente ou oponente a Fazenda Pública litiga em juízo tal qual o particular, embora goze de alguns privilégios, como prazos maiores para contestar (quádruplo) e recorrer (dobro). As despesas judiciais (custas, emolumentos, salários de peritos e honorários) devidas pela Fazenda Pública federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal serão pagas, a final, pelo vencido no pleito (CPC, art. 27). Até mesmo do preparo de seus recursos está dispensada.


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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO





1) NOÇÕES GERAIS

A responsabilidade é uma categoria jurídica comum ao Direito Privado e ao Direito Público, cabendo-lhe sua estruturação à Teoria Geral do Direito que, abstraindo e generalizando, alcança as formas puras, os modelos jurídicos descompromissados ainda com qualquer dos ramos da ciência do Direito. O certo é que a administração pública sem adentrarmos na Teoria Geral do Direito, e tentarmos vislumbrar a natureza jurídica da responsabilidade civil do Estado, modernamente, responde civilmente pelos atos que, através dos seus servidores ou agentes, pratica em prejuízo de terceiros.

Tanto quanto os particulares, é a administração pública obrigada a reparar prejuízos que da sua atividade venham a resultar para o patrimônio alheio individual. A reparação do dano compreende o dano emergente, isto é, o dano resultante do fato lesivo, e também os lucros cessantes, os honorários advocatícios e os juros de mora, sendo que, em caso de lesão corporal ou morte, abrange também as despesas de tratamento ou de sepultamento e os alimentos, estes devidos aos parentes da vítima.

Pode a ação de indenização ser promovida não só contra as entidades estatais responsáveis (União, Estados, Municípios) como contra as autarquias e as entidades paraestatais. Na execução da sentença condenatória, deve observar-se o disposto no art. 100 da Constituição, em virtude do qual os pagamentos devidos pela Fazenda Pública, por força de sentença judiciária, deverão fazer-se na ordem de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, sendo proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações para esse fim.

Cabe por outro lado, recorrer à intervenção federal nos termos do art. 34, n° VI, do texto constitucional, quando necessária para a efetiva execução da decisão judiciária. A Administração Pública pode defender-se no processo judicial indenizatório, pela demonstração da inexistência de relação de causa e efeito entre o fato e o dano alegado pelo autor da ação ou pela prova de que o fato se deveu, no todo ou em parte, à culpa da vítima.Uma vez condenada e depois de haver transitado em julgado a sentença condenatória (res judicata), cabe a administração propor contra os funcionários causadores do dano, a ação regressiva.



2) DEFINIÇÃO E TIPOS DE RESPONSABILIDADE

Segundo Cretella Júnior:

"Responsabilidade é vocábulo que serve para a situação de todo homem a quem, por qualquer titulo, incumbem as conseqüências de um fato danoso.

A responsabilidade pode nascer de contrato recebendo o nome de responsabilidade contratual e nascer fora do contrato corresponde à responsabilidade extra contratual.

Podemos englobar estas responsabilidades em duas esferas: privada e pública. Cretella Júnior ainda afirma:

A responsabilidade pública é a que, se subordina a um regime jurídico de direito exorbitante e derrogatório do direito comum, inconfundível com o regime jurídico de direito privado, que é estudado pelo direito civil.

Podemos observar, ainda, a existência da chamada responsabilidade civil, penal, disciplinar e, segundo outros, também a chamada responsabilidade contábil. Entretanto, no âmbito do direito público, interessa a responsabilidade do Estado, que só pode ser de um tipo: a responsabilidade civil. Desse modo, temos que o Estado não pode ser responsável penalmente, vez que as pessoas jurídicas não podem ser presas por uma impossibilidade material.

Costuma-se dizer que ocorre a responsabilidade civil do Estado por ato lesivo de seu preposto, que é o funcionário público. Como o Estado é uma abstração, síntese e não soma dos indivíduos que o compõem, os agentes públicos ou funcionários Públicos são os que, por ação ou omissão, causam danos a terceiros, o que empenha a responsabilidade civil do Estado preponente, em virtude de ato danoso de seu preposto. A filosofia também na seara pública é a aplicação da velha máxima: o ato do preposto obriga o preponente.



3) FUNDAMENTO

O fundamento da responsabilidade patrimonial do Estado é bipartidário, conforme seja ela decorrente de atos lícitos ou ilícitos. No caso dos atos lícitos (construção de um calçadão que impede a utilização de um prédio, construído e regularmente utilizado como garagem), o fundamento é o princípio da distribuição igualitária dos ônus e encargos a que estão sujeitos os administrados. Destarte, se o serviço ou a obra é de interesse público, mas, mesmo assim, causa um dano a alguém, toda a comunidade deve responder por ele, e isso se consegue através da indenização. Para essa indenização todos concorrem, inclusive o prejudicado, já que este, como os demais administrados, também paga tributos. No caso dos atos ilícitos (descumprimento da lei), o fundamento é a própria violação da legalidade.



4) EVOLUÇÃO

Atualmente, a responsabilidade civil do Estado é aceita universalmente. Esse consenso é expressado pela doutrina, pela jurisprudência e pela legislação dos povos civilizados. Segundo dito consenso, o Estado tem de recompor o patrimônio diminuído em razão de seus atos, a Administração Pública viveu fases distintas, indo da irresponsabilidade para a responsabilidade com culpa, civil ou administrativa, e desta para a responsabilidade sem culpa, nas modalidades do risco administrativo e do risco integral.

Podemos assim dispor essas fases:

No sistema da responsabilidade com culpa civil do Estado, também chamada de responsabilidade subjetiva do Estado, instaura-se sob a influência do liberalismo, que assemelhava, para fins de indenização, o Estado ao indivíduo. Por esse artifício o Estado tornava-se responsável e, como tal, obrigado a indenizar sempre que seus agentes houvessem agido com culpa ou dolo. O fulcro, então, da obrigação de indenizar era a culpa do agente. É a teoria da culpa civil. Essa culpa ou dolo do agente público era a condicionante da responsabilidade patrimonial do Estado. Sem ela inocorria a obrigação de indenizar. O Estado e o indivíduo eram, assim tratados de forma igual. Ambos, em termos de responsabilidade, respondiam conforme o Direito Privado, isto é, se houvessem se comportado com culpa ou dolo. Caso contrário, não respondiam.

No sistema de culpa do serviço ou administrativa, levam-se em conta, para o efeito da responsabilidade civil do Estado, a inexistência do serviço público, o seu mau funcionamento ou a sua ação retardada.

Comprovado qualquer desses fatos em determinado caso, os danos que dele resultarem para os particulares deverão ser indenizados pelo Estado.

Sob o segundo sistema - o do risco administrativo ou objetiva - considera-se o Estado responsável em razão do risco constituído pela sua posição de superioridade em relação aos indivíduos, que, em última análise, são quem suporta, através dos tributos os ônus da reparação pecuniária conseqüente aos males ou danos produzidos pelo uso da máquina administrativa. Ao Estado pois, incumbe, em compensação, indenizar os prejuízos ocasionados pela sua atividade, uma vez estabelecido o nexo causal entre o fato e o evento danoso, independentemente da consideração de haverem os agentes públicos procedidos com dolo ou culpa, só se devendo ter em vista a ocorrência de culpa ou dolo no comportamento da vítima.

Finalmente, o sistema de risco integral é aquele segundo o qual o Estado é sempre responsável pela reparação do dano, desde que entre este e o fato haja relação de causa e efeito, não importando que tenha havido ou não culpa ou dolo por parte da vítima ou dos agentes da administração.

Convém lembrar que nas teorias acima os conceitos de culpa e dolo são os mesmos do Direito em geral. O agente público atua com culpa quando age com imprudência, negligência ou imperícia. Eis aí a noção de culpa. Dolo, de outra parte, é a vontade, o desejo consciente do agente público voltada para a prática de um ato que sabe ser contrário ao Direito.



5) RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Responsabilidade civil é a que se traduz na obrigação de reparar danos patrimoniais, e se exaure com a indenização.

O Douto Hely Lopes Meirelles preleciona:

"Como obrigação meramente patrimonial, a responsabilidade civil independe da criminal e da administrativa, com as quais pode coexistir, sem, todavia, se confundir. Responsabilidade Civil da Administração é, pois, a que impõe à Fazenda, Pública a obrigação de compor o dano causado a terceiros, por agentes públicos, no desempenho de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las. É distinta da responsabilidade contratual e da legal".

A atual Constituição Federal, no seu art. 37, § 6°, assim dispõe:

"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos dolo ou culpa.

O que importa é que o agente da Administração tenha realizado o ato ou a omissão administrativa no exercício de suas atribuições.

Por tal preceptiva as pessoas jurídicas de direito público, ou, vale dizer, a União, os Estados-membros, os Municípios, o Distrito Federal, os Territórios e as autarquias, e as de direito privado (criadas pelo Estado, a exemplo das sociedades de economia mista, empresas públicas e fundações, ou pelos particulares, tais como as sociedades mercantis e as industriais), prestadoras de serviços públicos, responderão objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Ainda respondem nestes termos as pessoas físicas, se prestadoras de serviço público.

Além disso, não importa a que título (autorização, permissão ou concessão) essas pessoas prestam serviços públicos ou se a prestação tem caráter permanente ou eventual. Isso é irrelevante. A Constituição, para torná-las responsáveis, só exigiu que fossem prestadoras de serviços públicos, a exemplo das de transporte. Tampouco importa, para esse fim, que seus vínculos com o Poder Público titular do serviço estejam em vigor. O que é relevante é o fato de, no momento da ocorrência do dano, serem prestadoras de serviço público. Ademais, exaurido o patrimônio dessas entidades, pelo restante responde, subsidiariamente, o Poder Público titular do serviço.

Não responderão, objetivamente, se entregues a outras atividades, mediante intervenção na ordem econômica. Nesses casos, responderão como um particular qualquer (Constituição da República, art. l73, § 19, e CC, art. 15), segundo os princípios da teoria da responsabilidade patrimonial com culpa ou teoria subjetiva da responsabilidade patrimonial do Estado.

Tampouco há responsabilidade objetiva nos casos de danos decorrentes de força maior (raio, incêndio, inundação, vendaval) ou oriundos de casos fortuitos, a exemplo dos atos multitudinários, da greve e da grave perturbação da ordem, dado que o Estado e as demais pessoas prestadoras de serviços públicos não os causaram. Por esses danos podem responder subjetivamente, isto é, nos termos da teoria da culpa administrativa. Ainda, não respondem, quer objetiva, quer subjetivamente, pelos furtos, acidentes de trânsito, porque o semáforo enguiçou, e outros, dado que decorrentes do risco comum que os administrados assumem por viverem em sociedade, salvo no caso de furto se praticado por assaltante foragido de uma penitenciária.

O texto constitucional em apreço exige para o ressarcimento uma ação do agente público, dada a utilização do verbo causar ("causarem"). Isto não significa que se há de ter por pressuposto uma atuação do agente público e que não haverá responsabilidade objetiva por atos omissos. Os danos são causados por ação ou omissão do agente público. Assegura Hely Lopes Meirelles, em lição ainda hoje válida:

"O essencial é que o agente da Administração haja praticado o ato ou omissão administrativa no exercício de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las". (Direito administrativo, cit. p. 556)

Dessa forma, não cremos assistir razão aos que entendem haver responsabilidade objetiva somente nos casos de uma ação como de uma omissão, vez que, a inexistência do serviço, o seu mau funcionamento ou a sua ação retardada ensejam responsabilidades por parte do estado.

O que se exige é que o dano há de ser causado por um agente do Estado ou de qualquer das pessoas privadas prestadoras de serviço público. Assim, não é apenas o funcionário ou o servidor, mas todo aquele que, ligado a essas entidades, cause dano a alguém no exercício de suas competências ou a pretexto de exercê-las. Desse modo, parece-nos que a expressão agente, propositadamente incluída no texto dessa regra, deve ser entendida em seu conteúdo lato, isto é, na condição de gênero, abrigando as duas espécies o administrativo (sem dúvida) e o político. É imprescindível que o agente esteja no desempenho de seu cargo, emprego ou função pública ou entidade a que está vinculado. Sendo assim, não responde o Estado nem as pessoas privadas prestadoras de serviços públicos, por dano causado por alguém que não é seu agente ou que, embora o seja, não está por ocasião do dano, no desempenho das atribuições do seu cargo, função ou emprego público, a exemplo do funcionário que promove quebra-quebra em um bar por ter tido com seu proprietário uma desavença qualquer. Contudo, parece-nos revestido de responsabilidade civil do Estado ato de terceira pessoa estranha aos quadros da administração, que induz a comunidade a erro, dano a entender ser servidor público. É o caso de um ladrão que se veste de policial e a bordo de uma viatura oficial assalta um transeunte.

Abstraindo-nos dos detalhes, e a título de regra geral, para o lesado, em suma, é indiferente o titulo pelo qual o causador direto do dano esteja vinculado à Administração; o necessário é que se encontre a serviço do Poder Público, embora atue fora ou além de sua competência administrativa. Trata-se, portanto da eleição, por parte do Constitucionalista brasileiro do sistema que acolhe a responsabilidade sem culpa do Estado, sob a modalidade do risco administrativo, consagrando a orientação doutrinária e jurisprudencial que em torno da regra da ordem Constitucional anterior se desenvolveu.



6) RESPONSABILIDADE CIVIL, PENAL E DISCIPLINAR

Pode ser civil, Penal, disciplinar. Sendo pessoa jurídica de direito público, o estado apenas pode ser responsabilizado civilmente, ou seja, patrimonialmente, em razão de prejuízos ocasionados por seus agentes. Logo, o Estado, pessoa jurídica pública, responde civilmente por danos causados pelo agente público, que age ou deixa de agir, quando se prova o dano efetivo e o nexo causal entre o dano e o agente público, causa eficiente do dano.



7) CARACTERÍSTICAS DO DANO INDENIZÁVEL

Só é reparável pela Administração Pública causadora do evento danoso o dano que for certo (possível), especial (individualizado, pois, se generalizado, configuraria ônus comum à vida em sociedade), referente a uma situação protegida pelo Direito (não são protegidos os danos causados a uma atividade ilícita, conforme ensina Celso Antônio Bandeira de Mello - Elementos, cit., p. 259), e, acrescentamos nós, de valor economicamente apreciável (não tem sentido a indenização de dano de valor economicamente irrisório).

8) EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE

Por certo não se há de admitir sempre a obrigação de indenizar do Estado. Com efeito, o dever de recompor os prejuízos só lhe cabe em razão de comportamentos danosos de seus agentes e, ainda, assim, quando a vítima não concorreu para o dano. Desse modo, em duas hipóteses o Estado não tem que indenizar. A primeira diz respeito a acontecimento, imprevisível e irresistível, causado por força externa ao Estado, do tipo do tufão e da nevasca (caso fortuito) ou da greve e da greve perturbação da ordem (força maior). Destarte, demonstrado que o dano é uma decorrência de acontecimentos dessa ordem, não há o Estado que indenizar, dado não ter sido ele o causador do dano, nem agido como dolo ou culpa. Todavia, os tribunais vem decidindo que o Estado é responsável, ainda que tendo ocorrido motivo de força maior perante particulares pelo mau funcionamento dos serviços públicos. A segunda diz respeito aos casos em que a vítima concorreu, parcial ou totalmente, para o evento danoso. Logo, provado que a vítima participou, de algum modo, para o resultado gravoso, exime-se o Estado da obrigação de indenizar, na mesma proporção. Assim, sua responsabilidade será parcial ou total conforme tenha sido a colaboração da vítima no evento.



9) FATO DO PRÍNCIPE

Medida editada pela Administração (= o Príncipe, o Estado) que tem por conseqüência tornar mais difícil e onerosa a realização do contrato. Essa medida, se imprevisível ao tempo da contratação, enseja ao contratante direito de exigir a reparação do prejuízo causado pela Administração, Pública.


10) RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR ATOS LEGISLATIVOS E JUDICIAIS

Por atos (permissão, licença) ou fatos (atos materiais, a exemplo da construção de obras públicas) administrativos que causem danos a terceiros a regra é a responsabilidade civil do Estado, mas por atos legislativos (leis) e judiciais (sentenças) a regra é a irresponsabilidade. Em princípio, o Estado não responde por prejuízos decorrentes de sentença ou de lei, salvo se expressamente imposta tal obrigação por lei ou se oriunda de culpa manifesta no desempenho das funções de julgar e legislar.

A lei e a sentença, atos típicos, respectivamente, do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, dificilmente poderão causar dano reparável (certo, especial, anormal, referente a uma situação protegida pelo Direito e de valor economicamente apreciável). Com efeito, a lei age de forma geral, abstrata e impessoal e suas determinações constituem ônus generalizados impostos a toda a coletividade. Nesse particular, o que já se viu foi a declaração de responsabilidade patrimonial do Estado por ato baseado em lei declarada, posteriormente, como inconstitucional. Assim, a edição de lei inconstitucional pode obrigar o Estado a reparar os prejuízos dela decorrentes. Fora dessa hipótese, o que se tem é a não obrigação de indenizar.

A sentença não pode propiciar qualquer ressarcimento por eventuais danos que possa acarretar às partes ou a terceiros. Devem ser ressalvadas as hipóteses de condenações pessoais injustas, cuja absolvição é obtida em revisão criminal (CF, art. 59, LXXV). Observe-se que nos casos em que o juiz, a exemplo do que prevê o art. 133 do Código de Processo Civil, responde, pessoalmente, por dolo, fraude, recusa, omissão ou retardamento injustificado de atos ou providências de seu ofício, não se tem responsabilidade patrimonial do Estado. A responsabilidade é do juiz, não se transmitindo ao Estado.



11) RESPONSABILIDADE DAS AUTARQUIAS E EMPRESAS PRIVADAS PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO

As autarquias são pessoas jurídicas de direito público e como tal responde, objetivamente, pelos danos que seus servidores, nessa qualidade, possam causar a terceiros. De outro modo: essas entidades respondem nos termos do § 6° do art. 37 da Constituição da República, e seu servidor, causador direto do prejuízo, é responsável, na conformidade do disposto na parte final desse parágrafo, isto é, se culpado, deve recompor o patrimônio da autarquia desfalcado, com a satisfação da indenização. Assim também respondem as fundações públicas e seus servidores, se culpados, pelos danos causados.

De igual modo respondem as empresas governamentais (sociedades de economia mista, empresas públicas) e as particulares (sociedades comerciais ou industriais), e as pessoas físicas prestadoras de serviços públicos, como são, entre outras, as de distribuição de gás, iluminação pública, captação e distribuição de água, transporte coletivo por meio de ônibus, avião ou trem, em razão do mesmo fundamento. Acolheu-se, assim, o entendimento que alargava a regra configurada no art. 107 da Constituição anterior. Para esse fim é irrelevante a natureza (autorização, permissão ou concessão) do vínculo que as liga ao Poder Público titular do serviço ou a circunstância de estar ou não em vigor o respectivo liame ou, ainda, se a prestação do serviço é remunerada ou graciosa. Assim, o que as nivela, em termos de responsabilidade patrimonial, por danos causados a terceiros por seus agentes, às pessoas jurídicas de direito público, é a condição de prestadoras de serviço público.

Por outro lado, a pessoa pública concedente ou permitente, uma vez exaurido o patrimônio da entidade privada ou governamental, concessionária ou permissionária de certo serviço público, responderá pelo valor remanescente e até a satisfação integral do direito da vítima, ofendida pelo ato ou fato danoso. No caso, a responsabilidade do Estado, como se vê, é subsidiária.

Ademais, diga-se que, se o Estado extinguir qualquer de suas empresas (sociedades de economia mista, empresas públicas), ou se uma delas vier a falir (embora o art. 242 da Lei das Sociedades Anônimas impeça essa possibilidade), os serviços e bens vinculados à prestação reverterão para a Administração Pública outorgante em razão da continuidade do serviço público, devendo o Estado, nesses casos, responder, integralmente, pelas obrigações por elas assumidas, inclusive as decorrentes de danos causados por seus servidores.

Se essas empresas governamentais não são prestadoras de serviço público, respondem subjetivamente. Aplica-se-lhes a teoria da responsabilidade com culpa. Assim deve ser, em face da sua natureza privada e da atividade econômica que exploram. Tal inteligência afina-se com o disposto no § 1° do art. 173 da Constituição Federal ("A empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias"). Pelos atos e obrigações assumidos não responde, a qualquer título (nem mesmo subsidiariamente), a Administração Pública a que pertencem ditas entidades. Os que com elas contratam estão sujeitos aos riscos inerentes ao desempenho de atividades empresariais, devendo, por isso mesmo, cercar-se das cautelas normais que todo negócio exige.

Essa responsabilidade está prevista no art. 15 do Código Civil.



12) REPARAÇÃO DO DANO E DIREITO DE REGRESSO

a) Aspectos Preliminares

A vítima de ação danosa da Administração Pública pode conseguir a correspondente indenização em sede de procedimento amigável ou Judicial. O primeiro ocorre perante a Administração Pública. O segundo passa-se junto ao Poder Judiciário. Lá se instaura um processo administrativo; aqui, uma ação judicial.

Indenizada a vítima, deve a Administração Pública restaurar seu patrimônio desfalcado com o ressarcimento, à custa dos bens do causador direto do dano, o seu agente. Essa medida (ação de regresso) está expressamente autorizada na parte final do § 6° do art. 37 da Constituição da República.

b) Procedimento Amigável

O pedido de indenização amigável processa-se perante a Administração Pública responsável pelo agente público causador do dano e, obviamente, pela indenização. O requerimento administrativo, sempre em termos, deve historiar os fatos e suas conseqüências, comprovando uns e outras sempre que necessário, e trazer o pedido de indenização (o que perdeu, o que deixou de ganhar e o que despendeu), cifrando essas verbas, mediante a apresentação de três orçamentos. Se houver atraso no pagamento, cabem, ainda, juros de mora e correção monetária.

Tal pedido é examinado pelos órgãos públicos, que, pela natureza da solicitação, devem sobre ele manifestar-se (setor de obras, se o dano é decorrente da construção de um edifício público, setor fazendário e setor jurídico). Verificada a correção do direito pleiteado quanto à lei, ao mérito e ao montante, determina a autoridade competente, ordenador primário, o pagamento. Com esse pagamento libera-se de sua responsabilidade a Administração Pública.

O normal é o pagamento da indenização em dinheiro e de uma só vez. Nada impede, por se tratar de composição de interesses disponíveis que a vítima concorde com o recebimento do montante indenizatório em parcelas. Também nada obsta que se possa convencionar o pagamento em bens. A Administração Pública dá à vítima tantos bens, de tal ou qual natureza, que sejam suficientes para a recomposição de seu patrimônio. Pode, ainda, ser pago parte em dinheiro e parte em outros bens (móveis, imóveis, direitos). A vítima, por fim, pode concordar com a restauração do bem. O Poder Público constrói o muro derrubado por veículo de sua propriedade, satisfazendo, com essa medida, a obrigação de indenizar ou mandar consertar, às suas expensas, o bem avariado. Observe-se que a composição amigável pode exigir lei autorizadora, como é o caso da entrega de bem imóvel para satisfazer a indenização.

Esse direito é prescritível. Prescreve em cinco anos (CC, art. 178, § 10, VI), contados da data do evento danoso. Assim, sob pena de prescrição, o pedido deve ser proposto antes do esgotamento desse prazo.

c) Procedimento Judicial

A ação de indenização deve ser proposta pela vítima perante a Justiça Estadual, se a causadora for pessoa jurídica integrante das administrações estaduais ou municipais. De outro lado, se a ação for contra a União, a competência é dos juizes federais, ex vi do art. 109, I, da Constituição da República. A ação é de rito ordinário e pode ser ajuizada contra a entidade responsável pelo ressarcimento ou contra seu agente causador do dano. Se dirigida contra a Administração Pública, deve o agente público causador do dano ser denunciado à lide, nos termos do art. 70, III, do Código de Processo Civil, embora nem todos os autores pensem desse modo.

A inicial, em termos, deve preencher os requisitos da legislação processual civil, notadamente o art. 282 do Código de Processo Civil. Provados os fatos, no que respeita ao dano efetivamente suportado pela vítima, e o nexo de causalidade entre o evento lesivo e o dano, garantido está o êxito da demanda, salvo se a Administração Pública demonstrar que a culpa pelo dano é da vítima.

A indenização deve ser paga em dinheiro e de uma só vez, salvo acordo. Transitada em julgado a sentença, procede-se à execução do crédito, observado o que estabelece o art. 100, e seus parágrafos, da Constituição Federal, se for contra a Fazenda Pública ou autarquia. Se for contra entidade governamental procede-se à execução como se fosse contra o particular.

Por último, ressalte-se que esse direito, entre nós, prescreve em cinco anos (CC, art. 178, § 10, VI), contados da data do evento danoso. Desse modo, sob pena de prescrição, o ajuizamento da ação indenizatória, por óbvio, há de ocorrer antes da extinção desse lapso temporal.

d) Indenização do Dano

A indenização do dano há de ser completa. Vale dizer, o patrimônio da vítima, com o ressarcimento, deve permanecer inalterado, deve-se retornar ao status quo ante. Seu valor, antes e depois do dano, deve ser o mesmo. A indenização deixa indene o patrimônio do prejudicado. Destarte, deve abranger o que a vítima perdeu, o que despendeu, e o que deixou de ganhar em razão do evento danoso.

Além desses valores, agreguem-se a correção monetária e os juros de mora, se houver atraso no pagamento. Se a indenização for em razão de lesão pessoal e morte da vítima, seu valor abrangerá o tratamento, o sepultamento e a prestação alimentícia àqueles a quem a vítima a devia, durante o tempo de sua vida provável (CC, art. 1.537). A pensão alimentícia, uma vez fixada, admite reajustamento às condições do custo de vida, conforme têm decidido os nossos Tribunais (RT, 329:257 e 601).

e) Responsabilidade Objetiva e Subjetiva

Temos a responsabilidade objetiva, nos casos de falta, anônima, quando o dano se verifica, mas não é possível apurar o agente responsável. Dessa forma, ocorrendo o dano e o nexo causal, bem como provando-se que o dano é proveniente do Estado, mesmo remotamente, está presente a responsabilidade objetiva, a qual não exige a individuação do funcionário público.

A responsabilidade subjetiva, por sua vez, ocorre quando é possível identificar o agente causador do dano, o sujeito, isto é, a pessoa que agiu ou deixou de agir, sendo neste caso possível a ação regressiva.

Em certos casos, a responsabilidade é objetiva, sem culpa, ou de presunção absoluta de culpa, bastando a relação de causalidade entre a ação e o dano, como no caso de coisas caídas de uma habitação (art. 1529 do C.C.), a responsabilidade do farmacêutico pelos erros e enganos de seu preposto (art., 1.546, do, C.C.). Em regra, a responsabilidade objetiva fundamenta-se no risco criado por determinada atividade (teoria do risco criado)

f) Ação Regressiva

É a medida judicial, de rito ordinário, prevista na parte final do § 6° do art. 37 da Constituição da República, para a Administração Pública reaver o que desembolsou à custa do patrimônio do agente causador do dano que tenha agido com dolo ou culpa. Tal medida deve ser interposta após o trânsito em julgado da sentença que condenou a Administração Pública a ressarcir o prejuízo e o pagamento do valor da indenização. Consoante legislação própria, pode-se estabelecer o prazo máximo para a interposição dessa medida.

Na esfera federal esse prazo é de sessenta dias (Lei n. 4.619/65, art. 19). Nesse prazo, salvo motivo justificado, o Procurador da República deve ingressar em juízo com o pedido de regresso, sob pena de falta funcional (citada Lei federal, art. 3°). Motivo justificado pode ser o não pagamento da indenização, dado ser esse pagamento, ao lado da culpa do causador do dano, um dos requisitos da ação de regresso. Se não proposta nesse prazo, isso não significa prescrição do direito. O descumprimento desse prazo pode implica, uma infração administrativa, nunca a perda do direito.

São requisitos dessa ação:

· a condenação da Administração Pública a indenizar, por ato lesivo de seu agente;
· o pagamento do valor da indenização;
· conduta lesiva, dolosa ou culposa do agente causador do dano.

Desse modo, se não houver o pagamento, não há como justificar-se o pedido de regresso, mesmo que o funcionário haja atuado com dolo ou culpa, e se não tiver o agente se comportado com dolo ou culpa, não pode vingar o pedido de regresso, mesmo que tenha havido o pagamento. Observe-se que o primeiro requisito pode não existir se a satisfação do prejuízo causado aconteceu por via amigável. Nesse caso, devem ficar cabalmente demonstrados os dois últimos.

O direito de regresso prescreve em vinte anos, ex vi do art. 117 do Código Civil, já que não subordinado o prazo, especial, e da jurisprudência de nossos Tribunais (RT, 131:132, 223:546, 230:483 e 259: 269). Dentro desse prazo, a ação de regresso pode ser ajuizada contra o agente causador do dano e, na sua falta, contra seus herdeiros ou sucessores. Ademais, pode ser intentada, se não prescrito o direito, após o afastamento (exoneração, demissão, disponibilidade, aposentadoria) do agente causador do dano de seu cargo, emprego ou função pública.

Esse procedimento pode ser levado a efeito na esfera administrativa. De fato, satisfeito o dano, seu agente causador é convocado a recompor o prejuízo que com sua ação, culposa ou dolosa, proporcionou à Administração Pública. Entendendo corretos e justos o procedimento e o valor a ressarcir, o agente público concorda e efetua o pagamento de uma só vez ou em certo número de parcelas, variáveis ou fixas, descontáveis em folha, que, a final, satisfarão o montante do ressarcimento.

Essas prestações, consoante fixado em lei, não poderão exceder certos limites. Nenhum limite nesse sentido existe na Consolidação das Leis do Trabalho. Sendo assim, o desconto poderá atingir percentual maior, sem alcançar, contudo, o total do salário.

A responsabilidade civil dos funcionários perante a Fazenda Pública, na ação regressiva, tem por fundamento a culpa ou dolo com que eles se tenham havido em relação ao fato danoso e se estende aos seus herdeiros ou sucessores, não excluindo a responsabilidade penal nem a administrativa, porventura ocorrentes.

A teoria do risco administrativo faz surgir a obrigação de indenizar o dano, do só ato lesivo e injusto causado à vitima pela Administração. Não se discute a culpa da Administração ou de seus agentes; basta que o lesado ou vitima demonstre o fato danoso e injusto ocasionado por ação ou omissão do Poder Público.